sexta-feira, janeiro 25, 2013

Com chapéu alheio - ANCELMO GOIS


O GLOBO - 25/01

A Fifa acaba de espetar uma conta de uns R$ 80 milhões em cada uma das seis cidades — Rio, Brasília, Belo Horizonte, Fortaleza, Recife e Salvador — que vão sediar, este ano, a Copa das Confederações. É, mais ou menos, quanto vai custar a construção dos chamados “overlay”, estruturas temporárias para abrigar a imprensa e vips no entorno dos estádios.

Segue...
Os governadores anfitriões já enviaram uma carta à Dilma dizendo que não pagarão essa conta. Na África do Sul, quem pagou foi a própria Fifa, o que faz mais sentido.

Templo é dinheiro
Circula no meio evangélico que a Igreja Mundial do Poder de Deus está negociando a compra da CNT, a rede de televisão. A conferir. O líder da Igreja, apóstolo Valdemiro Santiago, é dono, segundo a “Forbes”, de um patrimônio no valor de US$ 220 milhões.

Randolfe é bamba
A Liga das Escolas de Samba do Amapá escolheu, assim como quem não quer nada, a figura mais famosa do estado para estampar a capa do CD com os sambas deste ano: o senador Randolfe Rodrigues. Veja na imagem, o político, todo pimpão, mandando beijos para a plateia.

PINTOU SUJEIRA
Veja como é difícil manter a praia limpa com tanto porcalhão jogando lixo na água. A imagem, do leitor Príamo de Melo, professor de engenharia química na Coppe/UFRJ, é da Praia Vermelha, na Urca, no Rio. É uma pena. Esta praia, veja só, acabou de ganhar quatro estrelas no Programa Areia Carioca, da Secretaria de Meio Ambiente do Rio. Só que as chuvas de verão e as correntes marinhas levaram para as areias da Urca muita sujeira que flutuava na Baía de Guanabara. Imagina na Olimpíada!

Calma, gente
João Pedro Stédile envia hoje uma carta à escola Unidos de Vila Isabel por ter aceito o patrocínio da alemã Basf ao enredo em homenagem ao trabalhador do campo. O MST, como se sabe, combate a empresa química da Alemanha por causa da produção de agrotóxicos agrícolas.

Segue...
Stédile promete também se queixar com o querido Martinho da Vila, um dos autores do samba deste ano.

A terra treme
Mais um lance da briga entre líderes patronais do comércio. Diretores da Confederação Nacional do Comércio decidiram, ontem, propor a cassação do mandato de Orlando Diniz na diretoria da entidade.

Rumo ao exterior
O último filme da cineasta Lúcia Murat, “A memória que me contam”, com os atores Simone Spoladore e Franco Nero, já tem convites para ser exibido no Uruguai, Portugal, França e EUA.

Depois da UPP
A prefeitura do Rio concedeu, ontem, licenciamento de um hostel na Favela do Vidigal. O proprietário é o arquiteto Hélio Guimarães Pellegrino. No projeto, há seis suítes e quatro quartos, todos com varanda, além de áreas com deques e quiosque.

Aliás...
Hostel é o cacete!

Fera da Baixada
A 7ª Câmara Criminal do Rio vai julgar, dia 29 agora, às 13h, um recurso de Luciene Reis Santana, conhecida como “a Fera da Baixada”, condenada a 43 anos de prisão. Ela, lembra?, começou a ser chamada assim após matar e ocultar o corpo da menina Lavínia Azeredo Santana, 6 anos, filha de seu amante.

Sem respeito
Um ônibus da 1001 saiu de Búzios, RJ, em direção do Rio, ontem, às 12h50m, com 50 minutos de atraso. Uma passageira foi reclamar e perguntou se os funcionários da empresa não poderiam, ao menos, pedir desculpas. E um deles disparou:

— Um pedido de desculpas vai fazer seu ônibus chegar na hora lá?

Efeito revitalização
A Bodega do Sal, o charmoso bar na Pedra do Sal, na Zona Portuária do Rio, vai entrar em obras depois do carnaval. O projeto da reforma é do arquiteto André Rodrigues, que modernizou alguns bares da Lapa.

Gatinha da DP
Os bombeiros do Rio resgataram uma gatinha, recentemente, que ficou três dias presa dentro do motor de um carro. O felino foi levado à Suipa, que cuida de bichinhos abandonados.
A gata recebeu o nome de...
Monique Vidal, a delegada da 9ª DP (Catete). Faz sentido!

ESTRELAS A SERVIÇO DA PAZ
Paulo Coelho e Charlize Theron, a atriz sul-africana, trocam chamego, após jantar, em Davos. O assunto principal foi... a ONU. É que os dois são mensageiros da paz. Fofos

Ponto Final
Era uma vez um menino negro que andava de bicicleta, em Chicago, nos EUA, e terminou detido por um guarda. O policial suspeitou que o pequeno tinha furtado o veículo.

Marian Shields Robinson, mãe do menino, provou que a bicicleta fora comprada. Aí, o guarda tentou dar o assunto como encerrado. Mas ela foi à polícia e o acusou de racismo. O menino cresceu, e sua irmã, Michele Obama, é a primeira-dama dos EUA.

Pagãos - FERNANDA TORRES

FOLHA DE SP - 25/01


Passei dias atormentada com a ceia, pensando no quanto a arte perdeu terreno para a tecnologia


Um rapaz de 15 anos, abastado, inteligente e educado, me disse que pagar R$ 0,99 por uma música na internet era uma exploração sem precedentes.

Graças a um certo atraso geracional, vivo alheia às questões de direitos autorais das novas mídias, mas, dessa vez, me senti algo indignada. Rebati perguntando o porquê de ele achar correto o preço de uma barra de chocolate e se sentir tão ultrajado com o singelo custo da composição. Ele respondeu que não teria como arcar com as mais de 2.500 músicas arquivadas no seu drive.

Sugeri que quem possui um computador caríssimo, jeans custosíssimos, além de iPads, iTouches e afins na sua parafernália de entretenimento, tem, sim, condições de arcar com o ônus de uma canção.

Com a calma de quem vive uma realidade que eu desconheço, o infante me explicou que a internet dá ao artista a chance de divulgar seu trabalho e não há lógica em cobrar por uma oportunidade.

Um outro jovem, esse com tendências mais à esquerda do que o primeiro, completou aos brados que o verdadeiro artista não trabalha por dinheiro e lembrou que os pobres devem ter acesso à cultura tanto quanto os endinheirados. Essa alegação empurrou a discussão para o campo da insensibilidade social, emudecendo a velha guarda.

Os adultos só tiveram chance porque a babá de um dos imberbes se manifestou, afirmando que toda a vez que um rico quer defender o seu ponto de vista apela para o direito dos menos favorecidos. "Pobre não tem computador." Lembrou ela.

Animados com o apoio da classe trabalhadora, os de maior contra-atacaram dizendo que o que parecia cultura para todos não passava de uma apropriação indevida das grandes corporações que faturavam trilhões em cima do conteúdo de terceiros.

"E os milhões que os cantores acumulam nos shows?" Devolveram os adolescentes. "E o direito autoral dos compositores?!" Vociferaram os mais velhos. "Eles não entendem", concluíram os menores, como se os nascidos antes da virada do milênio fossem matusaléns sem cura, presos ao tempo em que era possível numerar o vinil, o livro ou o celuloide.

Um dos poucos antenados da segunda idade lembrou que Gilberto Gil, o mais apto membro da MPB a lidar com as novas diretrizes do mercado fonográfico, liberou parte de sua obra para ser "downloadada" de graça, ao mesmo tempo que protegeu o melhor de sua discografia da ferocidade da pirataria. Hipócrita! Bradou ultrajado o mais à esquerda dos pequenos.

A noite terminou em lágrimas, com os pais afrontados com as crias e os de menor aviltados pelo atraso das gerações pregressas.

Passei dias atormentada com a violência da ceia, pensando no quanto a arte perdeu terreno para a tecnologia. E assim entramos na Scuola di San Rocco, em Veneza, onde Tintoretto preencheu cada milímetro de parede do exuberante prédio renascentista com a sua extraordinária versão da Bíblia. E descemos a bota com os rebentos, arrastando-os por capelas cobertas por Giotto, Michelangelo, Da Vinci e

Fra Angelico.

É impressionante como esse levante de artistas, bancados pela igreja e por "dodges" e príncipes alinhados com o Papa, conseguiram se superar diante de uma restrição temática tão acirrada. E tome madona, crucificação e santa ceia, ressurreição e batismo, manjedoura e Menino Jesus.

A arte sempre caminhou entre a marginalidade e o sistema. O século 20 foi o último a viver sobre a influência do humanismo, cuja explosão ocorreu lá, no renascimento. Hoje, vivemos um ateísmo tecnológico sem precedentes, tão bem representado pela indiferença do rapaz que despreza o conteúdo artístico e venera sua nave virtual.

Fiz essa viagem para apresentar às crianças o berço do Ocidente, que pode até ter sido a Grécia, mas que se desenvolveu à plena potência na Itália. Depois de uma via crucis por igrejas, notei o ar de vingança no rosto dos moleques ao adentrarem o Coliseu.

O sofrimento cristão é mesmo de uma melancolia sem fim, admirar o vigor das estátuas realistas de Trajano, Adriano e Marco Aurélio encoraja o espírito. Mas as novas gerações não se miram nem em Roma nem em Cristo, seu paganismo é de outra ordem.

O iPhone é a nova Pietá.

Potter e a mágica dos beatniks - LUCAS MENDES

BBC BRASIL - 24/01


Em Manhattan os boêmios, músicos e notívagos eram os "hipsters", uma derivação da palavra "hep", de origem africana para identificar a gente "de olho aberto", a turma por dentro.


Músicos e fãs eram hipsters ou hepcats. Na época, década de 40, a música transitava do swing para o bop e para o jazz.

Deles brotaram os "beats", palavra que também vem da cultura do jazz, criada e definida por Jack Kerouac, em 48, um dos fundadores da tribo beat. Significava derrubado, marginalizado, pobre, mas cheio de inspiração.

A palavra também tinha conotação de beatificação, gente pura. Eles eram fudidos iluminados, drogados, alienados, existencialmente angustiados, sexualmente e homossexualmente liberados e tolerantes, culturalmente inovadores e do contra, politicamente alienados.

Em 1958, quando os russos lançaram o satélite Sputnik, Herb Caen, um influente colunista de San Francisco, no deboche, fundiu beat com "nick", deu beatnik. Enfureceu Jack Kerouac, que se sentiu chamado de "babaca". O nome pegou, mas até hoje a maioria dos americanos não sabe o que significa. Faça o teste.

Depois deles, nos 60, vieram os hippies. Novas drogas, novas loucuras, pacifismo e outro ritmo, o rock.

O que nos interessa hoje são os beatniks, que estão entre os hipsters e os hippies e de volta nos cinemas, livrarias e debates. A obra máxima dos beatniks, On The Road, de Jack Kerouac, é uma biografia fictícia sobre suas viagens de carro com um amigo, da costa Leste à Oeste, idas e voltas, em álcool, drogas, sexo, divagações metafísicas em busca deles mesmos e do sentido da vida.

On The Road, o filme do diretor brasileiro Walter Salles, está em cartaz nos Estados Unidos, numa versão que dividiu os críticos e não correspondeu às expectativas de bilheteria americana. Até agora, o filme, que custou mais de US$ 20 milhões, faturou pouco mais de US$ 8 milhões no exterior, a maior parte na França, Itália e Brasil, e menos de US$ 200 mil nos Estados Unidos.

