FOLHA DE SP - 16/03
RIO DE JANEIRO - Na Constituição de 1988, os Estados da Federação fizeram um pacto. O ICMS relativo ao petróleo deixava de ser cobrado na origem e passava a ser pago no destino. Com isso, saíam perdendo o Rio e o Espírito Santo, seus grandes produtores, e beneficiavam-se os Estados onde se concentrava o consumo. Para restabelecer o equilíbrio e compensar os riscos ambientais próprios da extração e do refino do produto, decidiu-se que os dois Estados receberiam royalties -os famosos royalties.
Uma geração se passou e o Congresso, desmemoriado, resolveu virar a mesa e punir de novo as regiões que já tinham se submetido a uma medida por si esdrúxula. Conseguiu com que os royalties do petróleo sejam drenados do Rio e do Espírito Santo e espargidos sobre os demais Estados e municípios, indiferente ao fato de que tal medida quebrará os dois Estados e não renderá mais que alfinetes para os outros.
Acontece que o Rio é o terceiro colégio eleitoral do país e sua população, sensível a tais esbulhos, costuma se vingar dos políticos que identifica como hostis a ela. Foi assim com José Serra, a quem o carioca atribuiu a tunga do ICMS na Constituinte e surrou sucessivamente em suas disputas presidenciais.
Dessa vez, o político que o Rio mais associa à campanha contra os seus interesses é o governador de Pernambuco, Eduardo Campos. Mas este é rápido. De olho no Planalto e, diante da perspectiva de ter o Rio contra si, ele -depois do malfeito- já tenta propor acordos que, à custa da União, diminuam os prejuízos dos produtores.
O mundo deve estar zureta com os políticos brasileiros. Ao jogar para suas galeras da província, eles rasgam a Constituição, desrespeitam contratos e ignoram compromissos. E, em nome de suas agendas eleitorais, saem tentando remendar os estragos que causaram.
sábado, março 16, 2013
Esse papo de Papa - ARNALDO BLOCH
O GLOBO - 16/03
Dois serventes conversavam com uma caixa. Um deles argumentava que o Brasil já tinha a Copa e as Olimpíadas.— Ainda ia querer levar o Papa? Aí é fácil.
Preparei-me com roupa decente e bons chinelos para assistir em casa, diante de um monitor de 52 polegadas, ao anúncio e à aparição do novo Papa. É grande a curiosidade de um judeu em relação aos papas, mesmo um não religioso tendendo ao agnosticismo, como é meu caso. Desde que o bom e pacífico João XXIII, no Concílio II, derrubou a tese do deicídio, e que João Paulo II chamou os judeus de “irmãos mais velhos” e fez expressão de Moisés olhando para Canaã na televisão, o interesse na comunidade só deve ter aumentado.
Claro que não houve judeu que não desse uma tremida quando Joseph Ratzinger subiu ao trono. O grande teólogo alemão acabou atacando não os judeus, mas o Islã, ao proferir uma frase a ser esquecida, parcial e intelectualmente incompleta, que deveria gerar repulsa em qualquer humanista, seja ele judeu, muçulmano, cristão, ateu, paulista ou argentino.
Como carioca, brasileiro, cidadão do país com maior número de católicos do mundo, estava também ansioso para saber se teríamos Dom Odilo Scherer no Vaticano. Não torcia especialmente por ele, temeroso de um papado continuísta e ultraconservador, mas sabia que algo aqui pelo Sul estava reservado, e desconfiava, mesmo sem grandes argumentos, de que isso seria bom.
Minha faxineira, que é evangélica bem sectária, não moveu um músculo da face com a agitação na pequena sala de estar, com a TV, as polifonias, o suspense dos apresentadores. A coisa, simplesmente, não era com ela. Preferi respeitar e observar antropologicamente se ao longo do anúncio a coisa mudaria.
E veio o Papa. Gostei do jeitão e do sorriso meio oblíquo. O fato de ter começado por um “boa noite” bem mundano, ao olhar para a multidão na praça, Roma ao anoitecer, trouxe uma vibração secular, urbana, de um homem que quer conversar com pessoas na Terra e que, até prova em contrário, não pode prometer o “divino já”, como fazem hoje tantos sacerdotes.
Em poucos segundos, soube que era argentino e que cozinhava a própria comida. Não pude deixar de indagar mentalmente: o que será? Um arroz com vagem, um omelete, um bife portenho, uma sopa de tomate? Gosta de vinho? Prefere as uvas da terrinha, tão na moda, bombadas na madeira, ou vai num tempranillo amadurecido?
Como não podia deixar de ser nesses momentos de concentração mundial, meu pai ligou para dar seu parecer. O velho judeu tinha chegado rápido a importantes conclusões, sempre um pouquinho para além daquilo que se informava.
— É um grande homem. Come na marmita com os operários, pega ônibus todo dia, vai moralizar o Mundo.
Aconselhei prudência e desliguei para poder ouvir as palavras de Francisco. Comecei também a navegar. Boatos inflados traziam até autoria de sequestros durante a ditadura. A posição quanto ao casamento gay era das mais azedas, sobretudo na expressão: trazia a imagem do demônio para dar uma força no contramarketing. Por outro lado, ter-se indisposto com a dinastia Kirchner, não importa muito o motivo, pesou positivamente nos meus quesitos.
À medida que o Papa ia ganhando a cena, minha excelente faxineira evangélica ficava mais absorta no trabalho: limpava os vidros da varanda do quarto com uma energia maior que a habitual, como se quisesse expressar, no atrito da flanela com o vidro, certa oposição ao roçar das vestimentas papais com as cortinas de veludo que, a partir de quarta-feira, fazem parte de sua rotina, por mais identificado que ele seja com as causas sociais: a Igreja de Roma não é das mais avessas ao dinheiro, e tirar-lhe este peso é tarefa epopeica.
Pelo que sabemos, esse Francisco nunca bebeu na esquerda mas tem um forte trabalho pastoral junto aos homens sem posses. Usa com frequência o termo “escravidão” para referir-se às dinâmicas das ruas, o que é um sinal de (boa) consciência: qualquer ser lúcido sabe que algum grau de escravidão ainda rege as relações de troca humanas, muitas vezes as mais lícitas.
Se foi fã colaboracionista dos milicos ou não foi, ele nega. Vai-se lá saber: tem tanto fã de gente ruim por aí que ocupa os tronos mais ilibados que essa é uma questão probabilística sempre muito forte quando alguém é alçado a um novo posto. Mas, aparentemente, esse apetite social do novo Papa traz à memória algo que parecia vibrar no sorriso de Albino Luciani, o João Paulo I, que veio a falecer um mês após sua escolha, deixando rumores terríveis no ar.
Rumores logo superados pela forte presença de Karol Wotjyla, com sua voz de ator, seu ouvido absoluto (cantou o João de Deus com os brasileiros murmurando uma terça abaixo de rara precisão e ataque). A doença acabou obscurecendo boa parte do pontificado daquele homem impressionante que, contudo, jamais avançou de fato para além da função que teve nas transformações que ocorriam à época, início da derrocada comunista.
A volta de um Papa com carisma, com voz, com emoção, parece ser uma boa notícia para o mundo, seja o mundo das crenças e dos dogmas, seja o mundo mais próximo à razão e ao livre pensar, seja o enclave entre o cientificismo e o criacionismo: é uma voz que fala para muitos, e o que quer que diga pode influenciar aquilo que convencionamos chamar de civilização mais numa direção ou em outra, sobretudo quando a paz é ameaçada.
Despedi-me de minha faxineira sem uma palavra sobre o assunto e fui ao supermercado. Dois serventes conversavam com uma caixa. Um deles argumentava que o Brasil já tinha a Copa e as Olimpíadas.
— Ainda ia querer levar o Papa? Aí é fácil.
Bom argumento, considerando-se que até a Deus se atribui nacionalidade.
Dois serventes conversavam com uma caixa. Um deles argumentava que o Brasil já tinha a Copa e as Olimpíadas.— Ainda ia querer levar o Papa? Aí é fácil.
Preparei-me com roupa decente e bons chinelos para assistir em casa, diante de um monitor de 52 polegadas, ao anúncio e à aparição do novo Papa. É grande a curiosidade de um judeu em relação aos papas, mesmo um não religioso tendendo ao agnosticismo, como é meu caso. Desde que o bom e pacífico João XXIII, no Concílio II, derrubou a tese do deicídio, e que João Paulo II chamou os judeus de “irmãos mais velhos” e fez expressão de Moisés olhando para Canaã na televisão, o interesse na comunidade só deve ter aumentado.
Claro que não houve judeu que não desse uma tremida quando Joseph Ratzinger subiu ao trono. O grande teólogo alemão acabou atacando não os judeus, mas o Islã, ao proferir uma frase a ser esquecida, parcial e intelectualmente incompleta, que deveria gerar repulsa em qualquer humanista, seja ele judeu, muçulmano, cristão, ateu, paulista ou argentino.
Como carioca, brasileiro, cidadão do país com maior número de católicos do mundo, estava também ansioso para saber se teríamos Dom Odilo Scherer no Vaticano. Não torcia especialmente por ele, temeroso de um papado continuísta e ultraconservador, mas sabia que algo aqui pelo Sul estava reservado, e desconfiava, mesmo sem grandes argumentos, de que isso seria bom.
Minha faxineira, que é evangélica bem sectária, não moveu um músculo da face com a agitação na pequena sala de estar, com a TV, as polifonias, o suspense dos apresentadores. A coisa, simplesmente, não era com ela. Preferi respeitar e observar antropologicamente se ao longo do anúncio a coisa mudaria.
E veio o Papa. Gostei do jeitão e do sorriso meio oblíquo. O fato de ter começado por um “boa noite” bem mundano, ao olhar para a multidão na praça, Roma ao anoitecer, trouxe uma vibração secular, urbana, de um homem que quer conversar com pessoas na Terra e que, até prova em contrário, não pode prometer o “divino já”, como fazem hoje tantos sacerdotes.
Em poucos segundos, soube que era argentino e que cozinhava a própria comida. Não pude deixar de indagar mentalmente: o que será? Um arroz com vagem, um omelete, um bife portenho, uma sopa de tomate? Gosta de vinho? Prefere as uvas da terrinha, tão na moda, bombadas na madeira, ou vai num tempranillo amadurecido?
Como não podia deixar de ser nesses momentos de concentração mundial, meu pai ligou para dar seu parecer. O velho judeu tinha chegado rápido a importantes conclusões, sempre um pouquinho para além daquilo que se informava.
— É um grande homem. Come na marmita com os operários, pega ônibus todo dia, vai moralizar o Mundo.
Aconselhei prudência e desliguei para poder ouvir as palavras de Francisco. Comecei também a navegar. Boatos inflados traziam até autoria de sequestros durante a ditadura. A posição quanto ao casamento gay era das mais azedas, sobretudo na expressão: trazia a imagem do demônio para dar uma força no contramarketing. Por outro lado, ter-se indisposto com a dinastia Kirchner, não importa muito o motivo, pesou positivamente nos meus quesitos.
À medida que o Papa ia ganhando a cena, minha excelente faxineira evangélica ficava mais absorta no trabalho: limpava os vidros da varanda do quarto com uma energia maior que a habitual, como se quisesse expressar, no atrito da flanela com o vidro, certa oposição ao roçar das vestimentas papais com as cortinas de veludo que, a partir de quarta-feira, fazem parte de sua rotina, por mais identificado que ele seja com as causas sociais: a Igreja de Roma não é das mais avessas ao dinheiro, e tirar-lhe este peso é tarefa epopeica.
Pelo que sabemos, esse Francisco nunca bebeu na esquerda mas tem um forte trabalho pastoral junto aos homens sem posses. Usa com frequência o termo “escravidão” para referir-se às dinâmicas das ruas, o que é um sinal de (boa) consciência: qualquer ser lúcido sabe que algum grau de escravidão ainda rege as relações de troca humanas, muitas vezes as mais lícitas.
Se foi fã colaboracionista dos milicos ou não foi, ele nega. Vai-se lá saber: tem tanto fã de gente ruim por aí que ocupa os tronos mais ilibados que essa é uma questão probabilística sempre muito forte quando alguém é alçado a um novo posto. Mas, aparentemente, esse apetite social do novo Papa traz à memória algo que parecia vibrar no sorriso de Albino Luciani, o João Paulo I, que veio a falecer um mês após sua escolha, deixando rumores terríveis no ar.
Rumores logo superados pela forte presença de Karol Wotjyla, com sua voz de ator, seu ouvido absoluto (cantou o João de Deus com os brasileiros murmurando uma terça abaixo de rara precisão e ataque). A doença acabou obscurecendo boa parte do pontificado daquele homem impressionante que, contudo, jamais avançou de fato para além da função que teve nas transformações que ocorriam à época, início da derrocada comunista.
A volta de um Papa com carisma, com voz, com emoção, parece ser uma boa notícia para o mundo, seja o mundo das crenças e dos dogmas, seja o mundo mais próximo à razão e ao livre pensar, seja o enclave entre o cientificismo e o criacionismo: é uma voz que fala para muitos, e o que quer que diga pode influenciar aquilo que convencionamos chamar de civilização mais numa direção ou em outra, sobretudo quando a paz é ameaçada.
Despedi-me de minha faxineira sem uma palavra sobre o assunto e fui ao supermercado. Dois serventes conversavam com uma caixa. Um deles argumentava que o Brasil já tinha a Copa e as Olimpíadas.
— Ainda ia querer levar o Papa? Aí é fácil.
Bom argumento, considerando-se que até a Deus se atribui nacionalidade.
Onde nem o papa tem vez - ÁLVARO PEREIRA JÚNIOR
FOLHA DE SP - 16/03
Na igreja católica de Changchun, a única na Coreia do Norte, metade dos fiéis vai só para espionar
EXISTE UMA igreja católica onde os fiéis, se é que existem, não fazem a menor ideia de que um novo papa foi eleito. Talvez não saibam nem que o antecessor renunciou, ou mesmo qual era o nome do papa anterior.
Essa catedral do absurdo fica na Coreia do Norte. Mais exatamente na capital, Pyongyang. Foi construída em 1988, durante um suposto relaxamento da repressão antirreligiosa do regime stalinista.
A igreja de Changchun não tem bispo, padre, nada. Os poucos serviços religiosos são tocados pelos próprios frequentadores. Uma estrangeira que sempre participa estima que só metade da congregação seja de fiéis legítimos. O resto são paus mandados do serviço de espionagem.
Esses dados sobre religião no regime mais fechado do mundo são só alguns entre tantos de um livro fascinante: "Only Beautiful, Please: A British Diplomat in North Korea" ("Só Bonitas, Por Favor: Um Diplomata Britânico na Coreia do Norte"). O autor é John Everard, embaixador da Grã-Bretanha de 2006 a 2008.
O título estranho se refere a um episódio em que um policial flagrou o diplomata tirando fotos em lugar não autorizado. Louco para exibir o pouco de inglês que falava, o tira ordenou: "Only beautiful!" (era para fotografar só as coisas bonitas).
A Coreia do Norte que emerge do livro não é o Estado policial sombrio de que tanto ouvimos falar. É um país de feições humanas, que preza as relações familiares, procura se divertir dentro dos parcos meios de que dispõe e, principalmente, acorda aos poucos de um longo torpor, percebendo que não é o paraíso que a propaganda totalitária vende à população há mais de 50 anos.
Everard faz compras em grandes mercados de rua. Anda de bicicleta para todo lado (às vezes até escapa -diz ele que inadvertidamente- da área permitida para estrangeiros). Vai a restaurantes frequentados pela população comum. Até pega metrô, coisa que quase nenhum estrangeiro faz.
Mais do que um regime que subjuga a população com punhos de aço, Everard -que deixou a Coreia do Norte quando Kim Jong-il, pai do atual ditador, ainda estava no poder-, descreve um sistema de repressão cada vez mais ineficiente e corrupto.
Para o inglês, o ponto de virada se deu na grande epidemia de fome de 1994 a 1998, quando cerca de 2 milhões de pessoas morreram, 10% da população.
Sem alternativa, Kim Jong-il foi obrigado a abrir o país para a ONU e ONGs de apoio humanitário. Os norte-coreanos passaram a ter contato com estrangeiros -em sua maioria, gente educada e saudável, que ainda por cima lhes trazia comida e atendimento médico.
Mas como? A Coreia do Norte não era a mais próspera das nações, em meio a um mundo corrupto e miserável? E os estrangeiros não eram todos agentes do imperialismo dispostos a tudo para liquidar os norte-coreanos?
Quando, a duras penas, a epidemia de fome foi superada, Kim Jong-il expulsou a grande maioria das ONGs, mas aí já era tarde -a semente da desconfiança já tinha sido plantada.
A tecnologia também passou a conspirar contra o regime. Pela fronteira com a China, cada vez mais porosa (pelo menos para os padrões de um regime totalitário), começaram a entrar no país DVDs com novelas sul-coreanas.
Os coreanos do norte viram então que seus vizinhos não eram um bando de mendigos ultraviolentos, nem Seul era um amontoado de favelas patrulhadas por sádicos soldados americanos (era isso o que dizia a propaganda oficial).
Perceberam que a Coreia do Sul é um país infinitamente mais rico e livre, embora de costumes liberais em excesso para o gosto norte-coreano.
Talvez a análise de Everard seja otimista demais, em especial depois de o regime do novo ditador, Kim Jong-un, ter feito novos testes nucleares e subido o tom de belicosidade. Pode ter acontecido um embrutecimento que o britânico não conseguiu prever. Ainda assim, seu livro tem muitos méritos.
Fica também um recado para as editoras do Brasil: façam contato com os diplomatas brasileiros que servem em Pyongyang. Com a tradição literária do Itamaraty (João Cabral, Rosa, Vinicius etc.), não é difícil que se produza um retrato ainda mais interessante que o de John Everard.
