quarta-feira, novembro 05, 2014

De Dilma para Dilma - CRISTIANO ROMERO

VALOR ECONÔMICO - 05/11 


A presidente Dilma Rousseff tem consciência de que precisa mudar a política econômica. Sabe que o risco, neste momento, é o país entrar numa grave crise econômica.

"Não tem saída", disse a esta coluna um interlocutor privilegiado da presidente.

"Tenho certeza absoluta de que o governo vai fazer o ajuste." Apesar de ter consciência dos problemas, Dilma não tem a urgência dos mercados: ela ainda não escolheu quem substituirá Guido Mantega no comando do Ministério da Fazenda. Nem muito menos quem presidirá o Banco Central (BC) a partir de janeiro. "Ela não tem a urgência do curto prazo. Vai fazer tudo ao seu tempo", contou um auxiliar.

Há um jogo de bastidor em curso, além da tentativa de setores do PT de impedir uma guinada ortodoxa: a presidente analisa, de fato, a nomeação de Henrique Meirelles para a Fazenda, mas há um rito a ser seguido. O primeiro passo é tratar do assunto com o ex-presidente Lula. Este já fez chegar a Dilma sua predileção por Meirelles, que presidiu o BC de forma bem-sucedida em seus dois mandatos. Mas não houve ainda uma "conversa pessoal" entre os dois. "A presidente não vai fazer nada sem antes conversar com uma pessoa: Lula", revelou uma fonte.

Há outras duas condições.

Dilma não aceitará a ideia, muito forte nos mercados, de que Meirelles entrará para o governo como o "salvador da pátria". "Ela não teve 54 milhões de votos para se submeter a isso", observou um colaborador. O outro aspecto relevante é o estabelecimento de um "acordo de convivência" entre os dois.

Em 2013, Lula tentou convencer Dilma a levar Meirelles para o governo. O argumento, já em abril daquele ano, é que isso ajudaria a restaurar a credibilidade da política econômica, abalada por contabilidades criativas e que tais. Lula está convencido de que, se tivesse seguido seus conselhos, Dilma teria vencido a eleição no primeiro turno, sem sustos.

Ao tempo em que o ex-presidente fez a indicação, havia apenas uma palavra para definir o que a presidente sentia por Meirelles: "desprezo".

Conforme noticiou a repórter Andréa Jubé, do Valor, Dilma mudou de ideia. "Hoje é diferente. As circunstâncias mudaram", comentou um assessor. "Continuo achando difícil [a escolha de Meirelles], porém, hoje, não descarto." Dilma não gosta de Meirelles porque o considera "liberal". Em 2010, pressionou-o mais de uma vez porque o BC iniciou um ciclo de aperto monetário em meio à campanha presidencial - na verdade, fez isso em abril, junho e julho, mas parou em setembro, véspera da eleição, mesmo tendo sinalizado antes que seria necessário elevar a taxa básica de juros (Selic) naquele momento.

Na transição de governo, a então candidata eleita teria dito a Meirelles que gostaria de chegar ao último ano do primeiro mandato com Selic real inferior a 2% ao ano. O então presidente do BC teria afirmado que não é possível trabalhar com meta de juros, mas, sim, de dívida pública, pré-condição para a queda da taxa Selic. Dilma não gostou e Meirelles ficou fora do governo. O então ministro da Casa Civil, Antonio Palocci, ainda se esforçou, em vão, para indicá-lo a outro cargo.

Pode não ser de agora a mudança de opinião de Dilma quanto a Meirelles. Durante a campanha, o ex-presidente do BC recebeu alguns sinais do entorno da presidente, todos na direção de que ele pode vir a ser convidado a integrar o novo governo. Mas havia também a percepção de que isso só ocorreria se a situação econômica do país piorasse. O fato é que piorou e tudo indica que continuará piorando se nada for feito.

Se a nomeação de Meirelles não se confirmar, Nelson Barbosa pode vir a ser convidado. A relação de Dilma com o ex-secretário-executivo do Ministério da Fazenda não é hoje das melhores, a presidente se chateou com a forma como ele deixou o governo e mais ainda com as críticas que vem fazendo à sua política econômica - sabe-se agora, por exemplo, que, numa reunião fechada promovida pela Anbima, ele teria tachado de "desastrosa" a decisão do BC de reduzir juros em agosto de 2011.

Apesar disso, Dilma gosta de Barbosa e se sente ideologicamente próxima dele.

As rusgas de Nelson Barbosa com Mantega e o secretário do Tesouro, Arno Augustin, que deve continuar no governo, embora em outro cargo, não representam um impeditivo, garante um assessor.

O trabalho de quem assumir a Fazenda não será nada fácil. O quadro é de deterioração dos principais fundamentos da economia. No afã de produzir resultados a curto prazo, o governo lançou mão de uma série de experimentos heterodoxos que, no fim, não apenas não produziram os resultados esperados, mas também colocaram em risco conquistas alcançadas nos últimos 20 anos, como o controle da inflação e o equilíbrio das contas públicas.

O quadro abaixo mostra o país que a presidente Dilma encontrou e o que está entregando quatro anos depois.

Ela entrega, na verdade, a si mesma porque, reeleita, terá que lidar com a própria herança. Os indicadores fiscais e externos mostram forte deterioração, mas, a rigor, tudo piorou: inflação, investimento e PIB.



Eu, robô? - ALEXANDRE SCHWARTSMAN

FOLHA DE SP - 05/11

A conta da campanha chegou e duvido de que o governo esteja disposto a pagá-la


Além de histórias em quadrinhos e mitologia grega, sou fã confesso de ficção científica e, claro, li muitos dos livros de Isaac Asimov, entre eles "Eu, Robô".

Uma das histórias do livro relata um episódio em que um robô (QT1) desenvolve um culto, ocasionando um conflito com os humanos, até que estes percebem que as crenças do robô, ainda que erradas, lhe permitiam cumprir sua tarefa melhor do que qualquer programação poderia conseguir.

Essa é minha percepção de boa parte do governo Lula (do qual participei de 2003 a 2006). Quaisquer que fossem as crenças do mandatário, a verdade é que, por muito tempo, foi um governo que fez as coisas certas no plano econômico.

O BC desfrutou de enorme autonomia operacional, as contas fiscais foram aprimoradas, e reformas importantes, adotadas, em particular no mercado de crédito.

Mesmo na política social a administração Lula rendeu-se ao "neoliberalismo" do Bolsa Família depois do fracasso do Fome Zero, sofrendo, aliás, duras críticas por parte de economistas historicamente ligados ao PT.