Nas livrarias, há uma nova biografia de Jack Kerouac, The Voice is All, da escritoria Joyce Johnson, que teve um affair com o escritor durante dois anos na época da publicação de On The Road, em 1958.

Este é o terceiro livro dela sobre Kerouac. Neste, ela defende o talento literário do "Rei dos Beats", nascido em Boston, mas de origem franco-canadense. Ele às vezes duvidava do próprio talento, debochava da incompetência nas duas línguas. Truman Capote também debochou, mas com crueldade. Quando contaram que Kerouac escreveu 125 mil palavras em 20 dias, Capote disse que "não escrevia. Datilografava".

Jack Kerouac agora brilha noutro filme, Kill Your Darlings, que estreou e foi vendido nesta semana no festival de Sundance. A recepção inicial foi entusiasmada, mas os críticos mais influentes ainda não se manifestaram.

O filme conta a história da amizade e das primeiras incursões literárias dos três beats originais, Jack Kerouac, Allen Ginsberg e William S. Burroughs, que se encontraram na universidade Columbia na década de 40. Havia um quarto beat, Lucien Carr.

O grupo bebe, fuma maconha, se droga, curte jazz no Village e no Harlem, transa com homens, mulheres, entre eles, e se envolve "no crime da década". Lucien Carr, que vinha de uma família milionária do sul, mata a facadas o tutor que o havia seduzido na adolescência e queria manter viva a relação entre os dois em Nova York.

O crime acaba com a carreira universitária dos futuros escritores e o assassino se muda para Paris, onde casa, tem filhos, se torna chefe da agência de notícias UPI e abandona os antigos amigos, embora Allen Ginsberg, que o adorava, tenha sido o responsável pela sentença curta que recebeu no julgamento.

Na universidade, Allen Ginsberg descobriu, além da sua homossexualidade, seu talento literário. Seu poema Howl, escrito em 1955, censurado e liberado pela Justiça, se tornou um hino dos hippies, desatinados e rebeldes durante várias décadas.

No filme, Allen Ginsberg é interpretado por Daniel "Harry Potter" Radcliff, que não é gay, mas se entrega de corpo e alma às cenas eróticas. Foi o assunto da imprensa e dos fãs depois da estreia em Sundance.

O ex-mago tem bom humor. Contou que antes de começar as cenas perguntou ao diretor "como é a transa? Preciso de instruções".

John Krokidas, que é gay, instruiu. As três cenas não duraram uma hora e meia de filmagem e as mais fortes foram cortadas.

Depois dos filmes Harry Potter, Radcllif fez a peça Equus, em Londres, onde aparecia nu no palco numa história sobre a relação física e espiritual (a sexual é subentendida) entre ele e um cavalo, e onde cega seis deles num estábulo.

Com Equus, Radcliff achou que se livraria do que chama de "maldição de Harry Potter", mas continuou Potter. Para Kill your Darlings, ele tingiu o cabelo, fez permanente, os olhos ficaram castanhos, as armações dos óculos engrossaram, mas quando entrou num prédio da Quinta Avenida foi cercado por adolescentes histéricas.

Quando saiu de uma filmagem na Universidade Columbia, milhares de estudantes estavam na porta aos gritos "Score One for the Gryffindor".

Depois da estreia e do choque homossexual de Kill Your Darlings em Sundance, o mago acha que se livrou da "maldição Potter".

Duvido. Mais fãs vão querer abraçá-lo. É a mágica dos beatniks.

Remédio pra dar alegria - ARTHUR DAPIEVE

O GLOBO - 25/01


Como qualquer droga, a cultura digital tem efeitos colaterais. A nossa sedação coletiva se reflete no campo das artes


Não é de hoje que vivemos um processo em que tranquilizantes bloqueiam ou amenizam a ansiedade nascida da multiplicação das relações humanas. A rivotrilização, como define um amigo. Nas mídias sociais, então, a falsa obrigação de ficar conectado e disponível gera a culpa de se estar em falta com alguém. Nelas, o mais próximo de conviver com todos é manter contato superficial com muitos. Como qualquer remédio (no caso, para a concentração do conhecimento), a cultura digital tem efeitos colaterais.

A nossa sedação coletiva se reflete no campo das artes, é claro. Na música pop, que traduz de maneira imediata e bandeirosa os humores de um tempo, escutamos aqui e lá fora a preponderância de trabalhos emocionalmente neutros, que remuneram o descomprometimento do artista com o descomprometimento dos ouvintes. Falta tesão, sentimento. Em 1984, quando computadores pessoais, celulares e Internet eram quase ficção científica, uma canção do Kid Abelha já fazia um diagnóstico sagaz dessa alienação moderna: “Eu tenho pressa/ e tanta coisa me interessa/ mas nada tanto assim.”

Um antigo “veneno antimonotonia” está na música que também clama por “algum remédio que me dê alegria”, ou seja, em “Todo amor que houver nessa vida”. É a nona das dez faixas originais do primeiro LP do Barão Vermelho, lançado em 27 de setembro de 1982. Como parte das comemorações pelos 30 anos da banda — na verdade, formada para uma apresentação abortada na Feira da Providência do ano anterior —, o disco foi relançado pela Som Livre em versão remixada e com três faixas bônus no final de 2012. Mais do que nunca, o disco soa como uma porrada na testa.

Diferentemente do que o ressentimento volta e meia ainda propala, o Barão não conseguiu contrato porque Cazuza era filho do presidente da Som Livre: o Barão conseguiu contrato apesar de Cazuza ser filho do presidente da Som Livre. João Araújo relutou. Só foi convencido quando o diretor artístico Guto Graça Mello jogou pesado: “Pior vai ser se seu filho estourar em outra gravadora.” Araújo topou, mas ficou longe. Graça Mello pegou dois fins de semana ociosos nos estúdios e, junto com o primeiro padrinho da banda, o saudoso crítico Ezequiel Neves, produziu “Barão Vermelho”.

Embora pouco entendessem de técnicas de gravação, Cazuza, Roberto Frejat, Maurício Barros, Dé Palmeira e Guto Goffi manjavam o bastante de som para sacar que o resultado das sessões não ficara legal. Isso já não importava muito na época — e agora, com a remixagem e a remasterização, importa menos ainda. O que conta mesmo é que aqueles cinco garotos entre 24 anos (de Cazuza) e 17 anos (de Dé) fizeram do estúdio uma festa, registrando a versão carioca do rock cru, sujo e meio caótico escutado na Inglaterra nos Stones circa “Exile on Main St.” (antes), nos Smiths (simultaneamente ao Barão), no Oasis (um pouco depois) ou nos Arctic Monkeys (bem, bem depois).

Graças à Fluminense FM, “Barão Vermelho” não passou em brancas nuvens, mas foi diminuído pelo sucesso de “As aventuras da Blitz”, lançado coincidentemente na véspera, 26 de setembro de 1982. No ano seguinte, porém, Caetano Veloso cantou em show “Todo amor que houver nessa vida” e Ney Matogrosso gravou “Pro dia nascer feliz”, já do segundo LP do Barão, inferior ao primeiro. A partir daí, a banda — e na cola dela todo o BRock — alcançou mais gente e mais respeito. Caetano, Graça Mello e Leo Jaime assinam pequenos textos no encarte da nova edição de “Barão Vermelho”.

“Todo amor que houver nessa vida” continua gloriosa. “Down em mim” (um blues, gênero antirrivotrilização por excelência), “Billy Negão” e “Bilhetinho azul”, cults na Flu FM, também. No entanto, além da inédita “Sorte e azar”, faixas menos badaladas na época agora saltam aos ouvidos, pintando um painel do Baixo Leblon da década de 80 do século passado, pré-Aids e pré-militarização do tráfico de drogas.

Há o ronco malicioso de “Posando de star”, com Cazuza quase engolindo o “se” do verso “você precisa é dar-se” num efeito hilariante. Escuta-se a guitarra de Frejat, já adulta entre 19 e 20 anos, no solo de “Certo dia na cidade”. E, sobretudo para mim, sente-se a força de uma trinca de canções furiosas: “Conto de fadas”, “Rock’n geral” e “Por aí”. Nas novas audições, o verso que me abriu o supercílio está nesta última, um terno hino à porra-louquice: “Eu tenho um plano que eu não sei achar”. Caraca!

É preciso ter em mente que, se hoje comemoramos 30 anos com o Barão e lamentamos quase um quarto de século sem Cazuza, àquela altura não existia perspectiva de um segundo disco, nem da banda nem de artistas solo dela egressos. Daí a espontaneidade de “Barão Vermelho”. Os caras seguiam, sem vergonha ou ansiolítico, o lema de Frank Zappa: é melhor se sentir mal do que não sentir coisa nenhuma.


Há 25 anos - RUY CASTRO

FOLHA DE SP - 25/01


RIO DE JANEIRO - Foi num dia 25 de janeiro, como hoje. Enquanto Alice tirava o carro, abri a geladeira e, tremendo muito, servi-me de quatro copos de vodca -pura, gelada, do freezer. Copos, não doses. Cheios, cada qual tomado de um gole, e que, como sempre, desceram como água. O tremor nas mãos não traía nervosismo. Tremia porque acabara de acordar e estava sem beber havia horas. Ainda não descobrira como beber dormindo.

Acordado, bebia um mínimo de dois litros de vodca por dia, só em casa -o consumo na rua era difícil de calcular. Uma vez por semana, a empregada botava os cadáveres para fora, à espera do garrafeiro. Os vizinhos deviam achar que os moradores daquela casa bebiam muito. Se soubessem que um único morador engolia aquilo tudo, não acreditariam.

Dali a pouco, estávamos na rodovia Raposo Tavares, rumo a Cotia, a 31 km de São Paulo, onde eu então morava. Sabia que, no lugar para onde Alice me levava -uma clínica para dependentes químicos-, não haveria bebida. Os quatro copos teriam de bastar até o fim do dia. Mas, e o dia seguinte? E os 30 dias seguintes? Não tinha ideia, nem me preocupava. Afinal, não vivia dizendo que "bebia porque gostava" e "seria capaz de parar quando quisesse"?

Os primeiros cinco dias foram de horror -o organismo reagindo ao corte súbito do suprimento com tremores pelo corpo inteiro, agitação, insônia, diarreia, taquicardia, suores, possibilidade de delírio. Nas palestras, as vozes dos terapeutas soavam muito longe e o que eles diziam, um mistério. Os colegas de internação, fantasmas sem rosto. Mas, aos poucos, o horror passou e, em menos de duas semanas, foi sendo substituído por uma sensação quase insuportável de lucidez, vigor físico e vontade de viver -como nunca antes. Até hoje.

Enfim, foi hoje, há 25 anos. Mas hoje é apenas mais um dia.

Acariciando a Comédia Humana - IGNÁCIO DE LOYOLA BRANDÃO


O Estado de S.Paulo - 25/01



Para Cora Rónai, amiga de tantos anos.