A ginga brasileira explica a dinastia totalitária dos Kim. Essa, eu pagaria para ler.
Na igreja católica de Changchun, a única na Coreia do Norte, metade dos fiéis vai só para espionar
EXISTE UMA igreja católica onde os fiéis, se é que existem, não fazem a menor ideia de que um novo papa foi eleito. Talvez não saibam nem que o antecessor renunciou, ou mesmo qual era o nome do papa anterior.
Essa catedral do absurdo fica na Coreia do Norte. Mais exatamente na capital, Pyongyang. Foi construída em 1988, durante um suposto relaxamento da repressão antirreligiosa do regime stalinista.
A igreja de Changchun não tem bispo, padre, nada. Os poucos serviços religiosos são tocados pelos próprios frequentadores. Uma estrangeira que sempre participa estima que só metade da congregação seja de fiéis legítimos. O resto são paus mandados do serviço de espionagem.
Esses dados sobre religião no regime mais fechado do mundo são só alguns entre tantos de um livro fascinante: "Only Beautiful, Please: A British Diplomat in North Korea" ("Só Bonitas, Por Favor: Um Diplomata Britânico na Coreia do Norte"). O autor é John Everard, embaixador da Grã-Bretanha de 2006 a 2008.
O título estranho se refere a um episódio em que um policial flagrou o diplomata tirando fotos em lugar não autorizado. Louco para exibir o pouco de inglês que falava, o tira ordenou: "Only beautiful!" (era para fotografar só as coisas bonitas).
A Coreia do Norte que emerge do livro não é o Estado policial sombrio de que tanto ouvimos falar. É um país de feições humanas, que preza as relações familiares, procura se divertir dentro dos parcos meios de que dispõe e, principalmente, acorda aos poucos de um longo torpor, percebendo que não é o paraíso que a propaganda totalitária vende à população há mais de 50 anos.
Everard faz compras em grandes mercados de rua. Anda de bicicleta para todo lado (às vezes até escapa -diz ele que inadvertidamente- da área permitida para estrangeiros). Vai a restaurantes frequentados pela população comum. Até pega metrô, coisa que quase nenhum estrangeiro faz.
Mais do que um regime que subjuga a população com punhos de aço, Everard -que deixou a Coreia do Norte quando Kim Jong-il, pai do atual ditador, ainda estava no poder-, descreve um sistema de repressão cada vez mais ineficiente e corrupto.
Para o inglês, o ponto de virada se deu na grande epidemia de fome de 1994 a 1998, quando cerca de 2 milhões de pessoas morreram, 10% da população.
Sem alternativa, Kim Jong-il foi obrigado a abrir o país para a ONU e ONGs de apoio humanitário. Os norte-coreanos passaram a ter contato com estrangeiros -em sua maioria, gente educada e saudável, que ainda por cima lhes trazia comida e atendimento médico.
Mas como? A Coreia do Norte não era a mais próspera das nações, em meio a um mundo corrupto e miserável? E os estrangeiros não eram todos agentes do imperialismo dispostos a tudo para liquidar os norte-coreanos?
Quando, a duras penas, a epidemia de fome foi superada, Kim Jong-il expulsou a grande maioria das ONGs, mas aí já era tarde -a semente da desconfiança já tinha sido plantada.
A tecnologia também passou a conspirar contra o regime. Pela fronteira com a China, cada vez mais porosa (pelo menos para os padrões de um regime totalitário), começaram a entrar no país DVDs com novelas sul-coreanas.
Os coreanos do norte viram então que seus vizinhos não eram um bando de mendigos ultraviolentos, nem Seul era um amontoado de favelas patrulhadas por sádicos soldados americanos (era isso o que dizia a propaganda oficial).
Perceberam que a Coreia do Sul é um país infinitamente mais rico e livre, embora de costumes liberais em excesso para o gosto norte-coreano.
Talvez a análise de Everard seja otimista demais, em especial depois de o regime do novo ditador, Kim Jong-un, ter feito novos testes nucleares e subido o tom de belicosidade. Pode ter acontecido um embrutecimento que o britânico não conseguiu prever. Ainda assim, seu livro tem muitos méritos.
Fica também um recado para as editoras do Brasil: façam contato com os diplomatas brasileiros que servem em Pyongyang. Com a tradição literária do Itamaraty (João Cabral, Rosa, Vinicius etc.), não é difícil que se produza um retrato ainda mais interessante que o de John Everard.
A ginga brasileira explica a dinastia totalitária dos Kim. Essa, eu pagaria para ler.
Esperança equilibrista - MIRIAM LEITÃO
O GLOBO - 16/03
O Brasil se move lento demais. O ritmo aflige quem sonha, há muito tempo, com um país mais civilizado. Ontem, 37 anos depois, foi finalmente entregue a certidão de óbito de Vladimir Herzog sem a mentira imposta pelos militares. Hora da morte não se sabe, mas agora está lá o local, II Exército, e a causa, “lesões e maus tratos”. Por que o Brasil precisou esperar tanto?
Muita gente fez a coisa certa para que o momento de ontem chegasse, mas ninguém fez mais que Clarice. Com 34 anos, viúva, dois filhos, decidiu enfrentar o regime nos terríveis anos 70. Conseguiu em 1978 que a União fosse responsabilizada, numa sentença inédita dada pelo corajoso e jovem juiz Márcio de Moraes.
“Obrigado mãe pelos seus valores e princípios inegociáveis” e “por ter cuidado tão bem de todos nós em momentos tão difíceis da sua vida”, disse Ivo para a mãe, Clarice. A música de Aldir Blanc e João Bosco, cantada por Elis, dizia: “Choram marias e clarices no solo do Brasil”. Era dela que se falava.
Hoje, o Instituto Vladimir Herzog, sob o comando de Ivo, tem belos planos para o Brasil na defesa de direitos humanos, no resgate da história e na proteção dos jornalistas.
Uma névoa ainda encobre os fatos que levaram à morte do jornalista naquele 25 de outubro de 1975. Uma campanha contra o jornalismo da TV Cultura começou um pouco antes de Vladimir ser preso. Uma das vozes era do deputado José Maria Marin. Em aparte ao deputado Wadih Helu, num discurso contra os jornalistas, Marin pediu: “É preciso mais do que nunca uma providência para que a tranquilidade volte a reinar nos lares paulistanos.”
O lar dos Herzog foi, duas semanas depois, atingido pela prisão e morte de Vladimir. Agora, tudo o que há é uma certidão de óbito com a verdadeira causa da morte. E José Maria Marin é presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF).
Esta semana, Marin usou o site da CBF para se defender. Disse que lembrar esses fatos é uma tentativa de conturbar “as atividades do futebol brasileiro”. O Futebol não é Marin. Ele devia responder por seus atos fora da CBF. É um espanto como o Brasil é arcaico às vezes.
Há muito o que ser louvado nos esforços da Comissão da Verdade e nas reportagens que têm iluminado parte desse tempo obscuro. Mas, tudo somado, é pouco, e o ritmo, muito lento.
A Fortaleza de São João é um prédio lindo, construído em 1565, na fundação da cidade do Rio de Janeiro. Fica no sopé do Pão de Açúcar. Fui lá esta semana entrevistar a almirante Dalva, a primeira oficial general do Brasil. Ela entrou na Marinha e logo depois engravidou. Nem ela esperava e muito menos a Marinha:
— Foi uma surpresa para todos e a gente não sabia como lidar. E outras três apareceram grávidas.
A Marinha adaptou o uniforme fazendo batas de grávidas e as quatro se formaram exibindo orgulhosamente suas barrigas. Até um berçário para que elas amamentassem foi providenciado. Mas a Força não permite até hoje que mulheres entrem para o coração da carreira, que passa pela Escola Naval e leva ao comando.
Quando ela ingressou, em abril 1981, o pior da ditadura havia passado, mas se recusava a ir embora. Tanto que dias depois houve o atentado do Riocentro.
Perguntei sobre a Comissão da Verdade, um assunto que os militares enfrentam com desconforto. Ela falou:
— A Marinha é legalista e cumprirá a lei e a vontade da nossa comandante em chefe. Eu, pessoalmente, sou a favor de que as verdades sejam sempre ditas.
Os avanços acontecem no Brasil, mas muito devagar. Ontem, um pedaço da verdade foi dita. Mas muito está encoberto. A esperança ainda tem que se equilibrar.
O Brasil se move lento demais. O ritmo aflige quem sonha, há muito tempo, com um país mais civilizado. Ontem, 37 anos depois, foi finalmente entregue a certidão de óbito de Vladimir Herzog sem a mentira imposta pelos militares. Hora da morte não se sabe, mas agora está lá o local, II Exército, e a causa, “lesões e maus tratos”. Por que o Brasil precisou esperar tanto?
Muita gente fez a coisa certa para que o momento de ontem chegasse, mas ninguém fez mais que Clarice. Com 34 anos, viúva, dois filhos, decidiu enfrentar o regime nos terríveis anos 70. Conseguiu em 1978 que a União fosse responsabilizada, numa sentença inédita dada pelo corajoso e jovem juiz Márcio de Moraes.
“Obrigado mãe pelos seus valores e princípios inegociáveis” e “por ter cuidado tão bem de todos nós em momentos tão difíceis da sua vida”, disse Ivo para a mãe, Clarice. A música de Aldir Blanc e João Bosco, cantada por Elis, dizia: “Choram marias e clarices no solo do Brasil”. Era dela que se falava.
Hoje, o Instituto Vladimir Herzog, sob o comando de Ivo, tem belos planos para o Brasil na defesa de direitos humanos, no resgate da história e na proteção dos jornalistas.
Uma névoa ainda encobre os fatos que levaram à morte do jornalista naquele 25 de outubro de 1975. Uma campanha contra o jornalismo da TV Cultura começou um pouco antes de Vladimir ser preso. Uma das vozes era do deputado José Maria Marin. Em aparte ao deputado Wadih Helu, num discurso contra os jornalistas, Marin pediu: “É preciso mais do que nunca uma providência para que a tranquilidade volte a reinar nos lares paulistanos.”
O lar dos Herzog foi, duas semanas depois, atingido pela prisão e morte de Vladimir. Agora, tudo o que há é uma certidão de óbito com a verdadeira causa da morte. E José Maria Marin é presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF).
Esta semana, Marin usou o site da CBF para se defender. Disse que lembrar esses fatos é uma tentativa de conturbar “as atividades do futebol brasileiro”. O Futebol não é Marin. Ele devia responder por seus atos fora da CBF. É um espanto como o Brasil é arcaico às vezes.
Há muito o que ser louvado nos esforços da Comissão da Verdade e nas reportagens que têm iluminado parte desse tempo obscuro. Mas, tudo somado, é pouco, e o ritmo, muito lento.
A Fortaleza de São João é um prédio lindo, construído em 1565, na fundação da cidade do Rio de Janeiro. Fica no sopé do Pão de Açúcar. Fui lá esta semana entrevistar a almirante Dalva, a primeira oficial general do Brasil. Ela entrou na Marinha e logo depois engravidou. Nem ela esperava e muito menos a Marinha:
— Foi uma surpresa para todos e a gente não sabia como lidar. E outras três apareceram grávidas.
A Marinha adaptou o uniforme fazendo batas de grávidas e as quatro se formaram exibindo orgulhosamente suas barrigas. Até um berçário para que elas amamentassem foi providenciado. Mas a Força não permite até hoje que mulheres entrem para o coração da carreira, que passa pela Escola Naval e leva ao comando.
Quando ela ingressou, em abril 1981, o pior da ditadura havia passado, mas se recusava a ir embora. Tanto que dias depois houve o atentado do Riocentro.
Perguntei sobre a Comissão da Verdade, um assunto que os militares enfrentam com desconforto. Ela falou:
— A Marinha é legalista e cumprirá a lei e a vontade da nossa comandante em chefe. Eu, pessoalmente, sou a favor de que as verdades sejam sempre ditas.
Os avanços acontecem no Brasil, mas muito devagar. Ontem, um pedaço da verdade foi dita. Mas muito está encoberto. A esperança ainda tem que se equilibrar.
Habemus polêmica - ZUENIR VENTURA
O GLOBO - 16/03
O conclave dos cardeais talvez seja o único lugar da Terra onde se guarda segredo. Parece milagre conseguir evitar vazamentos de um evento que junta 115 pessoas, é assediado pela imprensa do mundo todo e não deixa escapar, antes da hora, o que foi discutido secretamente. Graças a isso, desmoralizou-se a capacidade de previsão dos vaticanistas, jornalistas, analistas e bolsas de apostas, que não desconfiaram que o argentino pudesse ser um forte candidato a suceder Hatzinger, de quem já fora o principal opositor em 2005 (a exceção foi o repórter Gerson Camarotti, da Globo News, que apontou Jorge Mario Bergoglio como papável, quando se apostava no italiano Ângelo Scola e no brasileiro Odilo Scherer).Eu não tinha a menor ideia de quem era o cardeal Bergoglio - eu e muita gente importante.
À medida que tomava conhecimento da biografia do novo Papa, ia me entusiasmando.
Como no Vaticano tudo, não apenas a fumaça, é símbolo, fui aprendendo a interpretar os sinais.
A escolha do nome era uma evidente homenagem ao santo dos desvalidos, de quem o novo Francisco reproduzia os hábitos simples.
Andava de ônibus e metrô, fazia sua própria comida e se condoía com a pobreza dos outros. A batina branca sem adereço, aquele curvar-se na sacada pedindo aos fiéis que rezassem por ele, tudo era signo de humildade.
É bem verdade que aqui e ali ficava-se sabendo de atitudes intolerantes em relação a temas como aborto e casamento entre gays, mas os elogios ao conjunto de sua obra social predominavam.
Até que o passado bateu à porta e vieram à tona pesadas acusações contra o arcebispo de Buenos Aires durante a ditadura militar, quando ele teria colaborado com as arbitrariedades cometidas pelo regime. Um advogado chegou a propor uma ação contra Bergoglio por omissão no sequestro de dois padres jesuítas em 1976. Foi lembrado também que o jornalista Horácio Verbitsky o acusara em livro de ter delatado como subversivos sacerdotes adeptos da Teologia da Libertação.
O ex-arcebispo sempre negou as acusações, e ontem o porta-voz do Vaticano alegou que nada ficou provado contra ele na Justiça e que se trata de uma "campanha difamatória". Parentes de vítimas, no entanto, ainda insistem nas denúncias.
Um deles disse à correspondente do GLOBO, Janaína Figueiredo, que ele é "o representante de uma igreja que foi cúmplice da perseguição, sequestro e assassinato de milhares de argentinos". Outro chamou-o de "autor intelectual" de crimes da repressão.
Apesar de tudo, a eleição do novo Papa foi em geral muito bem recebida, e é provável que o futuro de Francisco seja menos polêmico que o passado de Bergoglio.
À medida que tomava conhecimento da biografia do novo Papa, ia me entusiasmando.
Como no Vaticano tudo, não apenas a fumaça, é símbolo, fui aprendendo a interpretar os sinais.
A escolha do nome era uma evidente homenagem ao santo dos desvalidos, de quem o novo Francisco reproduzia os hábitos simples.
Andava de ônibus e metrô, fazia sua própria comida e se condoía com a pobreza dos outros. A batina branca sem adereço, aquele curvar-se na sacada pedindo aos fiéis que rezassem por ele, tudo era signo de humildade.
É bem verdade que aqui e ali ficava-se sabendo de atitudes intolerantes em relação a temas como aborto e casamento entre gays, mas os elogios ao conjunto de sua obra social predominavam.
Até que o passado bateu à porta e vieram à tona pesadas acusações contra o arcebispo de Buenos Aires durante a ditadura militar, quando ele teria colaborado com as arbitrariedades cometidas pelo regime. Um advogado chegou a propor uma ação contra Bergoglio por omissão no sequestro de dois padres jesuítas em 1976. Foi lembrado também que o jornalista Horácio Verbitsky o acusara em livro de ter delatado como subversivos sacerdotes adeptos da Teologia da Libertação.
O ex-arcebispo sempre negou as acusações, e ontem o porta-voz do Vaticano alegou que nada ficou provado contra ele na Justiça e que se trata de uma "campanha difamatória". Parentes de vítimas, no entanto, ainda insistem nas denúncias.
Um deles disse à correspondente do GLOBO, Janaína Figueiredo, que ele é "o representante de uma igreja que foi cúmplice da perseguição, sequestro e assassinato de milhares de argentinos". Outro chamou-o de "autor intelectual" de crimes da repressão.
Apesar de tudo, a eleição do novo Papa foi em geral muito bem recebida, e é provável que o futuro de Francisco seja menos polêmico que o passado de Bergoglio.
Intervencionismo - CELSO MING
O ESTADO DE S. PAULO - 16/03
O governo Dilma acordou para a enorme necessidade de ampliação do investimento. Mas vai esbarrando na relutância dos empresários em se atirar à empreitada e em mobilizar seu espírito animal.
Eles elogiam a nova música que vai sendo entoada em Brasília, garantem que vão executar a partitura e, no entanto, ficam à espera de melhores condições.
As razões reconhecidas dessa falta de entusiasmo são duas: (1) a falta de retorno compensador para os negócios, dadas as condições da economia; e (2) o excessivo intervencionismo do governo na iniciativa privada, que subverte marcos regulatórios e cria a insegurança.
As queixas sobre o ativismo excessivo têm dois níveis. O primeiro deles tem a ver com os fundamentos macroeconômicos. E o segundo, com o forte protagonismo do governo federal nos negócios.
Sobre o primeiro nível, o que se pode dizer é que a segurança dos investimentos é dada, em larga medida, por uma boa administração das finanças públicas (marco fiscal); por estabilidade nas regras do câmbio; e por um rígido controle da inflação - algo que depende de clareza na condução da política monetária (política de juros).
