domingo, maio 06, 2012

Há reservas para a crise - ALBERTO TAMER


O Estado de S.Paulo - 06/05/12


O Brasil tem hoje em reservas liquidez de R$ 1,4 trilhão para enfrentar um possível agravamento da crise na zona do euro, que já dura mais de dois anos. Fechou praticamente o principal canal de contaminação, o financeiro.

Foi um processo iniciado bem antes, que melhorou consideravelmente a taxa de risco do país a ponto de as empresas e o governo estarem captando hoje aos juros mais baixos da história. E tudo indica que o Ministério da Fazenda, o Banco Central e o Tesouro estão reforçando esses instrumentos de defesa contra a crise.

Eles se concentram em alguns pontos básicos: aumento das reservas cambiais, compulsório, atração de investimentos diretos e colchão de liquidez no Tesouro. Há outros, como o equilíbrio fiscal e a relação dívida - PIB, mas estes podem ser considerados os pontos-chave com uma série de dados oficiais que podem ser cansativos, mas são essenciais para saber se o Brasil está ou não preparado para o agravamento de crises externas.

Nos últimos 12 anos, o Brasil passou a ser um país confiável, melhorou consideravelmente a taxa de risco, empresas e governo captam hoje - quando quiserem e se quiserem - aos juros mais baixos da história. E isso porque, entre outros fatores importantes, a dívida líquida do setor público caiu de 60% do PIB há 12 anos para 36,5% agora.

Esse cenário positivo só se fortaleceu nos últimos anos e mais ainda agora. Há dinheiro para financiar as contas correntes e liquidez para o financiamento da dívida pública.

Onde está. O colchão de liquidez brasileiro de RS$ 1,4 trilhão se encontra em três fontes.

1. Reservas internacionais que passaram de US$ 328 bilhões há um ano para US$ 374 bilhões em março. São recursos que poderiam ser usados em parte - como foram na crise de 2008 - em caso de extrema escassez de liquidez. As reservas cambiais, que dobraram entre 2007 e hoje, reduziram consideravelmente a vulnerabilidade externa da economia, foram e continuam sendo um importante instrumento para administrar as crises de 2008 e a atual.

2. A outra parcela de recursos é o compulsório dos bancos, depositado no Banco Central. Há um ano, eram RS$ 400,9 bilhões e, em março, chegaram a RS$ 407,7 bilhões. São recursos que foram usados antes e podem ser injetados no sistema financeiro a qualquer momento, se eventualmente faltar liquidez.

3. Ainda temos os investimentos diretos. Em 12 meses, passaram de US$ 60,5 bilhões para US$ 64 bilhões. Sozinhos, eles vêm financiando o déficit em conta corrente. E isso deve se manter considerando os projetos que as empresas externas já anunciaram para este ano. O BC estima que devem chegar a US$ 50 bilhões. No primeiro trimestre, já entraram quase US$ 15 bilhões.

Tesouro também. Mas há também recursos que os técnicos chamam de "colchão de liquidez do Tesouro" que podem ser injetados no mercado a qualquer momento. Eles estão hoje entre RS$ 180 bilhões e R$ 200 bilhões.

Sobra o comércio. O outro canal, o comercial, continua aberto. O superávit em abril caiu 55% em relação a igual mês do ano passado. E o resultado só não foi pior porque as importações recuaram 3,1% e os preços de algumas commodities ainda se mantêm. Mas é um problema que afeta mais a indústria do que a balança comercial, como vimos, financiada pelos investimentos diretos. E não há sinais de reversão em curto e médio prazos. O desafio decorre da desaceleração do comércio mundial, o desaquecimento na China e, principalmente, a recessão na Europa, que importou menos 3,7% este ano do Brasil. Um problema sem sinal de solução pelo menos este ano. Há fatores internos mais complexos além da simples demanda. Por exemplo, câmbio, juro, dependência crescente das exportações das commodities, falta de investimento em produtividade e inovação.

O desafio é menos grave do que seria no setor financeiro. Como lembrou Affonso Celso Pastore, em um de seus artigos no Estado, o Brasil não depende mais de grandes financiamentos externos em suas contas correntes, como no passado.

Fechando esses cenários, pode-se dizer que o Brasil está bem diante da crise, não vende, mas pela estabilidade econômica e fiscal, continua atraindo investimentos em meio à desaceleração mundial e ao aumento de liquidez externa provocada por países que ainda lutam com a recessão.

E tudo indica que a equipe econômica não só vai manter, mas reforçar ainda mais essa política de aumentar o colchão de liquidez interno porque não há nenhum sinal que as coisas lá fora vão melhorar este ano.

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