O pacote subiu pelo elevador. Apanhei, era da Editora Globo. Deixei em cima da mesa, enquanto almoçava e na hora do café abri. Surgiram os primeiros quatro volumes da Comédia Humana, de Balzac, numa reedição dentro da Biblioteca Azul. Então, o tempo se misturou e me vi numa tarde de muito vento em Araraquara, com meu pai chegando com os cabelos revoltos e um sorriso enorme. Trazia um pacote. Colocou sobre a mesa do jantar e disse: "Uma preciosidade. Um dos maiores livros do mundo". Meu irmão Luis e eu ficamos em polvorosa. Que livro seria? Líamos contos de fadas e o Tesouro da Juventude e já achávamos o máximo. Minha mãe colocou a sopa, sempre havia sopa na janta (como se diz) em minha terra, cidade quente. Meu pai comia com a colher na mão direita, enquanto a esquerda repousava sobre o pacote. Fazia o teatro dele, o Totó Brandão.

Terminado o jantar, ele tomou leite com farinha de milho e foi sentar-se com o pacote no colo. Abriu e vimos o que provocava tanto encantamento: o primeiro volume da Comédia Humana, editado pela Globo de Porto Alegre. Era o ano de 1948 (vejo, agora, que era a quarta edição do volume 1, datado de 1947) e eu tinha 12 anos, mas aquela tarde ficou em mim. Parte da então chamada Biblioteca dos Séculos, o volume de Balzac foi devorado por meu pai ao longo de semanas, uma hora por dia, ao chegar do trabalho.

Aquele mesmo exemplar e todos os outros da Comédia estão hoje aqui, em casa. Trouxe a coleção após a morte de meu pai em 1993, lembrando que foram comprados um a um, à medida que saíam. Dinheiro economizado do salário de um ferroviário. Livros encadernados em couro marrom avermelhado.

Passaram-se os anos, muitos, e minha filha Rita viu quando cheguei de Araraquara com aquela coleção. Abri espaço nas estantes. Um dia, ao chegar em casa, vi que a Comédia tinha "desaparecido". Estranhei até descobri-la no quarto de Rita. Tinham sido baldeados (para usar uma expressão de ferrovia), porque, aos 25 anos, ela começou a ler e se encantou. Leu todos. Imaginei que Balzac não seduziria nova geração. Enganei-me.

Antes, muito antes daquele dia de vento, na aula de francês do ginásio, mademoiselle Fanny nos fez ler, em francês, um trecho que ela havia trazido, copiado em mimeógrafo (aparelho da pré-história das copiadoras). Cada aluno teve um excerto (palavra da época) do Pai Goriot para ler, traduzir. Aos 14 anos, em meu francês primário e precário, traduzi. O dicionário era o Burtin-Vinholes, de segunda mão. Tudo que me lembro do trecho é que havia um gato que farejava leite e uma mulher com um nariz como bico de papagaio. Sei que foi um dia de vento e chuva, porque o dicionário molhou todo, até hoje conserva as páginas amareladas, enrugadas. Logo depois, Fanny nos mandou ao cinema assistir ao filme O Pai Goriot. Filmes franceses eram exibidos no cine Paratodos, considerado o cinema dos pobres, ainda que fosse o mais belo arquitetonicamente, e eram sempre esperados com avidez, porque eram os únicos em que as atrizes mostravam os seios.

Mas O Pai Goriot era um drama sem nenhum erotismo e acabei envolvido pela atmosfera. Tão diferente dos filmes americanos róseos, em que tudo dava certo. Não tenho certeza se o pai Goriot foi interpretado por Pierre Frenay ou Pierre Brasseur, não encontrei mais referências. Lembro-me dos ambientes soturnos, pesados, das casas imundas. Há uma versão moderna com Charles Aznavour como Goriot. Não vi.

Anos atrás, apanhei o metrô em Paris na direção de Passy. Queria descobrir as ruas e os edifícios que aparecem no início de O Último Tango em Paris. Caminhando, encontrei o que desejava e continuei; afinal, à minha frente caminhava uma jovem japonesa morena, saia curtíssima, pernas queimadas de sol. Súbito, um vento furioso bateu, a saia subiu, ela segurou com as duas mãos, de nada adiantou.

Distraí-me um segundo, ela sumiu. Caminhei e dei com uma escada que descia para uma espécie de pátio cinco metros abaixo do nível da rua. Ela estaria ali? Desci, dei com a placa: Maison Balzac. Ali ele tinha morado, é um museu, Rue Raynouard, 47. Entrei para ver o museu e a jovem. Ela tinha desaparecido. Não importa. Fiquei horas indo de uma sala para outra, porque me emociona olhar manuscritos, ver a letra, as emendas nas provas de livros, as fotos, os móveis. E as mulheres que ele amou e que o amaram? Condessas, marquesas, burguesas. Baixo, gordo e (diziam) desdentado, ele seduzia pela inteligência. E fui também à porta dos fundos, por onde Balzac fugia dos credores.

Tudo isso e aquelas rajadas de vento esses quatro volumes me trouxeram em instantes. Encantamento. Neste dia, fim do ano 2012, sinto a mesma sensação de meu pai naquela tarde de vento. Quatro volumes quadrados, bons para manusear, capas tipográficas, elegantes. Como o mundo não acabou, terei tempo de me deliciar, são livros com 700 a 800 páginas cada um, levíssimos. Ao olhar para esta coleção, me vem ainda a lembrança de Paulo Rónai, intelectual excepcional, história de vida fascinante. Uma vida que ele dedicou às traduções e a Balzac. Tudo vai se ligando, a vida é assim. Digito esta crônica com a mão direita. A outra mão está repousada sobre estes livros quadrados, de cor cinza, assim como vi meu pai fazer, cuidando e acariciando a Comédia Humana e me sentindo ínfimo como escritor.

Nossos filhos sem domésticas - ANA ESTELA DE SOUSA PINTO

FOLHA DE SP - 25/01


SÃO PAULO - Um cabo de guerra de mulheres está em curso no país.

Cada time puxa de um lado do processo civilizatório. As vítimas serão nossos filhos -ou os delas; depende do lado da corda em que se está.

Um grupo é o daquelas que, como diz Delfim Netto, fizeram a "revolução": era uma senhora que prestava serviços domésticos, estudou, foi promovida a manicure, a cabeleireira. Preparou-se mais, foi para o call center, virou caixa de supermercado.

Resultado: enquanto a ocupação cresceu em todo o país, o número de domésticas encolheu. As que ficaram encareceram e são disputadas a tapa pela outra ponta da corda.

As patroas (sem atirar a primeira pedra) já enxergam o dia em que não poderão arcar com as empregadas. Cedem espaço no cabo de guerra, ainda passo a passo porque sobra um "estoque" de domésticas -cujas filhas jamais seguirão seus passos.

Só por um salário competitivo e com condições profissionais -no Brasil, sabemos, relações entre patrões e empregados são ambíguas. (Para dizer o mínimo. Em Higienópolis, uma criada que fritava o filé-mignon da sinhá recebia carne de segunda e era orientada a lavar seu prato com esponja específica, que não tocasse a porcelana dos patrões.)

Os filhos dos "ricos-mas-nem-tanto" sofrerão o efeito da mudança, porque ainda são criados para morar em apartamentos enormes que não conseguimos limpar sozinhos, receber refeições feitas na hora e ver louças e roupa suja desaparecerem por encanto para ressurgir impecáveis.

Pós-choque, talvez eduquem nossos netos (homens finalmente incluídos) para a realidade. E o Brasil deixará de ser visto por estrangeiros como selvagem paraíso do qual o que mais se sente falta são os serviços domésticos (como, nesta semana, no site da "Forbes": http://is.gd/uAJJUZ).

Com o fim de janeiro, termina também minha colaboração neste espaço. Obrigada pela companhia.

Um tapinha na fachada - HUMBERTO WERNECK


O Estado de S.Paulo - 25/01


Quando São Paulo fez 450 anos, em 2004, vieram me pedir, a mim e a outros 449 moradores da cidade, uma frase para estampar nas estações do metrô. Não precisei pensar muito:

"Danada de feia - mas cozinha como poucas!"

Nove anos depois, vejo razões para pôr ainda mais ênfase na segunda afirmativa, e me dispenso de repetir que em raras cidades deste mundo se come bem como aqui. Quanto à primeira parte da frase, bem... - sou obrigado a admitir que infelizmente também ela continua valendo.

Permita essa reclamação, pra lá de óbvia, da parte de quem apesar de tudo não tem motivos para abandonar a cidade que o acolheu faz mais de 40 anos. Não queira mal ao forasteiro que tanta coisa boa, em especial dois filhos e uma neta, vieram paulistanizar irreversivelmente.

São Paulo já me pareceu assim, minuciosamente feia, naquele 16 de maio de 1970 em que desci na medonha rodoviária velha, ali na Luz, sob um teto cafona de bolhas coloridas. Não que eu viesse de algum lugar maravilhoso. Não mesmo: a Belo Horizonte de então caprichava em desmentir o adjetivo que traz no nome. Depois tomou jeito, ou quase. Devo reconhecer que minha cidade melhorou depois que saí de lá...

Sem que eu tenha feito grande coisa para isso, São Paulo também melhorou, mais por mérito dos cidadãos do que pelos administradores que tem tido. Ainda está de pé, é verdade, o Minhocão, ou o viaduto da Praça 14 Bis, duas monstruosidades entre várias. Mas pelo menos já se fala em desfazer o que o Maluf fez num tempo em que, debaixo das botas, ninguém ousava abrir o bico para questionar o que se fazia.

Deveria existir alguma coisa como, sei lá, um Conselho da Beleza Urbana, para prevenir aberrações e tentar remediar as que aí estão. Trabalho é o que não lhe faltaria. E já nem penso na feiura lancinante da miséria, mas na feiura endinheirada dos prédios que a mediocridade e a cobiça não cessam de espetar na paisagem. Muitos deles, aliás, com denominações pretensiosas do tipo "maison" ou "château" - postas, dá pra perceber, por nouveaux riches cujo francês, mesmo com tanta viagem, parece não ir muito além de bonjour, petit-pois e maionese. Para cada Artacho Jurado, Rino Levi, Vilanova Artigas, Lina Bo Bardi, Paulo Mendes da Rocha, Márcio Kogan ou Isay Weinfeld, tome fartura de horrores arquitetônicos.

Quanto a isso, é claro que pouco se poderia fazer. Nem que uma nova ditadura nos impusesse um Maluf do bem, pois mesmo em boa causa não se justifica uma censura estética. Alguma coisa, porém, sempre se poderia tentar, ainda que no vasto rol das miudezas, sob a forma de iniciativas que, somadas, viriam atenuar a estridente feiura de São Paulo.

Boas ideias não faltariam. Minha amiga Wanda acha que umas fontes, não necessariamente luminosas, trariam à cidade um frescor também visual. O cronista Ivan Angelo sugeriu que nas calçadas se plantassem árvores frutíferas, provedoras de sombra e gostosura. Um pouco como Belém, cujas ruas há mais de um século de encheram de mangueiras. Motivo já não haveria, pelo menos, para chorar as pitangas.

De minha parte, ficaria bem feliz se se desse força à ideia de enterrar a fiação aérea. Não sonho em oscarfreirizar tudo quanto é rua e avenida, mas seria uma bênção se nos livrássemos do máximo de fios e cabos. Com eles, sumiriam postes, e aposto que nem os cães reclamariam. Só peço que deixem onde está um postezinho de ferro esquecido aqui nas vizinhanças, pequeno, esguio, elegante, tendo no topo a torneira do gás com que muito antigamente se iluminava aquele trecho da Cardoso de Almeida.

