quinta-feira, novembro 06, 2014

A imprensa e o segredo - DEMÉTRIO MAGNOLI

O GLOBO - 06/11


Dilma e Lula sabiam de tudo sobre o escândalo de corrupção na Petrobras, teria declarado o doleiro Alberto Youssef na moldura da delação premiada. A notícia bombástica, publicada por Veja na antevéspera do segundo turno, não apareceu nos telejornais da Globo daquela sexta, mas ganhou manchete da Folha de S.Paulo no dia seguinte. Você pode interpretar as diferenças de comportamento entre os três veículos sob as lentes da disputa partidária, mas apenas se apreciar teorias conspiratórias ou estiver a serviço de uma agenda política.

Na Folha, um jornalista enveredou pela trilha minada, atribuindo o silêncio da Globo ao “medo” do governo. A resposta, assinada por Ali Kamel, diretor de Jornalismo da emissora, transferiu a polêmica para o campo da ética jornalística: “A Globo (...) não faz política, faz jornalismo. (...) só repercute denúncias de outros veículos se puder confirmá-las por meios próprios”. O princípio parece ter orientado a própria Folha quando publicou a denúncia de Youssef junto com a explicação de que a confirmara com suas fontes. A revista e o jornal não estavam noticiando que Dilma e Lula sabiam do desvio de somas astronômicas da estatal para o PT, o PMDB e o PP. Contudo, empenhavam a sua reputação na informação de que Youssef declarara isso às autoridades judiciais. Fizeram jornalismo ou política?

Naquele sábado, véspera da eleição, militantes da União da Juventude Socialista (UJS), um tentáculo do PCdoB, promoveram atos de vandalismo diante da sede da Editora Abril, acusando a revista de conspirar contra a candidatura de Dilma Rousseff. À noite, os telejornais da Globo noticiaram o evento e o contextualizaram. “O ataque ao prédio da Editora Abril, um ataque à liberdade de imprensa, não poderia ser ignorado”, argumentou Kamel, para concluir: “E, ao ser noticiado, era preciso explicar que ele fora motivado por uma reportagem, sem endossá-la”. Na celebração da vitória de Dilma, militantes petistas entoaram palavras de ordem contra a Globo. Dias depois, Lula qualificou a edição de Vejacomo “um panfleto da campanha do Aécio”, mas não se referiu à Folha. É política contra política ou política contra jornalismo?

A expressão “guerra midiática” alcançou estatuto oficial na Venezuela de Hugo Chávez. O ex-presidente “bolivariano” chegou a promover um encontro latino-americano destinado a consagrar a tese de que a imprensa é um instrumento de potências estrangeiras ou de elites nacionais contra governos “populares”. Na Argentina, no Equador e na Bolívia, a tese sustenta campanhas estatais contra a liberdade de imprensa. No Brasil, desde o escândalo do mensalão, foi abraçada por setores do PT e encampada por Franklin Martins, que trocou a posição de comentarista político da Globo pela de ministro das Comunicações de Lula. Em seu primeiro mandato, Dilma afastou-se do rumo esboçado nos anos anteriores, congelando as propostas de “controle social da mídia” que se articulavam sob o comando do ministro. Hoje, contudo, no rastro dos vazamentos do escândalo na Petrobras, multiplicam-se os indícios de ressurreição do projeto engavetado. O tácito respaldo de Lula às arruaças da UJS não é um raio no céu claro.

O colunista Janio de Freitas, da Folha, definiu a reportagem de Veja (e, talvez, a confirmação da mesma Folha...) como uma “investida originada na imprensa para interferir na disputa eleitoral”, sugerindo paralelos entre a publicação da denúncia e o golpe militar de 1964. A senha do “golpismo midiático”, utilizada pelo PT na hora do mensalão, disseminou-se pela rede de blogueiros patrocinados pelas estatais. Mas as acusações à revista revelaram-se inconsistentes. O depoimento de Youssef aconteceu na terça, apenas três dias antes da sua publicação: era notícia nova. Veja não operava segundo um critério partidário: como em eleições anteriores, a revista organizara com larga antecedência um programa de circulação antecipada. A imprensa não tem o direito ético de sonegar informações relevantes em função do calendário eleitoral. Nem o de julgar o interesse público de uma notícia na balança de suas hipotéticas consequências políticas.

Segundo a tese chavista, a “mídia” é uma entidade monolítica, que opera como “partido da burguesia”. O cenário descortinado a partir da reportagem de Veja não se encaixa nessa interpretação caricatural. Na sua réplica ao jornalista da Folha, Kamel esclareceu que, “na sexta”, a Globo “não confirmou com suas fontes o sentido do que fora publicado por Veja” e, ainda, que as fontes da emissora “classificaram de distorcida” a manchete da edição de sábado da Folha”. O “não confirmou” não significa que as fontes da Globo desmentiram as da Veja, mas a palavra “distorcida” sugere algo mais. À primeira vista, a apuração da Globo indicaria que as fontes da emissora interpretam como de segunda mão as informações da Veja e da Folha. A revista e o jornal teriam se baseado em fontes com acesso às gravações, mas não nas próprias gravações.

O jornalismo livre não produz discursos monocórdicos, como fazem as agências estatais e as assessorias de imprensa. Veja e Folha arriscaram sua credibilidade, pois acreditam nas suas fontes. A Globo, que também acredita nas suas, diferentes, preferiu adotar postura mais cética. Nenhum dos veículos, porém, questionou o princípio jornalístico de que a missão da imprensa é dar notícias de interesse público, mesmo se oriundas de vazamentos judiciais: nas democracias, a proteção do segredo de Justiça não é responsabilidade de jornalistas, mas de policiais e juízes.

Sob o influxo da tentação autoritária de “controle social da mídia”, o episódio converteu-se em nova plataforma de ataque contra os princípios do jornalismo. Não fosse isso, estaríamos discutindo o que, de fato, interessa: a excessiva amplitude do instituto do segredo de Justiça no sistema judicial brasileiro

Pós-eleições - o diálogo que interessa - SERGIO FAUSTO

O ESTADO DE S.PAULO - 06/11


Já no dia seguinte ao pleito o ex-presidente Lula pôs seu bloco na rua com vista a 2018. Depois de dizer o diabo na eleição, ele ressurge conciliador em vídeos postados na internet, nos quais se dirige fundamentalmente às "classes médias" (velhas e novas) para recompor uma interlocução que se deteriorou nos últimos quatro anos. Dirige-se também à militância de seu partido, aconselhando-a a não se deixar levar pela "campanha de ódio contra o PT", um recado aos jovens radicalizados que emporcalharam a sede da Editora Abril. Enfim, um primor de astúcia política e desfaçatez (o ex-presidente chega a invocar a si próprio como exemplo de político que não se vale de ofensas para combater os partidos adversários).