Sobre a estabilidade desses três pilares vêm pairando dúvidas crescentes e um progressivo desarranjo geral da economia. A todo momento, o governo vem se sentindo obrigado a negar que haja problemas com o câmbio flutuante, com o cumprimento das metas do superávit primário (sobra de arrecadação para pagamento da dívida) e com a observância das metas de inflação. No entanto, uma hora o governo puxa as cotações do câmbio para o alto com o objetivo de dar mais competitividade à indústria. E, logo em seguida, as derruba para ajudar a combater a inflação. Os compromissos fiscais têm sido atropelados com manobras contábeis esquisitas, como aconteceu em 2012. E o Banco Central se comporta como se uma meta de juros fosse mais importante do que a meta de inflação e já não consegue ancorar as expectativas. Em outras palavras, o governo federal vem mexendo de tal forma nos fundamentos da economia que deixa sérias dúvidas sobre a consistência da política econômica.
O outro nível de intervencionismo que suscita retração do investidor são as iniciativas temporárias e arbitrárias de distribuição de favores tributários e de créditos de longo prazo - aquilo que esta Coluna outras vezes chamou de "política do puxadinho". Ora favorecem alguns setores, como a indústria de veículos e de aparelhos domésticos; ora empresas eleitas previamente para se transformar em futuras vencedoras à custa das demais.
São decisões como essas que deixam muito flácidas as regras do jogo e que criam insegurança ou porque podem ser retiradas a qualquer momento e, assim, deixar o investidor "com a brocha na mão"; ou porque são discricionárias e permitem que alguns se tornem artificialmente mais competitivos do que os outros.
O diabo é que os dois níveis de intervenção na economia sempre se compõem para criar instabilidade e mais insegurança. Assim, fica difícil calcular retorno e riscos de um negócio e a tendência dos investidores ou é de alguma maneira compensar-se pelo aumento do risco - o que implica aumento de custos para a economia - ou simplesmente adiar os investimentos.
O governo Dilma acordou para a enorme necessidade de ampliação do investimento. Mas vai esbarrando na relutância dos empresários em se atirar à empreitada e em mobilizar seu espírito animal.
Eles elogiam a nova música que vai sendo entoada em Brasília, garantem que vão executar a partitura e, no entanto, ficam à espera de melhores condições.
As razões reconhecidas dessa falta de entusiasmo são duas: (1) a falta de retorno compensador para os negócios, dadas as condições da economia; e (2) o excessivo intervencionismo do governo na iniciativa privada, que subverte marcos regulatórios e cria a insegurança.
As queixas sobre o ativismo excessivo têm dois níveis. O primeiro deles tem a ver com os fundamentos macroeconômicos. E o segundo, com o forte protagonismo do governo federal nos negócios.
Sobre o primeiro nível, o que se pode dizer é que a segurança dos investimentos é dada, em larga medida, por uma boa administração das finanças públicas (marco fiscal); por estabilidade nas regras do câmbio; e por um rígido controle da inflação - algo que depende de clareza na condução da política monetária (política de juros).
Sobre a estabilidade desses três pilares vêm pairando dúvidas crescentes e um progressivo desarranjo geral da economia. A todo momento, o governo vem se sentindo obrigado a negar que haja problemas com o câmbio flutuante, com o cumprimento das metas do superávit primário (sobra de arrecadação para pagamento da dívida) e com a observância das metas de inflação. No entanto, uma hora o governo puxa as cotações do câmbio para o alto com o objetivo de dar mais competitividade à indústria. E, logo em seguida, as derruba para ajudar a combater a inflação. Os compromissos fiscais têm sido atropelados com manobras contábeis esquisitas, como aconteceu em 2012. E o Banco Central se comporta como se uma meta de juros fosse mais importante do que a meta de inflação e já não consegue ancorar as expectativas. Em outras palavras, o governo federal vem mexendo de tal forma nos fundamentos da economia que deixa sérias dúvidas sobre a consistência da política econômica.
O outro nível de intervencionismo que suscita retração do investidor são as iniciativas temporárias e arbitrárias de distribuição de favores tributários e de créditos de longo prazo - aquilo que esta Coluna outras vezes chamou de "política do puxadinho". Ora favorecem alguns setores, como a indústria de veículos e de aparelhos domésticos; ora empresas eleitas previamente para se transformar em futuras vencedoras à custa das demais.
São decisões como essas que deixam muito flácidas as regras do jogo e que criam insegurança ou porque podem ser retiradas a qualquer momento e, assim, deixar o investidor "com a brocha na mão"; ou porque são discricionárias e permitem que alguns se tornem artificialmente mais competitivos do que os outros.
O diabo é que os dois níveis de intervenção na economia sempre se compõem para criar instabilidade e mais insegurança. Assim, fica difícil calcular retorno e riscos de um negócio e a tendência dos investidores ou é de alguma maneira compensar-se pelo aumento do risco - o que implica aumento de custos para a economia - ou simplesmente adiar os investimentos.
FLÁVIA OLIVEIRA - NEGÓCIOS & CIA
O GLOBO - 16/03
Quem sai
O juiz Fernando Cesar Ferreira Viana, da 7ª Vara Empresarial do TJ-Rio, determinou o afastamento imediato de Natan Kimelblat da administração da Natan Joias. O juiz considerou “desastrosa” a gestão do fundador da joalheria, em recuperação judicial desde 2012. As duas últimas lojas fecharam as portas este mês.
Quem chega
Thais Gaudino Brescia, empresária de São Paulo, foi nomeada gestora judicial da Natan por 90 dias. Ela tem um mês para apresentar relatório sobre a situação financeira da empresa.
Cheiroso
Neymar, craque do Santos e da Seleção Brasileira, será garoto-propaganda do perfume Dakkar. Assinou com a L’Oréal.
Em dia
A Renascença, de locação de imóveis, registrou em janeiro de 2013 a menor taxa de inadimplência de aluguéis dos últimos três anos. Ficou em 0,85%, na faixa de R$ 2 mil a R$ 3 mil; e em 3,14%, de R$ 1.500 a R$ 2 mil.
Cultura
As inscrições de projetos para o Programa de Editais de Investimento Não-Reembolsável da RioFilme começam na 2ª. O aporte é de R$ 11,5 milhões. Só no primeiro semestre, Senai e RioFilme oferecerão 14 cursos de capacitação em audivisual.
Semana Santa 1
A Ambep Tur Seguros, de viagens, esgotou há sete dias todos os pacotes para a Semana Santa. O Nordeste liderou a procura. Com 40% dos contratos, o destino mais procurado foi Fortaleza.
Semana Santa 2
Nos destinos internacionais, Buenos Aires está no topo da preferência dos brasileiros, segundo o site Mundi. Tem 18,76% das buscas. Miami é 2º (8,17%), seguido de Lisboa, Santiago e Montevidéu.
Investimento 1
O grupo alemão B.Braun, do segmento médico-hospitalar, vai investir R$ 346 milhões na construção de uma nova fábrica no Brasil. A planta,
que buscará certificação LEED (de eficiência energética e sustentabilidade), começa a operar em 2017.O laboratório já tem unidade no Rio.
Investimento 2
A americana Parker Hannifin, do setor de automação, abriu fábrica em Arujá (SP). Investiu R$ 2 milhões no complexo de quatro mil metros quadrados. De olho no crescimento do setor agrícola, vai produzir filtros e acessórios hidráulicos. A meta é faturar 10% mais no Brasil este ano.
Quem sai
O juiz Fernando Cesar Ferreira Viana, da 7ª Vara Empresarial do TJ-Rio, determinou o afastamento imediato de Natan Kimelblat da administração da Natan Joias. O juiz considerou “desastrosa” a gestão do fundador da joalheria, em recuperação judicial desde 2012. As duas últimas lojas fecharam as portas este mês.
Quem chega
Thais Gaudino Brescia, empresária de São Paulo, foi nomeada gestora judicial da Natan por 90 dias. Ela tem um mês para apresentar relatório sobre a situação financeira da empresa.
Cheiroso
Neymar, craque do Santos e da Seleção Brasileira, será garoto-propaganda do perfume Dakkar. Assinou com a L’Oréal.
Em dia
A Renascença, de locação de imóveis, registrou em janeiro de 2013 a menor taxa de inadimplência de aluguéis dos últimos três anos. Ficou em 0,85%, na faixa de R$ 2 mil a R$ 3 mil; e em 3,14%, de R$ 1.500 a R$ 2 mil.
Cultura
As inscrições de projetos para o Programa de Editais de Investimento Não-Reembolsável da RioFilme começam na 2ª. O aporte é de R$ 11,5 milhões. Só no primeiro semestre, Senai e RioFilme oferecerão 14 cursos de capacitação em audivisual.
Semana Santa 1
A Ambep Tur Seguros, de viagens, esgotou há sete dias todos os pacotes para a Semana Santa. O Nordeste liderou a procura. Com 40% dos contratos, o destino mais procurado foi Fortaleza.
Semana Santa 2
Nos destinos internacionais, Buenos Aires está no topo da preferência dos brasileiros, segundo o site Mundi. Tem 18,76% das buscas. Miami é 2º (8,17%), seguido de Lisboa, Santiago e Montevidéu.
Investimento 1
O grupo alemão B.Braun, do segmento médico-hospitalar, vai investir R$ 346 milhões na construção de uma nova fábrica no Brasil. A planta,
que buscará certificação LEED (de eficiência energética e sustentabilidade), começa a operar em 2017.O laboratório já tem unidade no Rio.
Investimento 2
A americana Parker Hannifin, do setor de automação, abriu fábrica em Arujá (SP). Investiu R$ 2 milhões no complexo de quatro mil metros quadrados. De olho no crescimento do setor agrícola, vai produzir filtros e acessórios hidráulicos. A meta é faturar 10% mais no Brasil este ano.
Chupa Argentina! Temos Capeta! - JOSÉ SIMÃO
FOLHA DE SP - 16/02
A TV chilena anunciou: "Alegria por erección de nuevo papa". O papa já teve uma erección? Que alegria!
BUEMBA! BUEMBA! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República! E ficamos assim: gol de mão não é pecado. Piada com argentino é pecado!
E a Argentina ainda comemora: perdemos as Malvinas mas ganhamos o Vaticano!
E o chargista Vasqs explica como foi a eleição do papa, com os véinhos reunidos: "Corrupção, homossexualismo, pedofilia, tentamos o pneumotórax?". "Não, a única coisa é botar um papa argentino."
E o chargista Brum colocou um brasileiro conversando com Deus: "Mas pai, meu Deus, você não era brasileiro?". E Deus: "YO?".
Rarará!
E sabe qual a diferença entre transar com o papa e transar com o marido? É que transar com o papa é pecado e transar com o marido é milagre!
E uma amiga disse que sexo na casa dela tá tão difícil que, quando acontece, rola até brigadeiro no final. Rarará!
E a TV chilena anunciou assim o novo papa argentino: "Alegria por erección de nuevo papa". O papa já teve uma erección? Que alegria!
Rarará!
E depois da fumaça, o incêndio: o imposto de renda! Sogra a gente declara como dependente ou ônus? Carma! Declara como carma! Porque sogra em casa é pior que assombração!
E do jeito que eu pago impostos, todos são meus dependentes: Romário, Tiririca, Dilma, Mantega, Alckmin, Haddad e Kassab!
E do jeito que eu pago juros, os bancos também são meus dependentes: Bradesco, Santander e Itaú! E a Dilma se declarou dependente do PMDB! Rarará!
E o tuiteiro Adriano Rima postou: "com a indicação do papa argentino, automaticamente a soberba deixa de ser um dos sete pecados capitais". Recordando: gol de mão e soberba não são mais pecados!
Aí vão dizer: "ah, mas esse papa é tão humilde". Mas humildade demais é soberba! Rarará! É mole? É mole, mas sobe!
E como no Brasil tudo começa e termina em Sarney, corre na internet uma foto do Sarney (claro!) com a legenda: "Chupa Argentina! Nós temos o Capeta!". Rarará!
Mas eu atualizaria substituindo a foto do Sarney pela foto do pastor Feliciano! Nós temos o Capeta!
Rarará!
Nóis sofre, mas nóis goza. Hoje só amanhã! Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno!
Tô empapuçado!
A TV chilena anunciou: "Alegria por erección de nuevo papa". O papa já teve uma erección? Que alegria!
BUEMBA! BUEMBA! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República! E ficamos assim: gol de mão não é pecado. Piada com argentino é pecado!
E a Argentina ainda comemora: perdemos as Malvinas mas ganhamos o Vaticano!
E o chargista Vasqs explica como foi a eleição do papa, com os véinhos reunidos: "Corrupção, homossexualismo, pedofilia, tentamos o pneumotórax?". "Não, a única coisa é botar um papa argentino."
E o chargista Brum colocou um brasileiro conversando com Deus: "Mas pai, meu Deus, você não era brasileiro?". E Deus: "YO?".
Rarará!
E sabe qual a diferença entre transar com o papa e transar com o marido? É que transar com o papa é pecado e transar com o marido é milagre!
E uma amiga disse que sexo na casa dela tá tão difícil que, quando acontece, rola até brigadeiro no final. Rarará!
E a TV chilena anunciou assim o novo papa argentino: "Alegria por erección de nuevo papa". O papa já teve uma erección? Que alegria!
Rarará!
E depois da fumaça, o incêndio: o imposto de renda! Sogra a gente declara como dependente ou ônus? Carma! Declara como carma! Porque sogra em casa é pior que assombração!
E do jeito que eu pago impostos, todos são meus dependentes: Romário, Tiririca, Dilma, Mantega, Alckmin, Haddad e Kassab!
E do jeito que eu pago juros, os bancos também são meus dependentes: Bradesco, Santander e Itaú! E a Dilma se declarou dependente do PMDB! Rarará!
E o tuiteiro Adriano Rima postou: "com a indicação do papa argentino, automaticamente a soberba deixa de ser um dos sete pecados capitais". Recordando: gol de mão e soberba não são mais pecados!
Aí vão dizer: "ah, mas esse papa é tão humilde". Mas humildade demais é soberba! Rarará! É mole? É mole, mas sobe!
E como no Brasil tudo começa e termina em Sarney, corre na internet uma foto do Sarney (claro!) com a legenda: "Chupa Argentina! Nós temos o Capeta!". Rarará!
Mas eu atualizaria substituindo a foto do Sarney pela foto do pastor Feliciano! Nós temos o Capeta!
Rarará!
Nóis sofre, mas nóis goza. Hoje só amanhã! Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno!
Tô empapuçado!
Um presente cada vez mais passado - ALBERTO DINES
GAZETA DO POVO - PR - 16/03
Joseph Ratzinger nos surpreendeu com a sua abdicação em pleno carnaval e, ao contrário do que se supunha, já na Quarta-Feira de Cinzas denunciava com firmeza o clima de hipocrisia e clamava por renovação na Igreja. Vinte e nove dias depois, bem antes da Sexta-Feira Santa, o colégio de cardeais reunidos em Roma elege com relativa facilidade seu sucessor, surpreendendo todos os vaticanistas, teólogos, torcedores e apostadores nos quatro cantos do globo.
Francisco, nascido Jorge Mario Bergoglio, é o primeiro papa não europeu, o primeiro latino-americano e o primeiro jesuíta nos 18 séculos do atual modelo pontifício. Tal como aconteceu logo após a escolha de Ratzinger em 2005, o passado político de Francisco foi minuciosamente vasculhado. O papa alemão fora obrigado a alistar-se na Juventude Hitlerista; com 16 anos, incorporado à Wehrmacht (o exército alemão); e, aos 18, em seguida ao fim da Segunda Guerra Mundial, libertado de um campo de prisioneiros. Ratzinger jamais ocultou esse episódio; ao contrário, sempre se serviu dele para a pregação antinazista que incluía veementes denúncias contra a complacência dos católicos alemães com as barbaridades cometidas contra os judeus.
Na quarta-feira, horas depois de a fumaça branca anunciar Habemus Papam, a biografia do novo pontífice já estava escancarada, e devassada a acusação de ter abandonado dois jovens jesuítas aos ferozes esbirros da ditadura argentina que os sequestraram e torturaram durante cinco meses.
O episódio está aparentemente esclarecido, mas não a íntima relação da Igreja do país vizinho com os militares implicados na “guerra suja” que até hoje sangra a Argentina. O nazifascismo foi batido há 68 anos, mas não desapareceu, teima em reaparecer sem disfarces. A ditadura argentina só agora começa a ser devidamente visualizada, e o papa Francisco será uma peça fundamental para completar o resgate. Mais ainda para pacificar a fragmentada sociedade argentina.
Não há mais segredos, as ditaduras mais secretas já não conseguem encobrir seus crimes e malfeitorias. O acontecer e o conhecer, verbos antes dissociados no tempo e no espaço, de repente se agregaram e conjugaram em ação única. Nossos ancestrais deslumbravam-se com as mutações a que assistiam e legaram preciosos tesouros de arte rupestre. As mudanças que testemunhamos e o clima de liberdade de que gozamos oferecem admiráveis oportunidades diárias para surpreender e assombrar.
O Homo sapiens é um ser em construção – crente ou agnóstico –, sempre sequioso de conhecimentos. Cada elemento que se acrescenta ao seu acervo pessoal o torna mais curioso, portanto melhor, mais sensível ao saber e sentir.
Um fascinante drama transcorre no menor Estado do mundo, o Vaticano, em ambiente solene, religioso. Ratzinger o viveu no plano moral e Bergoglio o quer no plano espiritual, para que a Igreja não seja confundida com “uma ONG piedosa”. Impossível ignorar, porém, que a ordem dos jesuítas, a militante Companhia de Jesus criada em Paris, em 1534, foi a primeira reação da Igreja romana ao cisma luterano iniciado 17 anos antes.
Vivemos o presente em alta velocidade. E, curiosamente, ele nos remete cada vez mais perto do passado.