Com os postes, sumiriam os deprimentes novelos de cordas e barbantes neles enrolados pelos penduradores de faixas. E já não haveria como pendurar também esses absurdos pares de tênis que por aí balangam sobre nossas cabeças.

Nada tão sensacional quanto pôr abaixo o Minhocão. Mas já seria um tapinha na fachada dessa dona que, até por cozinhar como poucas, bem podia ser mais graciosa.

Jogue a mamãe do trem - BARBARA GANCIA

FOLHA DE SP - 25/01


Walmor parece ter seguido à risca as recomendações do ministro japonês, que quer ver velhos morrendo logo


Ai! Ui! Ói! A autoridade japo­nesa vai lá e dá uma declara­ção enxuta, navalha na carne de tão realista, e o mundo inteiro reage fazendo biquinho, levantan­do a sobrancelha e colocando a mãozinha na frente da boca. Oh, que infâmia!

Ministro das Finanças de gabine­te recém-empossado do Japão, Ta­ro Aso, 72, afirmou sem reticências que idosos em estado terminal de­viam "se apressar e morrer" para poupar gastos do governo com a saúde pública. Depois ainda arre­matou dizendo que recusaria qual­quer tipo de tratamento médico para prolongar sua vida.

A reação foi instantânea. Agências de notícia, twiteiros cinco estrelas e donas de casa de bobeira na frente da página do Facebook se apressaram em classificar os comentários numa escala que variava entre "imprópria" e "infame".

Estou confusa com a reação. Depois de ver a minha família passar justamente pelo calvário que o ministro recomendou fosse evitado, eu não só lhe dou razão como aplaudo.

Veja: nenhum de nós, Gancias, é médico. A única decisão que nos coube, naquele período crítico, foi confiar ou não nos profissionais. Optamos por entregar a eles a nos­sa sorte.

Certo, errado, nunca saberemos o que pensar. Só posso dizer que a morte veio coincidentemente quando o limite de grana estipulado para o tratamento pelo seguro-saúde estava vencendo.

Fomos colhidos por um redemoinho de incertezas naqueles anos intermináveis e, por mais que eu buscasse aconselhamento profis­sional e espiritual cá e lá, para onde quer que eu me voltasse acabava sempre topando numa muralha de silêncio e corporativismo.

Só muito depois da perda alguns médicos amigos do peito começa­ram, aos poucos, a apontar como as coisas poderiam ter sido conduzi­das, sem tamanho sofrimento e hu­milhação, e não desconsiderando ética e a plena legalidade.

Não somos uma gente desprevenida, desorganizada ou que despreza o diálogo. Ao contrário, resolvemos encarar o problema unidos e de forma racional. Antes da doença, quantas vezes não tínhamos o pior? Aliás, que pai ou mãe já não manifestou seu desejo de forma explícita: "Pelo amor de Deus, nunca me deixe vegetando em uma cama de hospital!"? Conosco não foi diferente, mas, na prática, você se dá conta de que não decide nadinha.

Quando soube que Walmor Chagas havia nos deixado, na possibilidade de tê-lo feito de sua pró­pria lavra, pensei na dignidade do gesto, na coragem e elegância de uma decisão como essa, tomada sem consultas; na dramaticidade de um ato que remete aos personagens vividos por Paulo Autran, Paulo José, Anselmo Duarte, Tarcísio, Leonardo Villar...

Walmor, que nós situávamos em outra década, parece ter seguido à risca as reco­mendações do ministro japonês antes mesmo que ele as externasse. Considerando que o débito da previdência é um tsunami que está a poucos quilômetros não só de países prósperos com populações ido­sas, como da Guaratinguetá (SP) em que o ator vivia.

Especialmente nos dias de hoje, é muito cinismo fingir que só Dino da Silva Sauro pensa em jogar a avó do penhasco. Aumento da expectativa de vida, dramas previdenciários e gastos e impostos ganhando os píncaros do Himalaia significam que um dia fatalmente todos terão seu momento nutrindo a fantasia de que o idoso dependente se vá sem traumas, no sono.

Ou será que só o mi­nistro percebeu que o fardo de cui­dar dos idosos tornou-se um dos maiores dramas da atualidade?

HAJA PACIENTE - MÔNICA BERGAMO


FOLHA DE SP - 25/01


Diabéticos que procuraram uma das 120 AMAs (Assistência Médica Ambulatorial) em SP, nesta semana, para medir a taxa de glicemia, foram orientados a voltar outro dia. A tira para fazer o exame está em falta. O abastecimento de 922 mil unidades do produto, que deveria ter sido feito no dia 15, "sofreu atraso em função de problemas do fornecedor", diz a Secretaria Municipal da Saúde.

A CAMINHO
A pasta prometia para ontem a entrega de 840 mil tiras -usadas para a dosagem de açúcar no sangue, no controle da doença. "Suficientes para quase dois meses de consumo", diz a secretaria. "O restante [82 mil] será entregue na sequência. A situação estará normalizada até o início da próxima semana."

SALGADO
Os bufês que têm exclusividade nos camarotes do Sambódromo do Rio durante o Carnaval cobram entre R$ 300 e R$ 500, por pessoa, por noite. O Scala, do espanhol Chico Recarey, oferece o serviço nos setores pares. Os ímpares estão a cargo da DP Brasil. De acordo com a Liga Independente das Escolas de Samba do Rio de Janeiro, são as únicas empresas credenciadas a fornecer comida e bebida durante a folia.

SALGADO 2
A justificativa para a reserva de mercado é a mesma. "Cada setor só tem uma cozinha. Não se pode abrir para mais de um bufê", diz Vagner Lopes, da DP Brasil. O Scala também alega que a exclusividade é por falta de espaço. Diretor da Liesa, coronel Hélio Motta explica que só os camarotes comerciais têm cozinha própria.

DUAS LOIRAS CANTAM PARABÉNS PARA SP
Wanderléa, 66, participa de apresentação do grupo Del Rey, que canta hits da Jovem Guarda no parque Ecológico do Tietê. O show, às 14h, é gratuito e integra o projeto Cultura Livre SP.

A partir das 23h, é hora da cantora estoniana Kerli, 25, fazer minishow com cinco músicas no Grand Metrópole. "Estou animadíssima. Passei a noite em claro, costurando uma roupa nova para o show." Conhecida como "filha da Lady Gaga", ela diz não se incomodar. "Cantamos diferente e tenho fãs amorosos no Brasil." Depois da apresentação, a gringa tira uns dias de folga em SP. "Quero comer muito!"

QUEM DÁ MENOS?
O leiloeiro Aloisio Cravo participou anteontem, na Galeria Vermelho, do lançamento de "Menos-Valia [leilão]", livro baseado em obra de Rosângela Rennó. No mesmo espaço, foi aberta exposição coletiva, com a presença dos artistas Leda Catunda, Maurício Ianês e Marcelo Cidade e da produtora cultural Rafaela Becker.

CURVAS PAULISTANAS
A viúva de Oscar Niemeyer, Vera Lúcia, 67, desembarcou ontem em SP. Ela recebe, hoje, homenagem póstuma ao arquiteto. O prefeito Fernando Haddad (PT-SP) lhe entregará a Medalha 25 de Janeiro, concedida em reconhecimento ao mérito e aos serviços prestados por ele à capital.

EM CONTA
O número de hostels cadastrados em São Paulo cresceu 136% em um ano. Existiam 52 estabelecimentos em 2012, contra 22 reconhecidos pela Associação de Hostels paulistana e pela SPTuris no ano anterior. Nessas acomodações, com quartos coletivos e diárias mais baratas, 65% dos hóspedes eram de fora do país no ano passado.

CAFÉ COM PÃO
Após entrevista a uma rádio na av. Paulista, ontem, o governador Geraldo Alckmin pediu café e pão na chapa, às 7h45, em um boteco na esquina da Augusta com a Jaú. Seguranças o observavam do outro lado da rua.

MAMA ÁFRICA
Djavan se apresentará pela primeira vez em Maputo, no Moçambique, em 14 e 16 de fevereiro. O cantor já lançou o disco "Rua dos Amores" no Chile e na Argentina.

ARCA DE NOÉ
O cruzeiro É o Amor, de Zezé Di Camargo e Luciano, terá leilão de gado a bordo. Em 1º de fevereiro, o pregão virtual será de cavalos quarto de milha. No dia seguinte, de vacas da raça nelore.

CURTO-CIRCUITO
Nato L. abre hoje a mostra "Rodas, Cangas e Pincéis", no Reserva Cultural.

Andrea Matarazzo apresenta fotos de iPhone na Mostra SP de Fotografia.

O Museu de Arte Sacra de São Paulo inaugura hoje a mostra "459 Paulistinhas".

O empresário Walter Torre se une a cicloativistas hoje, no World Bike Tour.

O Attimo foi eleito o melhor novo restaurante no Prêmio Design Awards da "Wallpaper".

Alexandre Agra é o idealizador da Sommos, plataforma digital de venda de músicas, literatura e vídeos de cultura brasileira.

O maestro João Carlos Martins se apresenta com ritmistas da Vai-Vai. Em Ilhabela, no dia 2.

Dilma e as críticas - JOSÉ PIO MARTINS

GAZETA DO POVO - PR - 25/01


O ano de 2012 foi rico em matéria de lições econômicas. Foi um ano que contrariou todas as previsões e induziu o governo federal a inventar várias estripulias contábeis para fechar as contas. A lei orçamentária fixara uma meta para o superávit primário de 3,1% do PIB (que é a sobra de caixa dos municípios, estados e União antes do pagamento dos juros da dívida), e o resultado ficou em apenas 2,4%.

Outros números “traiçoeiros” foram a inflação oficial, que ficou em 5,84% (a meta fixada pelo Banco Central era de 4,5%); o crescimento do PIB, de apenas 1% (a meta era de 4%); e o saldo da balança comercial (diferença entre as exportações e importações de mercadorias tangíveis), que foi muito magro, bem abaixo do que se projetava.

A repercussão negativa das manipulações na contabilidade pública, capitaneada pelo ministro Guido Mantega, foi enorme; muito maior do que o governo poderia ter imaginado. A revista The Economist fez duras críticas e chamou Mantega de “o ministro do jeitinho”, e o jornal Financial Times condenou de forma veemente o comportamento das autoridades.

No mercado interno, as manobras do governo já tinham recebido críticas e a repulsa do mercado, a ponto de um amigo dileto do governo, o ex-ministro Delfim Netto, ter publicado um artigo no jornal Valor Econômico com críticas duríssimas às artimanhas do governo. Delfim chegou a dizer que o governo do PT está promovendo relações incestuosas entre o Tesouro Nacional, o BNDES, o Banco do Brasil e a Caixa Econômica.

A presidente Dilma, que merece elogios por sua capacidade de examinar as críticas e reconhecer os erros, ficou assustada com o teor das críticas internas e, sobretudo, com a dureza das críticas internacionais. Certamente, ela não esperava que as manobras na contabilidade para maquiar o saldo do superávit pudessem ter tanta repercussão. Algumas lições do episódio são importantes.

A primeira é que a globalização e a inserção do país no mercado internacional diminuem a margem de manobra dos governos e obrigam as autoridades a levar em consideração a repercussão dos agentes nacionais e estrangeiros. A revista The Economist anunciou que não mais publicará estatísticas econômicas da Argentina e da Venezuela, porque os governos desses dois países estão manipulando os indicadores e mentindo descaradamente. Trata-se de um exemplo interessante e alguém pode achar que isso não importa muito, mas importa, sim! Para começar, os bancos estrangeiros passam a negar empréstimos a esses países, pois, com informações falsas, os negócios são feitos no escuro, coisa que os banqueiros odeiam.