Lula sabe que o discurso do "nós somos pelos pobres e eles pelos ricos" não o levará à vitória em 2018. Se o País retomar o crescimento, as novas "classes médias" voltarão a se expandir, com ainda maiores expectativas de ascensão social, e o número de pessoas realmente pobres se reduzirá a um contingente menos expressivo eleitoralmente. Se o crescimento continuar rastejando, as novas "classes médias" estarão frustradas em suas expectativas de maior ascensão ou iradas com a condição de "novos pobres", prontos a castigar o governo de turno.

Os desajustes produzidos pela "nova matriz econômica" são tantos que o cenário mais provável aponta para a continuidade do crescimento medíocre com inflação incômoda. A diferença está em que, de agora em diante, haverá aumento do desemprego. Acabou o vento de cauda da economia internacional e se esgotaram os motores do consumo público e privado, que puxaram o crescimento brasileiro nos últimos anos. Sobrou uma agenda de problemas provavelmente maior que a capacidade do "novo" governo de solucioná-los, agravados por uma crise política latente. Tem razão Lula quando diz: "Mais quatro anos como estes e estaremos perdidos" - frase citada na imprensa. A questão é que não será nada fácil tornar substancialmente melhor o próximo período presidencial.

Fiar-se nessa previsão, porém, é o maior erro que poderá cometer a oposição. O PSDB fez sua melhor campanha desde que deixou o poder, em 2002. O campo das oposições ampliou-se, com o PSB e a firme posição assumida por Marina Silva. Nunca o PT esteve tão perto de ser derrotado, nos últimos 12 anos. Mas a força política das oposições ainda é uma incógnita. Entre outras coisas, ela dependerá da articulação de um discurso que permita disputar, com vantagem, corações e mentes das classes médias baixas e intermediárias, que compõem o grosso do eleitorado. O mesmo contingente eleitoral em que o PT perdeu terreno nesta eleição e para o qual Lula começou a acenar mal terminada a apuração. Trata-se de pessoas e famílias que vivem tensionadas entre o medo de retroceder e a aspiração de ascender socialmente. Estão integradas ao mercado, mas não podem dispensar serviços públicos, como o fazem, em maior medida, as classes de renda mais alta. Nas novas classes médias, os jovens têm mais educação que seus pais. Muitos se endividaram para cursar o ensino superior privado. Terão de pagar a dívida em meio às incertezas de um mercado de trabalho bem mais apertado do que até aqui.

A oposição precisa falar para esse eleitor. Ele não tem dono. Não é movido por fúrias ideológicas, votou majoritariamente no PT nas duas eleições anteriores, mas nesta deu sinais de estar mudando de posição. O desafio é ampliar e consolidar esse movimento. Confrontar a propagação de inverdades é o primeiro passo nessa direção. Exemplo típico é a afirmação - repetida diversas vezes por Lula nos vídeos pós-eleitorais - de que antes do PT os "pobres estavam fora do orçamento do governo federal". Ora, quem pôs os pobres no orçamento federal - mais bem dito, quem fincou os alicerces dos direitos sociais para todos - foi a Constituição de 1988, ao estabelecer a saúde como direito universal e definir a educação fundamental como dever do Estado, além de prever a Lei Orgânica da Assistência Social. Tais conquistas continuariam letra morta não fosse o Plano Real, que debelou a hiperinflação. Quem pôs em marcha os programas para torná-las viáveis foi o governo FHC. Antes de chegar ao poder o mérito do PT, apesar de votar contra todas essas medidas, consistiu em organizar movimentos de reivindicação de direitos sociais e deslocar a competição política para a esquerda.

Tão ou mais importante que pôr os pingos nos is é elaborar um discurso político que supere a dicotomia entre o "econômico" (o mercado, essa entidade mal afamada no Brasil) e o "social" (produto da ação de um Estado benfeitor). Falta ainda articular um discurso que, sem ser populista, não seja tecnocrático; sem ser "de confronto", seja político, no sentindo de explicitar conflitos distributivos que se dão pela alocação de recursos públicos. Por que a campanha de Aécio Neves não politizou o tema da "bolsa empresário", por exemplo?

A tarefa das oposições é escrever uma partitura que convença o eleitor médio de que um Estado fiscalmente equilibrado, ativo, mas não discricionário, um mercado mais livre e mais bem regulado e uma sociedade civil autônoma são não apenas a melhor combinação possível para a realização de suas expectativas de progresso individual e familiar, mas também o caminho certo para um País mais rico e mais justo. Nessa partitura o meio ambiente deve ser uma nota dominante. Para dizer o óbvio, o "ambiental" é constitutivo do "social" e do "econômico". Agora num sentido mais radical do que jamais foi na história da humanidade, já que a natureza, em desarranjo provocado pelo homem, ameaça transformar definitivamente as condições de vida no planeta.

O mandato recebido das urnas é inquestionável. A hora não é de deploráveis passeatas. É da disputa de projetos, com respeito à democracia, patrimônio comum de todos nós.

Economia política - SÍLVIO RIBAS

CORREIO BRAZILIENSE - 06/11
O que levou a economista Dilma Vana Rousseff, presidente da República, a errar tanto na condução da economia brasileira? Quando estreou no comando do Executivo, em 2011, sua avaliação sobre o momento econômico do país estava corretíssima, a de que o país precisava (e ainda precisa) de novo motor para o progresso, trocando o protagonismo do consumo pelo dinamismo do investimento produtivo. Só que a a receita para alcançar o objetivo é que estava redondamente enganada, divorciada da realidade local e global. Por questão de fé ideológica e das prerrogativas do sistema presidencialista, o Brasil perdeu tempo e dinheiro.

Dilma apostou todas as fichas na capacidade de o Estado liderar grandes projetos estruturantes, despejando recursos do Tesouro e dando papel destacado a novas e velhas estatais, a agentes públicos de financiamento e a órgãos federais de controle, todos contaminados pelas práticas de gestão discutíveis e pelo aparelhamento político. O resultado disso tudo foi a grave desconfiança dos investidores privados, os erros de cálculo, a ineficiência na execução de planos e, ainda, os bilhões de reais drenados pela corrupção.

Com estragos explícitos em praticamente todos os indicadores econômicos, a presidente se reelegeu graças ao voto de confiança dos induzidos pelo terrorismo eleitoral e dos que se agarraram ao único índice positivo da gestão petista, o emprego. Mas esse trunfo é o mais ameaçado pela deterioração dos fundamentos econômicos e pela degringolada da indústria. Diante do espelho e de uma realidade bem pior que esperava, a presidente busca forças em seu interior e no ex-presidente Lula para ceder aos anseios da "gente do mercado" e contrariar o pesamento próprio.

O primeiro e maior dos desafios colocados para o segundo mandato da petista, que já começou, é nomear um ministro da Fazenda simpático ao capitalismo que tenha mínima autonomia em relação à gerente do Brasil. Se ela continuar resistindo aos fatos em nome de um ideário pessoal, só deixará explícito o pior quadro de dificuldades para a economia desde o início da estabilização, há 20 anos.

