sábado, setembro 22, 2012
LD, LP, CD, DVD, Tropicália - MARCELO RUBENS PAIVA
O Estado de S.Paulo - 22/09
Um dos maiores fracassos comerciais da indústria de entretenimento foi o LD (laserdisk). Lembrava um LP espelhado, com cara de elemento de cena de 2001 - Uma Odisseia no Espaço. Anunciava-se o futuro. E era caríssimo, apesar do padrão analógico. Nem chegou a ter distribuidor oficial no Brasil. Só os amigos com grana e passaporte em dia tinham e se gabavam. O primeiro título saiu nos Estados Unidos em 1978: Tubarão, de Spielberg, o Midas da nerdocracia. Em 2000 pararam de sair filmes em LD. Há três anos a Pioneer, detentora da patente, tirou os reprodutores da linha de produção.
O DVD, digital, com mais definição e um quarto do tamanho, na mesma forma dos já bem-sucedidos e responsáveis pela transformação da indústria, os CDs, foi o responsável. Os apressados não podem nem se vangloriar de que ver um filme em LD é "infinitamente" superior do que em DVD ou Blu-ray. Ele tem uma definição maior apenas do que as antigas fitas em VHS. Mas existem dúvidas entre a experiência de ouvir músicas num LP, analógico, e CD, digital. Para os entendedores, foi um assalto da indústria aos nossos ouvidos.
O CD retira amostragens pontuais da onda sonora de alta e baixa frequência, o que empobrece o som, embola, fatia a curva sonora, junta pedaços, perdem-se nuances, o extremo do agudo e do grave se misturam a outros instrumentos com sonoridades semelhantes. A música é "resumida" para liberar espaço. Faixas abaixo de 25 Hz e acima de 16 kHz são dispensadas.
Enquanto um LP reproduz a gama total da curva, o CD elimina frequências que teoricamente não ouvimos, mas, sim, estão lá e encorpam a música, tornando-a mais próxima da realidade; ou, como se dizia, com alta-fidelidade. Tem os riscos, os pulos, a poeira que se acumula na agulha, o esbarrão que arranha a superfície do vinil e termina com a música, o tamanho, o espaço para se guardarem dezenas ou centenas de discos. Foi por isso que você, como eu e a maioria, trocou LPs por CDs.
***
Me senti aliviado quando um primo distante comprou minha coleção de três décadas que começou com Joe Cocker. Você também se lembra do primeiro disco que comprou na vida? Levou tudo e ainda me deu 500 contos, calculado randomicamente. Deu para comprar uns 20 CDs. Hoje vejo colecionadores atrás de discos que já tive, que muitos tiveram, e que desprezei como estorvos que atrapalhavam a circulação da casa. Como uma estátua de anão. Ou uma coluna de gesso na sala.
Aquele Dave Brubeck, Pink Floyd, Bill Evans, Led Zeppelin, Beatles, Stones, The Cure, a caixa tripla de Sandinista, do Clash, aquelas maravilhas de desenhistas e designers modernos, com seus encartes e jogos de imagem e mensagens cifradas, como Physical Graffiti ou Sticky Fingers, o disco da língua, que causavam ilusão de ótica, viraram um bagulho de plástico que quebra com facilidade. Abandonamos nossos preciosos brinquedos.
O tempo passou e limitaram mais ainda nossa capacidade auditiva. Educamos nossos ouvidos com fones primários, minúsculos, e com arquivos, não mais músicas, em MP3, FLAC, WAV e AAC de 3 MB ou ripados, sequências de zeros e uns que unidas conseguem a proeza de imprimir maravilhas num disco compacto, chip, memória, nas nuvens. Espaço é a lei, não a qualidade. Herança de uma sociedade que aceita e muitas vezes prefere o simulacro, para pagar menos.
Todas as noites praguejo contra meu primo que pensei que me fizera um favor. E me pergunto onde está aquele aterrorizante Tubular Bells, de Mike Oldfield, cujo baixo controla o andamento que cresce e se repete- como em Bolero de Ravel -, em que, em cada lado, havia uma faixa apenas, trilha do filme O Exorcista, que em CD ficou seco, e se as novas gerações entendem quando dizemos que muitas vezes preferimos o "lado B" das coisas.
***
Alguns clássicos ainda são remasterizados e relançados em vinil, como Transa do Caetano, destaque nas megalivrarias - quase não existem mais lojas de discos. Confesso que se eu reiniciasse minha coleção, começaria por ele.
Duas músicas eram reproduzidas como hinos de repúblicas estudantis no final dos anos 1970, que sabíamos de cor e cantávamos nos entorpecendo, bebendo, cada um com um instrumento: Back in Bahia, de Gil, em que se aumentava no refrão "hoje eu me sinto como se ter ido fosse necessário para voltar, tanto mais vivo de vida mais vivida, dívidas e dúvidas pra lá e pra cá", e It's a Long Way, do disco que não saía das vitrolas da nova esquerda, Transa, libelo juvenil tão urgente quanto Love Will Tear Us Apart (Joy Division) e Smell Like Teen Spirit (Nirvana).
A esquerda de dez anos antes não entendia "nada, nada!". Caetano e Gil, sim, mudaram a nossa cabeça para sempre. Tudo o que queríamos era cantar com os amigos numa jam desafinada: "Hey brothers, say brothers, it's a long, long, long way, it's a long, long, long way, long, long, long, long. It's a long road". Se bem que nas repúblicas mais alternativas, ou de drogas mais pesadas, o disco Araçá Azul era o indispensável. Como numa em que morei, em que um estudante virou padre, dois morreram de HIV, outro virou professor de teatro, e eu, hum... ainda com dúvidas pra lá e pra cá.
***
"Eu não queria ir pro festival, não sou escoteiro", disse Caetano sobre o convite para tocar no Isle of Wight Festival - enquanto amargava o exílio em Londres -, no documentário do amigo Marcelo Machado, Tropicália, daqueles filmes que caras da minha idade choram e saem do cinema com um turbilhão de imagens do passado invadindo a procura do carro no estacionamento, o caminho pra casa e o sono.
Que, como Simonal - Ninguém Sabe O Duro Que Dei, Raul - O Início, o Fim e o Meio, Uma Noite em 67 e Titãs - A Vida não É Uma Festa, mostra a força desse gênero que, definitivamente, aprendemos a fazer. Especialmente com a aliança do que temos de melhor, a música.
Numa das imagens, Tropicália resgata os brasileiros subindo timidamente no palco do festival em que tocaram Joe Cocker, The Who, Bob Dylan, Jimi Hendrix, Chicago, The Doors, The Who, Miles Davis, enquanto o locutor informava para centenas de milhares: "Vamos dar boas-vindas a um grupo de artistas brasileiros que não pode se exibir no seu país por motivos políticos".
Mal sabiam que era "o" grupo de artistas brasileiros que malandramente sintetizava todos eles e vomitava de volta com temperos de forró, bossa nova, samba, batidas de macumba, maxixe, maracatu, fado, frevo, xote, repente.
Feitiço da fila - CLÁUDIA LAITANO
ZERO HORA - 22/09
A fila não só anda, mas fala. Se as filas pudessem ser conservadas em âmbar, seriam como fósseis sociológicos à espera de um Indiana Jones disposto a decifrar os segredos de uma época. Diga-me por que te perfilas e te direi quem és.
Há basicamente dois tipos de fila, as compulsórias e as eletivas. A compulsória é aquela que sequestra o tempo e a disposição da vítima: fila para ser atendido no hospital, fila para matricular o filho na escola, fila para receber a aposentadoria... Em situações extremas, o primeiro sinal de que a sociedade entrou em colpaso é a fila para satisfazer necessidades básicas. Quanto mais filas compulsórias uma pessoa é obrigada a enfrentar, menos desenvolvido é o lugar em que ela vive. Fila é o IDH sem estatística.
A fila eletiva é aquela que enfrentamos por nossa conta e risco de desconforto: para visitar um museu pela primeira vez, para ver o time jogar uma final, para ficar perto de um ídolo. Claro que a fila eletiva dos outros sempre pode nos parecer sem sentido, mas exatamente porque os motivos que levam algumas pessoas a enfrentar uma fila nos parecem insondáveis é que elas são tão interessantes.
Não é absurdo imaginar que algumas são retroalimentadas pelo “fetiche da fila”: se existe uma fila, e eu não estou nela, devo estar perdendo algo. Não sei se é lenda urbana ou fato, mas já ouvi dizer que algumas casas noturnas de Porto Alegre dificultam a entrada para provocar filas e atrair mais gente ainda – para a casa e para a fila. A fila na frente daqueles lugares que no pleistoceno eram chamados de “boate” sempre me comove. Apesar da roupa de festa e do cabelo arrumado, a fila do sabado à noite é quase compulsória, já que a maioria dos que estão ali – de pé, no frio, as meninas de salto alto – é movida pela universal necessidade básica de se dar bem no fíndi.
Exótica mesmo é a fila que atrai um sujeito capaz de dormir na frente de uma loja para comprar um produto que ele poderia adquirir alguns dias depois – sem fila. Devidamente registradas para a posteridade, as filas para comprar o último modelo do iPhone são o fóssil da nossa época que os estudiosos do futuro irão examinar com curiosidade e espanto.
Diante das lojas, em Nova York, na Alemanha ou Hong Kong, adultos aparentemente normais erguem o aparelhinho como se fosse o troféu de uma maratona. E de certa forma é, já que a fantasia que alimenta é a de que seus usuários poderão ultrapassar os limites do próprio corpo. Saber mais, viajar mais, comunicar-se mais, divertir-se mais. Navegar pelo cybercosmos com liberdade infinita e numa velocidade cada vez mais alucinante.
Talvez os geeks na fila do iPhone se vejam assim, como aventureiros de um novo mundo, ansiosos para expandir fronteiras em suas embarcações portáteis de última geração (até o próximo modelo) . Vistos de longe, porém, a única liberdade que os maratonistas do iPhone parecem exercer é a de escolher a marca a que decidiram ficar presos.
A fila não só anda, mas fala. Se as filas pudessem ser conservadas em âmbar, seriam como fósseis sociológicos à espera de um Indiana Jones disposto a decifrar os segredos de uma época. Diga-me por que te perfilas e te direi quem és.
Há basicamente dois tipos de fila, as compulsórias e as eletivas. A compulsória é aquela que sequestra o tempo e a disposição da vítima: fila para ser atendido no hospital, fila para matricular o filho na escola, fila para receber a aposentadoria... Em situações extremas, o primeiro sinal de que a sociedade entrou em colpaso é a fila para satisfazer necessidades básicas. Quanto mais filas compulsórias uma pessoa é obrigada a enfrentar, menos desenvolvido é o lugar em que ela vive. Fila é o IDH sem estatística.
A fila eletiva é aquela que enfrentamos por nossa conta e risco de desconforto: para visitar um museu pela primeira vez, para ver o time jogar uma final, para ficar perto de um ídolo. Claro que a fila eletiva dos outros sempre pode nos parecer sem sentido, mas exatamente porque os motivos que levam algumas pessoas a enfrentar uma fila nos parecem insondáveis é que elas são tão interessantes.