Outra lição é que tentar encobrir maus resultados manipulando a contabilidade é como tentar curar a febre mudando a regulagem do termômetro. Esse tipo de conduta incute desconfiança nos mercados e contribui para desestimular os investidores. E, num país democrático, com imprensa livre, é impossível esconder as traquinagens do governo e o mau comportamento dos governantes.

A terceira lição a aprender é que não basta redução dos juros, liberação de financiamentos e desoneração tributária para estimular os investimentos privados nacionais e estrangeiros. O governo fez tudo isso, mas, ao ser intervencionista demais e gerar desconfiança, ajudou o investimento privado a ser baixo.

Política econômica é como receita de bolo: basta um ingrediente sair errado para que o todo seja perdido.

A controvérsia da energia - EDITORIAL ZERO HORA

ZERO HORA - 25/01


A redução na tarifa de energia não pode camuflar, em meio à euforia governamental, a realidade revelada por estudos que apontam deficiências no setor e o risco de apagões.



É natural que a decisão governamental sobre a redução das tarifas de energia provoque euforia entre governistas e seja recebida com críticas ou com cautela por setores da oposição e também por especialistas do setor. A medida deve representar redução de custos para as famílias e as empresas, com menos impacto na inflação e, ao mesmo tempo, estímulo à produção. Há, no entanto, um desencontro de opiniões em torno de várias questões, começando pela resistência de algumas concessionárias de geração a participarem da engenharia financeira montada pelo governo. Pela percepção do Planalto, reforçada no discurso da presidente Dilma Rousseff na quarta-feira, as reações fariam parte de um boicote ao plano de desconto nas tarifas, comandando por "aqueles que são sempre do contra".
É uma definição simplificadora demais para as manifestações provocadas não só pela redução. Mesmo que o componente político quase sempre esteja presente no debate das deliberações governamentais, a presidente sabe, como estudiosa da área, que nem todos os que emitiram comentários a respeito do assunto são movidos por interesses partidários ou ideológicos. As observações críticas levam em conta vários fatores, entre os quais o de que o governo fez escolhas, e com altos custos, para bancar a tarifa mais barata. A diferença será sustentada pelo desembolso de R$ 8,4 bilhões do Tesouro Nacional, numa operação ainda não esclarecida.
Quando o debate envolve aspectos estruturais do setor, amplia-se a desconfiança com a efetividade, no longo prazo, de uma decisão que depende de pesados investimentos. Avaliações técnicas, e não apenas políticas, têm alertado para o fato de que o Brasil não investe, há pelo menos uma década e meia, o que deveria na geração de energia. Tais avaliações apontam para a fragilidade de um sistema de geração que se sustenta na diversidade das fontes hidro, termo e eólica, mas com um equilíbrio cada vez mais precário. Tanto que não foram poucos os casos de apagões enfrentados no atual governo, apesar da afirmação da própria presidente da República, no pronunciamento desta semana, de que "algumas pessoas, por precipitação, desinformação ou qualquer outro motivo, tenham feito previsões sem fundamento" _ ao referir-se à ameaça de falta de energia.
Mesmo que não exista risco de colapso no setor, análises sérias indicam que o Brasil pode, sim, enfrentar problemas, se a economia voltar a crescer. Não seria uma situação inédita, mas a repetição de panes, cada vez mais intensas e danosas. O esforço do Planalto para desqualificar avaliações que contrariam seu otimismo não contribui para a compreensão da realidade energética do país. É preciso distinguir a oposição política _ em especial dos governadores que se recusaram a participar da estratégia dos descontos _ e a posição técnica dos que temem novos apagões no país, com base no nível dos reservatórios hidrelétricos e na histórica falta de investimentos em geração e transmissão. O efeito duradouro das tarifas mais baratas depende de respostas a essas desconfianças, desde que não se limitem a desdenhar opiniões e estudos discordantes.

O corte de juros chegou ao fim - CLAUDIA SAFATLE


Valor Econômico - 25/01


O Banco Central subiu o tom. Na ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), divulgada ontem, ele avisou ao mercado que não haverá mais queda da taxa básica de juros, mesmo com a atividade econômica ainda bastante frágil.

Para o governo, a autoridade monetária também deixou importantes mensagens. A principal pode ser assim resumida: não haverá espaço para um "Pibão" enquanto a taxa de investimento na economia permanecer em queda.

O investimento cai há cinco trimestres consecutivos - os dados do último trimestre de 2012 ainda não saíram, mas não há sinais de reação. Esta dependerá do grau de confiança do setor privado no futuro e, portanto, nas ações do governo para reduzir as incertezas que desestimulam os empresários a botar as mãos no bolso e ampliar produção.

Não haverá "Pibão" sem novos investimentos

No Parágrafo 26, o mais importante da ata, o Copom expõe sua visão: "O ritmo de recuperação da atividade econômica doméstica - menos intenso do que se antecipava - se deve essencialmente a limitações no campo da oferta." E completa: "Dada sua natureza, portanto, esses impedimentos não podem ser endereçados (aqui usa um anglicismo comum na fala do presidente do BC, Alexandre Tombini) por ações de política monetária que são, por excelência, instrumento de controle da demanda."

É importante lembrar, nesse contexto, que os investimentos só aumentam a oferta quando maturados. Antes, eles são fatores de maior pressão da demanda.

Como limitações da oferta, há desde o aperto no mercado de trabalho - com o desemprego num nível muito baixo - a restrições na disponibilidade de alguns insumos, como energia, por exemplo.

O consumo de energia cresceu em torno de 4,5% no ano passado, mesmo com a atividade econômica morna - variação em torno de 1% - ao longo de todo o exercício. Com taxas mais fortes de expansão da atividade, o consumo será ainda maior.

Na avaliação do BC, o investimento pode reagir, voltar a crescer e até dar impulso ao crescimento ainda este ano. Ele é a componente mais volátil da demanda agregada. Mas não virão do Copom mais estímulos monetários para animar a economia, assim como não estão nos planos de voo do comitê novos apertos monetários para controlar a alta dos preços que decorre de choques de oferta.

A inflação, alias, só começará a ceder no segundo semestre deste ano, conforme os prognósticos oficiais, mesmo considerando a queda mais pronunciada das tarifas de energia, o adiamento dos aumentos das tarifas de transportes urbanos para meados do ano, e um reajuste de apenas 5% para a gasolina - conforme antecipado pela ata.

Os movimentos de alta de preços estão mais disseminados e "a reversão de isenções tributárias, combinadas com pressões sazonais e pressões localizadas no segmento de transportes, tendem a contribuir para que, no curto prazo, a inflação se mostre resistente", avisa o BC. Os incentivos do IPI para a compra de automóveis e para os produtos da linha branca começam a ser reduzidos neste primeiro trimestre e devem acabar em junho, com possíveis impactos sobre os preços desses produtos.

O expansionismo fiscal é outro elemento que pesa no balanço de risco da inflação. Em relação à política fiscal, o BC conta com a geração de superavit primário de R$ 155,9 bilhões este ano e de uma cifra equivalente a 3,1% do Produto Interno Bruto (PIB) para 2014. Nesse caso, a preocupação da autoridade monetária não é com os indicadores de solvência do setor público - dados pela relação dívida líquida/PIB - mas com a expansão da demanda produzida pelo aumento dos gastos governamentais.

O Ministério da Fazenda, porém, não comunicou que meta fiscal pretende, de fato, perseguir neste ano e o Congresso ainda não aprovou o orçamento para 2013.

A ata, assim, poderia ser vista como parte da ação clássica dos BCs - de entrar no salão e retirar o chope no auge da festa. Nesse caso, porém, a festa (entendida como aceleração do PIB) nem começou, mas o Copom já deixou claro que do lado monetário não há mais o que fazer, e problemas de oferta não são da sua alçada.

Haveria uma válvula de escape na política cambial. Afinal, a desvalorização do real promovida no ano passado não se revelou capaz de estimular o crescimento. Ao contrário, se algum efeito teve, além de produzir mais inflação, foi de cunho contracionista: encareceu as importações em geral, a de bens de capital em particular, e retirou poder de compra da classe média. A taxa de câmbio, que chegou ao pico de R$ 2,14 a R$ 2,15, hoje ronda a na casa dos R$ 2,05.

No leque de possibilidades do governo estaria, por exemplo, uma reversão mais acentuada das medidas de restrição ao ingresso de recursos externos. Seria difícil, porém, a presidente Dilma Rousseff a essa altura admitir uma valorização do real.

No início do terceiro ano desta gestão fica exposta a impossibilidade de se ter tudo ao mesmo tempo: inflação na meta, taxa de câmbio desvalorizada, juros baixos e o crescimento econômico que o governo persegue - algo na casa dos 4% a 4,5% ao ano.

A inflação deve bater no teto nos próximos meses e só começa a ceder a partir do meio do ano. O crescimento tende a ser moderado, em torno de 3%. E os juros, por enquanto, vão fixar estáveis em 7,25% ao ano.

Intervenção de Lula na prefeitura de São Paulo - ROBERTO FREIRE

BRASIL ECONÔMICO - 25/01


Eleito para comandar a maior cidade do Brasil pelos próximos quatro anos, o petista Fernando Haddad sequer completou o primeiro mês no cargo e já deu uma péssima sinalização aos paulistanos.

Na última semana, a poucos dias do aniversário de 459 anos de São Paulo, celebrado nesta sexta-feira (25), o prefeito recebeu em seu gabinete o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e dele ouviu, assim como 11 de seus secretários municipais, nada menos que dez "diretrizes" sobre como governar a megalópole.

O que se viu, na verdade, foi uma ingerência inadmissível de um ex-presidente da República na administração municipal, como se Lula tivesse autoridade para determinar o que deve ser feito em São Paulo por Haddad e sua equipe.

Entre as "instruções" dadas por Lula, segundo a imprensa, estão a necessidade de acertar parcerias com o governo do estado e priorizar áreas como habitação e transporte nos convênios firmados com o governo federal, além de monumentais obviedades como a preocupação em não deixar obras incompletas ou exigir o cumprimento de metas.

Tudo didaticamente explicado a Haddad e aos secretários de Governo, dos Transportes, da Saúde, do Planejamento e das Finanças, entre outros.

Ao aceitar o lamentável papel de mero cumpridor das determinações do ex-presidente, o prefeito se esquece do lema inscrito no brasão da cidade que administra: "Non ducor, duco", em latim, que significa "Não sou conduzido, conduzo".

Conduzir São Paulo de forma altiva e independente é tarefa que não permite hesitações. A vergonhosa reunião no gabinete do prefeito deixou claro que, nas atuais circunstâncias, Haddad é conduzido, não conduz.

Como se não bastasse exercer o papel interventor na prefeitura da maior cidade do país, Lula mostra que seu apego ao poder não tem limites e pretende tutelar também a presidente Dilma Rousseff. Segundo a imprensa, ele deve encontrá-la nesta sexta-feira para discutir a gestão do governo federal e a estratégia do PT para a eleição presidencial de 2014.