Obviamente muita coisa descambou desde então, inicialmente de forma algo envergonhada, culminando com a "nova matriz macroeconômica", a verdadeira implantação das ideias econômicas do partido, que redundou em crescimento medíocre (na casa de 1,6% ao ano), inflação acima da meta (próxima a 6,5%), elevados desequilíbrios externos e uma forte redução no ritmo de crescimento da produtividade.

Agora, passada a eleição, a questão é saber se voltaremos à situação do conto, em que, apesar das crenças equivocadas, uma política econômica apropriada voltará a vigorar, ou se experimentaremos mais do mesmo.

Posto de outra forma, queremos saber se teremos um estelionato eleitoral, para escândalo de André Singer, que recentemente descobriu, ó, horror, que políticos mentem durante a campanha, ou se a aposta será dobrada, produzindo, conforme argumentei na semana passada, os mesmos resultados medíocres observados nos últimos quatro anos, se não coisa ainda pior.

Muito embora a decisão inesperada do BC de elevar a taxa de juros --contrária, a propósito, de sua sinalização nos últimos meses-- possa sugerir estelionato eleitoral (perdão, correção de rumos), há dimensões em que a mudança é muito mais custosa, sugerindo tratar-se de caminho muito pouco provável.

De fato, nos primeiros nove meses deste ano, o setor público registrou deficit primário equivalente a 0,4% do PIB, segundo os números oficiais. Descontadas "pedaladas", criatividade contábil e demais estripulias, o deficit no período deve andar na casa de 1% do PIB, tornando a promessa de início do ano (superavit de 1,9% do PIB) não mais que uma distante memória.

O tamanho do ajuste fiscal requerido para pôr a casa em ordem é praticamente sem precedentes. Precisaremos sair de um deficit primário (verdadeiro) ao redor de 1% do PIB para um superavit de 3,0% do PIB, de acordo com as contas de Marcos Lisboa. Em dinheiro, falamos de algo na casa de R$ 200 bilhões.

É inviável atingir tal melhora em apenas um ano. Trata-se, na melhor das hipóteses, de um programa de ajuste para ser realizado em três anos, contra um pano de fundo de uma administração que não apenas se mostrou incapaz de atingir suas metas mas que também deliberadamente produziu a maior deterioração fiscal de que se tem notícia no país nos últimos 20 anos.

O governo não terá, portanto, o benefício da dúvida. Pelo contrário, terá que apertar muito para convencer o distinto público de sua firmeza de intenções, o que destruiria até as perspectivas de crescimento pífio de 1% em 2015, hoje consensuais, com reflexos negativos sobre o desemprego.

Desconfio, e estou longe de estar sozinho, de que a presidente não há de apreciar sua única conquista econômica se esfumaçando no rastro do ajuste fiscal, mesmo necessário.

A conta da campanha chegou e duvido de que o governo esteja disposto a pagá-la.

Toque de reunir - DORA KRAMER

O ESTADÃO - 05/11


A julgar pelas decisões tomadas na reunião da direção Executiva do PT nesta segunda-feira, o partido parece mais empenhado em falar à militância que propriamente interessado em colaborar com a presidente Dilma Rousseff para enfrentar as dificuldades e dirimir os atritos já contratados para o segundo mandato.

As resoluções divulgadas vão todas na contramão do discurso de conciliação do governo, vocalizado pela presidente e levado por seus interlocutores ao Congresso a fim de propor uma trégua. O tom está longe de evocar unidade. Por outra, soa a demarcação de terreno.

Logo de início o partido reivindica participação "ativa" nas decisões políticas e econômicas dos próximos quatro anos. Desnecessário dizer o que o setor privado com o qual o governo busca reaproximação pensa do "ativismo" petista na economia. Quanto à política, é justamente da exclusiva influência do PT nas decisões de poder que reclamam os partidos aliados quando reivindicam participação efetiva, e não apenas o papel de coadjuvantes submissos.

A agenda prossegue com a decisão de enfrentar o PMDB na disputa pela presidência da Câmara. Não que o PT não tenha esse direito. Mas há maneiras e maneiras. Uma delas é iniciar a conversa falando em negociação, principalmente quando é o adversário quem momentaneamente está na posição do mais forte. O jeito que os petistas entraram no assunto, digamos de sola, oferece ao PMDB rebelde o argumento ideal para conquistar o apoio da oposição.

A dissonância não para por aí. O partido insiste na proposta de reforma política não só mediante plebiscito, mas por meio de convocação de Assembleia Nacional Constituinte exclusiva; sugestão ampla, reiterada e contundentemente repudiada pelos partidos e entidades mobilizadas em torno do assunto.

E como se não bastasse, o PT anuncia que pretende retomar o projeto dos conselhos populares que acabou de ser derrotado na Câmara dos Deputados. Em suas resoluções de ano novo inclui também a velha ideia do controle social (agora sob a denominação de "econômico") dos meios de comunicação.

Seria o cardápio ideal para uma agremiação interessada em colecionar derrotas ou se dedicar ao exercício da malhação em ferro frio. Não sendo esses os objetivos do PT, só resta a hipótese de que o partido esteja pouco se importando com a construção de convergências que ajudem a presidente. Parece, isso sim, mais empenhado em falar ao público interno para mobilizar a antiga militância e tentar fazer ligação direta com a "rua", a fim de enfrentar a oposição passando ao largo do Congresso.

Mais embaixo. Os apelos do Palácio do Planalto à trégua no Congresso têm um pouco a ver com a chamada "pauta bomba" de criação de despesas, mas têm muito mais a ver com o receio de perder o controle da base em outro tipo de agenda: comissões de inquéritos, convocações de autoridades, tramitação de processos de cassação e até eventuais pedidos de impeachment aos quais governos estão sempre sujeitos.

Deixa que digam. Os eleitores inconformados com o resultado da eleição têm o direito de se manifestar. Já os políticos derrotados têm o dever de repudiar atos que resvalem para agressão ao regime democrático, sem dar a menor margem à desconfiança de que estariam de acordo com palavras de ordem que pregam interrupção ilegal de mandatos e pregam a volta dos militares.

Tudo bem. É gente que não sabe o que diz. Que não poderia dizer o que bem entendesse se seus apelos fossem atendidos. Mas convém manter tais gatos pingados à distância, desprovidos de eco até que o berreiro tenha por destino a morte por inanição.