Não é absurdo imaginar que algumas são retroalimentadas pelo “fetiche da fila”: se existe uma fila, e eu não estou nela, devo estar perdendo algo. Não sei se é lenda urbana ou fato, mas já ouvi dizer que algumas casas noturnas de Porto Alegre dificultam a entrada para provocar filas e atrair mais gente ainda – para a casa e para a fila. A fila na frente daqueles lugares que no pleistoceno eram chamados de “boate” sempre me comove. Apesar da roupa de festa e do cabelo arrumado, a fila do sabado à noite é quase compulsória, já que a maioria dos que estão ali – de pé, no frio, as meninas de salto alto – é movida pela universal necessidade básica de se dar bem no fíndi.
Exótica mesmo é a fila que atrai um sujeito capaz de dormir na frente de uma loja para comprar um produto que ele poderia adquirir alguns dias depois – sem fila. Devidamente registradas para a posteridade, as filas para comprar o último modelo do iPhone são o fóssil da nossa época que os estudiosos do futuro irão examinar com curiosidade e espanto.
Diante das lojas, em Nova York, na Alemanha ou Hong Kong, adultos aparentemente normais erguem o aparelhinho como se fosse o troféu de uma maratona. E de certa forma é, já que a fantasia que alimenta é a de que seus usuários poderão ultrapassar os limites do próprio corpo. Saber mais, viajar mais, comunicar-se mais, divertir-se mais. Navegar pelo cybercosmos com liberdade infinita e numa velocidade cada vez mais alucinante.
Talvez os geeks na fila do iPhone se vejam assim, como aventureiros de um novo mundo, ansiosos para expandir fronteiras em suas embarcações portáteis de última geração (até o próximo modelo) . Vistos de longe, porém, a única liberdade que os maratonistas do iPhone parecem exercer é a de escolher a marca a que decidiram ficar presos.
Só a prova do autor não basta - SÉRGIO AUGUSTO
O ESTADÃO - 22/09
SÃO PAULO - No último 7 de setembro, o escritor Philip Roth postou na revista The New Yorker uma carta aberta à Wikipedia. A enciclopédia digital se recusara a retirar uma informação a respeito de seu romance The Human Stain (A Marca Humana, na tradução da Companhia das Letras), e ele decidiu reiterar seu pedido publicamente.
Apresentando-se com maliciosa gentileza ("Dear Wikipedia. I am Philip Roth."), o mais importante escritor americano vivo reafirmou que, diferentemente do que constava do verbete sobre o livro, o personagem Coleman Silk não fora inspirado no crítico literário Anatole Broyard (1920-1990), mas num velho amigo, Melvin Tumin, professor de sociologia da Universidade de Princeton, recebendo como resposta um respeitoso não, acompanhado de uma surpreendente explicação: a enciclopédia aceitava o argumento de que o autor é a maior autoridade sobre sua obra, mas exigia o aporte de alguma "fonte secundária".
Em miúdos: para ser atendido, Roth teria de providenciar um documento cabal, consignado em algum impresso, atestando a procedência de seu reparo. Uma confissão por escrito (e publicada) de Melvin Tumin talvez satisfizesse a exigência, mas o sociólogo mestiço que, para livrar-se do preconceito racial no mundo acadêmico americano, também fingia ser branco e judeu, morreu há quase 20 anos.
Nenhum autor tem pleno controle de sua obra, cuja ressonância lhe escapa por completo, mas seu conhecimento sobre a origem de cada um de seus personagens é total e absoluto, logo, inquestionável - e portanto isento de subsídios testemunhais. Não na Wikipedia. Broyard foi uma hipótese ventilada por três ou quatro resenhistas nova-iorquinos e acolhida pela enciclopédia não por sua inquestionável plausibilidade, mas por ter sido avalizada pelo New York Times e outras fontes secundárias, com links para as indispensáveis notas de rodapé.
A carta de Roth é longa (2.655 palavras) e adquire a envergadura de um ensaio confessional sobre a gênese de A Marca Humana, a complicada relação de Tumin com sua negritude, a pouca ou nenhuma intimidade do escritor com Broyard, os conceitos de autoridade e autoria, e o modus operandi da Wikipedia, com suas regras pétreas de seleção e edição.
A lógica por trás da desculpa dada a Roth é surrealista, se não kafkiana. De qualquer modo, ele exagerou ao pedir que removessem a especulação da mídia sobre Broyard e Coleman Silk, em vez de solicitar que apenas a desmentissem. Afinal de contas, ainda que à revelia do escritor, a figura de Broyard passou a fazer parte da "biografia" do personagem.
Esclarecer a referência, no mundo real, do protagonista de A Marca Humana é, para efeito de fruição e avaliação do romance, uma démarche irrelevante. A reputação literária de Encontro Marcado em nada se alteraria se Fernando Sabino, pouco antes de morrer, tivesse revelado que os personagens Hugo e Mauro não haviam sido inspirados em Otto Lara Resende e Hélio Pellegrino, e sim em, digamos, Paulo Mendes Campos e Murilo Rubião.
A obsessão da Wikipedia com a neutralidade e a verificabilidade é meritória, mas às vezes beira o insano. Discussões bizantinas tomam-lhe um tempo precioso. Seus administradores alemães e poloneses gastaram dois anos discutindo como a cidade de Gdansk, na Polônia, deveria ser chamada, já que entre o século 14 e o fim da 2.ª Guerra Mundial ela se chamou Danzig. Àquela altura, os historiadores tradicionais já haviam encontrado a solução mais sensata: Gdansk antes de 1308 e depois de 1945, e Danzig entre 1308 e 1945.
Por ser um mutirão de anônimos e abnegados voluntários (80% do sexo masculino), é um milagre que a Wikipedia tenha logrado tamanho padrão de qualidade. Com cerca de 23 milhões de artigos em 285 línguas, acessada por 400 milhões de internautas, tornou-se, em 11 anos, o maior depósito de conhecimento da história da humanidade. E, graças à internet, a mais útil e rapidamente atualizada ferramenta de consulta. Seus antecessores analógicos eram umas carroças. Mas era o que tínhamos.
Fui criado com a maravilhosa Britannica, que consultava a três por dois, na mais devota confiança. Para mim, a Britannica não errava nunca. Se ela afirmasse que eu já havia morrido, enfiaria dois chumaços de algodão nas narinas e me deitaria imediatamente no chão, com as mãos cruzadas sobre o peito.
Apesar do empenho e da sapiência de suas dezenas de editores full time e milhares de fiéis colaboradores, a Britannica errou inúmeras vezes: datas de nascimento (Stalin, uma delas), citações, acidentes geográficos, fórmulas matemáticas, os nomes completos de Casanova e Bill Clinton, a identidade dos verdadeiros inventores da lâmina de barbear (dois irmãos alemães, 30 anos antes de King Camp Gillette registrar a patente da sua, em 1904). Correções, só na edição seguinte, que demorava não sei quantos anos para ficar pronta e ser posta à venda. Além do mais, ocupava muito espaço e custava uma baba. Não resistiu à era digital. Ao cabo de 242 anos de vida, sua versão impressa foi desativada.
Muitos wikpédicos criticam a perspectiva "demasiado ocidental e masculina" de suas pesquisas e já propuseram uma revisão em seu esquema de referências e abonações. Se a Wikipedia, argumentam, pretende ser a soma de todo o conhecimento humano, não deveria se fiar apenas em documentos impressos, apoiando-se também em vídeos, por exemplo. Há coisas (brinquedos de crianças africanas, bebidas regionais, etc.) ainda não verbetadas porque não existem delas uma só prova documental por escrito ou acessíveis pelo Google.
Ah, sim. O caso Roth teve um final feliz. A Wikipedia incorporou o reparo do escritor ao verbete de A Marca Humana.
Eleições: O "eu" e o "nós" - KÁTIA ABREU
FOLHA DE SP - 22/09
A população aparenta estar com os olhos fechados para a política, e os candidatos parecem fingir que não são políticos
Em alguns dias, nossa população voltará às urnas para escolher prefeitos e vereadores em todo o Brasil. Olhando para trás é difícil não perceber que os episódios eleitorais estão se tornando cada vez mais rotineiros, sem a carga de drama e de tensão tão comum no passado.
Nas cidades grandes e médias, que concentram a maior parte da população urbana, os antigos antagonismos e polarizações se dissolveram e quase já não se reconhecem as identidades políticas.
Passando os olhos pelas pesquisas de opinião, não é fácil identificar tendências que permitam alguma interpretação comum dos sentimentos dos eleitores. Cada cidade parece estar tecendo a sua história, sem uma nítida conexão com a política nacional. Alguém pode dizer que isso é natural, pois o que está em jogo são questões puramente locais. Será essa a razão?
Nos tempos que antecederam o fim do regime militar e nas eleições que se seguiram à redemocratização, as disputas municipais refletiam as forças que se defrontavam no cenário nacional, e os temas das campanhas seguiam as agendas dos principais grupos políticos.
Votar no PT, no PMDB ou no PFL fazia uma diferença que ninguém abria mão de expressar. Hoje, percebo que essas diferenças estão praticamente ocultas e o tom das campanhas, por si só, não nos permite identificar o campo político do candidato.
Ao final da convenção do Partido Democrata nos Estados Unidos, na Carolina do Norte, Barack Obama afirmou, com razão, que nas eleições de novembro os norte-americanos serão chamados a escolher entre duas visões antagônicas de mundo, com consequências profundas e duradouras.
Algumas pessoas acham que essa é uma realidade negativa, que reflete uma sociedade dividida. No entanto, a política só tem sentido e utilidade quando as pessoas não conseguem, espontaneamente, chegar a um acordo sobre as questões essenciais que afetam suas existências. Ela provê os instrumentos e os processos pelos quais -por meio da discussão, da mobilização de maiorias e de recuos e compromissos- os grupos sociais vão progressivamente tecendo consensos.
Mas, para que haja política, não basta que existam apenas as instituições formais da política. É necessário que haja vida cívica, que as pessoas se disponham a conciliar seu isolamento individual com um mínimo de participação ativa, pois os bens que a política deve produzir, principalmente a liberdade e a cidadania, não são de apropriação individual e só se desfrutam coletivamente.
A poucos dias das eleições, sinto que a população das cidades está com os olhos fechados para a política. Os candidatos parecem fingir que não são políticos, nem sequer falam de política. Prefeitos devem ser gestores dos seus municípios, mas gestores políticos, o que não é a mesma coisa que um gerente de uma empresa privada. Devem lidar com necessidades infinitas e recursos limitados -por isso, devem fazer escolhas que terão um inevitável custo humano.
Devem ser capazes de soprar energia na alma da sua comunidade, para que a cidade não seja apenas uma multidão de estranhos, que não se veem e não se falam, que temem o outro e aspiram apenas proteção e isolamento.
Precisam ser capazes de infundir nas pessoas um senso de coletividade e uma visão compartilhada de futuro. Mas, para que esse prefeito possa existir, é preciso que o povo da cidade queira que ele exista.