Joseph Ratzinger nos surpreendeu com a sua abdicação em pleno carnaval e, ao contrário do que se supunha, já na Quarta-Feira de Cinzas denunciava com firmeza o clima de hipocrisia e clamava por renovação na Igreja. Vinte e nove dias depois, bem antes da Sexta-Feira Santa, o colégio de cardeais reunidos em Roma elege com relativa facilidade seu sucessor, surpreendendo todos os vaticanistas, teólogos, torcedores e apostadores nos quatro cantos do globo.
Francisco, nascido Jorge Mario Bergoglio, é o primeiro papa não europeu, o primeiro latino-americano e o primeiro jesuíta nos 18 séculos do atual modelo pontifício. Tal como aconteceu logo após a escolha de Ratzinger em 2005, o passado político de Francisco foi minuciosamente vasculhado. O papa alemão fora obrigado a alistar-se na Juventude Hitlerista; com 16 anos, incorporado à Wehrmacht (o exército alemão); e, aos 18, em seguida ao fim da Segunda Guerra Mundial, libertado de um campo de prisioneiros. Ratzinger jamais ocultou esse episódio; ao contrário, sempre se serviu dele para a pregação antinazista que incluía veementes denúncias contra a complacência dos católicos alemães com as barbaridades cometidas contra os judeus.
Na quarta-feira, horas depois de a fumaça branca anunciar Habemus Papam, a biografia do novo pontífice já estava escancarada, e devassada a acusação de ter abandonado dois jovens jesuítas aos ferozes esbirros da ditadura argentina que os sequestraram e torturaram durante cinco meses.
O episódio está aparentemente esclarecido, mas não a íntima relação da Igreja do país vizinho com os militares implicados na “guerra suja” que até hoje sangra a Argentina. O nazifascismo foi batido há 68 anos, mas não desapareceu, teima em reaparecer sem disfarces. A ditadura argentina só agora começa a ser devidamente visualizada, e o papa Francisco será uma peça fundamental para completar o resgate. Mais ainda para pacificar a fragmentada sociedade argentina.
Não há mais segredos, as ditaduras mais secretas já não conseguem encobrir seus crimes e malfeitorias. O acontecer e o conhecer, verbos antes dissociados no tempo e no espaço, de repente se agregaram e conjugaram em ação única. Nossos ancestrais deslumbravam-se com as mutações a que assistiam e legaram preciosos tesouros de arte rupestre. As mudanças que testemunhamos e o clima de liberdade de que gozamos oferecem admiráveis oportunidades diárias para surpreender e assombrar.
O Homo sapiens é um ser em construção – crente ou agnóstico –, sempre sequioso de conhecimentos. Cada elemento que se acrescenta ao seu acervo pessoal o torna mais curioso, portanto melhor, mais sensível ao saber e sentir.
Um fascinante drama transcorre no menor Estado do mundo, o Vaticano, em ambiente solene, religioso. Ratzinger o viveu no plano moral e Bergoglio o quer no plano espiritual, para que a Igreja não seja confundida com “uma ONG piedosa”. Impossível ignorar, porém, que a ordem dos jesuítas, a militante Companhia de Jesus criada em Paris, em 1534, foi a primeira reação da Igreja romana ao cisma luterano iniciado 17 anos antes.
Vivemos o presente em alta velocidade. E, curiosamente, ele nos remete cada vez mais perto do passado.
Reforma tributária já! - PEDRO DELARUE
O GLOBO - 16/03
No início do ano, a novela se repete. O contribuinte começa a recolher a papelada para a declaração do Imposto de Renda. A Receita Federal muda uma ou outra coisa no software, pequenas regras de preenchimento se alteram, a imprensa elabora reportagens que auxiliem o leitor no esforço de não pagar mais do que já paga.
Justamente em janeiro, quando o cidadão mal terminou de pagar o consumo do Natal e é emparedado pelos carnês de impostos que jamais atrasam - como os do IPVA e do IPTU - é que se percebe a alta carga tributária. Não foi à toa que ganhou espaço nos jornais o estudo realizado pelo Sindifisco sobre o Imposto de Renda de Pessoa Física.
O resultado é preocupante: desde 1996, a defasagem na tabela gira em torno de 60%.
Este é um dos efeitos de um sistema tributário regressivo, que pune o assalariado - principalmente o de menor poder aquisitivo. A tabela do IRPF vem sendo corrigida, ao longo de quase duas décadas, abaixo da inflação oficial. Não se trata de decisão de governo, e sim de Estado.
A arrecadação, porém, é uma cadeia. O erro do início terá manifestações no final. No meio, na tentativa de corrigir o rumo, surgem criativas formas de cobranças. O Custo Brasil não reflete somente mazelas no escoamento por causa da infraestrutura precária. Uma das dificuldades do produto brasileiro para competir em pé de igualdade com o importado é a quantidade de impostos embutida na formulação dos preços ao consumidor.
A Reforma Tributária é de urgente necessidade.
Vários estudos apontam sinais de esgotamento do consumo como mola-propulsora da economia.
Isso explica por que as desonerações setoriais, que visavam a dar mais estímulo à produção de alguns setores, não apresentaram o efeito estimado em 2012.
Esse resíduo do ano passado projeta um 2013 somente razoável, já que alterações estruturais vêm sendo adiadas. Dentre elas, as relacionadas à arrecadação.
O sistema tributário oneroso é uma das razões pelas quais o "espírito animal", como propôs a presidente Dilma ao empresariado meses atrás, por ora é tão tímido. É necessária uma Reforma Tributária que elimine distorções - como a incidência, sobre a mesma base, de diferentes impostos e taxas.
Enquanto o Estado trabalhar com uma carga desequilibrada, jamais diminuirá nas costas do contribuinte o peso do sistema de arrecadação.
Justamente em janeiro, quando o cidadão mal terminou de pagar o consumo do Natal e é emparedado pelos carnês de impostos que jamais atrasam - como os do IPVA e do IPTU - é que se percebe a alta carga tributária. Não foi à toa que ganhou espaço nos jornais o estudo realizado pelo Sindifisco sobre o Imposto de Renda de Pessoa Física.
O resultado é preocupante: desde 1996, a defasagem na tabela gira em torno de 60%.
Este é um dos efeitos de um sistema tributário regressivo, que pune o assalariado - principalmente o de menor poder aquisitivo. A tabela do IRPF vem sendo corrigida, ao longo de quase duas décadas, abaixo da inflação oficial. Não se trata de decisão de governo, e sim de Estado.
A arrecadação, porém, é uma cadeia. O erro do início terá manifestações no final. No meio, na tentativa de corrigir o rumo, surgem criativas formas de cobranças. O Custo Brasil não reflete somente mazelas no escoamento por causa da infraestrutura precária. Uma das dificuldades do produto brasileiro para competir em pé de igualdade com o importado é a quantidade de impostos embutida na formulação dos preços ao consumidor.
A Reforma Tributária é de urgente necessidade.
Vários estudos apontam sinais de esgotamento do consumo como mola-propulsora da economia.
Isso explica por que as desonerações setoriais, que visavam a dar mais estímulo à produção de alguns setores, não apresentaram o efeito estimado em 2012.
Esse resíduo do ano passado projeta um 2013 somente razoável, já que alterações estruturais vêm sendo adiadas. Dentre elas, as relacionadas à arrecadação.
O sistema tributário oneroso é uma das razões pelas quais o "espírito animal", como propôs a presidente Dilma ao empresariado meses atrás, por ora é tão tímido. É necessária uma Reforma Tributária que elimine distorções - como a incidência, sobre a mesma base, de diferentes impostos e taxas.
Enquanto o Estado trabalhar com uma carga desequilibrada, jamais diminuirá nas costas do contribuinte o peso do sistema de arrecadação.
De votos e devotos - WALTER CENEVIVA
FOLHA DE SP - 16/03
A eleição do papa nada mais é que uma escolha pelo voto, mas não se confunde com outras
O processo eleitoral que acabou de ser cumprido com a escolha do papa Francisco merece referência jurídica por suas características especiais. Não se confunde com outros, também eleitorais, mas distintos dos procedimentos religiosos.
Servem de exemplo países em que há eleição indireta do chefe do Executivo. O legislador escolhe entre eleitos pelo povo, candidato ou candidatos para os cargos componentes das funções propriamente governamentais.
A eleição do papa é nada mais que uma escolha pelo voto, mas não se confunde com nenhuma das outras. Sua principal distinção reside na qualificação dos eleitores, no número restrito, no fato preliminar de que são exclusivamente retirados do grupo de cardeais da religião católica romana, antes da instauração do processo eleitoral.
O papa reinante nomeia, segundo seu próprio critério, os cardeais, quando se criem novas cátedras cardinalícias ou faleçam os antecedentes ocupantes.
Não tem semelhança com a escolha em nações, nas quais a mais comum tem sido a da base essencial da linha familiar do soberano. É o caso do trono britânico, cujos componentes não governam, ou dos reinados em países árabes, também por transmissão familiar do soberano que reina e governa.
A sucessão do papa se distingue de todas as outras pelo número restrito dos eleitores, estranhos à massa do povo, participantes do chamado colégio dos cardeais, no qual, em tese, cada componente é também candidato em potencial.
Até a gestão de Bento 16 e durante séculos, o novo papa era eleito quando o antecedente falecia. As candidaturas não são preanunciadas, embora se destaquem possibilidades de concorrentes em países de predominância católica. A inscrição cabe somente a titulares do cardinalato católico.
A circunstância de que o Vaticano é um Estado dentro do Estado italiano não se confunde com o predominante enquadramento religioso da escolha do papa, que não altera a avaliação final do resultado.
No Estado italiano, é operante o sistema misto; a linha administrativa do Estado não fica aos cuidados do presidente da República, mas do primeiro-ministro.
A relação entre os votantes e a massa de seus correligionários, embora de segmentos variados do catolicismo, é apenas teórica. Cada cardeal não consulta os fiéis de seu país, para avaliar as preferências.
Havendo vários cardeais do mesmo país, é aceitável que suas preferências não sejam uniformes nem mesmo próximas. O voto é secreto, decidido na hora da manifestação de cada eleitor.
No tempo da sucessão por morte, os procedimentos eram mais fáceis. Hoje, temos um papa emérito (Bento 16) e um papa eleito (Francisco). Embora, em tese, aquele não esteja no exercício do papado, será impossível impedi-lo de manter contatos políticos, se o desejar. No futuro, é possível que sejam dois ou mais os papas renunciantes.
Com a complicação gerada pelas mudanças sociais, técnicas e políticas da vida, a divisão entre funções religiosas e dos negócios gerais da igreja (econômicos, sociais e políticos) aumentarão. O governo do dia a dia do Estado Vaticano e suas ramificações mundiais exigirão aperfeiçoamento alheio à verificação, pelo pontífice. A dinâmica da vida distanciará o voto dos devotos.
A eleição do papa nada mais é que uma escolha pelo voto, mas não se confunde com outras
O processo eleitoral que acabou de ser cumprido com a escolha do papa Francisco merece referência jurídica por suas características especiais. Não se confunde com outros, também eleitorais, mas distintos dos procedimentos religiosos.
Servem de exemplo países em que há eleição indireta do chefe do Executivo. O legislador escolhe entre eleitos pelo povo, candidato ou candidatos para os cargos componentes das funções propriamente governamentais.
A eleição do papa é nada mais que uma escolha pelo voto, mas não se confunde com nenhuma das outras. Sua principal distinção reside na qualificação dos eleitores, no número restrito, no fato preliminar de que são exclusivamente retirados do grupo de cardeais da religião católica romana, antes da instauração do processo eleitoral.
O papa reinante nomeia, segundo seu próprio critério, os cardeais, quando se criem novas cátedras cardinalícias ou faleçam os antecedentes ocupantes.
Não tem semelhança com a escolha em nações, nas quais a mais comum tem sido a da base essencial da linha familiar do soberano. É o caso do trono britânico, cujos componentes não governam, ou dos reinados em países árabes, também por transmissão familiar do soberano que reina e governa.
A sucessão do papa se distingue de todas as outras pelo número restrito dos eleitores, estranhos à massa do povo, participantes do chamado colégio dos cardeais, no qual, em tese, cada componente é também candidato em potencial.
Até a gestão de Bento 16 e durante séculos, o novo papa era eleito quando o antecedente falecia. As candidaturas não são preanunciadas, embora se destaquem possibilidades de concorrentes em países de predominância católica. A inscrição cabe somente a titulares do cardinalato católico.
A circunstância de que o Vaticano é um Estado dentro do Estado italiano não se confunde com o predominante enquadramento religioso da escolha do papa, que não altera a avaliação final do resultado.
No Estado italiano, é operante o sistema misto; a linha administrativa do Estado não fica aos cuidados do presidente da República, mas do primeiro-ministro.
A relação entre os votantes e a massa de seus correligionários, embora de segmentos variados do catolicismo, é apenas teórica. Cada cardeal não consulta os fiéis de seu país, para avaliar as preferências.
Havendo vários cardeais do mesmo país, é aceitável que suas preferências não sejam uniformes nem mesmo próximas. O voto é secreto, decidido na hora da manifestação de cada eleitor.
No tempo da sucessão por morte, os procedimentos eram mais fáceis. Hoje, temos um papa emérito (Bento 16) e um papa eleito (Francisco). Embora, em tese, aquele não esteja no exercício do papado, será impossível impedi-lo de manter contatos políticos, se o desejar. No futuro, é possível que sejam dois ou mais os papas renunciantes.
Com a complicação gerada pelas mudanças sociais, técnicas e políticas da vida, a divisão entre funções religiosas e dos negócios gerais da igreja (econômicos, sociais e políticos) aumentarão. O governo do dia a dia do Estado Vaticano e suas ramificações mundiais exigirão aperfeiçoamento alheio à verificação, pelo pontífice. A dinâmica da vida distanciará o voto dos devotos.
Não vem, Sean Penn - GUILHERME FIÚZA
O GLOBO - 16/03
Dilma anunciou a redução de impostos sobre a cesta básica. Depois, a cesta básica ficou mais cara — por causa da escalada da inflação, que é obra do governo popular e perdulário
Evo Morales, o presidente da Bolívia, disse estar “quase convencido” de que Hugo Chávez morreu envenenado. O brado do cocaleiro lembrou o do mensaleiro: “Estou cada vez mais convencido da minha inocência”, declarou quase convicto José Dirceu, antes do julgamento do mensalão. Assim a mística bolivariana vai avançando no continente, enchendo seus bufões de votos, cargos e dinheiro. O envenenamento de Chávez só não é mais bizarro que o da opinião pública, estranhamente convertida a esse messianismo terceiro-mundista.
Uma das primeiras personalidades a se manifestar após a morte de Chávez foi Sean Penn. O ator americano disse que os pobres do mundo “perderam um campeão”. A esquerda festiva sempre foi ridícula em qualquer lugar, mas a de Hollywood é imbatível. Campeã. Sean Penn é um artista formidável, o que torna o quadro ainda mais patético. O consagrado diretor Oliver Stone veio junto, declarando estar de luto “por um grande herói”. Americanos posando contra o império americano — a velha receita politicamente correta que transforma, instantaneamente, dois ídolos “conscientes” em dois panfletários infantis. Que bom se fossem só eles.
Hugo Chávez barbarizou a democracia da pior forma — fingindo-se soldado dela. Derrubou o equilíbrio de poderes usando o populismo para se eternizar no governo legalmente. Analistas supostamente isentos (e críticos desse autoritarismo) ressalvam que o chavismo reduziu a pobreza com o dinheiro do petróleo. Esses são tão tolos quanto Sean Penn e Oliver Stone.
Num futuro muito próximo, a heroica bolsa-petróleo terá sido devidamente solapada pela baderna econômica criada pelo mesmo benfeitor. Como acreditar que um governo que paralisou os investimentos, detonou as instituições, gastou o que não tinha, semeou a inflação alta e trabalhou para encobrir isso tudo numa batalha sórdida contra a imprensa — como acreditar que um projeto desses deixará um país melhor para os pobres? Ou é preguiça de pensar, ou é sociedade com a malandragem populista.
As autoridades brasileiras estão no segundo caso. Chávez foi saudado pelo ministro da Secretaria-Geral da Presidência e chefe de gabinete vitalício do petismo, Gilberto Carvalho, como o homem que fez “uma revolução” na Venezuela. É mais do que compreensível essa admiração pelo chavismo. Gilberto Carvalho é o braço armado de Dilma contra a mídia, o escalado para espalhar nos congressos e seminários do PT a artilharia contra a “imprensa burguesa”, dizendo que o país precisa de uma nova mídia e o governo será um agente estimulador disso, entre outras doces barbaridades. Como se vê, o Brasil só não é a Venezuela ainda porque a “imprensa burguesa” por aqui é mais difícil de amordaçar.
Enquanto isso, o governo dos amigos do revolucionário envenenado vai montando suas verdades e entregando-as a domicílio. Para tanto, nada melhor do que uma cadeia obrigatória de rádio e TV — brinquedo preferido de Dilma Rousseff, no que se refere a só ler o script e caprichar no penteado. E nesses tempos em que Hugo Chávez vira bibelô da bondade para astros de Hollywood, nada mais providencial do que um Dia Internacional da Mulher para decorar o presépio do oprimido — e ensejar mais um pronunciamento à nação da “presidenta”, profissão mulher.
Dilma anunciou a seu povo a redução de impostos sobre itens da cesta básica. Uma semana depois, viria a notícia de que a cesta básica ficou mais cara apesar da bondade do governo popular e revolucionário — por causa da escalada da inflação, que é obra do governo popular e perdulário. Mas não tem problema. Como ensinou o mártir bolivariano, as más notícias que a imprensa burguesa traz são puro golpismo. A verdade que vale é a que sai da boca dos heróis da pobreza, como mostram seus fantásticos índices de aprovação.