Na última segunda-feira (21), Lula já havia sido a grande estrela de um encontro promovido por seu instituto que contou, inclusive, com a presença dos ministros Celso Amorim, da Defesa, e Marco Aurélio Garcia, assessor especial da Presidência.

Nunca antes neste país, para usar expressão ao gosto lulista, um ex-presidente fez tanta questão de esbanjar poder e influência, intrometendo-se em administrações das quais se considera fiador.

Acuado por denúncias que vão do chamado "Rosegate" às acusações de Marcos Valério sobre o mensalão, Lula voltou aos holofotes justamente para tentar sair das cordas. Tutelando Haddad e Dilma, o ex-presidente ajuda a desviar o foco do noticiário, criando factoides e fugindo das explicações que deve à nação.

Agindo assim, pode até beneficiar a si próprio momentaneamente, mas diminui a estatura política do prefeito de São Paulo e da presidente da República.

Haddad e Dilma não deveriam aceitar essa intervenção tão escandalosa que envergonha a nação, constrange e mancha ainda mais o PT e deixa perplexos os brasileiros.

Os ecos do discurso de Dilma Rousseff - RICARDO GALUPPO

BRASIL ECONÔMICO - 25/01


A presidente Dilma Rousseff, no pronunciamento da última quarta feira, fez o que dela se esperava - e talvez a falta de surpresas tenha sido o ponto mais positivo do discurso.

Dilma assegurou que as tarifas da energia serão reduzidas na proporção prometida em setembro passado, garantiu que não há risco de apagão e afirmou que o país conta com a eletricidade necessária para crescer "neste e nos próximos anos".

Segundo Dilma, a capacidade instalada de geração (que é de 121 mil megawatts) será duplicada nos próximos 15 anos. E que neste ano entrarão em operação 7,5 mil novos quilômetros de linhas de transmissão.

Talvez a presidente tenha pecado por exagero ao afirmar que o Brasil tem um dos sistemas elétricos mais seguros do mundo porque trabalha com diversas matrizes de produção. O país, depois da crise de 2001, ampliou as fontes de energia e reduziu sua dependência da matriz hidrelétrica. Muito embora essa afirmação não possa ser contestada, nada impede que ela seja discutida.

Apesar de a sensação das pessoas diante dos constantes cortes no fornecimento de eletricidade não confirmar o otimismo da presidente, existe a percepção de que algo está sendo feito. Também é inegável que o problema está sendo enfrentado com determinação.

A mesma determinação que Dilma demonstrou diante dos juros bancários. Talvez a mudança viesse de uma forma menos tensa se a presidente se dispusesse a conversar um pouco mais com os agentes envolvidos.

E se ampliasse ainda mais o debate em torno da questão das tarifas, criando para os estados compensações financeiras que justificassem uma redução do ICMS na conta de luz. Mas, como esse tipo de diálogo não combina com o estilo do atual governo, pode se dizer que o cenário de hoje é o melhor que se poderia esperar.

Muitas vezes, o que falta aos debates sobre as questões sensíveis do país (e a eletricidade, sem dúvida, é uma delas) é bom senso. E nem sempre a falta desse ingrediente se dá por responsabilidade exclusiva dos órgãos diretamente envolvidos com a questão da energia.

Muito embora a dependência da matriz hidrelétrica tenha se reduzido, os principais investimentos que contribuirão de forma mais expressiva para a duplicação da oferta de que falava a presidente ainda exploram a força dos rios. E dependem das chuvas.

É preciso ampliar a diversificação e estudar com seriedade os investimentos em energia térmica a partir do gás do pré-sal e (por que não?) na matriz nuclear.

Também ajudaria muito se todos os órgãos do Estado (incluindo aí o Ibama, a Funai e o Ministério Público) se pusessem de acordo com relação à necessidade de não deixar o país às escuras. Mas isso talvez seja impossível.

A redução das tarifas de energia é um avanço. Mas é preciso avançar mais.

Uhuhu! Hoje é dia de São Paulo! - JOSÉ SIMÃO

FOLHA DE SP -25/01


E quando o Haddad deixar de ser bonzinho vai mudar o nome pra Malddad! Rarará!


Buemba! Buemba! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República! Isso é carma: o Corinthians perder pra Ponte Preta de novo?! Diz que o Corinthians não passa pela ponte porque o Chevette quebra no caminho! GPS de corintiano: evite ponte.

Pensamento do dia: o melhor lugar pra comer gambá é na ponte. Rarará! E a musiquinha do dia: "Boi, boi, boi/ Boi da cara preta/ Timão ganhou a Libertadores/ Mas perdeu pra Ponte Preta"!

E o meu São Paulo goleou o Bolívar! E o site Futirinhas diz que o time do Bolívar é tão ruim, mas tão ruim, que só venceria o Palmeiras por uns 2 X 0! Como disse um são-paulino: o jogo de volta pode ser até na altitude de Marte.

E tinha um jogador boliviano chamado: Eguino! O Eguino não dá coice, mas faz pênalti! E o Zizao depois da derrota: "Cleio que neste ano não selei mais o melhor do mundo". Tadinho do fofo! Tem que ter um bonequinho do Zizao!

E atenção! Hoje é aniversário de São Paulo. E todo ano dou a mesma definição: São Paulo foi fundada há 459 anos e afundada na última enchente! Afundação de São Paulo! E a única novidade é que temos um prefeito novo. Um pré-feito. Pré-feito pelo Lula! Rarará!

E o Haddad tinha que ser prefeito em Bollywood. Tem cara de galã indiano! E quando o Haddad deixar de ser bonzinho vai mudar o nome pra Malddad! Rarará! E uma biba me disse que São Paulo tem tanta biba que devia mudar o nome pra São Paula! Rarará! Dou o maior apoio!

E desde menino escuto esta: "São Paulo não pode parar! São Paulo não pode parar!". São Paulo não pode parar porque não tem estacionamento! Se eu fosse prefeito eu mandava cimentar o Ibirapuera. Pra virar um megaestacionamento. Rarará! E carro em São Paulo paga

IPTU! Por bem imóvel!

São Paulo é a capital da gastronomia: todo mundo come todo mundo! São Paulo tem japonesa loira e bunduda! E avisa pro Haddad que não queremos nem bilhete único nem bilhete mensal, queremos Bilhete Eterno! Com serviço de bordo e banheiro limpo! É mole? É mole, mas sobe!

É por isso que eu amo São Paulo! Se me perguntarem: "Quer se mudar pra Bali, aquela ilha paradisíaca?". "Não, quero morar em São Paulo." Cheirar gasolina e tomar penicilina. Porque em São Paulo a gente ou tá engarrafado ou gripado! Rarará!

Nóis sofre, mas nóis goza! Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno!

Avançamos, mas há nuvens no horizonte - WASHINGTON NOVAES

O ESTADÃO - 25/01


Ainda que se deixem de lado notícias acerca da área do clima, parecem cada vez mais inquietantes as novas análises sobre dramas que o mundo enfrentará nas próximas décadas. Pode-se começar pela própria Organização das Nações Unidas (ONU), que já não menciona apenas a previsão de que chegaremos a 9 bilhões de pessoas - 2 bilhões mais que hoje - em 2050; agora prevê 9,5 bilhões em 2075 (BBC Brasil, 17/1). E os relatórios acentuam que, embora 40% da humanidade viva abaixo da linha da pobreza (US$ 2 por dia), entre 30% e 50% dos alimentos produzidos (1,2 bilhão a 2 bilhões de toneladas) podem "ir parar no lixo". De acordo com a organização Global Food, isso se deve a más práticas em transporte, armazenamento, compras desnecessárias, prazos de validade rigorosos. E implica desperdício de áreas para agricultura, água e energia.

Nos Estados Unidos e na Europa, onde as perdas são maiores, o desperdício vai a 50%. As consequências são especialmente graves no desperdício de 500 bilhões de metros cúbicos anuais de água - quando o mundo caminha para o uso de 13 trilhões de m3 /ano, muito mais que o consumo atual. E os usos são muito altos principalmente na produção de carnes. Segundo o jornal The Washington Post (28/8/12), uma família média norte-americana, de quatro pessoas, joga no lixo a cada ano US$ 2.227 em comida, um desperdício dez vezes maior que no Sudeste Asiático e o dobro do que desperdiçava nos anos 1970.

Na Europa o desperdício é ainda mais contraditório, visto que o crescimento da pobreza com a crise econômica nos últimos quatro anos já levou ao aumento do número de pobres para 120 milhões de pessoas - dados da Comissão Europeia (Estado, 4/12/12). Na Espanha mais de 50% dos jovens estão desempregados, na Grécia são 21% da população abaixo do nível de pobreza.

Felizmente, no Brasil as notícias vinham caminhado na contramão dessas. As pessoas que vivem em extrema pobreza, com renda mensal per capita abaixo de R$ 70 mensais, e que representavam 5,3% da população em 2003, estão em 3,4% do total, com os programas de renda, Bolsa-Família, etc.; mas podem baixar para 0,8%, , segundo o Ipea e o Pnad/IBGE (Estado, 27/12). Entre crianças e jovens até 15 anos a queda pode ser ainda maior, para 0,6%. Os investimentos só nessa faixa são de R$ 3,94 bilhões anuais, para atender 8,1 milhões de crianças e jovens. No programa Bolsa-Família, diz a ONG Contas Abertas (17/1), as aplicações já chegam a R$ 21,2 bilhões/ano, 15,3% mais que no ano anterior, para atender 13,9 milhões de famílias com renda per capita entre R$ 70 e R$ 140 ou que vivem em extrema pobreza (renda per capita até R$ 70). Só estas últimas incluem 16 milhões de pessoas. Mas temos também motivos para grande preocupação com a pobreza extrema e com o fato de cerca de 40 milhões de pessoas, ao todo, ainda dependerem das transferências de renda.

O cenário da renda real dos trabalhadores no Brasil tem melhorado, chegou em novembro à média de R$ 1.809,60 mensais, fora gratificações e 13.º salário, segundo o IBGE (Agência Estado, 22/12). E aumentou o número de postos formais de trabalho - mais 5,3% -, como aumentou em 2,7% a média salarial no País. Mas, alerta a Fundação Getúlio Vargas, o panorama pode ser mais difícil este ano. E ainda resta muito a resolver. Mais de 1 milhão de casas no Brasil não dispõem de energia elétrica, segundo a Aneel (Folha de S.Paulo, 26/12/2012).

Como observou Roldão Arruda neste jornal (16/1), houve avanços expressivos na comparação entre o consumo dos 10% mais ricos e dos 10% mais pobres no Brasil, observados os números do IBGE. Mas esses avanços não se devem aos programas sociais, e sim a fatores relacionados com os ganhos reais no salário mínimo e no próprio mercado de trabalho em geral. De qualquer forma, as regiões mais beneficiadas foram as mais ricas do País. E em 9 de 10 empregos novos a remuneração é inferior a três salários mínimos mensais. No quadro geral de ocupações, 50% dos trabalhadores não têm direitos trabalhistas nem à Previdência.

Os programas sociais são muito importantes, mas não chegam a alterar decisivamente as desigualdades. Seria necessária também uma reforma no campo tributário que reduzisse os impostos indiretos - que afetam todas as pessoas - e aumentasse os diretos, como o Imposto de Renda, para cobrar mais das maiores rendas.