Voltando à pergunta inicial deste artigo, afirmo que Dilma foi traída pelas próprias convicções. Elas podem ser resumidas numa frase do discurso de homenagem à professora Maria Conceição Tavares, em 2012. A discípula disse ter aprendido com a mestra que "economia deve ser sempre tratada como economia política". Simples assim.

O Brasil sentado no fundão - VINICIUS TORRES FREIRE

FOLHA DE SP - 06/12

País sofre mais na América Latina porque governo também não soube lidar com a crise mundial


O BRASIL NÃO será o pior aluno da classe de economia latino-americana neste ano porque há Argen- tina e Venezuela. No quadriênio 2011-2014, ficará na lanterna entre as economias mais relevantes da região.

Como tediosamente se sabe, o governo alega que a economia se arrasta por causa da "crise mundial". A oposição argumenta que a desculpa não para em pé porque países da região crescem bem.

Sob Dilma Rousseff, teremos crescido em média cerca de 1,6% ao ano, ante mais de 4% do Chile, mais de 5% de Colômbia, Peru e Uruguai. Mesmo o México, um dos piores desempenhos da região nos últimos 20 anos, terá avançado 2,8%.

Posto nesses termos, o debate é ruim. Do lado da oposição, pressupõe-se que a economia brasileira possa ser comparada, sem mais, às dos demais países latino-americanos. Não pode, dadas as diferenças de tamanho, nível médio de renda, variedade produtiva e relevância do setor industrial, para citar o mais óbvio. O país mais assemelhado ou comparável ao Brasil seria o México, que, no entanto, é uma economia atrelada à dos Estados Unidos.

Para começo de conversa, a explicação governista condena o Brasil à dependência passiva dos humores mundiais, e as políticas brasileiras, à quase irrelevância. Nesse nível de banalidade, o argumento valida a tese de que o Brasil teria crescido nos anos Lula porque especialmente favorecido pelo crescimento mundial da década passada.

A crise e também as mudanças da economia mundial depois de 2008 podem ter tido impacto específico maior no Brasil industrializado do que na vizinhança.

O país foi afetado pela grande sobra de mundial de manufaturados baratos. Pelo contínuo avanço chinês sobre nossos mercados de manufaturados. Pelo dólar barateado pela sobra mundial de capital, pelos juros mundiais a quase zero, pelo saldo comercial propiciado pela alta do preço das commodities de exportação. Passamos a importar mais e exportar menos produtos industriais. A indústria está na mesma desde 2008.

Isto posto, porém, o governo ignorou tais problemas ou procurou corrigi-los com remendos que, agora se nota, danificaram o conjunto da economia pelo menos até 2016 ou 2017.

O governo tolerou a alta de custos (inflação), o que piorou o efeito do dólar barato na indústria (o Brasil ficou ainda mais caro). Tentou compensar a indústria com auxílios fiscais diversos (subsídios, empréstimos oficiais baratos, redução de impostos mal projetadas, tentativa fracassada de reduzir o custo da energia). Provocou assim uma calamidade nas contas públicas, des- crédito, mais valorização do real, inflação persistente e alta de juros, para nem mencionar várias ineficiências criadas por intervenções equivocadas. Os problemas da indústria continuam pelo menos os mesmos, mas provocou-se descalabro macroeconômico.

Corrigir os excessos do fim do governo Lula e enfrentar o ambiente externo adverso provavelmente custariam o crescimento de curto prazo, haveria Pibinhos. Mas ao menos a economia não estaria em desordem e poderiam ter sido tentadas inovações para lidar com os problemas de uma economia de renda média e industrializada nesse novo ambiente mundial.

Do Facebook para as ruas. Desta vez é pra valer - FLÁVIO ST JAYME

GAZETA DO POVO - PR - 06/11

Manifestações populares no Brasil estão tomando sentidos diversos. Organizadas via Facebook, é comum terem a confirmação de 2 mil ou 3 mil pessoas, mas o comparecimento de 50 ou 100. Claro, é muito mais fácil protestar no sofá de casa, com apenas um clique, do que ter de ir para a rua reivindicar seus direitos. Ou, como aconteceu nas manifestações do ano passado, se meter em atos de violência só pra fazer selfie e postar no Instagram.

Felizmente, o que se viu no último dia 1º de novembro foi bem diferente. Pessoas de todas as idades foram às ruas (ainda em número menor que o de confirmações de Facebook, é verdade) para demonstrar sua insatisfação com o governo federal reeleito. Em Curitiba e São Paulo, pessoas marcharam com gritos de guerra e sem vínculo com partido algum, exigindo nada menos que honestidade e coerência.

Não vou questionar aqui, de modo algum, a legitimidade do processo eleitoral – embora estejam, aos poucos, surgindo evidências de possíveis fraudes nesse sentido. O que penso a respeito, e proponho o pensamento, é: como ficar calado diante de um governo reeleito que é comprovadamente corrupto e que está querendo se valer de atos inconstitucionais para garantir seu poder?

O Foro de São Paulo, criado por Lula e Fidel Castro em 1990, é uma aliança dos países de esquerda da América Latina que pretende criar uma “unidade comunista”, implantando governos socialistas em eleições ditas democráticas convertidas em governos totalitários. Defendido com unhas e dentes pelos petistas, o Foro já declarou (na pessoa de Lula) seu apoio incondicional às Farc em 2001, acusando de terrorismo as ações do governo colombiano contra a organização. Existem inclusive evidências de dinheiro das Farc sendo utilizado na campanha presidencial de Lula. Dilma, a presidente reeleita, apoia obviamente o Foro de São Paulo.

É preciso que se lembre de um fato muito importante: praticamente metade do país não queria Dilma no poder (3 milhões de votos é uma diferença ínfima nesse sentido). Protestar agora pode parecer coisa de criança birrenta que não sabe perder; no entanto, trata-se de um número expressivo de brasileiros insatisfeitos e isso não pode significar somente birra. As acusações contra Dilma e Lula no caso Petrobras (que os petistas insistem em não querer ver) são gravíssimas. Por muito menos a população foi para a rua para tirar Fernando Collor do poder. Por que a população deveria se calar agora? Por que não exigir investigações e conferências?

A despeito dos gritos de guerra ecoados ou dos pedidos (como impeachment e intervenção militar), não partamos para extremismos. A população deve exigir, sim, saber. Exigir investigação. As denúncias são graves e fortes, não podem passar impunes sem ao menos uma investigação. A população elegeu Dilma. Ela é “funcionária do povo”. Nada mais natural que este povo exija uma explicação.

Muito se falou nas redes sociais após a eleição em separatismo, em dividir o Brasil. Isso, claro, é absurdo. Neste momento, o que o país mais precisa é de união. Em vez de querer dividir, se unir e dar as mãos contra um sistema e um poder que, visivelmente, está definhando o país. Agora, sim, é a hora de ir para as ruas. Manifestações como as do dia 1º de novembro demonstraram que a população sabe, sim, exigir seus direitos de forma pacífica, sem quebra-quebra e sem máscaras. Com a cara limpa e sem vergonha de gritar e exigir seus direitos.