A presidenta mulher atacou também a violência doméstica dos maridos, e fez um alerta incrível: aos homens que não entendessem por bem que não devem agredir suas esposas, que se lembrassem então que quem manda neste país é uma mulher. Ou seja: em cadeia nacional, Dilma resolveu ameaçar os barbados com seu cargo. Só faltou o rolo de pastel na mão. Um show de feminilidade sem precedentes.
Assim são o chavismo e seus derivados: esconda-se atrás de um símbolo social (a mulher, o operário, a vítima da ditadura) e navegue à vontade no proselitismo. Pode mentir numa boa, pode afundar as empresas de energia para forjar uma conta de luz barata, pode ludibriar o contribuinte para adular o consumidor, pode maquiar as contas públicas para esconder a gastança eleitoreira, pode vampirizar a Petrobras e depois usá-la para soltar panfletos de “capacitação da mulher”, pode tudo isso que enche os olhos dos astros abobalhados de Hollywood.
Para a minoria cada vez mais exígua que deplora esse tipo de heróis e campeões, resta pedir, com todo respeito: não vem, Sean Penn.
Dilma anunciou a redução de impostos sobre a cesta básica. Depois, a cesta básica ficou mais cara — por causa da escalada da inflação, que é obra do governo popular e perdulário
Evo Morales, o presidente da Bolívia, disse estar “quase convencido” de que Hugo Chávez morreu envenenado. O brado do cocaleiro lembrou o do mensaleiro: “Estou cada vez mais convencido da minha inocência”, declarou quase convicto José Dirceu, antes do julgamento do mensalão. Assim a mística bolivariana vai avançando no continente, enchendo seus bufões de votos, cargos e dinheiro. O envenenamento de Chávez só não é mais bizarro que o da opinião pública, estranhamente convertida a esse messianismo terceiro-mundista.
Uma das primeiras personalidades a se manifestar após a morte de Chávez foi Sean Penn. O ator americano disse que os pobres do mundo “perderam um campeão”. A esquerda festiva sempre foi ridícula em qualquer lugar, mas a de Hollywood é imbatível. Campeã. Sean Penn é um artista formidável, o que torna o quadro ainda mais patético. O consagrado diretor Oliver Stone veio junto, declarando estar de luto “por um grande herói”. Americanos posando contra o império americano — a velha receita politicamente correta que transforma, instantaneamente, dois ídolos “conscientes” em dois panfletários infantis. Que bom se fossem só eles.
Hugo Chávez barbarizou a democracia da pior forma — fingindo-se soldado dela. Derrubou o equilíbrio de poderes usando o populismo para se eternizar no governo legalmente. Analistas supostamente isentos (e críticos desse autoritarismo) ressalvam que o chavismo reduziu a pobreza com o dinheiro do petróleo. Esses são tão tolos quanto Sean Penn e Oliver Stone.
Num futuro muito próximo, a heroica bolsa-petróleo terá sido devidamente solapada pela baderna econômica criada pelo mesmo benfeitor. Como acreditar que um governo que paralisou os investimentos, detonou as instituições, gastou o que não tinha, semeou a inflação alta e trabalhou para encobrir isso tudo numa batalha sórdida contra a imprensa — como acreditar que um projeto desses deixará um país melhor para os pobres? Ou é preguiça de pensar, ou é sociedade com a malandragem populista.
As autoridades brasileiras estão no segundo caso. Chávez foi saudado pelo ministro da Secretaria-Geral da Presidência e chefe de gabinete vitalício do petismo, Gilberto Carvalho, como o homem que fez “uma revolução” na Venezuela. É mais do que compreensível essa admiração pelo chavismo. Gilberto Carvalho é o braço armado de Dilma contra a mídia, o escalado para espalhar nos congressos e seminários do PT a artilharia contra a “imprensa burguesa”, dizendo que o país precisa de uma nova mídia e o governo será um agente estimulador disso, entre outras doces barbaridades. Como se vê, o Brasil só não é a Venezuela ainda porque a “imprensa burguesa” por aqui é mais difícil de amordaçar.
Enquanto isso, o governo dos amigos do revolucionário envenenado vai montando suas verdades e entregando-as a domicílio. Para tanto, nada melhor do que uma cadeia obrigatória de rádio e TV — brinquedo preferido de Dilma Rousseff, no que se refere a só ler o script e caprichar no penteado. E nesses tempos em que Hugo Chávez vira bibelô da bondade para astros de Hollywood, nada mais providencial do que um Dia Internacional da Mulher para decorar o presépio do oprimido — e ensejar mais um pronunciamento à nação da “presidenta”, profissão mulher.
Dilma anunciou a seu povo a redução de impostos sobre itens da cesta básica. Uma semana depois, viria a notícia de que a cesta básica ficou mais cara apesar da bondade do governo popular e revolucionário — por causa da escalada da inflação, que é obra do governo popular e perdulário. Mas não tem problema. Como ensinou o mártir bolivariano, as más notícias que a imprensa burguesa traz são puro golpismo. A verdade que vale é a que sai da boca dos heróis da pobreza, como mostram seus fantásticos índices de aprovação.
A presidenta mulher atacou também a violência doméstica dos maridos, e fez um alerta incrível: aos homens que não entendessem por bem que não devem agredir suas esposas, que se lembrassem então que quem manda neste país é uma mulher. Ou seja: em cadeia nacional, Dilma resolveu ameaçar os barbados com seu cargo. Só faltou o rolo de pastel na mão. Um show de feminilidade sem precedentes.
Assim são o chavismo e seus derivados: esconda-se atrás de um símbolo social (a mulher, o operário, a vítima da ditadura) e navegue à vontade no proselitismo. Pode mentir numa boa, pode afundar as empresas de energia para forjar uma conta de luz barata, pode ludibriar o contribuinte para adular o consumidor, pode maquiar as contas públicas para esconder a gastança eleitoreira, pode vampirizar a Petrobras e depois usá-la para soltar panfletos de “capacitação da mulher”, pode tudo isso que enche os olhos dos astros abobalhados de Hollywood.
Para a minoria cada vez mais exígua que deplora esse tipo de heróis e campeões, resta pedir, com todo respeito: não vem, Sean Penn.
Quem confia em Kassab? - LEONARDO CAVALCANTI
CORREIO BRAZILIENSE - 16/03
Ele vai ter um minuto e 34 segundos para negociar no programa dos candidatos a presidente em 2014. E isso o torna um dos políticos mais poderosos do país. Mas não quer dizer que o ex-prefeito seja querido pelo governo ou pela oposição
Quando se quer enaltecer a esperteza de um político, diz-se que o camarada é capaz de se apresentar como um tolo e conseguir a proeza de enganar a todos. O ex-prefeito de São Paulo Gilberto Kassab é um pouco esse personagem. Ao cultivar um estilo desleixado, tanto na forma como no conteúdo, o camarada se passa por alguém sem grandes ambições ou mesmo ardis. Por tais qualidades - ou melhor, defeitos -, Kassab é a própria esperteza em pessoa. Por mais que, a cada dia, o papel de bobo e inocente não o sirva mais e a imagem da dissimulação ganhe força. E a desconfiança aumente. Hoje, quem confia em Kassab levante a mão. E por que o homem consegue tanta atenção dentro e fora do governo?
A resposta mais direta é o partido, especificamente o tempo de rádio e televisão do PSD, calculado em cima de bancada de 48 deputados. Dos quase 17 minutos do tempo proporcional que os partidos terão, por programa, na eleição de 2014, Kassab - o chefe da legenda - tem um minuto e 34 segundos. A título de comparação, um comercial de qualquer empresa na TV dura 30 segundos e, a depender do produto, vende. Muito. Assim é Kassab, o homem do baile a andar com um placa luminosa, sempre pronto a levantá-la para políticos em geral, de todas as cores e credos. "Eu tenho 1 minuto e 30 segundos, eu tenho 1 minutos e trinta segundos." Todos querem bailar com ele.
Além de esperto, Kassab é um fenômeno típico da política brasileira. O cacique sem apelo nacional, ancorado na burocracia partidária, pronto a entregar o apoio a quem oferecer mais. Foi assim na criação do PSD, em 2011, quando conseguiu parlamentares do DEM, do PPS e do PSDB e se disse um colaborador da presidente Dilma Rousseff. Naquele momento, com todas as desconfianças, Kassab disse que não queria ficar amarrado ao Palácio do Planalto. O PSD, assim, seria um partido governista - afinal, daria apoio à petista -, mas manteria a independência. Na época, escrevi aqui que a legenda poderia ser oposicionista, com jeito e cara de governo. Ou governista, com cheiro de oposição. Um partido com dois amos, tal qual a comédia de Carlo Goldoni. Um jogo para lá de arriscado.
Coerência
De uma coisa, Kassab não pode ser acusado: falta de coerência. Com a mini-reforma ministerial anunciada ontem, o camarada preferiu ficar de fora da dança das cadeiras. "Nem governo, nem oposição", diria. O problema é que Kassab só anunciou a desistência horas antes de a mexida de Dilma se acertada na Esplanada. Assim, embolou as negociações e ajudou a presidente a fazer uma reforma pífia, inexpressiva, incluindo negociações no Congresso e costura de palanques para 2014. Os três anúncios de ontem apenas serviram para confirmar o óbvio: os ministérios são usados como postos políticos, em vez de servirem de núcleos de gestão de políticas públicas eficientes. Tal coisa não é culpa de Kassab, evidentemente. Ele seria apenas mais um personagem da triste trama ministerial.
Por mais que tenha um argumento razoável para recusar pastas menores - o próprio tamanho delas, evidentemente -, ao não aceitar um cargo, o PSD deixa a porta aberta para seguir fazendo o que mais gosta: barganhar. É diferente de outros partidos da base governista? Não. O problema é que os gestos de Kassab não excluem a oposição. E isso, tentar agradar ou se mostrar "amigo" de dois lados, só faz com que os partidos o vejam com desconfiança. E isso também é coerente na curta história do partido.
Outra coisa
Não deixa de ser curiosa a volta de José Serra (PSDB) ao Twitter "com regularidade". Antes da quinta-feira (13), a última aparição do tucano foi em 31 de dezembro do ano passado para desejar "Feliz Ano Novo" aos seguidores. Um intervalo de quase três meses sem qualquer movimento, qualquer comentário. Um personagem enigmático, pois. Por exemplo, até agora não se sabe se o político estava magoado com a derrota para Dilma ou simplesmente resolveu reavaliar a vida.
A resposta mais direta é o partido, especificamente o tempo de rádio e televisão do PSD, calculado em cima de bancada de 48 deputados. Dos quase 17 minutos do tempo proporcional que os partidos terão, por programa, na eleição de 2014, Kassab - o chefe da legenda - tem um minuto e 34 segundos. A título de comparação, um comercial de qualquer empresa na TV dura 30 segundos e, a depender do produto, vende. Muito. Assim é Kassab, o homem do baile a andar com um placa luminosa, sempre pronto a levantá-la para políticos em geral, de todas as cores e credos. "Eu tenho 1 minuto e 30 segundos, eu tenho 1 minutos e trinta segundos." Todos querem bailar com ele.
Além de esperto, Kassab é um fenômeno típico da política brasileira. O cacique sem apelo nacional, ancorado na burocracia partidária, pronto a entregar o apoio a quem oferecer mais. Foi assim na criação do PSD, em 2011, quando conseguiu parlamentares do DEM, do PPS e do PSDB e se disse um colaborador da presidente Dilma Rousseff. Naquele momento, com todas as desconfianças, Kassab disse que não queria ficar amarrado ao Palácio do Planalto. O PSD, assim, seria um partido governista - afinal, daria apoio à petista -, mas manteria a independência. Na época, escrevi aqui que a legenda poderia ser oposicionista, com jeito e cara de governo. Ou governista, com cheiro de oposição. Um partido com dois amos, tal qual a comédia de Carlo Goldoni. Um jogo para lá de arriscado.
Coerência
De uma coisa, Kassab não pode ser acusado: falta de coerência. Com a mini-reforma ministerial anunciada ontem, o camarada preferiu ficar de fora da dança das cadeiras. "Nem governo, nem oposição", diria. O problema é que Kassab só anunciou a desistência horas antes de a mexida de Dilma se acertada na Esplanada. Assim, embolou as negociações e ajudou a presidente a fazer uma reforma pífia, inexpressiva, incluindo negociações no Congresso e costura de palanques para 2014. Os três anúncios de ontem apenas serviram para confirmar o óbvio: os ministérios são usados como postos políticos, em vez de servirem de núcleos de gestão de políticas públicas eficientes. Tal coisa não é culpa de Kassab, evidentemente. Ele seria apenas mais um personagem da triste trama ministerial.
Por mais que tenha um argumento razoável para recusar pastas menores - o próprio tamanho delas, evidentemente -, ao não aceitar um cargo, o PSD deixa a porta aberta para seguir fazendo o que mais gosta: barganhar. É diferente de outros partidos da base governista? Não. O problema é que os gestos de Kassab não excluem a oposição. E isso, tentar agradar ou se mostrar "amigo" de dois lados, só faz com que os partidos o vejam com desconfiança. E isso também é coerente na curta história do partido.
Outra coisa
Não deixa de ser curiosa a volta de José Serra (PSDB) ao Twitter "com regularidade". Antes da quinta-feira (13), a última aparição do tucano foi em 31 de dezembro do ano passado para desejar "Feliz Ano Novo" aos seguidores. Um intervalo de quase três meses sem qualquer movimento, qualquer comentário. Um personagem enigmático, pois. Por exemplo, até agora não se sabe se o político estava magoado com a derrota para Dilma ou simplesmente resolveu reavaliar a vida.
A política fiscal e a credibilidade do Banco Central - MÁRIO RAMOS RIBEIRO
FOLHA DE SP - 16/03
Reacendeu-se a faísca da desconfiança dos investidores sobre a independência do Banco Central. A política fiscal vem dominando a instituição, que perde assim a sua principal virtude: a fidúcia. Transforma-se em um leão desdentado.
A perda de confiança na capacidade operacional e técnica do BC é hoje bem medida pelo nervosismo que sacode a Bolsa de Valores e o mercado financeiro. As sucessivas intervenções no mercado cambial e, principalmente, a volatilidade do Produto Interno Bruto (PIB) entre 2008 e 2012 só pioram o cenário.
Nesses cinco anos, as taxas de crescimento do PIB, medidas em termos anuais, foram 5,18% (2008); -0,2% (2009); 7,5% (2010); 2,7% (2011) e 0,9% (2012).
A altíssima volatilidade coloca no paredão a eficiência da política monetária do BC. Em um regime de metas de inflação -do qual já estamos nos afastando-, a diferença entre o produto potencial e o efetivo é uma das duas informações relevantes que fazem com que a taxa de juros nominal de curto prazo seja alterada.
É evidente que a política monetária não conseguiu diminuir os desvios entre o PIB potencial e o efetivo. Com isso, o BC se arrisca a perder a meta da inflação e ameaça punir com a elevação da taxa de juros nominal.
A segunda informação relevante é o risco de se ampliar o hiato entre a meta de inflação e a taxa efetiva de inflação. Aqui a situação também não é confortável. A inflação de fundo -ou inflação núcleo- também oscilou.
O professor Samuel Pessôa mostrou, em sua coluna na Folha, em fevereiro, que, em meados 2004, a inflação de fundo anual era de 7% e, em meados de 2007, ela caiu para 4%. Desde então, a inflação núcleo vem subindo até atingir os 6% no final de 2012.
A sensação é tamanha que o Comitê de Política Monetária (Copom) não consegue mais esconder o receio de que a inflação tenha mudado de patamar. Na ata da sua última reunião, fala em "desconforto" e "resistência" da inflação e sinaliza disposição para elevar as taxas de juros ao informar que irá acompanhar a "evolução do cenário".
As regras de política monetária usadas no regime de metas de inflação explícitas ou implícitas são procedimentos reativos. Elas descrevem como as taxas de juros devem reagir diante de variáveis como o PIB real e a taxa de inflação. Para serem ótimas, devem descrever o comportamento dos "banqueiros centrais" e, assim, imputar-lhes alguma reputação.
Mas esse esforço é inútil em um ambiente sem credibilidade. Variações erráticas do PIB e do hiato de inflação inabilitam a taxa de juros para exercer a função de controlar a inflação. Para retomar a confiança e ser eficiente no combate à inflação, o Tesouro Federal tem de colaborar, deixando de "lutar contra a crise internacional" (sic) e parar de combater moinhos.
É fundamental a criação de uma regra fiscal, a exemplo do que foi feito no Chile no governo de Michelle Bachelet (2006-2010). Na versão brasileira, seria interessante que o que excedesse o superavit primário fosse poupado em uma verdadeira política anticíclica. O superavit aumentaria nos períodos de expansão, formando uma provisão para os tempos de adversidade, e diminuiria em momentos de dificuldade.
O problema com essa regra é que ela exige maturidade política. Há consenso quanto ao que fazer nos tempos de recessão: gastar! Mas, infelizmente, na hora em que tudo está bem -e que o superavit deveria aumentar e a ordem do dia seria aumentar a poupança pública- a razão técnica se choca com a razão política. Por que perder popularidade com medidas austeras na hora da fartura?
Uma regra fiscal assim diminuiria a volatilidade do PIB. No dia em que começarmos a entender que poupar é fundamental, teremos uma regra fiscal. Talvez aí a taxa de juro volte a ser um instrumento de política monetária.
Reacendeu-se a faísca da desconfiança dos investidores sobre a independência do Banco Central. A política fiscal vem dominando a instituição, que perde assim a sua principal virtude: a fidúcia. Transforma-se em um leão desdentado.
A perda de confiança na capacidade operacional e técnica do BC é hoje bem medida pelo nervosismo que sacode a Bolsa de Valores e o mercado financeiro. As sucessivas intervenções no mercado cambial e, principalmente, a volatilidade do Produto Interno Bruto (PIB) entre 2008 e 2012 só pioram o cenário.