É preciso que, diante da escolha eleitoral, as pessoas deixem de ser "eu" e se transformem em "nós". E esqueçam, nessa identidade coletiva, da sua rua e do seu bairro, pensando na cidade como uma coisa viva, em que tudo tem uma função e um sentido. Pensem na cidade como uma realidade que evolui em direção ao amanhã e que tudo o que nela se faz ou se deixa de fazer afeta o futuro. E é nesse futuro, nessa cidade, que estarão os nossos filhos e os nossos netos.
Por isso, deveríamos votar para prefeito com a mesma gravidade como votamos para presidente da República.
A população aparenta estar com os olhos fechados para a política, e os candidatos parecem fingir que não são políticos
Em alguns dias, nossa população voltará às urnas para escolher prefeitos e vereadores em todo o Brasil. Olhando para trás é difícil não perceber que os episódios eleitorais estão se tornando cada vez mais rotineiros, sem a carga de drama e de tensão tão comum no passado.
Nas cidades grandes e médias, que concentram a maior parte da população urbana, os antigos antagonismos e polarizações se dissolveram e quase já não se reconhecem as identidades políticas.
Passando os olhos pelas pesquisas de opinião, não é fácil identificar tendências que permitam alguma interpretação comum dos sentimentos dos eleitores. Cada cidade parece estar tecendo a sua história, sem uma nítida conexão com a política nacional. Alguém pode dizer que isso é natural, pois o que está em jogo são questões puramente locais. Será essa a razão?
Nos tempos que antecederam o fim do regime militar e nas eleições que se seguiram à redemocratização, as disputas municipais refletiam as forças que se defrontavam no cenário nacional, e os temas das campanhas seguiam as agendas dos principais grupos políticos.
Votar no PT, no PMDB ou no PFL fazia uma diferença que ninguém abria mão de expressar. Hoje, percebo que essas diferenças estão praticamente ocultas e o tom das campanhas, por si só, não nos permite identificar o campo político do candidato.
Ao final da convenção do Partido Democrata nos Estados Unidos, na Carolina do Norte, Barack Obama afirmou, com razão, que nas eleições de novembro os norte-americanos serão chamados a escolher entre duas visões antagônicas de mundo, com consequências profundas e duradouras.
Algumas pessoas acham que essa é uma realidade negativa, que reflete uma sociedade dividida. No entanto, a política só tem sentido e utilidade quando as pessoas não conseguem, espontaneamente, chegar a um acordo sobre as questões essenciais que afetam suas existências. Ela provê os instrumentos e os processos pelos quais -por meio da discussão, da mobilização de maiorias e de recuos e compromissos- os grupos sociais vão progressivamente tecendo consensos.
Mas, para que haja política, não basta que existam apenas as instituições formais da política. É necessário que haja vida cívica, que as pessoas se disponham a conciliar seu isolamento individual com um mínimo de participação ativa, pois os bens que a política deve produzir, principalmente a liberdade e a cidadania, não são de apropriação individual e só se desfrutam coletivamente.
A poucos dias das eleições, sinto que a população das cidades está com os olhos fechados para a política. Os candidatos parecem fingir que não são políticos, nem sequer falam de política. Prefeitos devem ser gestores dos seus municípios, mas gestores políticos, o que não é a mesma coisa que um gerente de uma empresa privada. Devem lidar com necessidades infinitas e recursos limitados -por isso, devem fazer escolhas que terão um inevitável custo humano.
Devem ser capazes de soprar energia na alma da sua comunidade, para que a cidade não seja apenas uma multidão de estranhos, que não se veem e não se falam, que temem o outro e aspiram apenas proteção e isolamento.
Precisam ser capazes de infundir nas pessoas um senso de coletividade e uma visão compartilhada de futuro. Mas, para que esse prefeito possa existir, é preciso que o povo da cidade queira que ele exista.
É preciso que, diante da escolha eleitoral, as pessoas deixem de ser "eu" e se transformem em "nós". E esqueçam, nessa identidade coletiva, da sua rua e do seu bairro, pensando na cidade como uma coisa viva, em que tudo tem uma função e um sentido. Pensem na cidade como uma realidade que evolui em direção ao amanhã e que tudo o que nela se faz ou se deixa de fazer afeta o futuro. E é nesse futuro, nessa cidade, que estarão os nossos filhos e os nossos netos.
Por isso, deveríamos votar para prefeito com a mesma gravidade como votamos para presidente da República.
Regras para greves de servidores - EDITORIAL O GLOBO
O GLOBO - 22/09
A lacuna existe desde 1988, quando foi promulgada a atual Constituição, com a restauração dos direitos civis cassados pela ditadura militar, entre eles o de greve por parte do funcionalismo. Mesmo uma Carta com excesso de detalhismo como a brasileira requer regulamentações posteriores. Várias foram feitas, menos com relação ao dispositivo da greve de servidores. Governos e partidos se omitiram diante do lobby de corporações sindicais, deixadas livres para explorar o vácuo jurídico.
Em certa medida a lacuna foi preenchida, em 2007, pelo Supremo Tribunal Federal. Ao julgar processos sobre assuntos sindicais, o STF, diante da omissão regulatória, estendeu ao funcionalismo a Lei de Greve (7.783, de 1989), de normatiza-ção das paralisações no setor privado. Passou a ser obrigatório, por exemplo, manter nos seus postos pelo menos 30% dos quadros de setores que sejam de atividades consideradas essenciais.
A Justiça tem agido, como deve ser. Ontem, o ministro Herman Benjamin, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), acolheu pedido de liminar feito pela Advocacia-Geral da União (AGU) e determinou que a Polícia Federal, em greve, mantenha 100% dos efetivos dos plantões em aeroportos, portos, assim como no atendimento à Justiça Eleitoral, nas eleições deste ano. Também foram determinados limites de funcionamento compulsório em outras atividades da PF. Mas o ideal é haver uma lei específica para o funcionalismo.
Pelo menos, a onda recente de greves de servidores, a maior em muitos anos, serviu para alertar o governo Dilma. Vários limites de sensatez foram ultrapassados por um movimento que paralisou cerca de 30 segmentos da máquina burocrática federal. A soma das reivindicações, quase todas fora da realidade, faria a já ampla folha de salários dos servidores aumentar em 50%, cerca de R$ 90 bilhões, o tamanho do orçamento da Saúde. Isso embora muitas categorias tenham recebido generosos reajustes na Era Lula.
Ficou evidente, também, o descaso com a população. Blindados com a estabilidade de emprego, funcionários se sentem acima de tudo e todos. Ficou registrada a falta de medicamentos importantes para pacientes em tratamento de quimioterapia, diabéticos etc., porque fiscais impediram a entrada de importações essenciais.
A presidente Dilma, então, encomendou à AGU um projeto de regulação dessas greves. Noticiou "O Estado de S. Paulo" que ela já avalizou a proibição expressa de "operações-padrão" instrumento clássico usado por certas categorias para pressionar o patrão Estado mantendo a população como refém.
Parece animador. O risco está em corporações sindicais, com trânsito livre em Brasília, engavetarem mais esta tentativa de uma imprescindível regulação.
A lacuna existe desde 1988, quando foi promulgada a atual Constituição, com a restauração dos direitos civis cassados pela ditadura militar, entre eles o de greve por parte do funcionalismo. Mesmo uma Carta com excesso de detalhismo como a brasileira requer regulamentações posteriores. Várias foram feitas, menos com relação ao dispositivo da greve de servidores. Governos e partidos se omitiram diante do lobby de corporações sindicais, deixadas livres para explorar o vácuo jurídico.
Em certa medida a lacuna foi preenchida, em 2007, pelo Supremo Tribunal Federal. Ao julgar processos sobre assuntos sindicais, o STF, diante da omissão regulatória, estendeu ao funcionalismo a Lei de Greve (7.783, de 1989), de normatiza-ção das paralisações no setor privado. Passou a ser obrigatório, por exemplo, manter nos seus postos pelo menos 30% dos quadros de setores que sejam de atividades consideradas essenciais.
A Justiça tem agido, como deve ser. Ontem, o ministro Herman Benjamin, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), acolheu pedido de liminar feito pela Advocacia-Geral da União (AGU) e determinou que a Polícia Federal, em greve, mantenha 100% dos efetivos dos plantões em aeroportos, portos, assim como no atendimento à Justiça Eleitoral, nas eleições deste ano. Também foram determinados limites de funcionamento compulsório em outras atividades da PF. Mas o ideal é haver uma lei específica para o funcionalismo.
Pelo menos, a onda recente de greves de servidores, a maior em muitos anos, serviu para alertar o governo Dilma. Vários limites de sensatez foram ultrapassados por um movimento que paralisou cerca de 30 segmentos da máquina burocrática federal. A soma das reivindicações, quase todas fora da realidade, faria a já ampla folha de salários dos servidores aumentar em 50%, cerca de R$ 90 bilhões, o tamanho do orçamento da Saúde. Isso embora muitas categorias tenham recebido generosos reajustes na Era Lula.
Ficou evidente, também, o descaso com a população. Blindados com a estabilidade de emprego, funcionários se sentem acima de tudo e todos. Ficou registrada a falta de medicamentos importantes para pacientes em tratamento de quimioterapia, diabéticos etc., porque fiscais impediram a entrada de importações essenciais.
A presidente Dilma, então, encomendou à AGU um projeto de regulação dessas greves. Noticiou "O Estado de S. Paulo" que ela já avalizou a proibição expressa de "operações-padrão" instrumento clássico usado por certas categorias para pressionar o patrão Estado mantendo a população como refém.
Parece animador. O risco está em corporações sindicais, com trânsito livre em Brasília, engavetarem mais esta tentativa de uma imprescindível regulação.
Preconceito invisível - HÉLIO SCHWARTSMAN
FOLHA DE SP - 22/09
SÃO PAULO - Saiu mais um daqueles relatórios do Ministério do Trabalho dando conta de que as mulheres ganham menos do que os homens. Em dezembro de 2011, o salário médio recebido por um trabalhador do sexo masculino era de R$ 1.828,90, contra R$ 1.393,34 pagos a representante do sexo frágil.
Não há dúvida de que existe preconceito na sociedade, mas eu receio que ele se materialize de forma mais sutil do que querem ativistas de movimentos feministas e assemelhados.
A julgar por trabalhos realizados nos EUA, os mais discriminados no mercado de trabalho, em especial no mundo corporativo, não são os negros nem as mulheres, mas os baixinhos. Entre os CEOs das maiores companhias americanas, 58% tinham mais de seis pés (1,83 m) de estatura, contra apenas 14,5% na população geral. Pior, cada polegada (2,54 cm) a mais de altura representava, em 2004, um incremento de US$ 789 na renda anual do funcionário. Estudo de Andréa Zaitune Curi e Naércio Aquino Menezes Filho apurou tendência semelhante no Brasil.
As hipóteses para explicar o efeito são as mais díspares possíveis. Vão desde força física e autoestima até a nutrição na infância -o que quer dizer que não temos ideia do que está realmente acontecendo.
Mas o que isso significa? Acho que ninguém sustentaria que existe preconceito consciente contra os baixinhos. Eles ao menos ainda não organizaram uma militância para exigir tratamento igual. Acompanhando Malcolm Gladwell em "Blink", acredito que a discriminação, neste caso, ocorra de forma implícita. Os responsáveis pelas contratações têm um estereótipo do que seja uma liderança ou um funcionário ideal e o aplicam aos candidatos, sem jamais verbalizar a regra ou mesmo dar-se conta de que ela existe em suas cabeças.