Sejamos os novos “caras-pintadas”. Que nos inflamemos novamente e tenhamos coragem de gritar a plenos pulmões pela volta da democracia conquistada a duras penas e que hoje está sendo camuflada e cada vez mais convertida em totalitarismo. Mostremos ao país que a indignação não é “uma mosca sem asas” e que pode e deve passar da tela de nossos computadores para atos reais, e demonstremos a força para transmitir a mensagem de uma juventude, sim, preocupada com o futuro do país. Precisamos de explicações.

***Flávio St Jayme, jornalista e empresário, é sócio-proprietário da agência Clockwork Comunicação e tem formação em Pedagogia e História da Arte

A elite estatal e seus reféns - CLEBER BENVEGNÚ

ZERO HORA - 06/11

A mais perversa das elites é a elite estatal. Ela quer que você compre um carro e diga: “Obrigado, governo. Como você é bondoso!”. Faça uma faculdade e diga: “Obrigado, governo. Eu te devo essa!”. Suba na vida e diga: “Obrigado, governo. Eu não seria nada sem você!”. Ela sequestra seu pensamento e inverte a lógica da vida social, fazendo parecer que você serve ao governo _ e não o contrário.
O protagonismo das pessoas é substituído pelo protagonismo do aparato estatal. Embalada no glamour da luta de classes, essa elite se apresenta como monopolista da justiça. Como se o dinheiro dos impostos, que subsidiam absolutamente todos os beneplácitos estatais, não viesse da própria sociedade. Como se o Estado, ele mesmo, gerasse riqueza e desenvolvimento.
A história é repleta de exemplos de elite estatal, à direita e à esquerda _ na América Latina, recentemente, esse último exemplo é mais vasto. Mistura supremacia coronelista com populismo assistencialista. Discursa para um lado e, com os seus, age para o outro. Enriquece nas barbas do poder. E legitima tudo em nome de um fim supostamente elevado.
É uma elite que verbaliza amor aos pobres, desde que estejam a seu serviço. Que prega integração dos negros, desde que julguem conforme seus interesses, sem trair a “causa”. Que quer conciliação, desde que ganhe as eleições. Que defende liberdade de imprensa, desde que os critérios disso sejam definidos por seus conselhos.
A elite estatal quer fazer crer que ela é o próprio bem. Quer substituir-se à ética universal. Quer que você se sinta em débito, creditando-a como um instrumento de solidariedade. Quer posicionar-se como indispensável até mesmo no ambiente privado. Se deixar, quer até mesmo dizer como você deve educar seus filhos. Quer que você devolva algo que simplesmente é seu, por direito natural e constitucional.
Não deixe que ninguém roube seus méritos e seu protagonismo. Nenhum partido é dono do seu destino. Nenhum. Quem faz acontecer são as pessoas, não o governo. Libertar-se dessa culpa social é um passo importante para evoluir. É o antídoto para evitar uma nação politicamente amorfa e culturalmente refém.

O último bastião - ELIANE CANTANHÊDE

FOLHA DE SP - 06/11


BRASÍLIA - Se eu fosse a presidente Dilma, acenderia dezenas de velas no Palácio da Alvorada para o emprego não começar a cair. Todos os indicadores econômicos, ladeira abaixo, ameaçam puxar também esse último bastião da campanha e do primeiro mandato de Dilma.

Nem o combate à miséria resistiu a esses quatros anos. Curiosamente atrasada, nos chega agora a notícia de que, pela primeira vez em dez anos, há uma interrupção na redução do total de miseráveis. O número caía ano a ano, mas passou a apresentar um leve movimento de alta. Os 10,08 milhões de brasileiros que em 2012 não tinham renda suficiente nem para uma cesta mínima de alimentos cresceram 3,7% e passaram a 10,45 milhões em 2013.

Trata-se de notícia oficial, de órgão oficial (Ipea), baseada em dados oficiais (do IBGE). Mas foi adiada para depois das eleições, sabe-se lá por quê. Ou será que a gente sabe? Em 2010, quando eram bons para Lula, os dados foram anunciados no meio das eleições. Em 2014, quando são ruins para Dilma, só são depois, e discretamente.

O quadro é o seguinte: estagnação da economia, alta dos juros, inflação no teto --ou acima do teto-- da meta, contas públicas no vermelho pela primeira vez em décadas, contas externas muito desfavoráveis ao Brasil, redução de importações de máquinas e equipamentos essenciais à indústria --que vem caindo.

Era óbvio, portanto, que o número de miseráveis pararia de cair, indicando que pode até subir. Como é óbvio que os empregos --que se seguram com os menos qualificados, que menos colaboram para o aumento da produtividade-- também deverão sofrer os efeitos dessa confluência nefasta na economia.

Depois de ouvir Lula longamente, Dilma defendeu nesta quarta (5) que é hora de todo mundo descer do palanque. É mesmo, tem toda razão, até porque ganhar a eleição já não foi fácil, mas corrigir rumos e tirar o país do buraco vai ser mais difícil ainda.


Ao perdedor, o festejo - DORA KRAMER

O ESTADÃO - 06/11

Mesmo depois de virar água passada, a eleição de 2014 continua produzindo fatos inusitados. Passado o baque daquela noite de domingo (26), em que o PT mais uma vez tirou o PSDB da rota de volta da planície ao Planalto, a oposição não faz outra coisa a não ser comemorar a derrota.

O entusiasmo, a unidade de ação e o pensamento dos perdedores contrastam com os reclamos, as divergências e a desorientação dos vencedores que ficaram com o governo, mas herdaram uma oposição cujos primeiros acordes sinalizam que será completamente diferente daquela que saiu das três eleições anteriores.

E a razão não está apenas no aumento do número de votos. Inclusive porque não foi assim tão significativa: José Serra teve 44% em 2010 e Aécio Neves, 48,4% agora.

A diferença está no entendimento por parte dos oposicionistas de que a eles cabe o papel de vocalizar o contraditório e se expressar em nome de parcelas da sociedade não apenas nos momentos em que precisam de votos.

A volta do senador Aécio Neves à cena, com seus discursos ontem na reunião da Executiva do PSDB e na tribuna do Senado, resume o que já vinha sendo dito e escrito por lideranças do partido: a oposição promete ser combativa, vigilante, contundente, incansável e não se limitar ao ambiente do Congresso.

Aécio deixou isso muito claro quando alertou ao governo para que não olhasse a oposição apenas pela ótica do tamanho de suas bancadas no Parlamento, mas na perspectiva dos 51 milhões de cidadãos que optaram pela candidatura dele e em nome dos quais, anunciou, "vamos fazer a mais vigorosa oposição que este Brasil já assistiu".