Oposição sem trégua - MERVAL PEREIRA

O GLOBO - 05/11
Com um discurso firme e sem subterfúgios, o presidente do PSDB, senador Aécio Neves, marcou ontem sua volta à luta política, depois da derrota para a presidente Dilma na disputa pela Presidência da República, com a atitude de quem pretende assumir a liderança da oposição brasileira e não dar tréguas ao governo que, embora tendo sido eleito legitimamente, não tem crédito para contar com a boa vontade da oposição, hoje representante de quase metade dos eleitores que votou na eleição presidencial.

Fortalecido pelas urnas, Aécio pretende dedicar sua atuação no Senado a um combate permanente ao PT, assim como a oposição de diversos matizes, que não está disposta a dar espaços para o PT, no Congresso e também nas ruas.

A oposição oficial se afasta, como não poderia ser diferente, de manifestações golpistas que surgem aqui e ali nas primeiras passeatas antipetistas registradas logo depois das eleições. Esse não é o sentimento majoritário da oposição brasileira, mas caberá ao governo se afastar também de seus radicais. E afastar, sobretudo, a ameaça de se alinhar, mais do que já acontece, aos governos bolivarianos que pregam a revolução no continente.

O acordo de cooperação entre o governo venezuelano e o MST, firmado em solo brasileiro, é ato de provocação radical que só acontece devido à complacência do governo brasileiro com seus vizinhos bolivarianos. E a saudação de Nicolás Maduro à reeleição da presidente Dilma, como se fosse o sinal de um aprofundamento da revolução na América Latina mostra que, pelo menos para os venezuelanos, estamos seguindo os seus passos.

Resta para a presidente reeleita mostrar com atos que não se trata disso.

Pizzolato

Blogs e publicações ligadas ao petismo, seja por interesses financeiros ou por proximidades ideológicas, ou excepcionalmente os dois, andaram espalhando que o que chamam de "grande imprensa" escondeu as verdadeiras razões por que a Corte de Bolonha negou a extradição do mensaleiro Henrique Pizzolato, que fugiu do país e foi preso na Itália. Além das péssimas condições das prisões brasileiras, os juízes italianos teriam aceitado outros dois argumentos da defesa, o que evidenciaria as "anomalias do julgamento da Ação Penal 470". Os magistrados italianos teriam apontado a falta de duplo grau de jurisdição no julgamento do mensalão pelo STF, "direito universal", segundo um dos blogueiros, e a omissão de provas apresentadas pela defesa. Pura mentira. A íntegra da sentença foi divulgada ontem, e nela está dito, com todas as letras, que a Corte considerou "infundadas" todas as alegações da defesa, inclusive a suposta omissão de provas. Com relação ao duplo grau de jurisdição, a sentença diz que esse direito pode ser alvo de exceção quando o interessado já tiver sido julgado em primeira instância por um tribunal superior, tanto é assim que o ordenamento jurídico italiano prevê um único grau de jurisdição na Corte Constitucional. No fim, o único argumento considerado válido foram as más condições das prisões brasileiras. Toda a onda feita sobre problemas no processo do mensalão acaba de ser derrubada no primeiro teste internacional a que foi submetida.

Bancos e bancos

Para aumentar o ridículo da coisa, circulam entre os petistas justificativas para a insistência do expresidente Lula de ter o presidente do Bradesco, Luiz Trabuco, no Ministério da Fazenda depois que a campanha de Dilma demonizou os banqueiros na figura da educadora Neca Setubal. É que o Bradesco seria um "banco popular", enquanto o Itaú seria "um banco de elite".

Disque Lula - FERNANDO RODRIGUES

FOLHA DE SP - 05/11


BRASÍLIA - Está péssimo o clima político em Brasília. Uma dezena de partidos disputa um naco do próximo governo da presidente reeleita. Os 39 ministérios serão insuficientes para aplacar os ânimos. Pelo menos 20 ministros serão demitidos e vão ruminar suas mágoas no time de políticos derrotados.

São exíguas as chances de Dilma Rousseff injetar entusiasmo na sua tropa no Congresso nos próximos dias. A saída para a presidente está mais na economia do que na política. Aí está a importância da escolha do novo ministro da Fazenda.

Se a petista conseguir encontrar um nome que traga tranquilidade e boas perspectivas para a retomada do crescimento do país, o ambiente pode melhorar com rapidez. De outra forma, vários problemas políticos ficarão maiores do que já são.

Há dois desafios principais no Congresso nos próximos meses. Primeiro, a escolha dos presidentes da Câmara e do Senado. Segundo, o início formal dos processos contra congressistas acusados de envolvimentos no escândalo da Petrobras, revelado pela Operação Lava Jato.

Tudo poderá ser mitigado se 2015 começar com bom vigor na economia --algo que ninguém mais acredita. Mas um nome correto na Fazenda ajudaria a conter o pessimismo.

Escândalos de corrupção só fragilizam um presidente de fato se vêm acompanhados de baixo crescimento do país. Foi assim com Fernando Collor, em 1992. Já em 1994 (quando o efeito do caso dos anões do Orçamento ainda arrasava o Congresso), o então presidente Itamar Franco lançou o Plano Real e elegeu Fernando Henrique Cardoso.

O problema de Dilma é encontrar a fórmula mágica para equilibrar as contas do país em pouquíssimo tempo. Só assim minimizará o impacto dos solavancos políticos. Talvez por essa razão a petista tenha seguido sua receita mais conhecida nessas horas. Ontem, ela se reuniu com seu mentor, Luiz Inácio Lula da Silva.

Deixem em paz a Constituição - ALMIR PAZZIANOTTO PINTO

CORREIO BRAZILIENSE - 05/11

Encerrada a apuração, a presidente Dilma dirigiu-se aos brasileiros para agradecer, como determina a boa educação, àqueles que a reelegeram. Atitude idêntica, de maturidade política, tomou Aécio Neves, vencido mas não desonrado no campo de luta, embora se batesse em desigualdade de condições.

Assistimos, no primeiro e no segundo turnos, a demonstrações de vigor democrático. PT, PSDB, PMDB, PSB e demais legendas devem enaltecer a exemplar conduta do povo, que se dirigiu às urnas e exerceu, com serenidade, a prerrogativa de escolha dos representantes políticos. Incidentes raros e isolados, solucionados sem necessidade de emprego da força, não chegaram a poluir o ambiente em que decorreu o pleito. A Justiça Eleitoral, por sua vez, deu provas de eficiência e imparcialidade.

É necessário e urgente restringir o número de partidos, aperfeiçoar o sistema eleitoral, proibir o financiamento de campanhas por empresas, erradicar a corrupção. Nada, porém, que não possa ser levado a efeito mediante emenda constitucional, reforma das legislações eleitoral e partidária, e forte dose de boa vontade por parte daqueles que integrarão o Congresso nos próximos quatro anos.