A constatação tem algo de sombrio. A mente humana discrimina da mesma forma que respiramos, isto é, sem nem perceber.
A espionagem da espionagem - LEONARDO CAVALCANTI
CORREIO BRAZILIENSE - 22/09
Tony Canning é um dos personagens de Serena (editora Companhia das Letras), o livro mais recente do incensado escritor inglês Ian McEwan. Na pele de um professor universitário, Canning parece um tanto menor na trama. É uma armadilha. Na verdade, ele inicia Serena, a protagonista do romance, no serviço secreto da Inglaterra e, depois, ao longo do texto, passa a ser suspeito de dupla espionagem, um pecado mortal para qualquer agente. Haveria, porém, certa moral nas ações de Canning, ao menos para ele: apenas um equilíbrio de forças, o medo recíproco, poderia manter a paz, mesmo que isso significasse entregar segredos a uma tirania. Se o Japão estivesse de posse de uma arma atômica, os horrores de Hiroshima não teriam ocorrido, diria Canning. No mundo real, não há desculpas, apenas o silêncio.
Reportagem publicada na última quinta-feira neste Correio revelou que a Polícia Federal prendeu um oficial-técnico da Agência Brasileira de Inteligência, a Abin. O homem investigava os próprios colegas. Na prática, o camarada era o espião dos espiões. Foi acusado de traição pela equipe.
O araponga inimigo dos arapongas passou a ser conhecido pelas iniciais W.T.N. e tem 35 anos. Ele teria hackeado 238 senhas de colegas que trabalhavam com informações estratégicas — pelo menos é o que deixam escapar outros agentes. Se você não valoriza o próprio trabalho, quem é que vai valorizar?
E aqui chegamos a um problema. Qual o tipo de informação produzida pelos nossos agentes?
“Suporte”
O serviço secreto brasileiro foi instalado em 1927, pelo presidente Washington Luís (1869-1957). Para os arapongas, este é o marco: a instituição do Conselho de Defesa Nacional. Pelo o que consta na página da agência na internet, ali “deu-se então o início da atividade de Inteligência no Brasil, como instrumento de suporte às ações estratégicas do Poder Executivo”. A partir daqui segue-se um breve histórico do serviço, chegando até a Abin, criada há 13 anos, em 1999. O que o site pouco mostra são os detalhes do serviço secreto durante o regime militar, entre 1964 e 1985, quando o agentes estavam diretamente ligados ao Serviço Nacional de Informações e todas às subdivisões, como a de Segurança e Informações (DSI) e a Assessoria de Segurança e Informações (ASI), presentes, na época, em vários órgãos, como na Universidade de Brasília (UnB) e no Incra, por exemplo.
É ingenuidade e até mesmo desonestidade intelectual esperar que um serviço secreto divulgue informações, mas não deixa de ser importante para o país saber qual o trabalho desempenhado pelo nosso agente secreto flagrado espionando os colegas de trabalho. Até para sufocar especulações.
Café e sabão
No ano passado, a agência passou por certo desgaste depois que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) considerou ilegais as investigações da Operação Satiagraha. Um parecer do Ministério Público apoia o argumento de que funcionários da agência participaram da apuração sem amparo legal.
Em janeiro de 2011, reportagem deste Correio mostrou que, entre os gastos sigilosos — sob a justificativa de “proteção do Estado” — estavam a compra de café e açúcar. As aquisições “secretas”, feitas no cartão corporativo, foram questionadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU).
As perguntas agora são: qual foi o tamanho do estrago feito pelo agente da Abin preso em flagrante pela Polícia Federal na semana passada acusado de arapongar os colegas? Quais as informações cruciais a que ele teve acesso? A cultura do silêncio da agência apenas abre espaço para especulações.
Lá vem a noiva - SONIA RACY
O ESTADÃO - 22/09
E sai a primeira leva de uniões estáveis entre homossexuais patrocinada pelo Estado. O Centro de Tradições Nordestinas será palco, sexta-feira, para troca de alianças de nada menos que... 32 pares de mulheres e 15 casais de homens.
Além da assinatura, os pombinhos participarão de ato ecumênico. Iniciativa inédita da Secretaria da Justiça.
Noiva 2
A cerimônia é aberta ao público. Jean Wyllys, deputado defensor da causa, foi convidado para ser padrinho de Priscila Pires, de 24 anos, e Kathrein Marrichi, de 30. “É muito bom conseguir ser igual a todo mundo, ter os mesmos direitos de um casal normal”, declarou à coluna, emocionada, Priscila.
Que já pensa em converter a união estável em casamento.
A calhar
Previsto inicialmente para hoje, o evento em que abispa Sonia vai declarar apoio da Renascer a Celso Russomanno foi transferido para dia 27.
Na brecha da agenda, o candidato conseguiu marcar encontro com Dom Odilo Scherer, arcebispo de SP, para tentar selar a paz com a Igreja Católica.
Categoria
Sobre o impedimento de Marta Suplicy em gastar sola de sapato por Haddad durante a semana em SP, Antonio Dona-to, coordenador da campanha, saiu pela tangente: “Não atrapalha. A maioria das atividades é durante o fim de semana”.
Pérola
De Orlando Morando, do séquito de Serra, ao ver cair o papel que indicava o lugar de Haddad à mesa de debate da Arquidiocese de São Paulo, anteontem: “É efeito da pesquisa.”
Tudo azul
Luís Adams não vê mais motivo para que se mantenham as greves em curso pelo País – como a dos policiais federais.
Em conversa com Marco Maia, presidente da Câmara, o advogado-geral da União salientou que a Lei Orçamentária enviada ao Congresso resolveu as divergências.
Ecolixo
Gabriel Garbin acaba de projetar a primeira Estação de Transbordo da cidade – para a Loga (concessionária de limpeza urbana de SP). Trata-se de aterro sanitário que incluirá ecoparque, centro de educação ambiental e horta comunitária.
Ainda sem local definido, está orçado em R$15 milhões.
Cá e... lá
CCRe Odebrechtforam convidadas pelo governo de Portugal para participar da privatização dos aeroportos por lá.
Aqui, correm o risco de serem barradas na próxima disputa, por causa do modelo em gestação.
À flor da pele
Tem texto de Criolo na mostra Paraíso na Boca, de Autumn Sonnichsen: “A entrega é total quando se percebe o sopro do fim da espera e nele se entrega, transpirando e sorrindo aberto pra mais, no que enche olhos, boca e barriga”, derreteu-se o rapper, amigo da fotógrafa americana radicada em São Paulo.
Abre hoje, na Ava Galeria.
Agrado
A Fifa fez série de exigências para trazer sua taça ao Brasil. Entre elas, ser transportada “em mãos” - – em case Louis Vuitton.
E mais: só campeões do mundo e chefes de Estado poderão tocar o troféu, que chegou ontem e foi direto para a Fundação Cafu.
Pega leve - VERA MAGALHÃES - PAINEL
FOLHA DE SP - 22/09
Dilma Rousseff ordenou que o tom da nota em que respondeu a Joaquim Barbosa evitasse ataques ao relator e qualquer menção que pudesse ser lida como apoio aos réus do mensalão. Assim como ocorreu quando respondeu ao ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que fez críticas a Lula, ministros afirmam que Dilma se sentiu provocada, mas desta vez ªbateu de leve'', porque Barbosa será o próximo presidente do STF. ªEle vai demorar para ser ex'', ironiza um interlocutor.
Força-tarefa Ao ser avisada por assessores a respeito da fala de Barbosa, Dilma pediu à sua equipe na noite de quinta-feira um pente-fino nos documentos do mensalão para localizar seu depoimento, dado em 2009.
Estado-Maior Participaram da reunião que antecedeu a nota os ministros Gleisi Hoffmann (Casa Civil), Gilberto Carvalho (Secretaria-Geral da Presidência), José Eduardo Cardozo (Justiça) e Luís Inácio Adams (AGU).
#tamojunto Apesar do tom ameno em relação a Barbosa, Dilma levou petistas à euforia. O pacote formado pela resposta a FHC, o pronunciamento de 7 de Setembro e a nota de ontem reaproximou a presidente do partido.
Cerimonial Ministros do STF observaram que, no texto, Dilma não chama o relator do mensalão de "excelentíssimo'', como são tratados os membros da corte. A petista optou por "senhor Barbosa''.
In loco Antonio Carlos Rodrigues (PR), que vai assumir a cadeira de Marta Suplicy no Senado, foi o primeiro político a acompanhar uma sessão do mensalão no plenário do STF, na quinta-feira, quando foi discutido o caso de Valdemar Costa Neto, seu colega de partido.
Aquecimento Rodrigues diz que foi ao STF a convite do futuro ministro da corte Teori Zavascki, indicado por Dilma, que será sabatinado pelo Senado no fim do mês.
Caso encerrado O vice-presidente, Michel Temer, relatou a Dilma nesta semana diálogo que teve com o presidente italiano sobre Cesare Battisti. Giorgio Napolitano queria reabrir a discussão sobre a liberdade concedida ao ex-terrorista pelo Brasil, mas Temer encerrou a conversa.
Ele... Mesmo com alta taxa de rejeição, Gilberto Kassab será acionado pelo QG de José Serra para mutirão na reta final da campanha.
... vem aí O prefeito deve ir a redutos em que houve instalação de equipamentos públicos, sobretudo praças, quadras poliesportivas e obras de reurbanização.
Varejo As incursões de Kassab foram mapeadas pelos vereadores "puxadores de voto" de sua base, como Milton Leite (DEM), Dalton Silvano (PV), Antonio Goulart (PSD), Toninho Paiva (PR), Antonio Carlos Rodrigues (PR) e Ricardo Teixeira (PV).
Tatuzão O prefeito, popularizado na campanha de 2008 com o boneco "Kassabão", é aguardado no evento de apresentação da mascote da Copa, segunda-feira, no Anhangabaú. À ocasião, será exibido tatu-bola inflável de sete metros de altura.
Colateral Além de causar a ira do PT, a gravação do ex-presidente Lula em apoio a Daniella Ribeiro (PP) em Campina Grande (PB) desagradou um aliado estratégico: o presidente da CPI do Cachoeira, Vital do Rêgo, irmão do prefeito Veneziano e cabo eleitoral de Tatiana Medeiros, do PMDB como ele.
Visita à Folha Luís Inácio Adams, advogado-geral da União, visitou ontem a Folha, a convite do jornal, onde foi recebido em almoço. Estava com Adão Paulo Oliveira, assessor de comunicação.
com FÁBIO ZAMBELI e ANDRÉIA SADI
tiroteio
"No meu dicionário não existe a palavra renúncia. Nunca fui homem de deixar amigo ferido pela estrada durante as batalhas."
DO CANDIDATO DO PDT EM SÃO PAULO, PAULINHO DA FORÇA, respondendo a aliados que pregam sua desistência para impulsionar Fernando Haddad (PT).
contraponto
Pesquisa qualitativa
O candidato do PT à Prefeitura de São Paulo, fazia campanha na Parada de Taipas, zona norte, e, em cima de um caminhão de som, defendia a proposta de educação em tempo integral, com o programa Mais Educação.