A cena fez lembrar outra, cerca de quatro anos atrás, quando Aécio Neves recentemente eleito senador subiu à mesma tribuna para fazer um discurso a fim de se apresentar (era a expectativa) como líder da oposição. Palavras brandas, foi aparteado por senadores do PT um após o outro em saudações elogiosas, no tom algo irônico de quem recepciona o oposicionista que pediu a Deus.

Retraído, pouco combativo, assim se comportou. É possível que isso tenha feito a diferença agora entre a vitória e a derrota. E por isso a entonação ontem foi outra: a começar por lembrar que a presidente Dilma Rousseff está tomando medidas que durante a campanha dizia que o adversário iria tomar.

Discurso que ela agora gostaria que fosse esquecido.

Extremos. Os protestos pós-eleitorais que degeneram para a defesa da volta dos militares são a outra face da moeda de gestos, tais como a recente assinatura de convênio entre o MST e o governo da Venezuela para troca de conhecimentos sobre os fundamentos da "revolução social".

Os primeiros foram repudiados pela oposição; de bom alvitre seria que, em relação ao intercâmbio bolivariano, o governo brasileiro pudesse dizer que não tem nada com isso.

Nada impede. Passada a eleição, perdeu a validade o argumento do ex-presidente Luiz Inácio da Silva para não atender ao convite da Polícia Federal que, desde fevereiro, tenta ouvi-lo sobre um depoimento de Marcos Valério de Souza apontando a interferência de Lula e de Antônio Palocci em repasse de R$ 7 milhões da empresa Portugal Telecom ao PT.

O inquérito foi aberto em abril de 2013 e a PF aguarda o depoimento do ex-presidente (como testemunha) para concluí-lo. O convite foi feito reiteradas vezes, mas só respondido de forma indireta pelo advogado Márcio Thomaz Bastos dizendo que iria tentar marcar uma data.

Quando o assunto veio a público, em setembro último, a alegação foi a de que no curso da campanha eleitoral não seria o período mais conveniente.

Sem tranquilidade - MERVAL PEREIRA

O GLOBO - 06/11

Tendo ainda pela frente mais alguns meses do primeiro mandato, e outros quatro anos de um segundo, a presidente Dilma não conseguiu ainda sair das cordas, apesar de vitoriosa nas urnas. Para seu azar, vai terminar o ano com um crescimento pífio, talvez abaixo de 0,5%, e engatar outro ano de economia débil, faça ou não as mudanças necessárias.

Mesmo se as fizer, vai aprofundar a recessão da economia e terá que conviver com pelo menos mais um ano ou dois de crise para tentar chegar ao final do mandato com a situação mais ou menos controlada. A herança maldita que herdou de si mesma afetará não apenas o seu governo, mas os projetos futuros de Lula e do PT, especialmente se Dilma quiser dobrar a aposta em seus métodos.

Se por um lado não tem o que perder nesse segundo mandato, pois não alimenta nenhum projeto político futuro, a presidente reeleita terá que lidar com as angústias de seu partido de adoção e, sobretudo, com um Lula disposto a mudar o jogo para não afundar o projeto de poder que tanto alimenta, com ou sem ele no governo.

A insistência de Lula para que Dilma coloque no Ministério da Fazenda Henrique Meirelles ou o presidente do Bradesco, Luiz Trabuco, mostra que o ex-presidente sabe exatamente o tamanho da encrenca em que o governo petista está metido, e sabe também o caminho a ser seguido, como fez em 2002 ao ser eleito pela primeira vez.

Como Dilma não é Lula, nem na capacidade de negociação nem na arte da dissimulação, é improvável que nomeie para a Fazenda alguém com luz própria. Lula terá então a possibilidade de se afastar de sua protegida com boas razões para criticá-la, surgindo como uma alternativa em 2018 para o PT.

Dilma terá que tourear neste 2º mandato um Congresso muito mais inquieto, até mesmo pelas ameaças que as delações premiadas estão produzindo, com uma base aliada muito mais infiel, e uma oposição reforçada pelas urnas. Pela primeira vez em 12 anos, o PT terá uma oposição sistemática ao seu governo, sem receio de ser jogada contra "a vontade popular". Simplesmente por que essa oposição atual representa quase tantos eleitores quantos os que votaram na continuidade do governo Dilma.

O maior aliado do PT no governo é o PMDB, também seu pior adversário. Saído das urnas com boa parte de seus quadros trabalhando com a oposição em diversos estados do país, o PMDB chega ao segundo mandato disposto a assumir o papel de fiel da balança, colocando-se mais como um contraponto do que um aliado do PT.

Lula, como sempre, atua dialeticamente, tentando levar a economia para o campo ortodoxo, mas propondo uma guinada à esquerda na política, inclusive para suprir uma eventual falta dos partidos de centro-direita que, mesmo na base aliada, já sentem o vento soprar em outra direção.

O PMDB já anunciou que apresentará sua versão da reforma política, o que prenuncia um embate dentro da base aliada em torno de temas fundamentais, como financiamento público de campanha, constituinte exclusiva, democratização da mídia, conselhos populares, temas caros aos petistas que encontram no PMDB forte resistência.

Por isso, não se sabe a quem a presidente Dilma enviou uma mensagem cifrada em sua fala de ontem, quando afirmou quer "há de saber ganhar, há de saber perder. A atitude do ganhador não pode ser de soberba, nem pretensão de ser o último grito em matéria de visão política. Saber perder é saber em que ponto você está e não significa que vamos construir um muro no Brasil".

Palavras ponderadas de quem vê dificuldades pela frente. Já o PT, num documento de sua Executiva Nacional, deixou de lado as sutilezas para abrir o jogo: "É urgente construir hegemonia na sociedade, promover reformas estruturais, com destaque para a reforma política e a democratização da mídia" (...) "Para transformar o Brasil, é preciso combinar ação institucional, mobilização social e revolução cultural".

São palavras de um partido que quer retomar seu viés revolucionário, depois do susto de ser quase derrotado nas eleições presidenciais. Diante da disposição da oposição de não dar trégua aos petistas, no Congresso e nas ruas, pode-se prever os "tempos interessantes" da maldição atribuída a Confúcio, em que os riscos e os sofrimentos não cessam, impedindo a tranquilidade.

Constrangimento na Petrobrás - EDITORIAL O ESTADÃO

O ESTADO DE S.PAULO - 06/11


Foi necessária a pressão de uma auditoria estrangeira, que está sujeita às rigorosas leis dos Estados Unidos, para que um diretor da Petrobrás acusado de envolvimento no escabroso esquema de corrupção na estatal acabasse afastado do cargo. Tudo leva a crer que, não fosse por isso, predominaria mais uma vez a vista grossa - e o diretor continuaria em suas funções como se nada de errado ou ilegal tivesse acontecido. No governo petista, todos prometem combater os malfeitos, mas a história mostra que, na maior parte das vezes, os malfeitores só são afastados quando o escândalo já não pode mais ser abafado.