Estamos na 8ª Constituição - a 7ª do período republicano. O número elevado de emendas revela que a redação original deixou a desejar. Somam 83 as alterações introduzidas desde 1993. Os membros da Assembleia Nacional Constituinte se decidiram por texto analítico, minucioso, prolixo, recheado de dispositivos dependentes de regulamentação. Recusaram o sucinto modelo americano, cuja lei fundamental data da declaração de independência, em 1787.

Duramente submetida à prova em mais de uma ocasião, a Constituição Coragem - como a denominou Ulysses Guimarães - encontrou forças para resistir e se consolidar, o que não conseguiram as antecessoras de 1891, 1934, 1946 e 1967, abatidas após acidentada existência.

A cassação do presidente Fernando Collor, o primeiro presidente eleito diretamente após a queda do regime militar, foi conduzida estritamente dentro das normas constitucionais. A ninguém ocorreu a ideia de derrubá-lo ou defendê-lo pelas armas. O processo do mensalão ratificou a independência do Judiciário. Submetido a poderosas pressões, o Supremo Tribunal Federal aplicou o Código Penal para condenar à prisão membros da Câmara dos Deputados e dirigentes do partido petista, acusados de desvio de dinheiro.

A imprensa é livre, os Três Poderes operam em harmonia e com independência, não há preso político, inexistem restrições ao direito de ir e vir, ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer senão em virtude de lei, respeita-se o exercício da greve, os sindicatos estão a salvo de intervenção governamental. Em resumo, o Brasil se encontra sob o Estado Democrático de Direito.

A Constituição de 1988 venceu desafios que, em passado não tão distante, poderiam atrair intervenção militar. Fernando Henrique obteve dois mandados consecutivos, o mesmo ocorreu com Lula e Dilma Rousseff. Não há melhor prova de que o país amadureceu, nem razão para perturbação do cenário de tranquilidade, com proposta de plebiscito ou referendo destinado a validar ou invalidar medidas de competência do Legislativo.    

Norberto Bobbio escreveu, durante uma das habituais crises que sacodem a Itália, artigo com o título "A Constituição não tem culpa". A frase cairia bem neste pequeno texto. Como tudo que há no mundo, diz o ilustre mestre, a Lei Maior não é perfeita. O mesmo se deve dizer em relação à nossa. Nem por isso devemos responsabilizá-la por problemas que enfrentamos. Também é ela produto "de um compromisso, necessário e a longo prazo benéfico, entre forças políticas apoiadas em ideais morais e sociais diferentes e, às vezes, até opostos".

O Brasil retomou em 1985 a marcha para a democracia. País em vias de desenvolvimento, com áreas de miséria, depende de tranquilidade e segurança jurídica para progredir. Há 12 anos no poder, o PT não pode se queixar. Investir contra a Constituição que lhe garantiu as condições para chegar ao poder, após se converter no maior partido do país é, além de temerário, gesto de terrível ingratidão.

Sugiro aos petistas de todos os escalões que não subestimem a força do povo; que não planejem golpe branco contra as instituições; o resultado lhes será nefasto. Deixem em paz a Constituição e comecem a trabalhar!

Cerco amplo ao esquema de corrupção na Petrobras - EDITORIAL O GLOBO

O GLOBO - 05/11

Para elucidar o caso, além da delação premiada, há a aplicação de dura legislação americana, pelo fato de a estatal ter ações nos EUA. Foi mau negócio saquear a empresa



Com a evolução do noticiário sobre a usina de corrupção montada dentro da Petrobras pelo menos a partir de 2004, com a nomeação de Paulo Roberto Costa para a diretoria de Abastecimento, o tamanho do escândalo não parou de aumentar.

Desde a revelação de que uma operação da Polícia Federal, a Lava-Jato, deflagrada a partir de Curitiba com a participação da Justiça Federal do Paraná, por meio do juiz Sergio Moro, e o Ministério Público estabelecera sólidas conexões entre o doleiro Alberto Youssef e o já ex-diretor Paulo Roberto, o escândalo começou ganhar contornos de um novo mensalão de petistas e aliados. Pois os milhões surrupiados da Petrobras pelo superfaturamento de contratos gerenciados por Paulo Roberto Costa — e talvez não só — também tomaram o caminho dos subterrâneos da política.

Mas o caso da Petrobras deve superar o mensalão, e não apenas em cifras. Uma diferença decisiva está no aparato mobilizado para investigar a roubalheira na estatal. O recurso legal da delação premiada parece ser usada de forma eficiente com Youssef e Paulo Roberto, e há pelo menos um executivo de empreiteira que se coloca à disposição para também ajudar em troca de atenuação de penas. A própria empresa se valerá de instrumento semelhante criado pela Lei Anticorrupção, recém-promulgada. Além disso, o fato de a estatal ser empresa com ações negociadas no exterior a torna subordinada à dura legislação americana destinada a punir falcatruas em companhias de capital aberto.

O afastamento de Sérgio Machado da presidência da Transpetro, mesmo apadrinhado do senador Renan Calheiros (PMDB-AL), é resultado prático da aplicação de regras de governança criadas nos Estados Unidos. É certo que, se dependesse do Conselho de Administração da estatal, controlado pelo Executivo, Machado continuaria no cargo, mesmo que Paulo Roberto Costa houvesse testemunhado ter recebido dele a propina de R$ 500 mil. E deve poder provar a denúncia, como rezam as regras da delação premiada. O desligamento, por meio de uma protocolar “licença”, foi exigência da empresa de auditoria financeira da estatal, a PricewatersHouseCoopers (PwC), ao se recusar a atestar a validade do balanço do terceiro trimestre da empresa. De acordo com as normas, Sérgio Machado não poderia assinar o demonstrativo. Teve de sair, com todo o apadrinhamento.

A estatal foi, ainda, forçada pela PwC a contratar uma investigação independente de todas as denúncias. Com acerto, os investigadores querem, entre outros assuntos, saber se houve qualquer participação do ex-presidente José Sérgio Gabrielli no esquema. Afinal, parece impossível que diretores atuassem no paralelo (Paulo Roberto, Severó, Jorge Zelada, Jorge Duque e Sérgio Machado, pelo que se conhece até agora) sem que o presidente da estatal nada soubesse.

Pelo jeito, foi grave erro do lulopetismo saquear a Petrobras, como fez, em escala menor, com o Banco do Brasil, no mensalão.

O PT sem a pele de cordeiro - EDITORIAL O ESTADÃO

O ESTADO DE S.PAULO - 05/11


A direção do PT considera que a reeleição da presidente Dilma Rousseff é a oportunidade para fazer uma profunda mudança na organização do Estado, na direção daquilo que o partido chama de "reformas democrático-populares".

