O Estado de S.Paulo - 06/01
O governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro (PT), reestatizou oficialmente todos os polos de pedágio rodoviários que haviam sido concedidos à iniciativa privada em 1998. As estradas federais, que somam 983 km, voltarão à União e não terão cobrança de pedágio. Os 816 km restantes ficarão a cargo de uma estatal, a Empresa Gaúcha de Rodovias (EGR).
A medida de Tarso já seria, em si mesma, um contrassenso, pois se sabe há muito tempo que o Estado é incapaz de administrar estradas. Mas seu rompante, uma promessa de campanha, é ainda mais exótico quando se observa que o governo federal, presidido por sua correligionária Dilma Rousseff, vai no sentido totalmente oposto, empenhando-se em atrair investimento privado, ainda que aos trancos e barrancos, para melhorar a intransitável malha rodoviária federal.
O governador justificou sua decisão recorrendo ao surrado recurso de caracterizar os empresários como sanguessugas: "Aqui temos um exemplo dos problemas daquele sistema de pedágio. Milhões de reais circulavam nesta praça de pedágio e não havia sequer o compromisso de fazer acostamento".
As concessionárias, com razão, qualificaram esse tipo de raciocínio de "político e ideológico" - acusam o governo de descumprir contratos, ao interferir nos preços dos pedágios, e pretendem cobrar na Justiça um passivo que dizem chegar a R$ 3 bilhões. Para o presidente da Associação Gaúcha de Concessionárias de Rodovias, Egon Schunck Júnior, "no Rio Grande do Sul, ao contrário do resto do mundo, a opção é a estatização".
O motivo para a tendência mundial à privatização é simples: estradas administradas pela iniciativa privada são melhores. Números da última pesquisa anual da Confederação Nacional dos Transportes (CNT) sobre a qualidade das rodovias provam isso. De acordo com o levantamento, 84,4% das estradas concedidas a empresas privadas estão em ótimo ou bom estado, enquanto apenas 26,7% das rodovias sob responsabilidade estatal se encontram nessas condições.
O governo petista do Rio Grande do Sul, porém, acredita que terá condições de administrar melhor as rodovias do Estado e de realizar os investimentos necessários. Para isso, criou uma estatal, a EGR, que cobrará pedágio mais barato e ainda fará melhorias.
Os números disponíveis, porém, mostram que esse objetivo não será facilmente atingido. Enquanto as concessionárias investiram nas estradas 55% do que arrecadaram, a EGR conseguiu alocar apenas 34,8%, segundo o jornal Zero Hora. A meta, diz o governo gaúcho, é chegar a 80%, mas a experiência no plano federal indica que, nesse caso, é grande a distância entre desejo e realidade.
O levantamento da CNT mostra que o investimento público federal em rodovias no ano passado, até 8 de outubro, foi de R$ 4,2 bilhões - apenas 33,2% do total autorizado. Na remota hipótese de que todo o investimento permitido tivesse sido executado, ainda assim teria sido insuficiente. Para os especialistas da CNT, seria preciso um aporte da ordem de R$ 355,2 bilhões para todas as obras necessárias na malha rodoviária, como a duplicação de 30 mil km e a construção de outros 18 mil km. O custo da melhoria das estradas e de sua administração é, portanto, insuportável para qualquer Estado - ainda mais para um Estado gigantesco e perdulário.
No caso das rodovias estaduais gaúchas, já se sabe que o fim da cobrança de pedágio resultará na suspensão de serviços de ambulância e guincho. Já as rodovias federais dependerão de recursos do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transporte, cuja situação é de penúria.
No palanque, porém, tudo fica muito mais fácil. Com fanfarra e discursos inflamados, Tarso foi a uma das praças de pedágio, em Carazinho, para simbolicamente retomá-la, recorrendo à demagogia das cancelas levantadas. "Pode passar que é de graça!", gritou o governador para um motorista de caminhão que buzinou ao atravessar o posto. No entanto, passada a festa populista, os gaúchos sabem que esse "de graça" vai acabar saindo muito caro.
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