Nesses cinco anos, as taxas de crescimento do PIB, medidas em termos anuais, foram 5,18% (2008); -0,2% (2009); 7,5% (2010); 2,7% (2011) e 0,9% (2012).
A altíssima volatilidade coloca no paredão a eficiência da política monetária do BC. Em um regime de metas de inflação -do qual já estamos nos afastando-, a diferença entre o produto potencial e o efetivo é uma das duas informações relevantes que fazem com que a taxa de juros nominal de curto prazo seja alterada.
É evidente que a política monetária não conseguiu diminuir os desvios entre o PIB potencial e o efetivo. Com isso, o BC se arrisca a perder a meta da inflação e ameaça punir com a elevação da taxa de juros nominal.
A segunda informação relevante é o risco de se ampliar o hiato entre a meta de inflação e a taxa efetiva de inflação. Aqui a situação também não é confortável. A inflação de fundo -ou inflação núcleo- também oscilou.
O professor Samuel Pessôa mostrou, em sua coluna na Folha, em fevereiro, que, em meados 2004, a inflação de fundo anual era de 7% e, em meados de 2007, ela caiu para 4%. Desde então, a inflação núcleo vem subindo até atingir os 6% no final de 2012.
A sensação é tamanha que o Comitê de Política Monetária (Copom) não consegue mais esconder o receio de que a inflação tenha mudado de patamar. Na ata da sua última reunião, fala em "desconforto" e "resistência" da inflação e sinaliza disposição para elevar as taxas de juros ao informar que irá acompanhar a "evolução do cenário".
As regras de política monetária usadas no regime de metas de inflação explícitas ou implícitas são procedimentos reativos. Elas descrevem como as taxas de juros devem reagir diante de variáveis como o PIB real e a taxa de inflação. Para serem ótimas, devem descrever o comportamento dos "banqueiros centrais" e, assim, imputar-lhes alguma reputação.
Mas esse esforço é inútil em um ambiente sem credibilidade. Variações erráticas do PIB e do hiato de inflação inabilitam a taxa de juros para exercer a função de controlar a inflação. Para retomar a confiança e ser eficiente no combate à inflação, o Tesouro Federal tem de colaborar, deixando de "lutar contra a crise internacional" (sic) e parar de combater moinhos.
É fundamental a criação de uma regra fiscal, a exemplo do que foi feito no Chile no governo de Michelle Bachelet (2006-2010). Na versão brasileira, seria interessante que o que excedesse o superavit primário fosse poupado em uma verdadeira política anticíclica. O superavit aumentaria nos períodos de expansão, formando uma provisão para os tempos de adversidade, e diminuiria em momentos de dificuldade.
O problema com essa regra é que ela exige maturidade política. Há consenso quanto ao que fazer nos tempos de recessão: gastar! Mas, infelizmente, na hora em que tudo está bem -e que o superavit deveria aumentar e a ordem do dia seria aumentar a poupança pública- a razão técnica se choca com a razão política. Por que perder popularidade com medidas austeras na hora da fartura?
Uma regra fiscal assim diminuiria a volatilidade do PIB. No dia em que começarmos a entender que poupar é fundamental, teremos uma regra fiscal. Talvez aí a taxa de juro volte a ser um instrumento de política monetária.
Cerco aos maus motoristas ILIMAR FRANCO
O GLOBO - 16/03
O governo quer aprovar projeto em tramitação na Câmara que mede a velocidade média dos veículos nas estradas durante todo o percurso. Quem ultrapassar a velocidade máxima da pista, será multado. O sistema existe em alguns países da Europa. A presidente Dilma tratou do assunto em reunião com a Casa Civil, Ministério da Justiça e líderes na Câmara esta semana.
Ações no STF e negociação política
Juristas debruçados sobre a nova Lei dos Royalties dizem que a regra é clara: "Proposta uma ação direta de inconstitucionalidade, não se admitirá desistência." Além disso, a jurisprudência do STF segue rigorosamente a mesma linha. Há decisões assinadas pelos ministros Celso de Mello e Cármen Lúcia. Portanto, com as Adins dos governos do Rio e do Espírito Santo levadas ontem ao Supremo contra a Lei dos Royalties, qualquer tentativa de acordo entre os estados será provisória. Eventual entendimento político só poderá ter consequência prática depois que a Corte julgar o mérito da nova distribuição, seja ela contra ou a favor dos produtores.
Que coisa!!
A ministra Marta Suplicy (Cultura) deu um piti ontem, em Washington, no News Museum, sobre a imprensa americana. Ao passar pelo mapa da liberdade de imprensa, o Brasil está em amarelo, cor dos que têm "imprensa parcialmente livre".
Impressões
A eleição do pastor Marco Feliciano (PSC-SP) a presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara não para de gerar reações país afora contra sua escolha. A cantora Rita Lee se saiu com esta: "Impressão minha ou o tal do Feliciano racista e homofóbico é mulato, faz chapinha e tira a sobrancelha? Tá boa santa?"
Fidelidade
Nos dias que antecederam sua demissão do Ministério do Trabalho, Brizola Neto disse a aliados que estava tranquilo: "Aconteça o que acontecer, estou comprometido com este projeto. Dentro ou fora, estou com a presidente Dilma".
Dança das cadeiras
Nelson Hubner, que deixou a direção geral da Anatel, aguarda decisão da presidente Dilma para saber se irá para a secretaria executiva da Casa Civil ou da Previdência. Dilma pretendia remanejá-lo para o lugar de Beto Vasconcelos, que está deixando a Casa Civil. Mas a ministra Gleisi Hoffmann prefere Carlos Gabbas, secretário-executivo da Previdência, no cargo.
Não decolou
Na pesquisa encomendada pelo PT ao Instituto Vox Populi, realizada na semana passada, o economista Sérgio Besserman, um dos nomes cotados para ser candidato do PSDB ao governo do Rio, aparece num dos cenários com 1%.
Intervenção preventiva
O presidente do PSDB de Brasília, Mário Machado, recebeu um puxão de orelha da direção nacional. É que estava na turma do "Volta Arruda". O ex-governador José Roberto Arruda está articulando candidatura ao cargo em 2014.
A Frente Nacional de Prefeitos, que reúne as maiores cidades do país, passará a ser presidida pelo prefeito de Porto Alegre, José Fortunati (PDT).
Quero ser grande - VERA MAGALHÃES - PAINEL
FOLHA DE SP - 16/03
Técnicos do governo traçam plano para vitaminar a Secretaria de Assuntos Estratégicos. A ideia em gestação é que a pasta assuma a interlocução entre "o público e privado", um dos gargalos da gestão de Dilma Rousseff. Num dos desenhos debatidos no Planalto, o ministério teria sob seu guarda-chuva as agências reguladoras. Com a vaga aberta após a ida de Moreira Franco para a Aviação Civil, a presidente deve instalar técnico ou político de sua cota pessoal no cargo.
Xodó
Dilma vai deixar Marcelo Neri como interino na SAE. O economista deve acumular a pasta com o Ipea.
Primeira classe
Entre as condições para a troca na Aviação Civil está a permanência do presidente da Infraero, Gustavo do Vale.
Econômica
Wagner Bittencourt aguardava para falar com Dilma quando uma servidora do Planalto brincou, pedindo a ele "carona" em voo oficial. "Hoje estou em avião de carreira", respondeu o futuro ex-ministro.
Despedida
Ao conversar com Mendes Ribeiro (PMDB) e agradecer pelo seu trabalho na Agricultura, Dilma se emocionou. Segundo relatos, ambos chegaram a chorar.
Então tá
Em 15 de fevereiro, o Planalto informou à imprensa que Dilma "não estava preparando reforma ministerial". O texto ainda consta no blog oficial. Na quarta, a presidente repetiu: "Não é meu tema essa semana".
IDH...
O governo orientou ministros e assessores a questionarem em bloco os dados do Pnud, que colocam o Brasil em 85º lugar no ranking de desenvolvimento humano que abrange 187 países.
... genérico
A ordem no Planalto é usar como referência estudo do Planejamento, lançado em fevereiro, em cujo prefácio representante da ONU reconhece "progressos significativos" na última década quanto ao indicador.
Prévia
O antropólogo e publicitário Renato Pereira, que fez as campanhas de Sérgio Cabral e Eduardo Paes, no Rio, e de Henrique Capriles, na Venezuela, assinará os programas e comerciais de TV do PSDB neste ano. O primeiro vai ao ar em maio. O martelo foi batido ontem em conversa com Aécio Neves.
Replay
O acordo não prevê, por ora, a eventual campanha de Aécio à Presidência. Mas, se a parceria se estender, Pereira repetirá "duelo" com João Santana, que trabalhou para Hugo Chávez em 2012 e pilotará o projeto reeleitoral de Dilma Rousseff.
Bússola
Em flerte com Marina Silva, Eduardo Campos e José Serra, o PPS convocou sua direção executiva nacional para discutir na próxima terça-feira a "conjuntura política e o posicionamento do partido para 2014".
De leve
Sérgio Cabral (RJ) e Renato Casagrande (ES) mudaram de tática e enviaram por meio eletrônico as ações de inconstitucionalidade contra a redistribuição dos royalties. Os governadores quiseram evitar a impressão de que estariam pressionando os ministros do STF.
SOS...
Em reunião da qual participaram Fernando Haddad (São Paulo) e José Fortunati (Porto Alegre), prefeitos das capitais fecharam ontem pauta comum a ser apresentada ao Congresso Nacional. Os principais itens são as dívidas com a União e a desoneração de tarifas de transporte.
... prefeituras
O documento será entregue pelo presidente da Frente Nacional de Prefeitos, João Coser (Vitória), aos presidentes da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), e do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL) na próxima quarta-feira.
com FÁBIO ZAMBELI e ANDRÉIA SADI
tiroteio
"Se a notícia é ruim, o PT prefere descredenciar a fonte. Na surra que o IDH da Líbia deu no do Brasil, a culpa sobrou até para a ONU."
DO PRESIDENTE DO DEM, JOSÉ AGRIPINO (RN), sobre o governo ver "distorções" nos dados das Nações Unidas que colocam o Brasil em 85º entre 187 países.
Contraponto
Fumaça
Na sessão em que deputados paulistas elegeram a nova Mesa Diretora da Assembleia Legislativa, ontem, o ex-presidente Barros Munhoz (PSDB) se incomodou com o rito da votação, imposto pelo regimento interno.
-A burocracia é tão grande que, mesmo havendo um candidato apenas, é preciso que haja votação nominal. É mais complicado que conclave...
Um parlamentar completou, lembrando do acordo PT-PSDB para instalar Samuel Moreira na presidência:
-Só mesmo com intercessão do Espírito Santo para petista votar em tucano, como estamos vendo aqui.
A visão de Campos - MERVAL PEREIRA
O GLOBO - 16/03
Aquela que um dia pareceu ser chapa possível para a disputa da Presidência da República - Aécio Neves na cabeça e Eduardo Campos de vice - tornou-se combinação improvável para 2014, mais pelo crescimento do governador de Pernambuco, que hoje é alternativa real de contraponto à reeleição de Dilma Rousseff e não aceita ser vice nem mesmo na chapa oficial. Falta, porém, definir em que campo ele exercerá o papel de oposição.
Se não tem dificuldades em criticar o PT, Campos não se sente bem no papel de opositor de Dilma, e muito menos de Lula. Não será fácil, portanto, desenhar uma candidatura que não seja de oposição "a tudo isso que está aíl mas a pontos específicos. O governador de Pernambuco corre o risco de fazer uma campanha como a da ex-senadora Marina Silva em 2010, que em nenhum momento criticou a candidata do PT diretamente, embora tivesse divergências tão graves com ela que acabaram levando-a a deixar o governo.
Marina tinha a vantagem de ter uma bandeira clara, a da defesa do meio ambiente, que bastou para que tivesse cerca de 20% dos votos. Mas faltou-lhe "gosto de sangue na boca" para se opor ao PT Campos tem a vantagem de não ser petista, como Marina sempre foi durante toda a sua vida política. Ao contrário, o neto de Arraes tem consigo lembranças de tentativas de golpe contra seu avô arquitetadas por José Dirceu, que queria tirar o PSB do grupo de Arraes com a ajuda de Garotinho, que chegou a disputar a Presidência da República pelo partido em 2002.
As divergências continuaram até hoje, quando o seu PSB disputou e derrotou candidatos petistas em vários estados, inclusive em Recife, mas eleições municipais. Realista, Eduardo Campos sabe que tem fragilidades partidárias diante dos principais adversários, Dilma e Aécio, e testa as chances de fazer alianças "que não precisem ser explicadas" mas que rendam tempo de TV, essa medida que se tornou fundamental para viabilizar qualquer candidatura. Nesse campo estão o PPS e o PDT Até mesmo uma eventual aliança com o DEM, que estaria se sentindo desprestigiado pelo PSDB, é possível. Além da relação que tem com o PSD de Kassab, que na undécima hora ficou em cima do muro em relação ao governo Dilma, rejeitando uma vaga no Ministério atual. "Mas eu não quero todos os pês, não" diz Campos referindo-se a diversas siglas que estão se oferecendo para apoiá-lo.
Muitas, ele sabe, buscam se valorizar dentro da aliança governista, e por isso a cautela é redobrada nas primeiras aproximações. Não foi por acaso que a presidente Dilma voltou a pensar em dar o Ministério do Trabalho para o PDT de Carlos Lupi, que estava em campo conversando não apenas com Eduardo Campos, mas também com o senador Aécio Neves.
A falta de estrutura de apoio nos principais colégios eleitorais - Rio, São Paulo e Minas -, ele acredita que poderá ser resolvida pelos embates dentro do PSDB e também com a disputa entre PT e PMDB no Rio. Partindo do princípio de que a ala paulista dos tucanos, especialmente a que segue o ex-governador José Serra, jamais se conformará com a escolha de um mineiro como candidato a presidente, Campos acha que, qualquer que seja o resultado dessa disputa, um dos dois estados se abrirá para ele.
Mantido Aécio Neves como candidato, ele acredita que a dissidência tucana pode lhe render bons votos em São Paulo. Caso o senador Aécio Neves tenha que desistir da candidatura por divergências insanáveis, Campos acredita que poderá receber seu apoio em Minas. No Rio de Janeiro, o PSB tem boa relação com o senador Lindbergh Farias - que acompanhou a apuração da eleição municipal na casa de Alexandre Cardoso, eleito prefeito de Caxias pelo PSB - e deve tê-lo como candidato, caso o PT seja obrigado a aceitar a candidatura do vice-governador Pezão (PMDB), como quer o governador Sérgio Cabral.
Caso os dois partidos tenham candidatos próprios, Campos considera que é possível aproveitar essa situação desconfortável para receber o apoio do grupo do PMDB do Rio. E é aí que entra a proposta de acordo sobre os royalties do petróleo. O problema para Campos é que o senador Aécio Neves tem os mesmos alvos e uma estrutura partidária mais forte. (Amanhã, "Os trunfos do PSDB")
Se não tem dificuldades em criticar o PT, Campos não se sente bem no papel de opositor de Dilma, e muito menos de Lula. Não será fácil, portanto, desenhar uma candidatura que não seja de oposição "a tudo isso que está aíl mas a pontos específicos. O governador de Pernambuco corre o risco de fazer uma campanha como a da ex-senadora Marina Silva em 2010, que em nenhum momento criticou a candidata do PT diretamente, embora tivesse divergências tão graves com ela que acabaram levando-a a deixar o governo.
Marina tinha a vantagem de ter uma bandeira clara, a da defesa do meio ambiente, que bastou para que tivesse cerca de 20% dos votos. Mas faltou-lhe "gosto de sangue na boca" para se opor ao PT Campos tem a vantagem de não ser petista, como Marina sempre foi durante toda a sua vida política. Ao contrário, o neto de Arraes tem consigo lembranças de tentativas de golpe contra seu avô arquitetadas por José Dirceu, que queria tirar o PSB do grupo de Arraes com a ajuda de Garotinho, que chegou a disputar a Presidência da República pelo partido em 2002.
As divergências continuaram até hoje, quando o seu PSB disputou e derrotou candidatos petistas em vários estados, inclusive em Recife, mas eleições municipais. Realista, Eduardo Campos sabe que tem fragilidades partidárias diante dos principais adversários, Dilma e Aécio, e testa as chances de fazer alianças "que não precisem ser explicadas" mas que rendam tempo de TV, essa medida que se tornou fundamental para viabilizar qualquer candidatura. Nesse campo estão o PPS e o PDT Até mesmo uma eventual aliança com o DEM, que estaria se sentindo desprestigiado pelo PSDB, é possível. Além da relação que tem com o PSD de Kassab, que na undécima hora ficou em cima do muro em relação ao governo Dilma, rejeitando uma vaga no Ministério atual. "Mas eu não quero todos os pês, não" diz Campos referindo-se a diversas siglas que estão se oferecendo para apoiá-lo.
Muitas, ele sabe, buscam se valorizar dentro da aliança governista, e por isso a cautela é redobrada nas primeiras aproximações. Não foi por acaso que a presidente Dilma voltou a pensar em dar o Ministério do Trabalho para o PDT de Carlos Lupi, que estava em campo conversando não apenas com Eduardo Campos, mas também com o senador Aécio Neves.
A falta de estrutura de apoio nos principais colégios eleitorais - Rio, São Paulo e Minas -, ele acredita que poderá ser resolvida pelos embates dentro do PSDB e também com a disputa entre PT e PMDB no Rio. Partindo do princípio de que a ala paulista dos tucanos, especialmente a que segue o ex-governador José Serra, jamais se conformará com a escolha de um mineiro como candidato a presidente, Campos acha que, qualquer que seja o resultado dessa disputa, um dos dois estados se abrirá para ele.