E há novas nuvens no horizonte. Como relata neste jornal (22/1) o correspondente Jamil Chade, o número de pessoas sem trabalho no Brasil aumentará em 500 mil e chegará este ano a 6,9 milhões. Em 2014 serão mais de 7 milhões. A taxa de desemprego (6,3% no final de 2012) será de 6,5% em 2013, prevê a Organização Internacional do Trabalho (OIT), para a qual, "depois de atingir os países ricos nos últimos anos, a crise agora chegará aos emergentes". O desemprego subirá nos próximos cinco anos. É provável que as cifras brasileiras incluam pessoas que recebem Bolsa-Família. Mas são preocupantes.

Como observa José de Souza Martins (Estado, 9/9/12), não podemos esquecer que os "aglomerados urbanos subnormais", segundo o IBGE, ainda eram em 2010 nada menos que 323, nos 5.565 municípios, com 6% da população total do País; 88,6% deles estavam em 20 regiões metropolitanas; 49,8%, predominantemente em favelas, no Sudeste; um terço na Região Metropolitana de São Paulo - onde mais de 2 milhões de pessoas estão nesses aglomerados. Em Belém, 62,5% da população vive nessas condições. Na cidade de São Paulo, 500,6 mil famílias têm renda per capita até R$ 140 (Estado, 18/12) e, destas, 226,6 mil recebem Bolsa-Família. No Nordeste são 7 milhões de famílias.

É preciso, então, reconhecer que os programas sociais e de complementação de renda, que vêm desde antes dos governos FHC e Lula e se foram ampliando, têm tido uma atuação relevante, reduzido a pobreza extrema, melhorado as condições de vida das populações. Mas há muito ainda a fazer.

Uma carta de São Pedro - ROBERTO PEREIRA D'ARAÚJO

VALOR ECONÔMICO - 25/01
Caro povo do Brasil: meu nome é Pedro. Vocês certamente me conhecem, pois fui um dos apóstolos de Jesus e o primeiro Papa. Dizem que sou santo, mas, eu mesmo não tinha certeza disso. Ultimamente meus colegas, alguns mais santos do que eu, andam dizendo que eu mereço o "posto" pela paciência infinita que tenho ao aturar as acusações das autoridades do setor elétrico brasileiro sobre falta de chuva. Aliás, nem sei por que recebi essa responsabilidade e não entendo essas rezas dirigidas para que eu faça chover ou parar de chover aqui e acolá. Não tenho esse controle fino que eles imaginam. A minha área de atuação é probabilística.

Vocês são bem grandinhos para saber que esse seu pedaço de planeta fica em área tropical, onde o clima é bastante imprevisível. Apesar dessas incertezas, vocês têm riquezas naturais que muitas outras áreas da Terra não dispõem. Se, com tudo o que têm ai, vocês não conseguem construir um sistema que gere eletricidade de forma confiável e barata, então vocês devem estar fazendo tudo errado.

Aliás, andei conversando com um grupo de famosos cuja opinião vocês devem considerar. Os doutores Ampére, Hertz, Faraday, Maxwell, Edson e outros opinaram sobre o caso. Todos foram unânimes em dizer que ficaram preocupados como vocês complicaram e encareceram um sistema relativamente simples. Afinal, essa é uma tecnologia do início do seu século passado. Já Benjamim Franklin não entendeu possíveis risadas dirigidas aos raios que ele tanto estudou. Ele acha que o assunto é sério.

Mas, voltando ao tema desta carta, parem de me culpar por possíveis racionamentos que vocês mesmo provocam! Afinal, um lugarzinho chamado Noruega tem a eletricidade produzida 100% por rios e, além de ser bem mais barata, não passa a penúria que vocês se impõem, de vez em quando. Eu nem precisaria me resguardar das acusações, mas, como sou santo, vou apresentar uns dados para que vocês se convençam da minha inocência.

Como a tarifa de energia é tão alta se quase todos kWh vem da água? Nem santo entende esse modelo

As chuvas, que vocês candidamente acham que eu controlo, alimentam os rios e fornecem a energia natural para que as usinas produzam os quilowatts que vocês necessitam. Portanto, é bom cuidarem das matas ciliares e darem mais importância ao aquecimento global, porque essa energia será fortemente afetada. O que pode ocorrer é uma maior frequência de secas e enchentes, uma péssima situação para seu sistema.

Em média, com suas usinas de 2012, eu geralmente entrego por volta de 500 TWh na soma das quatro regiões. Nada mal se comparado ao consumo de 513 TWh de vocês. Afinal, vocês têm outras fontes de energia.

Em 2012, ao contrário do que as autoridades do seu governo dizem, por motivos que não posso controlar, só entreguei 436 TWh, 13% abaixo da média. Pelas rezas que recebo, até parece uma grande desgraça, mas valores nesse entorno já ocorreram em mais de 10% dos anos que constam nos seus registros.

Se vocês estão arquivando os dados, podem verificar que em 5% dos anos a energia natural esteve 30% abaixo da média! Isso sim é que é problema! Portanto, não aceito reclamações sobre 2012! Se eu, mesmo sendo santo, não posso saber o que virá em 2013, não entendo como é que autoridades garantem que não haverá problemas. Se até consultores de confiança do seu governo afirmam que o risco de racionamento não é nulo, é bom tomar cuidado com as promessas.

Para os que ainda acham que sou o culpado, saibam que apenas 36% do histórico da energia dos rios ficaram abaixo da média, ou seja, 64% estão na média ou acima! A distribuição é assimétrica. E mais: de cada cinco anos, um tem água igual ou maior que 20% da média! Quando isso ocorre, acho que nem posso dizer que fui eu, pois, pelo menos energeticamente, é uma dádiva de Deus. A pergunta que tenho é: Quem está se aproveitando dessas "dádivas"? Como é que vocês democratizam essa energia extra?

Mas, continuando minha defesa, como foram as minhas últimas "entregas" em relação à média? Antes dos 87% de 2012 que vocês tanto reclamam, vejam: em 2011 - 119%; em 2010 - a média; em 2009 - 117%; em 2008 - 97%; em 2007 -104%; em 2006 - 94%; em 2005 -108% e em 2004 - 108%. Ora, não venham me dizer que não conseguiram "guardar" alguma água que sobra de um ano para o outro, porque, daqui de cima estou vendo que os reservatórios não estão enchendo completamente. Portanto, algum espaço para guardar água ainda resta.

Eu nem deveria me intrometer para assessorar, mas, como sou santo, talvez vocês estejam sendo perdulários com a água estocada. A geração das hidráulicas (pouco mais de 70% das usinas), sempre muito alta, está muito estranha.

A maior fonte de energia são as hidráulicas? Claro! Elas são mais baratas, e parte dessa energia é da substituição pelas térmicas, que ficam como seguro. Mas, como é feita essa "transferência"? Quem pode "comprar" energia na "safra"? Como a tarifa é tão alta se quase todos quilowatts vêm da água? Nem santo entende esse modelo!

Há alguns anjos que estão por aqui desde o início dos tempos. Eles me contaram que, durante a criação do mundo, alertaram ao criador que esse pedaço da Terra que iria se chamar Brasil "largaria" com uma enorme vantagem depois da descoberta do eletromagnetismo.

- Senhor, a abundância hídrica e a diversidade hidrológica irão trazer uma enorme vantagem a esse povo. É uma injustiça com as outras nações que surgirão. Ao que o Criador, com um sorriso enigmático, retrucou: - É, mas vocês vão ver os modelos que eles vão adotar lá....

Queiram-me bem

Simão, mais conhecido como S. Pedro 


A disputa pelos lotes urbanos - MELHIM NAMEM CHALHUB

O GLOBO - 25/01


Em tempos de polêmica sobre ativismo do Judiciário versus imobilismo do Legislativo, é oportuno lembrar que o Supremo Tribunal Federal decidirá proximamente questão suscitada pelo Ministério Público do Distrito Federal sobre a legislação municipal relativa à implantação de condomínios de lotes de terreno.

Questiona-se a obrigatoriedade, ou não, de a matéria ser regulada pelo plano diretor da cidade. Pouco importando o desfecho da demanda, o que interessa é que lei federal estabeleça as diretrizes gerais a serem seguidas pelos municípios. Projeto existe, e já tramita na Câmara há mais de uma década.

Para se avaliar a gravidade do problema, relembre-se que o isolamento de conjuntos imobiliários surgiu em meados do século passado, apelidado de "loteamento fechado” e seu propósito é suprir a deficiência de serviços públicos; por essa forma, os moradores cercam a área, assumem os serviços de limpeza, conservação e segurança.

A prática é irregular, cria guetos que obstruem o fluxo viário, asfixia a cidade e é fator de aumento da desordem urbana. Além disso, estimula o litígio entre vizinhos e abarrota o Judiciário com demandas relativas à cobrança de contribuições. São tão graves esses problemas que o Supremo Tribunal Federal qualificou a questão como matéria de repercussão geral, isto significando que os efeitos do processo judicial extrapolam o interesse das partes litigantes e atingem toda a sociedade.

A desordem resultante dessa prática é de tal magnitude que reclama urgente proibição do "fechamento” de loteamentos e a pronta regulamentação da implantação de condomínios de lotes, pois esta é a alternativa legalmente adequada ao "fechamento”

É que na estrutura do loteamento, as ruas e demais áreas são de domínio público e, assim, os donos dos lotes são proibidos de se apropriar delas, não podendo também impedir o acesso dos cidadãos em geral — enquanto na estrutura legal do condomínio, diferentemente, as vias de circulação e outras áreas internas são de propriedade dos titulares de lotes, que, sendo proprietários dessas áreas, têm o direito exclusivo de fruição desses espaços e poder de impedir o acesso de estranhos; além disso, são obrigados por lei a pagar os custos de conservação, segurança etc.

Algumas administrações municipais já vêm processando essa adaptação, mas de maneira errática e assimétrica, circunstância que recomenda seja a matéria sistematizada em lei federal que estabeleça critérios gerais para todo o país, com as travas necessárias à preservação ambiental e os critérios de articulação entre os condomínios e a estrutura do bairro e da cidade, entre outros requisitos que assegurem a realização das funções urbanas.

Ante a gravidade do problema, o que se espera é que o Congresso Nacional se ponha em movimento e regulamente esta matéria com urgência, até mesmo para que um eventual imobilismo não dê causa a mais um episódio de ativismo judicial.

Qual política comercial? - JOSÉ BOTAFOGO GONÇALVES

O ESTADÃO - 25/01


Aparentemente, o governo brasileiro decidiu sair de sua plurianual apatia no campo dos acordos internacionais de comércio e retomar negociações com a União Europeia (UE) visando a firmar um amplo acordo de livre-comércio a ser concluído até 31/12, quando cai automaticamente, sem chances de renovação, o Sistema Geral de Preferências com a Europa. Por outro lado, o Itamaraty está examinando a conveniência, ou não, de negociar um acordo de comércio com o Canadá.

Se, de um lado, essas iniciativas parecem indicar a retomada de uma política comercial mais ativa e atual, com o objetivo de fazer face à perda de dinamismo e competitividade do comércio exterior brasileiro, por outro, seja na Presidência, no Itamaraty ou no Ministério da Fazenda, o governo vem adotando medidas no campo diplomático e da política industrial que sinalizam orientações ou contrárias ou inconsistentes com um eventual acordo de livre-comércio com a UE.