-A criança vai ficar um turno na escola e no outro vai usar os equipamentos culturais e de lazer.
Crianças cutucaram a candidata a vice, Nádia Campeão (PC do B), e o deputado Paulo Teixeira (PT):
-Ele quer que a gente fique o dia inteiro na escola?
Diante da confirmação, protestaram e foram embora. Os dois não aguentaram e caíram na gargalhada.
Protestos também no PDT - ILIMAR FRANCO
O GLOBO - 22/09
A presidente e o futuro presidente
A presidente Dilma ficou irritada com o ministro do STF Joaquim Barbosa, relator do processo do mensalão, que citou seu depoimento de 2009 para condenar deputados e reforçar as provas de compra de votos. A interlocutores, Dilma reclamou que Barbosa tirou suas declarações de contexto para apoiar sua tese no julgamento e que seu nome foi usado de forma gratuita. No entanto, políticos mais experientes que integram a base aliada consideram que a presidente se precipitou ao contestar o ministro, que, em dezembro, assumirá a presidência do Supremo. O mais adequado, dizem, teria sido delegar a crítica para um ministro ou um de seus líderes políticos.
“O Judiciário tem sua própria pauta, e nós, obviamente, temos que respeitar a
autonomia dos poderes”
José Eduardo Cardozo
Ministro da Justiça, sobre o julgamento do mensalão
Valdir Raupp não agiu só Antes de assinar carta de apoio ao ex-presidente Lula, que provocou protestos no PMDB, seu presidente interino, senador Valdir Raupp (RO), recebeu aval do vice Michel Temer, e dos líderes Henrique Alves (RN) e Renan Calheiros (AL).
Bola fora
O governador Marconi Perillo (PSDB-GO) se recusou a participar de reunião com a ministra Maria do Rosário (Direitos Humanos), quarta-feira passada, para tratar do envolvimento de policiais em grupos de extermínio. Mandou em seu lugar o
secretário de Segurança, João Furtado, que, dois
dias depois, foi afastado pelo Ministério Público.
Vem aí a troca da guarda
Assessores da presidente Dilma começaram a ouvir parlamentares da base sobre a deficiente articulação no Congresso. Ela se prepara para substituir Eduardo Braga (PMDB-AM), Arlindo Chinaglia (PT-SP) e José Pimentel (PT-CE).
“Prefeito! Prefeito!”...
Cantarola no plenário o deputado Lúcio Vieira Lima (PMDB-BA). Gabriel Chalita sorri e conta como vai vencer em São Paulo. “O Serra e o Haddad estão se matando. A Arquidiocese está contra o Russomanno e vai me apoiar. Vou para o segundo turno e ganho”. Dito isso, Chalita pergunta: “E Salvador?”. Lúcio responde: “É como em São Paulo. O ACM e o Pelegrino estão se matando. Kertész vai atropelar e vencer”.
Sonho de consumo: superar o PMDB
A presidente Dilma e o presidente do PT, Rui Falcão, jantaram terça-feira, no Alvorada. Falaram sobre eleições. A despeito dos reflexos negativos do mensalão, os petistas avaliam que o partido pode sair do pleito como o mais votado.
Precisa-se de voluntários
Especialista em voluntariado, o consultor americano Rick Lynch foi ouvido, quinta-feira, no Ministério do Esporte.
O programa Brasil
Voluntário vai abrir cem mil vagas, no ano que vem, para atuar na Copa das Confederações.
ONTEM, SEXTA-FEIRA, o ex-presidente Lula atingiu a marca dos 231 mil fãs no Facebook. É o político com maior número de seguidores na rede social.
SILÊNCIO SEXY - MÔNICA BERGAMO
FOLHA DE SP - 22/09
ARTILHARIA UNIDA
Há um consenso, no comando das campanhas de José Serra (PSDB-SP), Fernando Haddad (PT-SP) e Gabriel Chalita (PMDB-SP), de que todos têm que atacar Celso Russomanno (PRB-SP) na reta final da campanha. Ou a eleição dele, qualquer que seja o adversário no segundo turno, se tornaria desde já irreversível.
CÍRCULO
O vice-presidente Michel Temer (PMDB-SP) reúne hoje toda a cúpula da campanha de Chalita.
Em pauta, as duas últimas semanas da corrida eleitoral.
AÍ SIM
O padre Júlio Lancelotti, desafeto dos tucanos, disse "até concordar com o PSDB" num ponto: "Celso Russomanno não tem estrutura para governar". A afirmação foi feita à coluna no debate de candidatos a prefeito promovido anteontem pela Arquidiocese de São Paulo.
SUOR E LÁGRIMAS
Os temores dos réus do mensalão se confirmaram.
Renilda Santiago, mulher do publicitário Marcos Valério, pivô do mensalão, conversou longamente por telefone com repórter de uma revista semanal.
SOB CONTROLE
Um dos réus que mais conhece os meandros do processo do mensalão disse à coluna que, apesar da pressão, Valério não vai explodir. Ele estaria mandando recados só para garantir que vai ser preso em detenção segura e que sua família "não vai morrer de fome". Com essas garantias, voltaria a se calar.
NADA SEI
O advogado do publicitário, Marcelo Leonardo, diz que não tem "a menor ideia desse assunto. Acho até que as informações não têm nenhum fundamento".
JÁ FOI
De acordo com o mesmo réu, Valério já repassou para a imprensa, desde o início do escândalo, o que tinha de informação preciosa -como o financiamento que Ângela Saragoça, ex-mulher de José Dirceu, conseguiu no Banco Rural para comprar um apartamento, depois de vender outro imóvel para um dos sócios de Marcos Valério.
LONGA VIDA
Filomena Matarazzo Suplicy, mãe do senador Eduardo Suplicy e de outros 10 filhos, comemora 104 anos na próxima segunda-feira, em São Paulo.
Com missa em casa, só para a numerosa família.
CORAÇÃO DO PARTIDO
Edmeire Celestino da Silva, a mulher de 29 anos que tentou invadir o Palácio do Planalto duas vezes e pedir a presidente Dilma Rousseff em casamento, tinha "entrado" para a política neste ano. Ela pagou a passagem de ônibus de Campinas para Brasília com dinheiro que ganhou fazendo panfletagem para um candidato a vereador do PT do B, que não é aliado do PT na cidade.
ZOADO
Mano Brown não parecia contente com o show de sua banda, os Racionais MC's, no VMB. "Zoaram tudo."
"Deu tudo errado", repetiu ele mais de uma vez, anteontem, em seu camarim.
RAP POPULAR BRASILEIRO
Mari Moon, Marcelo Adnet e a trupe da MTV comandaram o VMB, anteontem. A apresentadora Patrícia Abravanel e os músicos Supla e Marcelo D2 foram ao Espaço das Américas ver shows de Gal Costa e dos Racionais MC's, que entraram no palco com o jogador Neymar. O tecnobrega de Gaby Amarantos e o rap foram os estilos mais premiados.
CURTO-CIRCUITO
Ronaldo celebra hoje seu 36º aniversário, no Outlaws. Com show de Preta Gil.
Neon e Amapô mostram hoje e amanhã coleção para crianças. Em Perdizes.
Agnaldo Rayol e Toquinho participam de show pelos cem anos da ONG A Mão Branca. Hoje, no Theatro Municipal, às 20h.
Hideko Honma lança hoje sua coleção de cerâmica.
O sociólogo Sérgio Franco e o pichador Djan Ivson debatem amanhã a pichação na Bienal de Berlim. No Centro Cultural da Juventude Ruth Cardoso.
Ridículo - EDITORIAL FOLHA DE SP
FOLHA DE SÃO PAULO - 22/09
Nota de líderes partidários governistas sobre mensalão repete cinismo e contradições de um bando de políticos unidos pelo apego ao poder
Não deveria, mas suscita pouca estranheza o documento de líderes partidários governistas divulgado na quinta-feira. O presidente do PT e artífice da nota, Rui Falcão, já se notabilizara por reações tão previsíveis quanto destemperadas ao modo como se desenvolve o julgamento do mensalão no Supremo Tribunal Federal (STF).
Somam-se agora à ladainha outras figuras do bloco situacionista. Vão de Renato Rabelo (PC do B) ao coordenador da campanha de Celso Russomanno à Prefeitura de São Paulo, Marcos Pereira (PRB). O manifesto insiste no gênero de argumento ouvido desde as primeiras denúncias sobre o mensalão.
Quando Roberto Jefferson, presidente do PTB, narrou em entrevista à Folha as gestões de um publicitário mineiro, Marcos Valério, que resultavam em saques de dinheiro vivo beneficiando políticos da base governista, tudo o que se tinha eram denúncias. Provinham, aliás, do líder de um partido que acabava de ser envolvido num escândalo de propina nos Correios.
Foi só aos poucos, como lembrou ainda nesta semana Joaquim Barbosa, relator do processo no STF, que os nomes pronunciados por Jefferson, e os fatos a eles associados, se confirmaram nas investigações. Vieram as confissões daquilo que, pouco antes, se negava com máxima indignação.
O petismo não perdeu a empáfia. Ao lado da esfarrapada desculpa de que os recursos do mensalão correspondiam apenas a gastos de campanha, surgiu a mais desonesta e deslavada operação ideológica de que foram capazes os tartufos da moralidade pública e da igualdade social.
Associados, como o são cada vez mais, à direita religiosa, ao malufismo, a José Sarney e a Fernando Collor, os petistas recorreram aos trapos de um vocabulário de esquerda para iludir os que, sempre, querem manter-se iludidos.
"Golpismo", "aventura conservadora", "ataque à democracia": assim se qualificou o empenho de desvendar o desvio de recursos públicos e a corrupção de parlamentares, levando o caso à Justiça, com amplo direito de defesa e longos anos de contraditório, de recursos e protelações.
O PT, tantas vezes acusado de ser "denuncista" quando erguia as bandeiras do "Fora Collor" e do "Fora FHC", recorre ridiculamente à mesma tática, ao associar o desfecho do julgamento no STF à iminência das eleições municipais.
Os governistas de São Paulo não deveriam preocupar-se tanto. Oriundo de um partido (PRB) no qual sobrevive o PL, notoriamente envolvido no escândalo, Russomanno é o líder nas pesquisas.
O PRB assina, todavia, a nota contra o "golpismo". A contradição política deve importar pouco, entretanto, para um bando multipartidário que já se acostumou a contradizer-se na polícia.
Nota de líderes partidários governistas sobre mensalão repete cinismo e contradições de um bando de políticos unidos pelo apego ao poder
Não deveria, mas suscita pouca estranheza o documento de líderes partidários governistas divulgado na quinta-feira. O presidente do PT e artífice da nota, Rui Falcão, já se notabilizara por reações tão previsíveis quanto destemperadas ao modo como se desenvolve o julgamento do mensalão no Supremo Tribunal Federal (STF).
Somam-se agora à ladainha outras figuras do bloco situacionista. Vão de Renato Rabelo (PC do B) ao coordenador da campanha de Celso Russomanno à Prefeitura de São Paulo, Marcos Pereira (PRB). O manifesto insiste no gênero de argumento ouvido desde as primeiras denúncias sobre o mensalão.