Mantido Aécio Neves como candidato, ele acredita que a dissidência tucana pode lhe render bons votos em São Paulo. Caso o senador Aécio Neves tenha que desistir da candidatura por divergências insanáveis, Campos acredita que poderá receber seu apoio em Minas. No Rio de Janeiro, o PSB tem boa relação com o senador Lindbergh Farias - que acompanhou a apuração da eleição municipal na casa de Alexandre Cardoso, eleito prefeito de Caxias pelo PSB - e deve tê-lo como candidato, caso o PT seja obrigado a aceitar a candidatura do vice-governador Pezão (PMDB), como quer o governador Sérgio Cabral.
Caso os dois partidos tenham candidatos próprios, Campos considera que é possível aproveitar essa situação desconfortável para receber o apoio do grupo do PMDB do Rio. E é aí que entra a proposta de acordo sobre os royalties do petróleo. O problema para Campos é que o senador Aécio Neves tem os mesmos alvos e uma estrutura partidária mais forte. (Amanhã, "Os trunfos do PSDB")
IDH: por que parou, parou por quê? - FLAVIO COMIM
ZERO HORA - 16/03
Apesar da notícia do "crescimento zero" do Brasil no ranking do Índice de Desenvolvimento Humano, IDH, em 2012 não ser uma surpresa, pois reflete uma desaceleração de longo prazo do IDH brasileiro, fica a pergunta sobre por que o país não consegue avançar nesse indicador. O Brasil agora se encontra na 85ª posição do IDH, muito atrás de países como Chile (40ª), Argentina (45ª), Uruguai (51ª), Cuba e Panamá (59ª) e México (61ª).
Uma olhada rápida nos três principais grupos de indicadores do IDH mostra que pouco mudou de 2011 para 2012. Com base nos dados oficiais atualizados pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, temos que na saúde a expectativa de vida ao nascer no país cresceu apenas 0,4% em 2012 passando a 73,8 anos (a mais baixa entre os maiores países da América Latina).
Similarmente, na educação, as duas variáveis que medem o progresso do país permaneceram inalteradas, ou seja, a variável "anos médios de estudo" continuou em 7,2 anos (também a mais baixa entre esses países latino-americanos) e a variável "anos esperados de estudo" seguiu em 14,2 anos em 2012. Já em relação à renda nacional bruta, a situação não foi muito melhor, pois ela cresceu apenas 0,65%, passando a US$ 10.152 per capita em 2012.
No entanto, se pararmos para pensar, como poderia ser o contrário? Temos a maior taxa de abandono da escola primária entre grandes países da América Latina (24,3%), uma das maiores taxas de homicídios (21 por 100 mil habitantes), o pior índice de satisfação com a saúde (somente 44% de pessoas satisfeitas), uma das mais altas taxas de mortalidade infantil (17 por 1 mil nascidos vivos) e de maior fertilidade na adolescência (76 por 1 mil mulheres entre 15-19 anos).
O foco estreito da política social brasileira em programas de transferência de renda ignora que o desenvolvimento é um fenômeno multidimensional e que para produzir justiça social precisa focar no que é básico na sociedade. O IDH parou porque a cidadania brasileira ainda não tem claro o suficiente que é preciso exigir de seus governantes um compromisso com padrões mínimos e básicos de saúde e educação para uma vida mais digna.
Apesar da notícia do "crescimento zero" do Brasil no ranking do Índice de Desenvolvimento Humano, IDH, em 2012 não ser uma surpresa, pois reflete uma desaceleração de longo prazo do IDH brasileiro, fica a pergunta sobre por que o país não consegue avançar nesse indicador. O Brasil agora se encontra na 85ª posição do IDH, muito atrás de países como Chile (40ª), Argentina (45ª), Uruguai (51ª), Cuba e Panamá (59ª) e México (61ª).
Uma olhada rápida nos três principais grupos de indicadores do IDH mostra que pouco mudou de 2011 para 2012. Com base nos dados oficiais atualizados pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, temos que na saúde a expectativa de vida ao nascer no país cresceu apenas 0,4% em 2012 passando a 73,8 anos (a mais baixa entre os maiores países da América Latina).
Similarmente, na educação, as duas variáveis que medem o progresso do país permaneceram inalteradas, ou seja, a variável "anos médios de estudo" continuou em 7,2 anos (também a mais baixa entre esses países latino-americanos) e a variável "anos esperados de estudo" seguiu em 14,2 anos em 2012. Já em relação à renda nacional bruta, a situação não foi muito melhor, pois ela cresceu apenas 0,65%, passando a US$ 10.152 per capita em 2012.
No entanto, se pararmos para pensar, como poderia ser o contrário? Temos a maior taxa de abandono da escola primária entre grandes países da América Latina (24,3%), uma das maiores taxas de homicídios (21 por 100 mil habitantes), o pior índice de satisfação com a saúde (somente 44% de pessoas satisfeitas), uma das mais altas taxas de mortalidade infantil (17 por 1 mil nascidos vivos) e de maior fertilidade na adolescência (76 por 1 mil mulheres entre 15-19 anos).
O foco estreito da política social brasileira em programas de transferência de renda ignora que o desenvolvimento é um fenômeno multidimensional e que para produzir justiça social precisa focar no que é básico na sociedade. O IDH parou porque a cidadania brasileira ainda não tem claro o suficiente que é preciso exigir de seus governantes um compromisso com padrões mínimos e básicos de saúde e educação para uma vida mais digna.
Uma política equivocada - LUIZ FERNANDO JANOT
O GLOBO - 16/03
Não há razão para expandir a estrutura urbana do Rio enquanto bairros tradicionais da Zona Norte sobrevivem à míngua pela falta de investimentos públicos e privados
Desde os tempos mais remotos se observa a preocupação em tornar as sociedades mais justas e mais humanas. Alguns modelos de cidade foram idealizados com esses objetivos. O conceito de “Cidade Jardim” proposto em 1902 por Ebenezer Howard, as teorias modernistas de Le Corbusier reunidas no livro “Urbanismo” em 1925 e a “Broadacre City” apresentada por Frank Lloyd Wright em 1932, são alguns exemplos paradigmáticos.
No Brasil, foram poucas as cidades planejadas sob a influência desses princípios. Brasília foi, sem dúvida, a que mais se destacou como representação do modelo de urbanismo modernista do século XX. Concebida inicialmente para ser uma cidade igualitária viu esse ideal sucumbir diante da proliferação, em seu entorno, de cidades satélites constituídas pela população excluída do seu núcleo central. O fracasso dos objetivos desse e de outros projetos modernistas revelou aos arquitetos e à sociedade o fim da cidade ideal e a valorização da cidade possível, isto é, aquela com a qual estamos habituados a conviver.
A história nos mostra que as cidades não são como maquetes feitas para serem vistas de cima e na sua totalidade. Para se conhecer uma cidade é necessário andar por suas ruas, apreciar as suas particularidades, conviver com as suas gentes e admitir os seus contrastes e as diferenças. Afinal, como afirma Italo Calvino em seu livro “Cidades Invisíveis”, “de uma cidade não aproveitamos as suas sete ou setenta e sete maravilhas, mas a resposta que dá às nossas perguntas”. Quanto mais circulamos pelos seus espaços diferenciados maiores serão as probabilidades para refletir e entender os seus verdadeiros significados. Pessoas que vivem exclusivamente em ambientes socialmente restritos dificilmente poderão compreender a verdadeira dinâmica urbana de uma cidade.
Além das questões das desigualdades sociais, dos problemas de mobilidade urbana e de preservação do meio ambiente, as cidades contemporâneas enfrentam, nos dias de hoje, muitas outras dificuldades. Nas cidades europeias sobressai a problemática dos imigrantes que vivem em condições precárias em redutos pobres localizados nas suas periferias. No Oriente Médio, os espaços públicos costumam ser ocupados por populações marginalizadas que nascem, vivem e morrem nas ruas, como se observa na Índia. Na China, proliferam, em velocidade espantosa, cidades com cerca de 30 milhões de habitantes, ou seja, mais do que o dobro da população da cidade de São Paulo.
O Rio, apesar de todos os malfeitos praticados contra a cidade ao longo do tempo, sobrevive estoicamente graças à sua fantástica beleza natural e ao espírito fraternal do carioca. Se os programas de pacificação e urbanização de favelas se consolidarem como política de Estado não há dúvida de que a desejada integração social no espaço urbano será alcançada definitivamente. Lamenta-se, no entanto, o isolamento de alguns que preferem restringir o convívio, exclusivamente, aos espaços fechados dos condomínios residenciais e dos shoppings centers.
É fundamental que esse processo de integração social e espacial alcance toda a cidade. Nesse sentido, não há razão para expandir desnecessariamente a sua estrutura urbana enquanto bairros tradicionais da Zona Norte sobrevivem à míngua pela falta de investimentos públicos e privados. Como a população do Rio praticamente não cresce, verifica-se que a extraordinária oferta de imóveis na região da Barra e do Recreio se deve, em parte, à demanda dos moradores dos subúrbios que para lá se mudam deixando para trás inúmeros imóveis desocupados e espaços urbanos degradados. Basta percorrer o curto trajeto entre o Maracanã e o Engenhão para constatar essa triste realidade. Se os órgãos responsáveis pelo planejamento da cidade não reverterem essa tendência expansionista, em curto prazo, dificilmente haverá projeto futuro que dará jeito nas consequências desastrosas dessa política urbana equivocada.
Em tempo, pergunto até quando o IPHAN irá tolerar aquela profusão de coberturas em plástico transparente formando os indefectíveis “puxadinhos” que degradam o conjunto arquitetônico do Museu de Arte Moderna?
Não há razão para expandir a estrutura urbana do Rio enquanto bairros tradicionais da Zona Norte sobrevivem à míngua pela falta de investimentos públicos e privados
Desde os tempos mais remotos se observa a preocupação em tornar as sociedades mais justas e mais humanas. Alguns modelos de cidade foram idealizados com esses objetivos. O conceito de “Cidade Jardim” proposto em 1902 por Ebenezer Howard, as teorias modernistas de Le Corbusier reunidas no livro “Urbanismo” em 1925 e a “Broadacre City” apresentada por Frank Lloyd Wright em 1932, são alguns exemplos paradigmáticos.
No Brasil, foram poucas as cidades planejadas sob a influência desses princípios. Brasília foi, sem dúvida, a que mais se destacou como representação do modelo de urbanismo modernista do século XX. Concebida inicialmente para ser uma cidade igualitária viu esse ideal sucumbir diante da proliferação, em seu entorno, de cidades satélites constituídas pela população excluída do seu núcleo central. O fracasso dos objetivos desse e de outros projetos modernistas revelou aos arquitetos e à sociedade o fim da cidade ideal e a valorização da cidade possível, isto é, aquela com a qual estamos habituados a conviver.
A história nos mostra que as cidades não são como maquetes feitas para serem vistas de cima e na sua totalidade. Para se conhecer uma cidade é necessário andar por suas ruas, apreciar as suas particularidades, conviver com as suas gentes e admitir os seus contrastes e as diferenças. Afinal, como afirma Italo Calvino em seu livro “Cidades Invisíveis”, “de uma cidade não aproveitamos as suas sete ou setenta e sete maravilhas, mas a resposta que dá às nossas perguntas”. Quanto mais circulamos pelos seus espaços diferenciados maiores serão as probabilidades para refletir e entender os seus verdadeiros significados. Pessoas que vivem exclusivamente em ambientes socialmente restritos dificilmente poderão compreender a verdadeira dinâmica urbana de uma cidade.
Além das questões das desigualdades sociais, dos problemas de mobilidade urbana e de preservação do meio ambiente, as cidades contemporâneas enfrentam, nos dias de hoje, muitas outras dificuldades. Nas cidades europeias sobressai a problemática dos imigrantes que vivem em condições precárias em redutos pobres localizados nas suas periferias. No Oriente Médio, os espaços públicos costumam ser ocupados por populações marginalizadas que nascem, vivem e morrem nas ruas, como se observa na Índia. Na China, proliferam, em velocidade espantosa, cidades com cerca de 30 milhões de habitantes, ou seja, mais do que o dobro da população da cidade de São Paulo.
O Rio, apesar de todos os malfeitos praticados contra a cidade ao longo do tempo, sobrevive estoicamente graças à sua fantástica beleza natural e ao espírito fraternal do carioca. Se os programas de pacificação e urbanização de favelas se consolidarem como política de Estado não há dúvida de que a desejada integração social no espaço urbano será alcançada definitivamente. Lamenta-se, no entanto, o isolamento de alguns que preferem restringir o convívio, exclusivamente, aos espaços fechados dos condomínios residenciais e dos shoppings centers.
É fundamental que esse processo de integração social e espacial alcance toda a cidade. Nesse sentido, não há razão para expandir desnecessariamente a sua estrutura urbana enquanto bairros tradicionais da Zona Norte sobrevivem à míngua pela falta de investimentos públicos e privados. Como a população do Rio praticamente não cresce, verifica-se que a extraordinária oferta de imóveis na região da Barra e do Recreio se deve, em parte, à demanda dos moradores dos subúrbios que para lá se mudam deixando para trás inúmeros imóveis desocupados e espaços urbanos degradados. Basta percorrer o curto trajeto entre o Maracanã e o Engenhão para constatar essa triste realidade. Se os órgãos responsáveis pelo planejamento da cidade não reverterem essa tendência expansionista, em curto prazo, dificilmente haverá projeto futuro que dará jeito nas consequências desastrosas dessa política urbana equivocada.
Em tempo, pergunto até quando o IPHAN irá tolerar aquela profusão de coberturas em plástico transparente formando os indefectíveis “puxadinhos” que degradam o conjunto arquitetônico do Museu de Arte Moderna?
Gestão, política e eleição - FERNANDO RODRIGUES
FOLHA DE SP - 16/03
BRASÍLIA - O Brasil está desde janeiro de 1995 com um sistema de governo e político mais ou menos estável. Houve eleições diretas para presidente. FHC e Lula ficaram oito anos cada um. Agora, Dilma Rousseff comanda.
Para o Brasil é uma eternidade, mas, em termos históricos, 18 anos é um período curto quando se trata de construir uma nação. Por essa razão, é compreensível que em um setor tenha havido pouca evolução até agora: a gestão política dos governos.
Ao assumir em 1995, FHC abraçou com paixão o modelo fisiológico franciscano do "é dando que se recebe". O país estava saindo da hiperinflação. O Estado estava em frangalhos. Ou o tucano aceitava compor com o centro conservador ou sairia pelo ralo como outros tantos.
Oito anos depois veio Lula, em 2003. Agentes financeiros espalharam pânico pelo mercado. A expectativa de inflação disparou. O filme se repetiu: ou Lula colocava no colo parte da "vanguarda do atraso" usada por FHC ou também poderia fracassar. Era a velha lógica leninista de tentar dar um passo atrás e depois dois à frente.
Em 2011, outro percalço. Chegou ao poder Dilma Rousseff. Ela nunca tinha disputado uma eleição. Muito menos era graduada nas negociações políticas federais para tocar uma administração com mais de meio milhão de servidores.
Depois de um início sinalizando faxina e austeridade, Dilma sucumbiu aos de sempre. Aumentou o número de ministérios. Agora são 39, e ainda não comportam o apetite de todos os partidos governistas.
Jorge Gerdau, empresário de sucesso e colaborador voluntário do governo, disse que a "burrice" de aumentar o número de ministros está perto do limite. Pode ser mais desejo do que realidade.
A lógica eleitoral por trás da reforma ministerial em curso indica que ainda vai demorar para o Brasil sofisticar a sua gestão política.
BRASÍLIA - O Brasil está desde janeiro de 1995 com um sistema de governo e político mais ou menos estável. Houve eleições diretas para presidente. FHC e Lula ficaram oito anos cada um. Agora, Dilma Rousseff comanda.
Para o Brasil é uma eternidade, mas, em termos históricos, 18 anos é um período curto quando se trata de construir uma nação. Por essa razão, é compreensível que em um setor tenha havido pouca evolução até agora: a gestão política dos governos.
Ao assumir em 1995, FHC abraçou com paixão o modelo fisiológico franciscano do "é dando que se recebe". O país estava saindo da hiperinflação. O Estado estava em frangalhos. Ou o tucano aceitava compor com o centro conservador ou sairia pelo ralo como outros tantos.
Oito anos depois veio Lula, em 2003. Agentes financeiros espalharam pânico pelo mercado. A expectativa de inflação disparou. O filme se repetiu: ou Lula colocava no colo parte da "vanguarda do atraso" usada por FHC ou também poderia fracassar. Era a velha lógica leninista de tentar dar um passo atrás e depois dois à frente.
Em 2011, outro percalço. Chegou ao poder Dilma Rousseff. Ela nunca tinha disputado uma eleição. Muito menos era graduada nas negociações políticas federais para tocar uma administração com mais de meio milhão de servidores.
Depois de um início sinalizando faxina e austeridade, Dilma sucumbiu aos de sempre. Aumentou o número de ministérios. Agora são 39, e ainda não comportam o apetite de todos os partidos governistas.
Jorge Gerdau, empresário de sucesso e colaborador voluntário do governo, disse que a "burrice" de aumentar o número de ministros está perto do limite. Pode ser mais desejo do que realidade.
A lógica eleitoral por trás da reforma ministerial em curso indica que ainda vai demorar para o Brasil sofisticar a sua gestão política.