O Conselho de Administração da Petrobrás passou os últimos dias sob forte tensão, conforme noticiou o Estado. Em vez de priorizarem as discussões sobre o necessário reajuste dos combustíveis - afinal aprovado, mas ainda sem definição de porcentual nem de data para entrar em vigor -, para superar a crise financeira da estatal, seus integrantes tiveram de gastar energia para tratar do assunto que assombra a empresa e que agora, por força da auditoria externa, ameaça prejudicar ainda mais sua imagem lá fora - justamente no momento em que mais precisa de capitais estrangeiros.

Responsável por auditar os balanços financeiros e operacionais da Petrobrás, a PriceWaterhouseCoopers (PwC) resistia a aprovar a demonstração contábil porque entre os que a avalizaram constava o nome de Sérgio Machado, presidente da Transpetro, subsidiária de transporte e logística da Petrobrás. Segundo afirmou Paulo Roberto Costa, ex-diretor de Abastecimento e pivô do escândalo na estatal, Machado lhe deu R$ 500 mil em dinheiro para direcionar uma licitação.

Ao tomar conhecimento da delação de Costa, a PwC fez duas exigências à Petrobrás: a contratação de outras duas auditorias independentes, para ampliar as investigações, e a demissão imediata de Machado - ex-deputado, ex-senador e afilhado do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), nomeado para o cargo em 2003, no governo Lula.

Não se trata de um capricho da auditora. Como a Petrobrás tem ações negociadas na Bolsa de Nova York, ela está submetida à legislação que regula o mercado de capitais nos Estados Unidos. Essa lei manda que os auditores incluam em seu trabalho "procedimentos concebidos para detectar, com razoável grau de confiança, atos ilegais que tenham tido efeitos materiais diretos na determinação dos montantes declarados". Conforme a norma, o Conselho de Administração da Petrobrás, uma vez notificado pela PwC, deve declarar-se ciente das demandas perante as autoridades americanas.

O Conselho de Administração aceitou contratar as auditorias exigidas pela PwC e encontrou uma maneira de afastar Machado - oficialmente, ele se licenciou por um mês, até que se concluam as investigações sobre seu envolvimento. Na prática, o governo considera que sua volta ao cargo é improvável, em razão da pressão da PwC, mas não é isso o que pensam os padrinhos de Machado. Peemedebistas ouvidos pelo jornal O Globo disseram que a saída de Machado é apenas provisória.

Esse caso mostra como a Petrobrás, aparelhada pelos petistas e seus associados, está amarrada a compromissos políticos que lhe tiram a autonomia necessária para agir conforme interesses exclusivamente empresariais. No momento em que enfrenta dificuldades consideráveis e precisa empenhar-se para superá-las, a estatal passa pelo constrangimento de ter suas contas questionadas por uma auditoria americana.

Ainda que a Petrobrás consiga convencer os auditores da PwC de que fará o que for necessário para livrar-se da corrupção, fica claro que os responsáveis pela estatal já não estão mais na zona de conforto proporcionada por uma CPI que atende às conveniências do governo, na qual os diretores da empresa deram respostas previamente combinadas.

O cerco se fecha graças não só à confissão de alguns dos que participaram do assalto à Petrobrás, mas também a uma auditoria estrangeira, que nada tem a ver com os acordos subterrâneos do governo petista.

Indústria na penúria - EDITORIAL FOLHA DE SP

FOLHA DE SP - 06/11


Perda de mercado interno e externo expõe erros da política do governo para setor industrial e reduz chance de país voltar a crescer


Se há um lugar onde os erros de política econômica dos últimos anos aparecem de forma cristalina, é no setor industrial. Apesar de o governo afirmar que vem implantando uma política eficaz para a área, o fato é que o desempenho da produção continua muito ruim. E, sem uma recuperação na indústria e da cadeia de serviços associados, será difícil retomar o crescimento econômico.

Nos primeiros nove meses do ano, a produção recuou 2,9% em relação ao mesmo período de 2013. O padrão é generalizado entre os setores, com destaque para a contração em máquinas (-4,2%) e bens de consumo duráveis (-9,6%). Não deixa de ser surpreendente constatar que a produção está em nível inferior ao que vigorava antes da crise financeira global em 2008.

Outra evidência problemática vem das transações com o resto do mundo. O saldo da balança comercial brasileira ficou negativo em US$ 1,2 bilhão em outubro e deve fechar o ano próximo de zero, se não abaixo disso.

Os preços das matérias-primas são o principal vilão. Eles vêm declinando já desde 2011, mas a tendência parece ter-se acelerado neste ano, a julgar pela queda de 40% no valor do minério de ferro.

É no segmento manufatureiro, entretanto, que o desastre aparece com clareza. Não apenas o total exportado pelo país tem diminuído como também as importações preenchem cada vez mais o espaço que antes era ocupado pelas fábricas brasileiras. O deficit no segmento chegou a US$ 105 bilhões nos últimos 12 meses.

As razões são múltiplas, mas vale destacar o erro de estratégia do governo de fechar o país à competição externa, com aumento de tarifas e a imposição de uma infinidade de regras que exigem conteúdo nacional. O câmbio valorizado dos últimos anos, os custos internos e os impostos altos contribuíram para reforçar ainda mais a lógica defensiva. Nesse contexto, auxílios como o Reintegra, que proporciona crédito tributário equivalente a até 3% do valor exportado, são apenas paliativos.

Muitos setores empresariais já perceberam que estão em um círculo vicioso, pois quanto mais se fecham, menos competitivos se tornam. Não se trata de abrir mão da política industrial, como quer fazer crer o governo quando responde a seus críticos. Ao contrário, é preciso preservá-la, mas com uma lógica de integração global. A mera tentativa de substituir importações é um anacronismo injustificável.

Se não houver uma mudança de paradigma, a indústria nacional continuará a perder mercado, inclusive o interno.

Limites institucionais no exercício da oposição - EDITORIAL O GLOBO

O GLOBO - 06/11

Depois de declarações de Aécio, em entrevistas e no Senado, o governo deve se preparar para enfrentar uma oposição dura, mas sempre dentro dos marcos legais



Uma das análises consensuais do resultado das eleições é que a trajetória do candidato tucano Aécio Neves o credencia a ser o grande líder das oposições a partir de sua cadeira no Senado, na qual representará Minas por mais quatro anos.

Desacreditado no primeiro turno assim que o destino colocou Marina Silva em posição privilegiada na disputada direta pela Presidência, Aécio continuou a acreditar na sua candidatura. Talvez fosse o único.

Conseguiu unir o PSDB em torno de si — algo que se pensava impossível —, enquanto resgatava a figura simbólica de FH, e, sem se envergonhar das reformas econômicas empreendidas pelo partido, foi para o segundo turno e perdeu para o rolo compressor aético da campanha da reeleição da petista Dilma Rousseff por apenas três pontos percentuais.