Quando Roberto Jefferson, presidente do PTB, narrou em entrevista à Folha as gestões de um publicitário mineiro, Marcos Valério, que resultavam em saques de dinheiro vivo beneficiando políticos da base governista, tudo o que se tinha eram denúncias. Provinham, aliás, do líder de um partido que acabava de ser envolvido num escândalo de propina nos Correios.
Foi só aos poucos, como lembrou ainda nesta semana Joaquim Barbosa, relator do processo no STF, que os nomes pronunciados por Jefferson, e os fatos a eles associados, se confirmaram nas investigações. Vieram as confissões daquilo que, pouco antes, se negava com máxima indignação.
O petismo não perdeu a empáfia. Ao lado da esfarrapada desculpa de que os recursos do mensalão correspondiam apenas a gastos de campanha, surgiu a mais desonesta e deslavada operação ideológica de que foram capazes os tartufos da moralidade pública e da igualdade social.
Associados, como o são cada vez mais, à direita religiosa, ao malufismo, a José Sarney e a Fernando Collor, os petistas recorreram aos trapos de um vocabulário de esquerda para iludir os que, sempre, querem manter-se iludidos.
"Golpismo", "aventura conservadora", "ataque à democracia": assim se qualificou o empenho de desvendar o desvio de recursos públicos e a corrupção de parlamentares, levando o caso à Justiça, com amplo direito de defesa e longos anos de contraditório, de recursos e protelações.
O PT, tantas vezes acusado de ser "denuncista" quando erguia as bandeiras do "Fora Collor" e do "Fora FHC", recorre ridiculamente à mesma tática, ao associar o desfecho do julgamento no STF à iminência das eleições municipais.
Os governistas de São Paulo não deveriam preocupar-se tanto. Oriundo de um partido (PRB) no qual sobrevive o PL, notoriamente envolvido no escândalo, Russomanno é o líder nas pesquisas.
O PRB assina, todavia, a nota contra o "golpismo". A contradição política deve importar pouco, entretanto, para um bando multipartidário que já se acostumou a contradizer-se na polícia.
Os fatos depois do apagão - MIRIAM LEITÃO
O GLOBO - 22/09
O Brasil não estava sob ameaça de apagão em 2003. Quem disse isso, na época, foi a então Ministra das Minas e Energia, Dilma Rousseff. O apagão de 2001 foi o pior momento do governo Fernando Henrique, mas a gerência da crise pelo então chefe da Casa Civil, Pedro Parente, construiu a solução que está sendo usada na atual seca: a de pôr as termelétricas como geração complementar.
A presidente Dilma disse recentemente que o governo Lula começou sob essa ameaça iminente. Voltou a dizer ontem. Havia muito a fazer na área energética, mas o risco imediato havia sido afastado. Tanto que as suas Medidas Provisórias só foram enviadas ao Congresso em dezembro de 2003, onze meses depois que ela assumiu o Ministério das Minas e Energia. Em setembro de 2003, perguntada pelo jornal O GLOBO sobre o risco de apagão, ela respondeu: "Falar de risco de apagão é não prestar atenção na atual conjuntura. Não corremos risco de racionamento, nem de apagão. Fizemos um levantamento e podemos garantir que não há risco."
A nota da presidente ontem foi motivada pela referência a uma declaração sua, de surpresa da rapidez na aprovação das MPs 144 e 145, no voto do ministro Joaquim Barbosa. O que a presidente quer é afastar qualquer ilação de que a rapidez tenha algo a ver com os estranhos fatos políticos da época.
Entende-se que a presidente esclareça a natureza da sua declaração. Difícil aceitar é a repetida tendência de mudar os fatos históricos sobre a crise no setor energético. A aprovação rápida deve ter sido mesmo fruto do trauma que ficou com o apagão, mas, para repor os fatos, foi assim que aconteceu: o governo Fernando Henrique não investiu o suficiente no setor, a economia cresceu muito no ano 2000 e houve uma enorme seca em 2001. Essa mistura de um ano de crescimento bom e uma seca incomum foi o bastante para provocar a pior crise energética do país.
A solução com as térmicas, como garantia em momentos de escassez hídrica, foi montada na época e tem servido ainda hoje. Este ano, o Operador Nacional do Sistema está "despachando", como se diz no jargão do setor elétrico, a energia das térmicas.
Além disso, houve enorme engajamento da população na época em reduzir e racionalizar o consumo. Quando a então Ministra Dilma assumiu o setor de energia, o país estava passando por um período de excedente de oferta. Dilma fez várias mudanças: reduziu os poderes da agência reguladora, criou a empresa para o planejamento energético e mudou a regulação do mercado livre. Algumas das suas decisões provocaram períodos de paralisia de investimentos. Sua gestão teve méritos, mas ela também cometeu erros.
Dilma desprezou a energia eólica quando estava claro que essa fonte ficaria mais importante e mais barata em inúmeros países. A energia solar, que é outra fonte que se torna cada vez mais importante, também tem sido desprezada.
Chegaram a ser licenciadas térmicas a carvão e a ideia era fazer um grande leilão dessa fonte no final de 2009, quando Dilma era Ministra-chefe da Casa Civil e candidata do ex-presidente Lula. Foi a Conferência do Clima de Copenhague que abriu os olhos do governo para o fato de que carvão numa hora dessas seria ir na contramão mundial.
O projeto da presidente na área de geração é excessivamente concentrado numa única ideia: hidrelétrica na Amazônia. Os custos ambientais não tem sido considerados; os riscos de desequilíbrio social têm sido ignorados. Os sinais de problemas institucionais não estão sendo previstos. O preço exato da opção tem sido escondido através de subsídios e da presença maciça de estatais e fundos de pensão de estatais, como em Belo Monte.
Ueba! Voto no Cido Putão! - JOSÉ SIMÃO
FOLHA DE SP - 22/09
E adoro esses comentários: "Mas eu ainda não conheci ninguém que vai votar no Russomanno". Nem vai! Porque frequenta o Clube Pinheiros, Oscar Freire, Bienal e Espaço Unibanco.
E o Ganso não foi vendido por R$ 24 milhões! Mas por R$ 23,9 milhões. Faltou R$ 100 mil pra piada pronta! E uma dúvida cruel: para onde migram o Eymael e o Levy Fidelix entre as eleições? Acho que eles se juntam às grandes migrações na Tanzânia e só voltam de dois em dois anos. As Grandes Migrações: Eymael e Levy Fidelix!
E este candidato de São Vicente, O Homem Picanha?! No ano passado ele apareceu na televisão dizendo que tinha um caso com um jogador do Corinthians! Ou seja, só assim prum corintiano comer picanha! Rarará! "Votem em mim! Eu comi um corintiano!" E o slogan de todas as travecas: "Votem em mim! Senão eu conto tudo!" Rarará!
E este de Águas de Lindóia: Cido Putão! Oba! Liberou geral! Vai ter uma luz vermelha na porta da Câmara. E, em vez do Hino Nacional, "Eu Quero Tchu, Eu Quero Tcha". Candidato Bataclan! E mais um predestinado. Sabe como se chama o jornalista da Folha que assinou reportagem sobre o Palmeiras? Marcel RIZZO! Rarará! É mole? É mole, mas sobe!
Guerra Santa! Jihad! Tá tendo guerra de igrejas em São Paulo. Cardeal: "Não se deve misturar religião com política". Então por que promoveu debate na arquidiocese?
O Brasil é um Estado laico liderado por religiosos! Eu não sou católico porque o Papa não deixa. Não sou evangélico porque não tenho dinheiro. Sou católico apostólico baiano. Acredito em tudo. Até na cegonha! Rarará!
E últimas notícias: "Ganso se recusa a sair pelos fundos e quer deixar o Santos de cabeça erguida". E depois reclamam quando a gente faz trocadilhos!
Rarará!
E a Soninha fala tanto que é transparente, transparente, transparente, que vai abrir um transporte de nepotismo: Transparente! Rarará!
A situação está ficando psicodélica! Rarará!
Nóis sofre, mas nóis goza! Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno
!
Ejaculação precoce - RUY CASTRO
FOLHA DE SP - 22/09
RIO DE JANEIRO - Em 1960, Fernando Sabino e Rubem Braga, intrigados com a aritmética que parecia reservar 10% dos direitos autorais ao autor de um livro e 90% ao editor, tiveram uma ideia: por que não abriam sua própria editora? Afinal, se os editores não escrevem os livros que editam, os escritores podem muito bem editar os livros que escrevem.
Editar por conta própria era coisa de quem não tinha nome nem editora. O que não era o caso de Fernando e Rubem -todos os disputavam. Assim, eles fundaram a Editora do Autor, e já a inauguraram com "O Homem Nu", de Fernando, e "Ai de Ti, Copacabana", de Rubem -podia haver melhor cartão de visita?
Empolgados, cooptaram os amigos a lançar seus livros por eles: Paulo Mendes Campos, Vinicius de Moraes, Otto Lara Resende, Manuel Bandeira, Carlos Drummond, João Cabral, Clarice Lispector, Armando Nogueira, Dalton Trevisan, muitos mais, e formaram um senhor catálogo. Aí descobriram que, depois de pagar a gráfica, os funcionários, os impostos, o distribuidor e os livreiros, o que sobrava para cada autor eram os mesmos 10%.
Foi uma experiência pioneira, mas diferente do fenômeno que hoje assola os EUA, a autopublicação -autores sem nome e sem mercado que, graças à tecnologia, podem agora lançar livros digitais independentes. Você dirá que a democratização chegou ao mercado editorial e que, com isso, qualquer um pode ser o seu próprio editor. Mas será bom?
A Editora do Autor não vivia só dos grandes nomes, mas de seus maravilhosos editores: Fernando Sabino e Rubem Braga. Eles sabiam orientar os autores. A prova está nos muitos clássicos que editaram. Já a autopublicação atual pode inventar mega-sellers, como "Cinquenta Tons de Cinza" -um Kama Sutra para senhoras com o avental sujo de ovo-, mas que terão a eternidade de uma ejaculação precoce.
Políticas e predominâncias - WALTER CENEVIVA
FOLHA DE SÃO PAULO - 22/09
O que parecia impossível de repente viabiliza possíveis punições em todos os níveis da administração
A APROXIMAÇÃO das eleições municipais cria um clima variado de expectativas jurídicas e políticas, hoje submetidas aos efeitos de uma causa única: o mensalão. Queiram ou não, os interesses em contrário -variáveis pelo Brasil afora- têm importância nova. Predomina a questão dos corruptos, delinquentes ou apenas do ameaçados de enquadramento criminal. O que parecia impossível de repente viabiliza a possibilidade de punições sérias, em todos os níveis da administração.
Na esfera municipal, vê-se a costumeira febre eleitoreira das obras urbanas. Uma variável: paira no ar a noção de que toda cautela é pouca, para as autoridades e para os munícipes, quanto a ações de legalidade duvidosa. Um lado da evolução do povo sugere que o segmento mais atingido pela desconfiança da maioria é o dos políticos. Aparentemente, a antevisão dos efeitos do processo submetido ao STF (Supremo Tribunal Federal) se agravará dia após dia, por mais que os interesses contrariados o neguem.