Uma resolução da sua Comissão Executiva Nacional - que reúne a nata do comando petista - deixa claro que o partido está convencido de que já pode despir-se da pele de cordeiro que Lula precisou vestir quando se elegeu pela primeira vez, em 2002. Naquela ocasião, recorde-se, o ex-metalúrgico - que em 1989 prometia estatizar tudo e tratar com desprezo os credores internacionais, aos quais chamava de "agiotas" - mudou o discurso e passou a prometer o "respeito aos contratos e obrigações".

Passado o susto da apertadíssima eleição, em que Dilma venceu basicamente porque sua equipe de marketing levou o "vale-tudo" eleitoral a dimensões inéditas, o PT quer tomar a dianteira e pautar o novo mandato da presidente - desta vez na direção de seu antigo projeto de 1989. No radical programa de governo para a campanha eleitoral daquele ano, o texto assinado por Lula dizia: "Se me pedissem para resumir numa frase o sentido do nosso programa, eu diria: reorganizar a sociedade brasileira, conferindo o papel de direção àqueles que vivem no mundo do trabalho e da cultura".

As semelhanças daquele programa de Lula com o adotado pelo atual comando do PT na resolução divulgada nesta semana são claras. Entre as prioridades escolhidas pelo partido para o novo mandato de Dilma, os petistas dizem que "é urgente construir hegemonia na sociedade" e "promover reformas estruturais, com destaque para a reforma política e a democratização da mídia".

A "hegemonia" perseguida pelo PT é o poder de determinar o que é a verdade, o que é certo e o que é errado. Para isso, é necessário "promover reformas estruturais", especialmente a reforma política - que, no modelo petista, significa submeter o Estado a organizações "populares" que respondem ao partido -, e "democratizar a mídia", que é o outro nome para a censura e a tentativa de propagar o pensamento único.

Assim, para o atual comando petista, nostálgico dos anos de sua fundação, a tarefa de "transformar o Brasil" demanda agora uma combinação de ação institucional, de mobilização social e de "revolução cultural". Para isso, o partido quer ampliar a importância de áreas como comunicação, educação, cultura e esporte, "pois as grandes mudanças políticas, econômicas e sociais precisam criar raízes no tecido mais profundo da sociedade brasileira". Eis aí a fórmula da hegemonia proposta pelo PT.

Com esses objetivos em mente, a liderança petista pretende, segundo suas palavras, "incidir na disputa principal em curso neste início do segundo mandato", isto é, "as definições sobre os rumos da política econômica". A pressão pública sobre Dilma - que, recorde-se, só se tornou petista em 2001 e enfrenta desconfiança dentro do partido desde sempre - é uma tentativa de forçá-la a abandonar os compromissos políticos do primeiro mandato, oferecendo-lhe em troca o apoio de sua militância nas ruas.

Nesse sentido, o aceno à oposição feito por Dilma logo após sua vitória foi desdenhado explicitamente na resolução petista. Os mais de 50 milhões de eleitores que votaram em Aécio Neves (PSDB) foram tratados como simpatizantes do "retrocesso neoliberal" e das "piores práticas políticas", a saber: "O machismo, o racismo, o preconceito, o ódio, a intolerância, a nostalgia da ditadura militar".

Aqueles que ousam se opor ao governo são, segundo os petistas, "apoiados pela direita, pelo oligopólio da mídia, pelo grande capital e seus aliados internacionais" e, portanto, não fazem parte do "povo brasileiro". Este, por sua vez, é somente aquele que vota no PT. Por essa razão, o partido diz que "precisa honrar a confiança que, mais uma vez, o povo brasileiro depositou em nós" e anuncia: "Não o decepcionaremos: com a estrela vermelha no peito e um coração valente, avançaremos em direção a um Brasil democrático-popular".

Este é o verdadeiro rosto do PT, que nem mesmo a imensa dificuldade para a reeleição de Dilma conseguiu alterar.

A idade da razão - EDITORIAL FOLHA DE SP

FOLHA DE SP - 05/11


Volta ao debate projeto que eleva idade da aposentadoria compulsória; oportuna, medida deveria valer para todo o funcionalismo


Ressurgiu com força, mas por motivos inapropriados, o debate a respeito da chamada PEC da bengala, que altera a idade com a qual membros das cortes superiores e do Tribunal de Contas da União são obrigados a se aposentar.

Pelas regras atuais, a carreira no funcionalismo se encerra de forma compulsória aos 70 anos. Se a emenda à Constituição for aprovada, esse limite se elevará para 75 anos no caso desses ministros.

Tendo passado pelo Senado em 2005, a proposta está parada na Câmara dos Deputados desde 2006. Agora talvez volte a andar. Ao que parece, peemedebistas rebelados repentinamente se deram conta de que, sem mudanças legais, a partir de 2016 o Supremo Tribunal Federal terá 10 de seus 11 integrantes indicados por governos do PT.

Essa maioria decerto pode implicar distorções institucionais. Os fatos, porém, não ajudam o argumento. Basta lembrar que as condenações do mensalão foram decididas por um plenário em que predominavam nomeações feitas pelo ex-presidente Lula (PT) ou pela presidente Dilma Rousseff (PT).

De resto, se um candidato petista vencer a eleição presidencial de 2018, alguém pedirá que a Carta seja alterada mais uma vez, quem sabe permitindo que os ministros escolhidos por administrações anteriores fiquem no STF até os 85 anos? O casuísmo é evidente.

Há outras razões, no entanto, para apoiar a PEC da bengala --e defender que seu princípio seja válido para todo o funcionalismo. É o que esta Folha faz desde 2008.

O elemento central diz respeito à demografia. Com o envelhecimento da população e a melhoria das condições de vida, não faz sentido impedir que se trabalhe no serviço público até idade mais avançada.

A expectativa de vida saltou de 52,4 anos em 1960 para 74,6 hoje; estima-se que chegue a 81 anos em 2050. Se em 1960 1,6% dos brasileiros passavam dos 70 anos e hoje são 4,8%, em 2050 mais de 15% da população deve ir além dessa idade.

Assim, é não só possível que a compulsória seja adiada mas também desejável, a fim de evitar o colapso do sistema previdenciário.

Quanto à renovação de quadros nos órgãos de Estado, é duvidoso que os cinco anos a mais constituam grave bloqueio à oxigenação institucional. Basta, de todo modo, criar regras que dificultem o engessamento da estrutura burocrática, como a imposição de rotatividade nos cargos de direção.

