quinta-feira, setembro 05, 2013

Instinto de sobrevivência - EDITORIAL O GLOBO

O GLOBO - 05/09


Congresso deve reduzir a amplitude da medida para evitar retaliações


Ocorreram fatos extraordinários na Câmara — dois, em seis dias. Primeiro, a execrável manutenção do mandato do presidiário Natan Donadon, eleito por Rondônia, e depois condenado à prisão, em instância final, pelo Supremo, por roubo e formação de quadrilha. Em seguida, na noite de terça, por unanimidade — algo poucas vezes visto —, a Casa deu aprovação final à proposta da emenda do fim do voto secreto no Congresso. Portanto, com o apoio daqueles mesmos que se valeram do biombo do voto sigiloso para exercitar o espírito de compadrio que permeia a Casa, e manter o mandato de Donadon, decisão suspensa, com acerto, pelo presidente da Câmara, Henrique Alves (PMDB-RN), num ato ainda pendente de decisão judicial.

A democracia representativa não pode, nem deve, se distanciar das ruas. O que não se confunde com “democracia direta” e outras deturpações do melhor sistema político engendrado pela Humanidade. Assim, depois de uma das mais deploráveis sessões da Câmara nos últimos tempos, a Casa soube aproveitar o momento e responder à exasperação com o caso Donadon, apressando a votação do fim do voto secreto, uma antiga reivindicação de quem se preocupa com o fortalecimento do Legislativo.

Enviada ao Senado, a PEC precisará ser aperfeiçoada, para limitar a revogação do voto secreto. Afinal, ele se justifica em casos nos quais o parlamentar precisa ser protegido de retaliações, principalmente do poderoso Executivo. Faz sentido que vetos presidenciais sejam avaliados sob a proteção do voto secreto, por exemplo. Assim como a confirmação de indicados a altos postos na burocracia do Estado, incluindo a Justiça.

Sintomático que, em 1969, depois do endurecimento do regime militar, um ano antes, com a edição do AI-5, a ditadura tenha forçado o Congresso a aprovar emenda para que os vetos presidenciais fossem avaliados em votação nominal. A proteção do sigilo só retornaria na Carta promulgada em 1988, na redemocratização.

É essencial que o Senado trabalhe sobre a emenda aprovada na Câmara com a urgência que o assunto merece. Na Casa, já existe emenda aprovada com a revogação limitada do voto secreto. Uma alternativa seria seu envio à Câmara. Ontem, porém, surgiu a possibilidade de o projeto dos deputados ser “fatiado”, para que a medida referente a cassações seja logo referendada, enquanto o restante tramitaria normalmente. Sem se esquecer de outros projetos apropriados para este momento de reformas sobre temas presentes nas manifestações. Como a cassação automática de político condenado pelo Supremo, determinada por emenda do senador Jarbas Vasconcelos.

O fim do voto secreto em decisões como a de cassação de mandato significa dar a quem precisa ter, o eleitor, o poder de acompanhar o trabalho no campo da ética daquele a quem ele concedeu a primazia do voto. Vai melhorar a legitimidade dos mandatos.

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