Está presente a predominância das incertezas quanto ao futuro. É válida a pergunta: quando outras irregularidades forem parar no STF, quem sairá bem na fotografia? A constatação só não preocupará aos tolos ou aos imprudentes.
É a nova predominância: a punibilidade parece possível. Este momento da vida brasileira surge, assim, como apropriado para que cada cidadão dê atenção aos fatos revelados, de escândalo após escândalo, no trato com a coisa pública. Pode continuar no mesmo padrão que se tem visto revelado ao povo? É válida a ação útil de cada um para não se deixar enganar. O sistema democrático, mesmo tendo defeitos, dá a melhor estrutura para a garantia da vida e do direito de todos. A mais importante das razões pelas quais o tema resultou nesta coluna está em que, se não houver reação efetiva, os inocentes terminarão no mesmo cesto dos culpados. Não se distinguirá o joio do trigo.
Há, pelo menos, um bom exemplo sobre o que está em jogo. Pode ser colhido no artigo 6º da Carta Magna, com o resumo dos direitos essenciais da grande massa: educação, saúde, trabalho, moradia, lazer, segurança, previdência social, proteção à maternidade e à infância e assistência aos desamparados. Direitos para todos. Válidos para trabalhadores urbanos e rurais, além dos que visem à melhoria de sua condição social.
Os fatos, transpostos para a população pelo trabalho meticuloso do ministro Joaquim Barbosa e pelos debates que se seguem no STF, parecem, a cada nova sessão, como se estivéssemos à frente de um cofre de segredos, mais espantoso a cada abertura da porta. A predominância de hoje se tornou inarredável: consiste em chegar até o fim do poço das irregularidades e de, respeitados cuidadosamente os direitos de todos os acusados, chegar à punição dos culpados, sem distinção de partidos e, em particular, sem distinção para os cargos que ocupam ou tenham eventualmente ocupado. A mensagem das preocupações a serem consideradas pode ser proclamada, sem temor de distorção por preferência de partidos, candidaturas ou o que mais seja. Se o leitor meditar sobre o assunto, estará mais preparado para os dias, meses e anos de seu futuro, dos filhos e das gerações do porvir.
O que parecia impossível de repente viabiliza possíveis punições em todos os níveis da administração
A APROXIMAÇÃO das eleições municipais cria um clima variado de expectativas jurídicas e políticas, hoje submetidas aos efeitos de uma causa única: o mensalão. Queiram ou não, os interesses em contrário -variáveis pelo Brasil afora- têm importância nova. Predomina a questão dos corruptos, delinquentes ou apenas do ameaçados de enquadramento criminal. O que parecia impossível de repente viabiliza a possibilidade de punições sérias, em todos os níveis da administração.
Na esfera municipal, vê-se a costumeira febre eleitoreira das obras urbanas. Uma variável: paira no ar a noção de que toda cautela é pouca, para as autoridades e para os munícipes, quanto a ações de legalidade duvidosa. Um lado da evolução do povo sugere que o segmento mais atingido pela desconfiança da maioria é o dos políticos. Aparentemente, a antevisão dos efeitos do processo submetido ao STF (Supremo Tribunal Federal) se agravará dia após dia, por mais que os interesses contrariados o neguem.
Está presente a predominância das incertezas quanto ao futuro. É válida a pergunta: quando outras irregularidades forem parar no STF, quem sairá bem na fotografia? A constatação só não preocupará aos tolos ou aos imprudentes.
É a nova predominância: a punibilidade parece possível. Este momento da vida brasileira surge, assim, como apropriado para que cada cidadão dê atenção aos fatos revelados, de escândalo após escândalo, no trato com a coisa pública. Pode continuar no mesmo padrão que se tem visto revelado ao povo? É válida a ação útil de cada um para não se deixar enganar. O sistema democrático, mesmo tendo defeitos, dá a melhor estrutura para a garantia da vida e do direito de todos. A mais importante das razões pelas quais o tema resultou nesta coluna está em que, se não houver reação efetiva, os inocentes terminarão no mesmo cesto dos culpados. Não se distinguirá o joio do trigo.
Há, pelo menos, um bom exemplo sobre o que está em jogo. Pode ser colhido no artigo 6º da Carta Magna, com o resumo dos direitos essenciais da grande massa: educação, saúde, trabalho, moradia, lazer, segurança, previdência social, proteção à maternidade e à infância e assistência aos desamparados. Direitos para todos. Válidos para trabalhadores urbanos e rurais, além dos que visem à melhoria de sua condição social.
Os fatos, transpostos para a população pelo trabalho meticuloso do ministro Joaquim Barbosa e pelos debates que se seguem no STF, parecem, a cada nova sessão, como se estivéssemos à frente de um cofre de segredos, mais espantoso a cada abertura da porta. A predominância de hoje se tornou inarredável: consiste em chegar até o fim do poço das irregularidades e de, respeitados cuidadosamente os direitos de todos os acusados, chegar à punição dos culpados, sem distinção de partidos e, em particular, sem distinção para os cargos que ocupam ou tenham eventualmente ocupado. A mensagem das preocupações a serem consideradas pode ser proclamada, sem temor de distorção por preferência de partidos, candidaturas ou o que mais seja. Se o leitor meditar sobre o assunto, estará mais preparado para os dias, meses e anos de seu futuro, dos filhos e das gerações do porvir.
Portos - nova rodada de concessões? - JOSEF BARAT
O Estado de S.Paulo - 22/09
Comemora-se, com justa razão, a honrosa 7.ª posição alcançada tanto pelo nosso PIB no ranking mundial quanto pela nossa participação no que é produzido no mundo, que é de cerca de 3% (embora bem distante dos 19% dos EUA e dos 14% da China). O problema é que, tendo a 5.ª população mundial, o PIB per capita brasileiro, de US$ 13 mil, nos coloca em 52.º lugar. Como os indicadores per capita, em geral, medem melhor os níveis de desenvolvimento, produtividade e bem-estar, ainda há um longo e trabalhoso caminho a percorrer.
Muito se tem falado das vergonhosas posições do Brasil em matéria de educação, conhecimento e qualificação dos seus recursos humanos. Igualmente, são recorrentes os maus desempenhos na saúde pública e nos serviços sociais. Mas um tema, também recorrente, que deve ser sempre lembrado é o dos gargalos nas infraestruturas, que têm sido um dos mais importantes fatores de inibição ao aumento de produtividade.
Deficiências na oferta de serviços de energia, logística, transporte, telecomunicações, informação e saneamento restringem fortemente o crescimento. De um lado, a infraestrutura para a provisão desses serviços depende do estágio de desenvolvimento de um país ou região. De outro lado, sua implantação tem o importante papel de induzir o crescimento, por sua ampla repercussão na geração de emprego e renda, obras e fornecimento de serviços, além do essencial estímulo aos negócios.
Quanto à disponibilidade e eficiência das infraestruturas em geral, a posição do Brasil no contexto mundial é vexatória. Recente relatório do Fórum Econômico Mundial (baseado em dados do Banco Mundial) aponta nosso país na 107.ª posição entre 144 países, numa avaliação agregada das infraestruturas. Por uma questão de espaço, fixemo-nos num dos aspectos cruciais: os portos.
O indicador de qualidade da infraestrutura portuária situa o Brasil em 135.º lugar, com nota 2,6, num ranking que varia de 7 (máximo de eficiência por parâmetros internacionais) a 1 (ineficiência extrema). Estamos bem abaixo da média de 4,3 e muito longe da nota máxima de 6,8 (Holanda e Cingapura), onde os portos são parâmetros mundiais.
Tomando por referência benchmarks dados pelos portos mais eficientes, a escala de operações e o desempenho dos portos brasileiros são bastante ruins, excetuando os terminais privativos especializados. Entre outros, vale citar os seguintes problemas: 1) longas esperas entre chegadas e atracações; 2) longas permanências (turnaround time) para as operações de carga e descarga; 3) baixos níveis de produtividade nas operações, por berço de atracação/dia; 4) tempos muito curtos de trabalho efetivo nas operações de carga e descarga dos navios atracados; 5) baixos níveis de desempenho dos trabalhadores portuários por navio e por turno, diante do tempo efetivo de trabalho dos navios; e 6) elevado número de avarias e perdas.
Diante de tantos problemas, o momento é propício para uma revisão profunda no arcabouço institucional, legal e regulador do setor portuário, tendo, sobretudo, uma visão crítica do modelo de gestão portuária adotado no Brasil.
O processo de concessões nos portos foi fragmentado por áreas e terminais específicos de operação, não contemplando o sítio portuário como um todo. Manteve-se, ainda, uma gestão impregnada da presença estatal, com muita burocracia e barganhas político-partidárias. As ações governamentais acabaram por estimular a competição no sítio portuário, em vez de promovê-la mais ativamente entre portos regionais, como ocorre nos países mais desenvolvidos.
Agora que o governo está perdendo a vergonha de ser privatista, se houver uma rodada de concessões para os portos, é importante conceder o sítio portuário como um todo. Portanto, é preciso dispor de projetos executivos abrangentes, pré-qualificar adequadamente os licitantes, estimular parcerias de operadores nacionais com estrangeiros de grande tradição, além de instituir uma autoridade portuária empresarial e efetivamente autônoma.
Dilma e sua lealdade - MERVAL PEREIRA
O GLOBO - 22/09
A presidente Dilma mais uma vez deixou de lado a liturgia do cargo para responder diretamente ao relator do mensalão, ministro do Supremo Tribunal Federal Joaquim Barbosa, que citou um depoimento seu ao tempo em que era ministra de Minas e Energia para confirmar sua tese de que houve compra de votos no mensalão.
Barbosa foi além do que a prudência exigiria em uma hora dessas, e atribuiu à "surpresa" manifestada pela então ministra Dilma Rousseff, no seu depoimento judicial, com a agilidade da aprovação das medidas provisórias de reformulação do setor elétrico, o caráter de uma confirmação tácita de que houvera algo mais que um simples acordo político naquela ocasião.
A presidente Dilma está certa ao rebater essa interpretação do relator, mas mais uma vez utilizou-se da forma errada, na minha opinião. Assim como quando rebateu as críticas do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, também desta vez a presidente não deveria ter respondido através de uma nota oficial da Presidência da República, colocando a questão como se fosse uma disputa entre os Poderes Executivo e Judiciário.
Bastaria que ela encarregasse o senador Delcídio do Amaral, que era o líder do governo à época, de desmentir a versão do relator, como, aliás, ele já fizera em declarações de iniciativa própria, confirmando que houve naquelas votações um acordo partidário diante da necessidade de reformas no setor elétrico depois dos problemas porque passara no final do governo de Fernando Henrique Cardoso.
Como na resposta ao ex-presidente, que classificara de "herança pesada" a deixada por Lula, juntando aos problemas econômicos uma especial referência às questões morais, também agora a presidente foi além do simples desmentido, aproveitando a ocasião para reafirmar sua lealdade ao antecessor, fazendo críticas ao governo de Fernando Henrique.