Quem quiser se aposentar aos 70 anos, ou mesmo antes, ainda poderá fazê-lo, mas por sua própria vontade. O setor público brasileiro não está em condições de expulsar funcionários experientes e qualificados em decorrência de uma regra que já caducou.

Investigar ou engavetar? - EDITORIAL GAZETA DO POVO - PR

GAZETA DO POVO - PR - 05/11


Decisão da PGR em relação à delação premiada de Paulo Roberto Costa indicará se Dilma realmente cumprirá a promessa de ir até o fim, “doa a quem doer”


Aproxima-se o dia em que saberemos definitivamente se há procuradores ou engavetadores nesta República. Segundo a presidente Dilma Rousseff, quando em campanha para a reeleição, engavetadores existiam apenas em governos anteriores ao seu e ao de seu antecessor, Lula – ou seja, na época em que o PSDB governava o país. De tanto engavetarem processos que envolviam na corrupção gestores do período de Fernando Henrique Cardoso, hoje eles “estão soltos, todos soltos”, indignava-se Dilma durante a campanha, ao insistir que nos últimos 12 anos tudo foi diferente: aos procuradores da República, à Polícia Federal e ao Judiciário foram dadas garantias de autonomia e independência para investigar, julgar e prender – o que escondia outra falácia, a de que é o presidente quem decide dar ou tirar autonomia desses órgãos, que, é preciso lembrar, são de Estado, não de governo.

No discurso da vitória, em 26 de outubro, e em outras ocasiões a presidente reeleita citou o combate à corrupção e assegurou que assim será “doa a quem doer”, para usar as palavras ditas por ela tanto antes do segundo turno quanto na entrevista concedida ao Jornal Nacional no dia seguinte à reeleição. Pois bem: está nas mãos do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, a tarefa de dar destino ao cabeludo inquérito resultante da delação premiada prestada pelo ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa. As confissões que fez à Justiça Federal do Paraná, à Polícia Federal e ao Ministério Público estão condicionadas a verdades que possam ser provadas. Caso contrário, o prêmio da liberdade que já lhe foi parcialmente concedido poderá ser anulado – e, então, Costa ficará sujeito a uma pena de até 40 anos de prisão.

E o que contam suas delações? Tratam de trambiques em contratos da Petrobras que faziam sobrar recursos não contabilizados para partidos, políticos e servidores da própria estatal, em porcentuais fixos sobre montantes bilionários. Citou nomes de políticos com mandato e sem mandato, de grandes empreiteiras e empresários gigantes, de gente pequena usada para operacionalizar o fluxo e a lavagem do dinheiro ilegal.

Ao procurador-geral da República compete tomar uma das três decisões: a primeira é aceitar como provas legítimas e legais as denúncias feitas pelo delator, considerá-las suficientes e já oferecer denúncia ao Supremo Tribunal Federal; a segunda é mandar abrir inquérito, que exigirá mais investigações para se chegar a novas evidências (nesses dois casos, ainda será necessário decidir se os envolvidos serão todos julgados pelo STF ou se haverá desmembramento, com autoridades com foro privilegiado sendo julgadas pelo STF e os demais, pelo Juízo Federal de primeira instância no Paraná); e a terceira e mais temerária das opções, mandar engavetar tudo e deixar “todos soltos”, para usar a expressão tão cara a Dilma.

Claro que, legalmente fundamentado, Janot pode optar pela última alternativa. Mas, se assim proceder, colocará em teste a solene e peremptória promessa presidencial de, “doa a quem doer”, fazer a faxina ética na Petrobras – na qual Dilma prometeu, na entrevista ao Jornal Nacional, “não deixar pedra sobre pedra”, mas sob cujas entranhas já não se esconde a deslavada corrupção – e também em outros nichos do seu governo. Chegará a hora da verdade e ela começará a ser contada por Dilma não apenas por sua eventual determinação de fazer a limpeza, mas, principalmente, pelas escolhas que fizer para a montagem de seu próximo governo.

Será possível acreditar se, de suas escolhas, não se vir sinal de influência do grupo que patrocinou o mensalão e, muito menos, dos beneficiários do “petrolão”. Desta crença comungam não apenas os que votaram em favor da oposição que “engavetava”, mas também os milhões que reelegeram Dilma na esperança de que tudo se aclare “doa a quem doer”.

Conta de luz fica mais cara - EDITORIAL CORREIO BRAZILIENSE

CORREIO BRAZILIENSE - 05/11


A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) autorizou ontem um aumento médio de 19,23% nas contas de luz pagas pelos cerca de 4 milhões de consumidores da Light, concessionária que atende a 41 municípios do Rio Janeiro. A empresa havia solicitado reajuste entre 20% e 25% para fazer face aos preços que tem sido obrigada a pagar pela energia comprada das geradoras termelétricas.

Essa é apenas uma das contas que, desde o início do ano, o setor elétrico vem transferindo para o bolso dos consumidores brasileiros. Em agosto, as tarifas de luz cobradas no Distrito Federal foram aumentadas, em média, em 18,88%. Meses antes, em março, os clientes da Cia. Energética de Minas Gerais (Cemig) foram "premiados" com 14,24% de aumento médio (a concessionária tinha pedido algo próximo a 19%), pelas mesmas pressões de custo.

Esses não foram os únicos reajustes. Toda a população do país que não vive no escuro vem sendo chamada a pagar aumentos de tarifas que não eram vistos desde os maus tempos da hiperinflação que assolava o país antes do Plano Real (junho de 1994). De Roraima ao Rio do Grande do Sul, ninguém escapou. No caso dos clientes da Light e, brevemente, dos que são atendidos pela CPFL Piratininga e Bandeirante, em São Paulo, o aumento agora autorizado poderia ter sido menor. Mas o governo não está às voltas apenas com os problemas dos setor elétrico. Por isso, esses consumidores foram chamados a pagar antecipadamente por uma parte do "aumentão" adiado para 2015.

Apertado com o descompasso entre gastos e receitas, o governo decidiu, em setembro, suspender o envio de R$ 4 bilhões para uma conta de ajuda às distribuidoras de energia elétrica. Era com essa verba que elas vinham compensando parte do prejuízo causado pela compra da energia mais cara.

Os aumentos autorizados para a Light - 19,11% para os clientes residenciais e 19,46% para os industriais - são um aviso aos consumidores das demais regiões do Brasil de que devem esperar pelo pior. Além de bater diretamente na conta de luz doméstica, esses reajustes três vezes mais altos do que a inflação prevista para o ano (6,5%) vão pesar nos custos da produção industrial. Isso significa não apenas mais inflação, como menos capacidade de exportar de nosso enfraquecido parque industrial.

