terça-feira, fevereiro 05, 2013

Malditos preços, benditos preços - ILAN GOLDFAJN

O GLOBO - 05/02

Reduzir os encargos da folha de pagamentos pode aliviar empresas, mas não altera a falta de oferta e a necessidade de maior produtividade da mão de obra


Os preços atraem muita emoção quando se mexem. É natural, alguns ganham e outros perdem. Mas os preços fazem parte do funcionamento das economias. A tentação dos governos é a de mantê-los sob mira curta, certamente para combater a inflação e evitar excessos derivados de monopólios, mas, em alguns casos, para tentar influenciar os rumos da economia.

Os preços têm um papel público. Sinalizam quando sobra ou falta. Um preço subindo pode não ser apenas sinal de injustiça ou inflação, mas de escassez ou ineficiência que mereça atenção. A liberdade dos preços traz a transparência necessária para ajudar na correção de rumos, muitas vezes de forma natural, quando os preços sobem para reduzir o consumo e aumentar a oferta (ou vice- versa).

Um exemplo clássico é o preço da gasolina. Muitos países têm regras para determiná-lo. Mas, se o preço da gasolina se afasta da cotação internacional por muito tempo, acaba gerando distorções. O consumo não se adapta ao preço internacional mais alto (relacionado ao que pode ser importado ou exportado). E quem vai ofertar não tem o sinal do preço correto para decidir quanto investe na produção. No limite, as estatais podem ser obrigadas a importar mais caro do que vendem no mercado doméstico, o que pode levar a prejuízos importantes.

Prejuízos alteram outro preço significativo da economia: as ações de empresas. Quedas sistemáticas e relevantes das ações refletem mudança do valor das empresas, um sinal de alerta importante. É necessário avaliar o que está gerando a destruição de valor e, caso necessário, realizar mudanças fundamentais.

Os juros básicos da economia determinados pelo Banco Central são também um preço importante da economia. Quando os juros sobem, normalmente é sinal de pressões inflacionárias e ciclo de atividade em alta. Quando caem, o inverso, inflação recuando e/ou atividade fraca. O Banco Central faz bem em insistir que os ciclos ainda não foram abolidos no Brasil, sinalizando que os juros podem eventualmente subir ou descer, apesar da mensagem básica de que devem ficar no atual patamar por um tempo prolongado.

Outro preço importante é a taxa de câmbio, que reflete o valor dos nossos bens relativos aos preços internacionais (ou comercializáveis, aqueles determinados no mercado internacional). No curto prazo, o câmbio pode ser determinado pelo governo, tanto mais quanto mais reservas tiver e mais controles de capitais introduzir. No longo prazo, o câmbio vai ser aquele que equilibrar as necessidades da economia. Uma taxa de câmbio mais depreciada do que o equilíbrio de longo prazo vai acabar gerando uma inflação corretiva, devolvendo o valor do câmbio real ao seu equilíbrio.

O salário é o preço do trabalho na economia. Reflete o excesso ou escassez de mão de obra na economia. Nos últimos anos, tem subido acima da inflação, refletindo crescimento maior da demanda que da oferta. A demanda tem aumentado devido ao crescimento mais forte dos setores intensivos em mão de obra, enquanto a oferta tem sido afetada por um crescimento mais lento da força de trabalho. Reduzir os encargos da folha de pagamentos pode aliviar empresas individuais, mas não altera a falta de oferta e a necessidade de maior produtividade da mão de obra. A competitividade da economia depende de a produtividade crescer acima (ou na proporção) do aumento dos salários.

Finalmente, os preços da energia também variam. Quando há sobra (falta) de energia, esta é vendida no mercado livre a preços menores (maiores). Com os reservatórios mais baixos no final do ano, os preços no mercado livre subiram, sinalizando oferta menor. Da mesma forma, quando as termoelétricas mais caras são ligadas, geralmente em momentos de escassez, preços maiores acabam sendo repassados ao consumidor. Esse aumento é necessário para o consumidor agir e economizar o necessário.

Os preços nos ajudam a identificar escassez e ineficiências e desenhar políticas para correção de rumos. Muitas vezes há exageros. A regulação dos mercados é fundamental. Mas não podemos dispensar o sistema de preços como um guia importante do que acontece na economia. É necessário observar os preços da economia para sinalizar escassez, excessos ou ineficiências e tomar medidas fundamentais para corrigir os problemas. Sem isso, o risco é de gerar distorções na economia maiores do que qualquer flutuação excessiva de preços pudesse ter ocasionado.

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