"Entre junho de 2001 e fevereiro de 2002, o Brasil atravessou uma histórica crise na geração e transmissão de energia elétrica, conhecida como ´apagão´", escreveu a presidente, já usando a terminologia com finalidades políticas, pois ela sabe que o país não passou por um "apagão".
"Como disse no meu depoimento, em função do funcionamento equivocado do setor até então, ou se reformava ou o setor quebrava", completou a presidente para justificar a tramitação rápida das medidas governamentais.
Nas duas ocasiões, procurou-se tirar vantagem das palavras e gestos de Dilma para colocá-la em dissidência com Lula, seu mentor e responsável maior pela chegada à Presidência.
Mesmo assim, o fato de a presidente ter se sentido devedora de uma explicação por escrito, ao que tudo indica sugerida por setores ligados a Lula, mostra não apenas o grau de subordinação partidária a que ela se submete, como a preocupação dos que cercam Lula com a repercussão do julgamento do mensalão sobre a sua biografia.
Sabe-se que já a nota expedida por cinco dos partidos da base aliada, repudiando as acusações contra Lula atribuídas a Marcos Valério, e denunciando um complô contra Lula fora insuflada pelo próprio, em busca de apoio público num momento em que sua influência política encontra resistências.
Agora, a nota da Presidência tem o objetivo de deixar claro publicamente que o depoimento da então ministra de Minas e Energia não insinuou, como o relator deu a entender, a existência do mensalão.
É compreensível que Dilma nutra por Lula um afeto e uma gratidão infinitos, mas a Presidência não pode ser usada para expressar esses sentimentos particulares. Também o fato de pertencer ao PT, embora não tenha suas raízes políticas no partido, não justifica uma atuação partidária tão desabrida quanto a que está tendo nessa campanha municipal, quando já anunciara que não entraria nas disputas regionais.
Com essas atitudes, Dilma deixa para trás uma postura republicana de equidistância das questões partidárias para usar a Presidência como moeda de troca, como fez ao nomear o senador Marcelo Crivella para o Ministério da Pesca, na doce ilusão de que o partido dos bispos apoiaria o candidato petista à prefeitura de São Paulo, e a senadora Marta Suplicy para a pasta da cultura, na tentativa de desempacar a candidatura.
Mesmo que ao fim os esforços do "deus" Lula e seus seguidores deem certo, a Presidência de Dilma sairá diminuída. Se der errado, então...
Contrarreforma na Previdência (I) - FABIO GIAMBIAGI
O Estado de S.Paulo - 22/09
Em minhas palestras gosto de perguntar à plateia qual foi a notícia de 2008 com maior impacto para a vida futura de nossos filhos. Invariavelmente, a resposta é: "A crise financeira". Porém, no dia em que os historiadores, daqui a 50 anos, se debruçarem sobre o período, talvez a crise de 2008 seja no Brasil apenas uma nota de rodapé. Ao mesmo tempo, o fato que - disparado - foi a novidade mais importante de 2008 para os brasileiros foi solenemente ignorado por todos: imprensa, governo, opinião pública e o (frequentemente míope) mercado. Refiro-me à revisão da projeção populacional feita pelo IBGE naquele ano.
Nas palestras costumo chocar a plateia com um slide em que está escrito "o dia em que desapareceram 45 milhões de brasileiros", seguido de outro que diz "e ninguém falou uma palavra". Nada no Brasil terá sido mais relevante para definir o contexto em que nossos filhos vão viver nas próximas quatro décadas do que as informações que o IBGE nos trouxe naquela ocasião.
A instituição, que a cada quatro ou cinco anos tem feito revisões da projeção populacional até o ano de 2050 - antecedidas pelas revisões de 2000 e 2004 -, informou que:
A população brasileira, que na revisão de 2004 se imaginava que aumentaria até 2050, passaria a diminuir a partir de 2040;
a população total estimada para 2050, que em 2004 tinha sido prevista em 260 milhões de pessoas, alcançaria naquela data, pela revisão de 2008, na verdade, 45 milhões de pessoas a menos;
e a população de 15 a 59 anos, que na revisão de 2004 se supunha que cresceria até 2040 para cair depois, a rigor, pela nova revisão, começaria a declinar já em 2028.
Vamos recapitular o quadro em perspectiva um dia antes que o IBGE apresentasse sua revisão no ano de 2008. Até então o IBGE, em função da revisão de 2004, informava que:
A proporção de pessoas com 60 anos e mais de idade, prevista para 10% do total em 2010, aumentaria até 25% do total em 2050;
e a população com idades de 15 a 59 anos aumentaria anualmente 0,5% entre 2010 e 2050.
Tal quadro já era preocupante. Pois bem, não bastasse isso, o IBGE, em 2008 informou que, na verdade:
A proporção de pessoas com 60 anos e mais de idade aumentaria não até 25%, e sim até 30% do total em 2050;
e a população com idades de 15 a 59 anos não aumentaria 0,5 % ao ano, mas, ao contrário, encolheria em termos absolutos entre 2010 e 2050.
A mudança ocorrida entre 2004 e 2008 dava sequência a um fenômeno já observado na passagem da revisão de 2000 para a de 2004: a mudança progressiva do quadro de envelhecimento da população - a proporção crescente de idosos em perspectiva era maior na revisão de 2004 que na de 2000 e foi novamente maior para cada ano na revisão de 2008 que na de 2004.
O número de pessoas com 60 anos e mais para cada 100 pessoas no grupo etário de 15 a 59 anos, previsto para 2050, passou de 38, na revisão de 2000, para 43, na revisão de 2008 e, finalmente, para 52, na revisão de 2008.
Na revisão de 2008 o IBGE nos informou, então, que a população total do Brasil alcançaria um máximo de 219 milhões de pessoas em 2039, passando a declinar posteriormente; e que a população de 15 a 59 anos atingiria um máximo em 2027, caindo depois.
A maioria dos países, defrontados com uma realidade em perspectiva tão desafiadora como essa, teria acionado todos os sinais de alerta, começando a enfrentar a difícil tarefa de explicar à população que as regras de aposentadoria estabelecidas para uma realidade que estava ficando para trás teriam de ser revistas, não apenas porque a realidade estava mudando, mas também porque essa mudança se estava processando num ritmo mais intenso do que o originalmente previsto.
Já o Brasil, porém, preferiu exercitar o seu "lado grego", lembrando o velho tango argentino que diz que vos interpretás las cosas al revés. Não só manteve as regras de aposentadoria intactas, perpetuando o regime surrealista que permite, por exemplo, que as mulheres se aposentem por tempo de contribuição pelo INSS com 30 anos de serviço, em média, aos 52 anos de idade, quando têm a expectativa de viver mais 30 anos, como também aumentou o valor médio da aposentadoria, incrementando o valor real de duas em cada três aposentadorias a uma média de 5% ao ano entre 2008 e 2012.
Defrontada com a crise, recentemente a Grécia fez o impensável: reduziu o valor das aposentadorias - algo cuja brutalidade salta aos olhos. Exatamente para evitarem ter de chegar a essa situação dramática, os países, tendo de encarar o fenômeno do envelhecimento populacional, procuraram adotar mecanismos mitigadores do desequilíbrio futuro do sistema, postergando o momento da aposentadoria. O Brasil do contexto de fantasia dos anos recentes fez exatamente o oposto: não só conservou as mesmas regras esdrúxulas de aposentadoria e pensão no âmbito do INSS - regras que permitem, no limite, que uma moça de 20 anos se case com um idoso de 80 anos que morra um mês depois, deixando para a viúva pensão integral pelas seis ou sete décadas seguintes, sem ter contribuído com um centavo -, como, ainda por cima, aumentou a remuneração real de dois terços dos aposentados.
Diante dessa realidade, o que tem sido publicado na imprensa, que o governo vai anunciar após as eleições - o fim do fator previdenciário -, é uma verdadeira contrarreforma. Num país onde a população de 15 a 59 anos em 2050 será inferior à de 2010 e que se defronta com o imenso desafio de ter de elevar a sua competitividade num contexto em que a Previdência custa cada vez mais, iríamos aumentar o valor das futuras aposentadorias. É simplesmente espantoso.
Voltaremos a tratar do assunto daqui a uma semana.
Guerra cambial - CELSO MING
O Estado de S.Paulo - 22/09
Em sua viagem durante esta semana à Europa, especialmente nos debates e nas entrevistas de que participou, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, não fez outra coisa senão condenar as decisões tomadas pelos dois grandes bancos centrais do mundo, o Federal Reserve (Fed), dos Estados Unidos, e o Banco Central Europeu (BCE), pelo despejo de mais dinheiro nos mercados por meio da recompra de títulos. Ele voltou a denunciar a "guerra cambial" deflagrada e intensificada pelos Estados Unidos e pela área do euro.
Mantega também avisou que vai continuar combatendo o que entende por excessiva valorização do real, produzida, segundo ele, pela forte entrada desses recursos, por meio de recompra de moeda estrangeira pelo Banco Central do Brasil e por meio de taxação (IOF) na entrada de capitais.
São duas as observações que se podem fazer a partir dessas reiteradas manifestações do ministro Mantega. A primeira delas é que é descabido condenar os grandes bancos centrais. Eles apenas estão tentando tirar suas economias do brejo em que se encontram. E chegaram à conclusão de que é melhor correr mais riscos, mas fazer alguma coisa para reativar o crédito e a atividade econômica, do que não fazer nada e ver a paradeira afundando as grandes economias e as emergentes.
O mundo inteiro (menos a Alemanha e o ministro Guido Mantega) está aplaudindo a atuação corajosa dos grandes bancos centrais, porque entende que o problema maior é a estagnação global e não determinados efeitos colaterais que possam vir a derrubar a competitividade das economias emergentes, sobretudo a do Brasil.
Às vezes, Mantega alega que essas operações gigantescas de emissão de moeda não servem para nada, porque não seriam capazes de reativar a economia. Mas este é um ponto de vista discutível. O próprio presidente do Fed, Ben Bernanke, vem dizendo o contrário. Ele argumenta que os resultados podem até não ser visíveis. No entanto, o que precisa ser avaliado, diz ele, é o tamanho do buraco em que estaria a economia americana se essas decisões não tivessem sido tomadas.
Isso não quer dizer que o governo brasileiro tenha de ficar parado e que não deva defender a economia de eventuais avalanches de moeda estrangeira sobre o câmbio interno - e essa é a outra observação a ser feita.
Por enquanto não há evidências de que a terceira rodada de afrouxamento quantitativo (quantitative easing) do Fed esteja provocando novo tsunami de moeda estrangeira no câmbio interno. Mas, se isso acontecer, que venham as defesas do governo brasileiro, desde que ajudem.
Esse debate não tem a ver com o que se trava a respeito dos grandes desalinhamentos cambiais que preexistem à crise - embora estejam sendo agravados pelas políticas expansionistas dos grandes bancos centrais. Esses descompassos pulverizaram as estruturas tarifárias (Imposto de Importação) destinadas a defender os produtos nacionais contra a ação predatória dos importados. E é por isso, também, que as disputas sobre o protecionismo tarifário perderam boa parte de sua base de referência.
Mas este é o mundo desordenado de hoje que esta crise tende a agravar.