A propósito, é em boa parte graças à queda da atividade industrial que o governo tem escapado do constrangimento de enfrentar um apagão de eletricidade. A seca prolongada vem baixando o nível dos reservatórios do parque hidrelétrico desde o ano passado. À medida que essa situação foi se agravando ao longo do ano, não faltaram especialistas para alertar o governo para a necessidade de acelerar a implantação de projetos de ampliação da capacidade de armazenamento dos reservatórios nas regiões Sudeste e Centro-Oeste, além de patrocinar uma campanha de economia de energia.

Nada disso foi feito. Pelo contrário. De olho no calendário eleitoral, o governo incentivou o consumo de eletricidade, baixando os impostos de eletrodomésticos e eletroeletrônicos, sob o pretexto de manter o nível de empregos. Mais consumo convivendo com menos geração hidrelétrica resultou no funcionamento ininterrupto das termelétricas e na situação que colocou em crise o setor elétrico. Agora, que o povo pague a conta.

A devastação da indústria - EDITORIAL O ESTADÃO

O ESTADO DE S.PAULO 05/11


A indústria continua em mau estado, investindo pouco e muito longe da recuperação, apesar de alguns sinais positivos identificados em setembro. Se depender do setor industrial, dificilmente o crescimento econômico em 2014 será muito melhor do que têm previsto economistas do mercado financeiro e de instituições internacionais - algo na vizinhança de 0,3%. Depois da recessão no primeiro semestre, só um grande impulso tiraria o Brasil do atoleiro da estagnação. Os mais otimistas ainda continuam, no entanto, esperando esse tranco salvador. A produção geral da indústria diminuiu 0,2% de agosto para setembro, segundo o IBGE, mas houve resultados positivos em dois dos três grandes segmentos: avanço de 1,9% em bens de capital e de 1% em bens de consumo, em contraste com a diminuição de 1,6% na fabricação de bens intermediários.

Alguns sinais animadores à primeira vista foram também apontados em relatório da Confederação Nacional da Indústria (CNI). Em setembro, o faturamento cresceu 0,8%, descontada a inflação, as horas de trabalho na produção aumentaram 1% e o uso da capacidade instalada, de 81,3%, foi 0,8 ponto porcentual maior que no mês anterior. Mas o lado positivo da história praticamente se resume nesses dados gerais da CNI e do IBGE e com alguns detalhes do desempenho setorial, como, por exemplo, o aumento mensal de produção em 15 de 24 classes de indústrias cobertas pela pesquisa oficial.

A maior parte do quadro continua muito feia. Em condições normais, com as festas de fim de ano a maior parte dos setores cresceria na segunda metade do ano. Mas, no terceiro trimestre, a indústria geral produziu 3,7% menos que entre julho e setembro de 2013. A fabricação de bens de consumo duráveis foi 12,6% menor que a de um ano antes. A de bens de capital, 9,9% inferior à de igual trimestre do ano anterior.

Os números acumulados em nove meses são igualmente desastrosos. A indústria geral produziu 2,9% menos que um ano antes. A fabricação de bens de consumo encolheu 2,2% em relação à mesma base. A de bens de capital diminuiu 8,2%.

O desempenho foi ruim em todos os grandes segmentos e na maior parte das categorias de indústrias. O encolhimento da produção de bens de consumo, principalmente dos duráveis (redução de 9,6%) é explicável basicamente por três fatores - a oferta mais moderada e mais seletiva de crédito, a piora das expectativas dos consumidores e o continuado avanço dos produtos estrangeiros no mercado nacional. O consumo, apesar de tudo, ainda cresceu, mas a indústria brasileira continuou incapaz de atender plenamente à maior demanda.

Os números da indústria têm mostrado há muito tempo o fracasso de uma estratégia de crescimento baseada principalmente na expansão do consumo. Mas o governo insistiu nesse jogo, como se esperasse, contra toda evidência e contra o mais chapado bom senso, resultados melhores em algum momento.

Sem investimentos, sem aumento de capacidade e sem ganho de eficiência, a indústria brasileira empacou e continua empacada. Alguns setores, como o automobilístico, têm vivido de estímulos fiscais, sempre renovados.

O governo continua investindo muito menos que o necessário para remover os entraves da infraestrutura. As empresas privadas pouco aplicam na ampliação e na modernização de sua capacidade produtiva. Os dados do IBGE são muito claros. A produção de máquinas e equipamentos, já empacada nos anos anteriores, diminuiu mais 4,3% nos 12 meses até setembro (e 8,2% na comparação dos primeiros nove meses de 2014 e 2013). A importação de bens de capital também diminuiu. O valor importado até outubro, de US$ 40,21 bilhões, foi 6,4% menor que o de um ano antes, pela média diária.

Parece muito natural, nesse quadro, a redução do emprego, embora as empresas tentem preservar a mão de obra treinada. De agosto para setembro, o emprego diminuiu 0,6%, segundo a CNI. Em nove meses, o pessoal empregado ficou 0,1% menor que um ano antes. Com isso, continua diminuindo o emprego de qualidade mais alta.

Economia brasileira se debilita com déficits gêmeos - EDITORIAL O GLOBO

O GLOBO - 05/11

O crescente desequilíbrio nas finanças públicas obriga o país a se financiar mais no exterior. Não é por acaso que a balança comercial apresenta fracos resultados


A teoria dos déficits gêmeos não é uma unanimidade entre os economistas, mas em países com o grau de desenvolvimento do Brasil o fenômeno tem se comprovado, na prática. Segundo essa teoria, o desequilíbrio das finanças públicas, dada a magnitude do Estado como agente econômico, provoca um déficit gêmeo nas contas externas.

Coincidência ou não, à medida que o superávit primário nas finanças governamentais foi minguando nos últimos anos, o déficit nas transações correntes (mercadorias e serviços) do balanço de pagamentos se ampliou, ultrapassando recentemente a casa de US$ 80 bilhões, o equivalente a 3,7% do Produto Interno Bruto (PIB). A ligação entre finanças públicas e contas externas se daria pela absorção de poupança doméstica para cobrir o rombo causado pelos gastos governamentais. A insuficiência de poupança interna forçaria a economia a se financiar mais no exterior. O tamanho do déficit nas transações correntes retrataria assim a dependência da economia brasileira à absorção de poupança externa.