No campo setorial, há um ressurgimento da política de "compre brasileiro" imposta às grandes empresas nacionais do tipo Petrobrás e Vale. O Brasil não é o único país que busca favorecer o fornecedor nacional nas compras governamentais ou nas compras de grandes empresas privadas, como a Vale. Mas há uma diferença entre as políticas americana ou chinesa de "compre nacional" e a brasileira. Se aquelas buscam conciliar o fornecimento do mercado interno com a competitividade internacional do produto, os simplórios mecanismos adotados pelo Brasil só fazem reduzir drasticamente a competitividade da empresa em razão do aumento de custo na montagem da cadeia produtiva.

Não responsabilizemos só os governantes pelo mau uso de certos instrumentos da política industrial. Com frequência, associações empresariais privadas fazem lobby no governo para serem beneficiadas com políticas protecionistas de reserva de mercado nacional, seja por meio de isenções ou reduções tributárias, seja pelo aumento das alíquotas dos impostos de importação. O caso mais conspícuo é o do setor automotivo, em que governo e privados buscam obsessivamente nacionalizar a cadeia produtiva via mecanismo de conteúdo local. O resultado está à vista: o Brasil é o quarto maior produtor de veículos de quatro rodas, mas só consegue exportar para o Mercosul e o México, além de não dispensar uma proteção tarifária mínima de 35% e suportar uma carga tributária sobre o preço do veículo de ordem superior a 60%!

No campo financeiro, o intenso uso de recursos do BNDES, com juros favorecidos, em projetos selecionados administrativamente parece indicar a ressurreição do princípio de intervenção desenvolvimentista do setor público ante o exame mais neutro das demandas e ofertas de mercado internacional de investimentos diretos produtivos.

No campo diplomático, o País, embora contrariado, parece "conformar-se" com as tendências centrífugas das políticas comerciais e econômicas dos vizinhos andinos, que acabaram de acordar com o México a criação do Arco do Pacífico. Em vez de buscar atrair Chile, Peru e Colômbia a integrarem suas economias à poderosa e emergente economia brasileira, preferiu o governo manifestar seu descontentamento com o Arco do Pacífico pelo alargamento horizontal do Mercosul com a programada incorporação da Venezuela, da Bolívia e, parece, em breve, do Equador.

Curiosamente, os novos sócios do Mercosul têm primado pelo silêncio sobre seus objetivos de incorporar-se ao bloco. Com exceção dos discursos de caráter político, as autoridades venezuelanas e bolivianas nada disseram, em público, de sua disposição de integrar suas economias às dos sócios fundadores do bloco. Ao contrário, os objetivos econômicos do bolivariano socialismo do século 21, bem como a política de ressurreição da Bolívia pré-colombiana indigenista, não são, nem na letra nem no espírito, compatíveis com o articulado fundacional do Tratado de Assunção.

Não é preciso entrar no mérito das aspirações bolivarianas e indigenistas. Basta salientar que elas são inconsistentes e contraditórias com os compromissos do Tratado de Assunção. Desde que ele foi firmado, em 1991, o mundo econômico mudou e a América do Sul, ainda mais, política e economicamente. Brasil, Uruguai, Paraguai, Chile, Peru e Colômbia adotam como modelo de desenvolvimento o equilíbrio macroeconômico com inclusão social e, em graus diversos, abertura da economia à concorrência externa. Argentina, Bolívia, Equador e Venezuela parecem coincidir na escolha de um modelo em que a inclusão social é conseguida pela adoção de políticas populistas e dispendiosas, a médio e longo prazos não sustentáveis num quadro político em que o "caudilhismo" latino-americano, tão em moda nos séculos 19 e 20, parece ressurgir com roupagem "formalmente democrática". Não será o caso de revistar as premissas político-comerciais que levavam o Brasil a liderar o projeto de integração regional a quatro e pensar, agora, num modelo de integração a sete, com incorporação de três novos sócios andinos? A partir de abril o Paraguai deve voltar ao Mercosul. Seu Parlamento não deu sinais de que mudará de posição sobre a entrada da Venezuela no clube. Em algum momento, o Parlamento brasileiro deverá pronunciar-se pela entrada da Bolívia.

No campo das relações bilaterais, o governo brasileiro tem sabido manter a calma nas complicadas negociações comerciais com a Argentina. Porém é evidente que esse país, pressionado por uma crise cambial sem perspectiva de solução, decidiu abandonar os princípios de livre-comércio que regiam as relações com o Brasil para adotar o sistema de administração pública do comércio, buscando, com métodos antiquados e personalistas, garantir saldos na balança comercial não só com o nosso país, mas com o resto do mundo.

Em resumo, a intenção de negociar um acordo de livre-comércio com a UE se choca de frente com essa multiplicidade de iniciativas políticas e decisões diplomáticas. Como diz o povo, não dá para assobiar e chupar cana ao mesmo tempo. O governo brasileiro tem pouco tempo para decidir que caminho deve tomar.

Mensalão, o musical - NELSON MOTTA

O GLOBO - 25/01


Políticos com ternos brilhantes, gravatas medonhas e cabelos acaju invadem a cena cantando para Lula e Jefferson: "Ei você aí/me dá um dinheiro aí/me dá um dinheiro aí"



Com grandes espetáculos, cenários luxuosos, elencos competentes e salas lotadas em longas temporadas, os musicais se tornaram o sucesso do momento no teatro brasileiro. Em tese, qualquer tema pode inspirar um musical, bastam boas musicas e letras e uma historinha para costurar tudo. Até o mensalão daria um musical.

A abertura seria a cena verídica, relatada por José Casado, do encontro de Lula e Zé Dirceu com Roberto Jefferson para celebrar o acordo do PT com o PTB. Com bons vinhos e largos sorrisos, eles chegam para o jantar festivo na casa de Jefferson. Depois do lauto repasto, dos risos e das garrafas vazias, passam à biblioteca para o café, conhaque e charutos.

Desabado no sofá vermelho, com o olhar já meio turvo, Lula é surpreendido por Jefferson, que começa a cantar acompanhado ao piano por sua professora de canto lirico:

" Eu sei que vou te amar/ por toda a minha vida eu vou te amar/ Em cada despedida eu vou te amar/ desesperadamente eu sei que vou te amar …"

Os convidados emudecem, a voz do baritono ressoa na sala, com gestos largos e interpretação grandiosa, olho no olho de Lula, Jefferson canta a música inteira com intensa emoção e termina com a voz embargada, enquanto uma lágrima furtiva rola pela face de Lula.

Trinta politicos de vários partidos, com ternos brilhantes, gravatas medonhas e cabelos acaju, invadem a cena cantando e dançando para Lula e Jefferson: "Ei voce voce aí/ me dá um dinheiro aí/ me dá um dinheiro aí".

Segue dueto de Jefferson e Zé Dirceu em "Vou festejar":

Jefferson: "Chora, não vou ligar/ chegou a hora/ vais me pagar/ pode chorar, pode chorar."

Dirceu: "É o teu castigo/ brigou comigo/ Sem ter por quê".

Jefferson: "Eu vou festejar/ vou festejar/ o teu sofrer/ o teu penar.

Os dois juntos: "Voce pagou com traição/ a quem sempre lhe deu a mão." (bis)

Dirceu canta "Segredo", de Herivelto Martins, para Jefferson: "Teu mal é comentar o passado/ ninguem precisa saber do que houve entre nós dois/ o peixe é pro fundo das redes/ segredo é pra quatro paredes/ primeiro é preciso julgar pra depois condenar."

Joaquim Barbosa bate o martelo. Black out.

Não darás falso testemunho - KÁTIA ABREU

FOLHA DE SP - 25/01


Não é verdade que despejei um pequeno agricultor. Tratava-se de grileiro, cuja crônica de maldades qualquer morador da região atestará


Li, com surpresa, nesta Folha, um texto rancoroso e eivado de fúria acusatória e caluniosa ("Apreensão no campo", em 23/1), assinado pelo bispo emérito de Goiás Velho, dom Tomás Balduino, atribuindo-me pecados que não cometi.

Como católica praticante, jamais imaginei um dia polemizar com um representante da mais alta hierarquia da fé que professo. Mas a fé que professo não parece ser a mesma que a dele. As palavras que me dirigiu não foram de um cristão.

Minha fé não é a do ódio revolucionário, que incita o conflito e trata como pecadores os que dele divergem ideologicamente. É a fé que o papa Bento 16, em seu livro "Jesus de Nazaré, da Entrada em Jerusalém à Ressurreição", proclama como sendo a da paz.

"A violência", diz o papa, "não instaura o Reino de Deus, o Reino da Humanidade. É, ao contrário, instrumento preferido do Anticristo. Mesmo com motivação religiosa idealista, ela não serve à humanidade, mas à inumanidade".

Não há mistura mais letal que a da política com a religião. O fundamentalismo é, em si, antirreligioso. Os católicos da Irlanda, em nome de sua fé -que seguramente não é a de Cristo-, usaram o terrorismo e o sangue de inocentes como arma política, em nome de Alguém que resumiu sua doutrina numa frase: "Amai-vos uns aos outros".

Minha mais remota lembrança de dom Tomás é diametralmente oposta ao espírito de seu artigo. Remonta a um tempo anterior à criação do meu Tocantins, então integrado a Goiás.

Ele, ainda padre, ensinava, num Sermão das Sete Palavras, na Sexta-Feira da Paixão, que Jesus, ao pedir ao Pai que perdoasse seus algozes, "pois não sabiam o que faziam", mostrava a importância de interceder não só pelos amigos, mas sobretudo pelos inimigos.

Ao que parece, algo mudou na transição de padre Tomás para o bispo dom Balduino. Invoco, pois, o espírito cristão do padre para responder ao bispo, com absoluta serenidade, as imputações que me faz -a mim e a meus irmãos Luiz Alfredo e André Luiz. Mesmo perdoando-o desde já, cumpro o dever de desmenti-lo.

Não é verdade, dom Balduino, que tenha perseguido, despejado e feito perseguir "por 15 policiais armados" um pequeno agricultor em Campos Lindos, Tocantins. Tratava-se do grileiro Juarez Vieira, cuja crônica de violências e maldades qualquer morador da região atestará. Obtive na Justiça reintegração de posse de terra de minha propriedade legítima.

Não é verdade também que a tenha recebido de "mão beijada". Adquiri-a em moeda corrente e a preço justo, como os demais fazendeiros. Era área inóspita e desabitada; hoje, é a internacionalmente conhecida região do Mapito, referência de produtividade em soja, milho e algodão, com infraestrutura bancada pelos produtores pioneiros.

Outra injúria atinge meus dois irmãos. O bispo acusa Luiz Alfredo de grilagem e André Luiz, de promover trabalho escravo. Mas Alfredo adquiriu com recursos próprios as terras que possui, devidamente documentadas. E André jamais foi proprietário da fazenda citada pelo bispo.

Apenas alugou dois tratores, sem os tratoristas, para o proprietário, nada tendo a ver com as denúncias, que não o envolveram. É, inclusive, funcionário do Ministério Público do Trabalho, onde jamais foi questionado.

Esclareço também que não sou responsável pela decisão da Advocacia-Geral da União de estender as condicionantes da demarcação de Raposa Serra do Sol às demais terras indígenas. Foi o Supremo Tribunal Federal que assim o determinou.

Sem seu grau de santidade e sabedoria, não lhe devolvo as insolências. E se for o caso de terminar com uma citação, tomo, com respeito, a palavra do Senhor, no Antigo Testamento: "Não darás falso testemunho contra o seu próximo" (Êxodo, 20, 16).