O desembarque do senador mineiro em Brasília, terça-feira, e seu primeiro discurso no Senado, ontem, começaram a justificar expectativas com relação ao papel de Aécio na oposição, a partir de agora.

Recepcionado como vitorioso ao chegar em voo comercial, o líder tucano se pronunciou, em entrevista, de forma certeira, sobre manifestações descabidas pelo impeachment da presidente Dilma e de apoio a um golpe militar. No fim de semana, em São Paulo, houve uma passeata em que se destacaram cartazes com mensagens descabidas como estas.

— Eu respeito a democracia permanentemente e qualquer utilização dessas manifestações no sentido de qualquer tipo de retrocesso terá a nossa mais veemente oposição — declarou na terça.

Da tribuna do Senado, numa sessão cercada de grande expectativa, Aécio se colocou como representante de um “movimento”, não de um partido ou aliança partidária, que nas urnas teve o apoio de 51 milhões de brasileiros, apenas 3 milhões a menos que Dilma.

Acertadamente, não deixou de reconhecer o resultado das urnas, algo essencial para o jogo da democracia. Impeachment não existe para servir de “terceiro turno” eleitoral. E golpe militar, como aprendeu o Brasil, é uma porta aberta para o precipício do arbítrio e tentações de perpetuação no poder. Essas duas tresloucadas bandeiras apenas repetem o pior de algumas falanges petistas: quando, no início do segundo mandato de Fernando Henrique, pregaram o “Fora FHC”, e, nos tempos que correm, buscam se manter no poder por meio de atalhos golpistas, como o da “Constituinte exclusiva”, convocada sob pretexto de fazer uma reforma política de conveniência, sem obedecer os trâmites previstos no Estado de Direito.

Depois do que disse Aécio, fica ainda mais claro que o Planalto deve se preparar para enfrentar uma oposição dura, agora com maior respaldo na sociedade, mas sempre dentro dos marcos legais. A recíproca deveria ser verdadeira.

A reforma política em foco - EDITORIAL O ESTADÃO

O ESTADO DE S.PAULO - 06/11


Encerrado o período eleitoral, a reforma política emerge como tema inquestionavelmente prioritário na agenda política. Mas o sólido consenso a respeito da urgência dessa discussão se esgota nele mesmo. Em torno de praticamente todas as questões pontuais que compõem o amplo espectro dessa reforma impera o dissenso. E existe um grande divisor de águas: de um lado, a tentativa populista do PT de conformar a reforma a seu projeto de poder; de outro, a resistência a esse golpe para incluir o Brasil no seleto grupo das repúblicas "populares" da América Latina. Flutuando entre as duas tendências, as velhas raposas, poderosas e nanicas, tentam preservar o grande balcão de negócios.

O elenco das medidas reformistas é amplo. Uma delas é a proibição do financiamento dos partidos por pessoas jurídicas, que caminha para uma solução satisfatória: está na pauta do Supremo Tribunal Federal (STF), onde a maioria dos ministros, 6 em 11, já votou pela proibição. Sua homologação acabará com uma das maiores distorções do sistema eleitoral, a que contraria o princípio de "um cidadão, um voto" ao permitir que quem não vota, as pessoas jurídicas, especialmente empreiteiras interessadas em negócios com o governo, influa com muito mais do que "um voto" no processo eleitoral.

Aqui o problema está naquilo com que o PT sonha: o financiamento público, como se já não existisse com o Fundo Partidário e o chamado horário gratuito.

Mas há outras distorções importantes que reclamam atenção, como as que comprometem a legitimidade da representação popular pelos partidos políticos. Em qualquer país democrático, a existência de um grande número de partidos é a regra, protegida pelos fundamentos democráticos da liberdade de opinião e de associação. Mas o casuísmo que sempre determinou as reformas pontuais do sistema eleitoral e partidário no Brasil acabou criando uma aberração: nada menos do que 28 legendas partidárias ocupam hoje as 513 cadeiras da Câmara dos Deputados.

Essa é uma das consequências das coligações nas eleições proporcionais. Em reportagem do jornal O Globo, o cientista político Jairo Nicolau, da UFRJ, explica: "Há dois problemas nisso. O primeiro é que a coligação transfere voto sem que o eleitor tenha informação disso. Então, a pessoa pode ter votado em um partido da situação para deputado federal, mas, pela composição da coligação estadual, acaba elegendo um deputado de oposição. O segundo é que o modelo favorece a dispersão dos partidos. (...) Essa fragmentação dificulta a aprovação de leis e favorece chantagens e achaques".

Além da proibição das coligações, a maneira mais efetiva de reduzir os efeitos nocivos da grande fragmentação partidária no Parlamento é o estabelecimento da chamada cláusula de barreira. Esse mecanismo criado pelos alemães permite que qualquer partido legalmente existente apresente candidatos, mas estabelece um mínimo de votos para que a legenda conquiste uma cadeira no Parlamento. Hoje, no Brasil, na eleição para a Câmara dos Deputados, por exemplo, qualquer partido que alcance o coeficiente eleitoral na soma dos votos dados a todos os seus candidatos num Estado tem direito a uma cadeira. Mesmo que não tenha obtido 1 voto sequer nos demais Estados.

A cláusula de barreira estabelece que, para fazer jus a uma cadeira, o partido terá de conquistar uma porcentagem mínima de votos num número mínimo de Estados.

A reportagem de O Globo mostrou que, se nas eleições deste ano as coligações não fossem permitidas, 5 dos 28 partidos não teriam assento na Câmara. E, se houvesse cláusula de barreira (por exemplo, 5% dos votos válidos em pelo menos 9 Estados), 182 cadeiras não seriam ocupadas pelos atuais eleitos e apenas 7 partidos permaneceriam representados na Câmara: PT, PMDB, PSDB, PSD, PP, PSB e PR.

Isso tudo demonstra que a reforma política de que o País precisa pode se tornar refém não apenas das manipulações do lulopetismo obcecado por se perpetuar no poder, mas também do fisiologismo de partidos e políticos nanicos pouco dispostos a largar o osso.


Padrão SUS - EDITORIAL FOLHA DE SP

FOLHA DE SP - 06/11


Para cada indivíduo, sua própria saúde se conta entre os bens mais valiosos que existem. Já para um sistema de saúde, é fundamental que os custos sejam controlados. Essa diferença de perspectivas implica que as relações entre usuários e gestores tendem por natureza a ser conflituosas.

Obviamente, o nível de enfrentamento só piora quando o sistema passa por mudanças rápidas, como vem ocorrendo no setor privado, notadamente em São Paulo. Nos últimos cinco anos, os planos tiveram um crescimento de 16% no número de usuários. Hoje, atendem a 26% da população brasileira, chegando a 45% no Estado de São Paulo, e a 61% na capital.

Como as operadoras não se prepararam para o acréscimo de demanda, o resultado são filas e queixas. Reportagem publicada por esta Folha na segunda (3) mostrou que os laboratórios da cidade estão lotados. Alguns deles pedem até três meses para agendar exames como ressonâncias magnéticas. Dependendo do problema do paciente, esse prazo pode ser fatal.