É o fim da picada - A. P. QUARTIM DE MORAES
O ESTADO DE S. PAULO - 16/03
Que tal uma Comissão de Direitos Humanos e Minorias presidida por um líder religioso indisfarçavelmente racista e homofóbico que,como se isso não bastasse, responde a processo por estelionato? Que tal uma Comissão de Constituição e Justiça que acolhe dois parlamentares condenados pela Suprema Corte por crimes de corrupção e formação de quadrilha? Que tal uma Comissão de Ética povoada por parlamentares com o rabo preso na Justiça? (Bem,com essa coisa de ter o rabo preso na Justiça é preciso ir com calma, se não as duas casas do Congresso Nacional talvez fiquem sem quórum para sessões plenárias.) À mulher de Cesar, diziam os romanos, não basta ser honesta, precisa parecer. Hoje ninguém alimenta ilusões sobre o Congresso Nacional ser uma instituição honesta, no sentido literal do termo. Mas podia pelo menos fazer um esforço para parecer.
Há uma expressão popular que cai como uma luva para definir não apenas as mais recentes peripécias dos nobres parlamentares brasileiros, mas o conjunto de sua obra: é o fim da picada. Todos esses atentados ao senso comum e aos bons costumes, perpetrados com olímpica indiferença por aquilo que a cidadania possa estar pensando, foram praticados em obediência restrita às norma se aos ritos estabelecidos pelo ordenamento jurídico do País, pelo regimento interno da Câmara dos Deputados e pelo acordo de vontades das lideranças partidárias. Quer dizer, tudo rigorosamente legal. Mas essa condição de incontestável legalidade, ao invés de minimizar a afronta, apenas a agrava. Tinge- a com as cores da hipocrisia.
A insistência com que os nossos parlamentares insistem em privatizar, pôr a serviço dos seus próprios interesses a função pública para a qual foram eleitos só faz confirmar a constatação de que a política brasileira - que tem no Congresso Nacional, como em qualquer regime democrático, seu principal teatro permanente de operações - está podre, falida. Fazer política tornou-se, entre nós, quase sinônimo de negligenciar a representação dos interesses da população para se dedicar prioritariamente aos conchavos do poder e do dinheiro, que se confundem em repulsiva promiscuidade.
O arcabouço legal que possibilita a legalização das piores ignomínias não está aí por acaso. É um fenômeno que tem raízes históricas na mentalidade paternalista e patrimonialista da política brasileira. Basta um olhar de relance para identificar os traços marcantes do coronelismo e da obsessão dinheirista no perfil dos nossos mais destacados líderes partidários. E a eles se aliaram, nos últimos tempos, os oportunistas "ideológicos" para quem os fins justificam os meios e o respeito à lei e à ética no trato da coisa pública não passa de desprezível preconceito pequeno-burguês. Aliada a fome à vontade de comer, a esbórnia sentou praça na política, como nunca antes na História deste país.
É óbvio, e até os mais cínicos beneficiários do status quo o admitem, que o País precisa urgentemente de uma ampla reforma política que aprimore, para começar, o sistema de representação, de modo a minimizar a influência do coronelismo rural e urbano na eleição de parlamentares, nos três níveis do nosso regime federativo. É indispensável repensar esse sistema partidário que permite a proliferação de legendas cujos verdadeiros interesses não vão além do acesso a recursos públicos e às vantagens de acordos de poder. É imprescindível estabelecer um sistema de financiamento de campanhas eleitorais que não torne os eleitos reféns de corporações ávidas por bons negócios como poder público, nem permita que os governantes de turno, por meio do financiamento público das campanhas, disponham de uma poderosa ferramenta de manipulação política.
O momento político que o Brasil vive,no entanto,não estimula previsões otimistas.A estação de caça ao voto para 2014 está prematuramente aberta, e e isque surge no horário gratuito o presidente do Partido dos Trabalhadores (PT) para trazer a boa nova de uma das decisões tomadas na última reunião do Diretório Nacional,em Fortaleza: "Diante das transformações que o País vem vivendo e para aprofundar a democracia brasileira, é inadiável a reforma do sistema político- eleitoral, para corrigir suas distorções e garantir maior participação da sociedade na vida nacional". É o que está escrito na página de abertura do site do PT. E é impossível discordar de diagnóstico tão progressista, embora não fique muito claro o que os petistas estão querendo dizer exatamente ao relacionar a inadiabilidade das reformas políticas com as "transformações que o País vem vivendo".
Lula & Cia. estão há mais de dez anos no poder.Só agora descobriram que o sistema político- eleitoral que lhes permitiu chegar lá está cheio de distorções e resulta em alta taxa de ilegitimidadeda representação popular?
O fato é que o PT mudou muito, não depois de chegar ao poder, mas exatamente para lá chegar e se manter. No âmbito estritamente político, a maior mudança talvez tenha sido se dar conta de que,em vez de acabar com os "300 picaretas" do Congresso Nacional - quem os denunciou foi o próprio Lula, no início dos anos 90-,era muito mais esperto a eles se aliar. Nem que fosse necessário pura e simplesmente comprá-los,como foi desastradamente feito pela quadrilha de José Dirceu.
É sintomático dessa mudança, também, o fato de o PT ter aberto mão de presidira Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados. A defesa dos direitos humanos, para quem se lembra, foi uma das principais bandeiras do PT, antes de Lula inventar este país maravilhoso em que vivemos. Mais importante agora, porém, é manter a base de sustentação no poder, mesmo que ao preço de deixar os direitos humanos aos cuidados do racismo e da homofobia.
É ou não é o fim da picada?
Milícias do pensamento - KÁTIA ABREU
FOLHA DE SP - 16/03
Está sendo construído um consenso de que o produtor rural é um usurpador social
O filósofo italiano Antonio Gramsci ensinava que o teatro de operações da revolução comunista não era o campo de batalha, mas o ambiente cultural, a trincheira do pensamento.
Enquanto Lênin pregava o ataque direto ao Estado, Gramsci sustentava que o novo homem, anunciado por Marx, emergiria não do terror revolucionário, mas da transformação das mentes.
Para tanto, impunha-se a infiltração e o domínio pelo partido dos meios de comunicação -jornais, cinema, teatro, editoras etc.- e a quebra gradual dos valores cristãos (que ele preferia chamar de burgueses), por meio do que chamava de guerra psicológica.
Segundo ele, é preciso uma reforma intelectual e moral, que leve à superação do senso comum, para a construção de outro consenso monitorado pelo partido.
A relativização desses valores resultaria, numa primeira etapa, numa sociedade mais fraca, destituída de parâmetros morais, mais propícia a absorver os valores do socialismo.
Desnecessário dizer que essa revolução está em pleno curso no Brasil -e não é de hoje.
Entre os consensos construídos, está o de que o produtor rural é um usurpador social, que deve ser permanentemente molestado.
Disso resultou o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), organização sem personalidade jurídica (insuscetível de ser processada por seus atos criminosos), mas com existência concreta, munida de verbas do Estado por meio de ONGs e transgressora recorrente do direito de propriedade, cláusula pétrea constitucional.
Dentro da estratégia gramsciana, as milícias do pensamento valem-se de escaramuças, que consistem em lançar ao debate teses que sabem serão rejeitadas num primeiro momento.
Importa, porém, romper a aura de tabu e acostumar a sociedade a gradualmente absorver o que sempre rejeitou.
Exemplo disso foi o Plano Nacional de Direitos Humanos 3 (PNDH), de 2009.
Trata-se de um conjunto de transgressões democráticas, propondo censura à imprensa, legalização das invasões de propriedades (tirando do Judiciário o poder de arbitragem e incluindo o invasor como instância de mediação), proibição do uso de símbolos religiosos em locais públicos, revisão do currículo das academias militares etc.
Agora, o PNDH-3 que a sociedade rejeitou volta como um fantasma na redação dada por alguns deputados ao artigo 159 do novo Código de Processo Civil.
Constam no texto, entre outras pérolas, que, "nos casos de litígio coletivo pela posse ou propriedade de imóvel urbano ou rural, antes do exame do requerimento de concessão da medida liminar, o juiz deverá designar audiência de justificação prévia de conciliação entre as partes e seus representantes legais".
Isso significa que, em vez da defesa natural da propriedade rural ou urbana, em caso de invasão, os invasores -com seus facões e foices, fazendo uso de cárcere privado de trabalhadores- deveriam ser previamente ouvidos e defendidos. Os criminosos, preliminarmente, colocariam suas exigências. Imagine se a moda pega e a proposta é estendida a roubo e homicídio.
A aberração não para aí. Diz o parágrafo 2º que, "sempre que necessário à efetivação da tutela jurisdicional, o juiz deverá fazer-se presente na área do conflito".
Não basta, por exemplo, a polícia, que passaria, então, a ter um papel meramente secundário. O próprio juiz, nesses casos, deveria ser obrigado a deixar suas funções para comparecer pessoalmente para ouvir os invasores, os criminosos.
Mais adiante, no parágrafo 4º, outro absurdo:
"O juiz requisitará aos órgãos da administração direta ou indireta da União, do Estado ou do Distrito Federal e do município informações fiscais, previdenciárias, ambientais, fundiárias e trabalhistas referentes ao imóvel".
Parece evidente, salvo para crédulos e radicais, que tal forma de mediação visa nada menos do que inviabilizar, tornar nulo o instituto da reintegração de posse. E, junto com a anulação, desapareceria o direito de propriedade, ferido de morte.
Gramsci, no inferno, deve estar elebrando.
Está sendo construído um consenso de que o produtor rural é um usurpador social
O filósofo italiano Antonio Gramsci ensinava que o teatro de operações da revolução comunista não era o campo de batalha, mas o ambiente cultural, a trincheira do pensamento.
Enquanto Lênin pregava o ataque direto ao Estado, Gramsci sustentava que o novo homem, anunciado por Marx, emergiria não do terror revolucionário, mas da transformação das mentes.
Para tanto, impunha-se a infiltração e o domínio pelo partido dos meios de comunicação -jornais, cinema, teatro, editoras etc.- e a quebra gradual dos valores cristãos (que ele preferia chamar de burgueses), por meio do que chamava de guerra psicológica.
Segundo ele, é preciso uma reforma intelectual e moral, que leve à superação do senso comum, para a construção de outro consenso monitorado pelo partido.
A relativização desses valores resultaria, numa primeira etapa, numa sociedade mais fraca, destituída de parâmetros morais, mais propícia a absorver os valores do socialismo.
Desnecessário dizer que essa revolução está em pleno curso no Brasil -e não é de hoje.
Entre os consensos construídos, está o de que o produtor rural é um usurpador social, que deve ser permanentemente molestado.
Disso resultou o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), organização sem personalidade jurídica (insuscetível de ser processada por seus atos criminosos), mas com existência concreta, munida de verbas do Estado por meio de ONGs e transgressora recorrente do direito de propriedade, cláusula pétrea constitucional.
Dentro da estratégia gramsciana, as milícias do pensamento valem-se de escaramuças, que consistem em lançar ao debate teses que sabem serão rejeitadas num primeiro momento.
Importa, porém, romper a aura de tabu e acostumar a sociedade a gradualmente absorver o que sempre rejeitou.
Exemplo disso foi o Plano Nacional de Direitos Humanos 3 (PNDH), de 2009.
Trata-se de um conjunto de transgressões democráticas, propondo censura à imprensa, legalização das invasões de propriedades (tirando do Judiciário o poder de arbitragem e incluindo o invasor como instância de mediação), proibição do uso de símbolos religiosos em locais públicos, revisão do currículo das academias militares etc.
Agora, o PNDH-3 que a sociedade rejeitou volta como um fantasma na redação dada por alguns deputados ao artigo 159 do novo Código de Processo Civil.
Constam no texto, entre outras pérolas, que, "nos casos de litígio coletivo pela posse ou propriedade de imóvel urbano ou rural, antes do exame do requerimento de concessão da medida liminar, o juiz deverá designar audiência de justificação prévia de conciliação entre as partes e seus representantes legais".
Isso significa que, em vez da defesa natural da propriedade rural ou urbana, em caso de invasão, os invasores -com seus facões e foices, fazendo uso de cárcere privado de trabalhadores- deveriam ser previamente ouvidos e defendidos. Os criminosos, preliminarmente, colocariam suas exigências. Imagine se a moda pega e a proposta é estendida a roubo e homicídio.
A aberração não para aí. Diz o parágrafo 2º que, "sempre que necessário à efetivação da tutela jurisdicional, o juiz deverá fazer-se presente na área do conflito".
Não basta, por exemplo, a polícia, que passaria, então, a ter um papel meramente secundário. O próprio juiz, nesses casos, deveria ser obrigado a deixar suas funções para comparecer pessoalmente para ouvir os invasores, os criminosos.
Mais adiante, no parágrafo 4º, outro absurdo:
"O juiz requisitará aos órgãos da administração direta ou indireta da União, do Estado ou do Distrito Federal e do município informações fiscais, previdenciárias, ambientais, fundiárias e trabalhistas referentes ao imóvel".
Parece evidente, salvo para crédulos e radicais, que tal forma de mediação visa nada menos do que inviabilizar, tornar nulo o instituto da reintegração de posse. E, junto com a anulação, desapareceria o direito de propriedade, ferido de morte.
Gramsci, no inferno, deve estar elebrando.
O pecado de Bergoglio - PLÁCIDO FERNANDES VIEIRA
CORREIO BRAZILIENSE - 16/03
Já contei aqui que, certa vez, engrossei uma vaia a dom Hélder Câmara, em 1981, no Recife. Nesse dia, em ato público na Universidade Católica de Pernambuco, ele discursava sobre o iminente fim da ditadura no Brasil e alertava os estudantes para os riscos de ações extremistas ou provocações que levassem a um possível retrocesso político. Até então, dom Hélder era um ídolo para mim. Mas, naquele momento, eu me decepcionara.
À época, bobo de galocha e massa de manobra de esquerdistas equivocados, eu pensava o contrário do arcebispo: era preciso aumentar a pressão e lutar com todas as armas para que o regime totalitário terminasse ainda mais depressa. Só muito tempo depois me dei conta do tamanho da injustiça que cometera contra o religioso. Coragem, de verdade, quem tinha era ele, que saía à rua desarmado, de peito aberto, a desafiar os tiranos de plantão.
Foi quando acordei para a verdadeira revolução à qual se propunham e lideravam nomes como Gandhi, Martin Luther King, Hélder. Todos eles defendiam a justiça social, a fraternidade e a igualdade, mas sem a eliminação daqueles que pensam o contrário. Se preciso, Hélder - mesmo fazendo a correta opção pelos mais desvalidos e tomando claras posições políticas sempre que necessário - daria uma hóstia para o mais injustiçado dos seres humanos e outra para o mais opressor. Assim manda o Evangelho que decidiu seguir. Se assim não procedesse, não estaria professando a palavra do Deus em que acredita. E, em vez da Igreja Católica, deveria procurar um partido político...
Todo esse preâmbulo vem a respeito das acusações de que o então cardeal argentino Jorge Mario Bergoglio, hoje o novo papa, teria colaborado com a ditadura argentina ou, no mínimo, sido omisso na defesa de dois padres jesuítas. Contra ele, é bom que se diga, não há uma única prova. Pelo contrário, a seu favor, há o testemunho de uma pessoa até hoje tida como acima de qualquer suspeita: o argentino Adolfo Perez Esquivel, ganhador do prêmio Nobel da Paz.
Conta Esquivel que havia, sim, integrantes da Igreja Católica colaboradores da ditadura no país vizinho. Mas ele afirma não ser o caso de Bergoglio, que teria intercedido a favor de vários perseguidos políticos. O fato é que, mesmo sem provas de que ajudou os carrascos da mais sangrenta tirania latino-americana, as denúncias contra ele devem se avolumar. Principalmente pelo "pecado" de haver sido um severo crítico do governo de Cristina Kirchner. A sagração dele como papa, noticiaram jornais portenhos, foi muito mal recebida pela chefe da Casa Rosada. E o principal acusador de Bergoglio é justamente um ex-motonero e atual kirchnerista.
À época, bobo de galocha e massa de manobra de esquerdistas equivocados, eu pensava o contrário do arcebispo: era preciso aumentar a pressão e lutar com todas as armas para que o regime totalitário terminasse ainda mais depressa. Só muito tempo depois me dei conta do tamanho da injustiça que cometera contra o religioso. Coragem, de verdade, quem tinha era ele, que saía à rua desarmado, de peito aberto, a desafiar os tiranos de plantão.
Foi quando acordei para a verdadeira revolução à qual se propunham e lideravam nomes como Gandhi, Martin Luther King, Hélder. Todos eles defendiam a justiça social, a fraternidade e a igualdade, mas sem a eliminação daqueles que pensam o contrário. Se preciso, Hélder - mesmo fazendo a correta opção pelos mais desvalidos e tomando claras posições políticas sempre que necessário - daria uma hóstia para o mais injustiçado dos seres humanos e outra para o mais opressor. Assim manda o Evangelho que decidiu seguir. Se assim não procedesse, não estaria professando a palavra do Deus em que acredita. E, em vez da Igreja Católica, deveria procurar um partido político...
Todo esse preâmbulo vem a respeito das acusações de que o então cardeal argentino Jorge Mario Bergoglio, hoje o novo papa, teria colaborado com a ditadura argentina ou, no mínimo, sido omisso na defesa de dois padres jesuítas. Contra ele, é bom que se diga, não há uma única prova. Pelo contrário, a seu favor, há o testemunho de uma pessoa até hoje tida como acima de qualquer suspeita: o argentino Adolfo Perez Esquivel, ganhador do prêmio Nobel da Paz.
Conta Esquivel que havia, sim, integrantes da Igreja Católica colaboradores da ditadura no país vizinho. Mas ele afirma não ser o caso de Bergoglio, que teria intercedido a favor de vários perseguidos políticos. O fato é que, mesmo sem provas de que ajudou os carrascos da mais sangrenta tirania latino-americana, as denúncias contra ele devem se avolumar. Principalmente pelo "pecado" de haver sido um severo crítico do governo de Cristina Kirchner. A sagração dele como papa, noticiaram jornais portenhos, foi muito mal recebida pela chefe da Casa Rosada. E o principal acusador de Bergoglio é justamente um ex-motonero e atual kirchnerista.