Fatores específicos podem ter contribuído para alguns dos resultados negativos mensais da balança comercial. O crescimento da China está desacelerando, o que tem se refletido nos preços de produtos básicos que o Brasil exporta para lá, como o minério de ferro e a soja. A crise na Argentina, nosso principal parceiro comercial no Mercosul, causou uma considerável retração na exportação de produtos manufaturados brasileiros, especialmente automóveis. A longa estiagem que baixou o nível dos reservatórios das hidrelétricas das regiões Sudeste e Nordeste fez com que as usinas térmicas operassem ininterruptamente a pleno vapor, aumentando as importações de gás e outros combustíveis. E etc.

Explicações não faltam para os fracos resultados da balança comercial — o pior outubro em 16 anos, com um déficit de US$ 1,1 bilhão. Porém, o denominador comum de todos os problemas que a economia brasileira atualmente enfrenta é mesmo o desequilíbrio das finanças públicas. Dessa maneira, é no plano macroeconômico que o governo precisa agir mais, embora medidas pontuais também sejam necessárias — dependência excessiva do Mercosul, infraestrutura precária etc. O item número um da agenda econômica do futuro mandato da presidente Dilma (se é que se deseja de fato derrubar a inflação e diminuir o grau de dependência na absorção de poupança externa) deveria ser o ajuste fiscal. Sem que as finanças públicas voltem a ficar em ordem, não se conseguirá resolver os demais problemas que hoje afligem a economia do país. Daí a ansiedade com que o mundo dos negócios e os diferentes mercados aguarda a revelação dos nomes que vão compor a nova equipe econômica do governo. Por esses nomes, teremos uma ideia do empenho e da importância que a presidente Dilma dará à busca de soluções de fato para as dificuldades econômicas do país.

COLUNA DE CLAUDIO HUMBERTO

“Reajuste de combustível não se anuncia, pratica-se”
Graça Foster, presidente da Petrobras, insinuando a volta da pegadinha do aumento


Petição quer investigação do Petrolão pelo FBI

Nova petição no site da Casa Branca cobra investigação nos Estados Unidos sobre o escândalo do Petrolão devido às perdas causadas pelo esquema de corrupção na estatal brasileira a investidores estrangeiros. Ações da Petrobras são negociadas na Bolsa de Nova York e a denúncia de desvios bilionários, nos governos Lula e Dilma, também afetou a reputação da empresa no mercado de capitais americano.

Conta muito cara

Acionistas da Petrobras podem cobrar prejuízos na Justiça dos EUA se for confirmado o envolvimento de dirigentes da estatal no Petrolão.

Rigorosa investigação

A iniciativa pede que o FBI, a Polícia Federal dos EUA, e a SEC, a Comissão de Valores Mobiliários de lá, façam “rigorosa investigação”.

É a lei

Caso atinja a marca de 100 mil assinaturas até o dia 30 de novembro, a petição passará por análise da Casa Branca e terá resposta oficial.

EUA terão posição

Outra iniciativa pede um posicionamento sobre o avanço bolivariano no Brasil e deve ter resposta oficial, pois já superou 133 mil assinaturas.

TCU: Segurança Pública não tem código de ética

Levantamento do Tribunal de Contas da União (TCU) em 25 dos 27 Estados aponta que 92% das secretarias estaduais de Segurança não possuem código de ética para seus funcionários. Isso significa que a quase totalidade das polícias civil e militar atua sem referenciais oficiais de comportamento. “Segurança pública é um dos gargalos da administração no País”, observa o presidente do TCU, Augusto Nardes.

Boa governança

O TCU realizará dia 17 o seminário “Pacto Pela Boa Governança: Um Retrato do Brasil”, destinado aos governadores eleitos este ano.

Cinco áreas

O seminário do TCU vai discutir o panorama da gestão pública nas áreas de saúde, educação, segurança, previdência e infraestrutura.

Ironia da vida

O petróleo atinge o nível mais baixo de US$ 78 o barril, e o governo Dilma se prepara para anunciar o (primeiro) aumento da gasolina.

Jantarzinho

A primeira noite de José Dirceu em casa, após uma temporada na Papuda, foi marcada por um jantar oferecido a um grupo de amigos. O pretexto, claro, não foi o benefício, mas o aniversário de sua mulher.

Sacolão vermelho

Após 32 dias sem pisar no Planalto, a agenda de Dilma ontem limitou-se a receber o governador cearense Cid Gomes. Nesse ritmo de rearranjo do “novo governo”, ela só terá 39 ministros perto do Natal.

Sombrero

O primeiro trem-bala da América Latina será no... México. Os chineses aceitaram vender os trens do primeiro trecho de 210 km por US$ 3,75 bilhões. Entre Rio-SP (400km) seriam US$16 bilhões e ninguém topou.

Cavalheiro-geral

No voo da GOL de Brasília para Guarulhos (SP), terça (4) à tarde, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, ajudou uma passageira com sua bagagem de mão, enquanto aguardavam manutenção.

E a ‘democracia direta’?

Requião resolveu bajular o governo, ontem, no Senado exaltando a tal “democracia direta” e defendendo os conselhos populares”, a sinecura petista enterrada pela Câmara. Vaiado por cidadãos nas galerias, ele perdeu a compostura, xingou as pessoas e pediu que fossem expulsos.

Direita, volver

O PT chama de “guinada à esquerda” a obsessão fascista de subjugar e controlar a imprensa que denuncia Mensalão, Petrolão etc. Virou só um agrupamento fisiológico, que faz “até o diabo” para manter o poder.

Birra antidemocrática

A Rede Sustentabilidade, de Marina Silva, instalou 25 pontos de coleta no País, tentando o número de adesões necessário à sua legalização. Ficaram de fora Piauí e Roraima, onde Marina foi derrotada no 1º turno.

Na rede

A volta de Aécio Neves (PSDB-MG) ao Senado colocou a hashtag “TV Senado” nos assuntos mais comentados do Twitter, ontem. A maior parte das mensagens era de apoio e promessas de “resistência”.

Ê, Cantareira

Dilma tem novo apelido, com a volta ao Palácio do Planalto fragilizada pela maior crise econômica e política em 16 anos: “Volume morto”.


PODER SEM PUDOR

Magro, mas valente

O general Ernesto Geisel governava o Brasil com mão de ferro e cara fechada. Numa visita à Paraíba, o governador Ivan Bichara o apresentou a todos os secretários, colocados lado a lado. Após passar por Luiz Coutinho, secretário da Fazenda, Geisel comentou baixinho:

- Como ele é magro!...

Coutinho ouviu a pilhéria e, valente, aproveitou para defender seu peixe, respondendo em cima da bucha:

- É, presidente, tão magro quanto as finanças da Paraíba!...