Para agravar o quadro, planos também têm aumentado as recusas de atendimento. Elas cresceram impressionantes 440% em apenas três anos, como revelou "O Estado de S. Paulo".

Em alguns casos, fazem-no mesmo sabendo que a negativa é ilegal. Calculam que nem todos os usuários acionarão a Justiça para assegurar o cumprimento do contrato. É um raciocínio imediatista. Ao fim e ao cabo, o cliente aprende o caminho das pedras e atitudes como essa servem principalmente para introduzir um custo estranho --as despesas judiciais-- na já salgada conta da saúde.

E esse não é o único nem o maior erro estratégico das operadoras. Ao comprimir a remuneração dos médicos, levaram esses profissionais a adotar consultas-relâmpago de 10 ou 15 minutos. Aí, para precaver-se contra erros, acabam pedindo exames, alguns bem caros, que se mostrariam desnecessários com uma anamnese mais cuidadosa. Não é uma coincidência que as requisições de exames estejam aumentando em ritmo maior que o da entrada de novos segurados.

Prover serviços de saúde é uma atividade cara. Se médicos e pacientes fizerem o que julgarem melhor sem ligar para custos, o sistema se torna inviável. Ou a conta fica impagável ou os desajustes são resolvidos com filas intransponíveis, como ocorre no SUS.

A grande verdade é que temos de aceitar a ideia de que o sistema precisa ser otimizado. É necessário adotar protocolos mais rígidos, que evitem desperdícios, ainda que isso limite as escolhas de médicos e pacientes.

COLUNA DE CLAUDIO HUMBERTO

DELAÇÃO PREMIADA DE EMPRESÁRIO CAUSA ESPANTO

Os depoimentos do empresário Júlio Camargo à Justiça Federal, sob delação premiada – garante fonte ligada às investigações – fazem parecer irrelevantes as revelações do ex-diretor Paulo Roberto Costa e do megadoleiro Alberto Youssef sobre o esquema que roubou a Petrobras. Ele não é apenas um executivo da japonesa Toyo Setal, responsável por depósitos no exterior depois convertidos em propina para políticos: “ele é o coração do esquema de corrupção”, diz a fonte.

FIGURA CENTRAL

O MPF acredita que Júlio Camargo protagonizou a formação de cartel de grandes fornecedores da Petrobras que alimentaram o Petrolão.

O ARTICULADOR

Júlio Camargo é mais que um “executivo”, como tem sido chamado. Ele seria, para os investigadores, líder e articulador do esquema corruptor.

NO OLHO DA MOSCA

Ao propor delação premiada, Júlio Camargo mostrou que a Operação Lava Jato atingiu em cheio o esquema de corrupção na Petrobras.

RIOS DE DINHEIRO

Milionário apaixonado por cavalos, Júlio Camargo é conhecido por levar seus “puro sangue” para competições em aviões climatizados.

EM EXTINÇÃO, DEM DISCUTE FUSÃO COM PSC E SD

Com objetivo de aglutinar três grandes forças – ruralistas, sindicalistas e evangélicos – o DEM abriu negociações para possível fusão com o PSC e o partido Solidariedade (SD). Sua direção obteve sinalização positiva do pastor Everaldo (RJ) e se reuniu em café da manhã na casa do presidente do SD, Paulo Pereira (SP), da Força Sindical, em Brasília. O novo partido nasceria com 49 deputados e seis senadores.

TROPA DE ELITE

Estiveram com Paulinho da Força Ronaldo Caiado (GO), Mendonça Filho (PE), Onyx Lorenzoni (RS) e Rodrigo Maia (RJ), todos do DEM.

DIVISÃO IGUALITÁRIA

O DEM propõe que os dirigentes dos atuais três partidos se revezem na presidência da nova sigla e dividam igualmente cargos na direção.

GANHA PESO

A fusão do DEM com o PSC e SD, que já fazem parte do blocão, só fortalece candidatura de Eduardo Cunha (RJ) ao comando da Câmara.

MÁGICA PRÓ-DIRCEU

Estranha a matemática que soltou José Dirceu. Ele descontou 142 dias da sua sentença, por ter supostamente trabalhado três vezes mais que isso (426 dias), ou sejam, 14 meses. Mas ele só ficou preso 11 meses.

SER OPOSIÇÃO É...

Aécio Neves (PSDB-MG), que jamais se opôs pra valer a ninguém, tem muito a aprender. Por exemplo: oposição não “cobra apuração das denúncias”, como afirmou, e sim “exige que o governo pare de roubar”.

CORPO MOLE MINEIRO

Adepto do “diálogo objetivo”, Aécio poderia aplicar “pedala, Robinho” na sua turma, em Minas, que faz corpo mole para repassar dados à equipe de transição do governador eleito Fernando Pimentel (PT).

POR QUÉ NO TE CALLAS?

Presidente da Petrobras, Graça Foster desdenhou das expectativas de novos preços afirmando que “aumento (de gasolina) não se anuncia, pratica-se”. A sentença vale para corrupção também.

CABISBAIXO

O presidente da Câmara, Henrique Alves, derrotado na disputa ao governo potiguar, colou no vice Michel Temer, durante jantar do PMDB, na terça, ignorando a mesa onde estavam seus conterrâneos.

VAMPIRA

Em meio à confirmação do doleiro Youssef de que deu R$1 milhão do Petrolão à campanha dela, a ministra Gleisi Hoffmann (Casa Civil) convocava tuiteiros a doar sangue numa campanha beneficente.

ARES PORTUGUESES

Após admitir que votou em Aécio Neves “por gratidão a Tancredo”, o ex-presidente e senador José Sarney passará uma semana em Lisboa levando um assessor – abriu mão de outros, ao contrário do ex Lula.

ESTAMOS DE OLHO

A Forbes (EUA) confirmou que as mais de 140 mil assinaturas em 48h, na petição à Casa Branca contra a corrupção e bolivarianismo, podem sensibilizar a administração Obama. A chance é remota, mas possível.

PENSANDO BEM...

...como diria Graça Foster, fim de ano não se anuncia, pratica-se: 2015 já acabou.


PODER SEM PUDOR

FUNDO DO POÇO DE POLÍTICO

O líder politico piauiense Heráclito Fortes está de volta como deputado federal, desta vez eleito pelo PSB. Ele ganhou lugar no "alto clero" do Congresso há décadas, inclusive quando fez parte - ao lado de Ulysses Guimarães - do célebre e exclusivo "Clube do Poire", no restaurante Tarantella, depois rebatizado de Piantella e até hoje ponto de encontro, em Brasília, dos políticos.

Estes dias, já de volta à capital, Heráclito lembrava a frase que utilizou em 2010, durante discurso de despedida do mandato de senador:

- Em política, fundo do poço tem mola. Logo estarei de volta.

Dito e feito.