quarta-feira, abril 25, 2012

Assim na China como nos Estados Unidos - PEDRO CAFARDO


VALOR ECONÔMICO - - 25/04/12


Quem nunca foi à China, precisa aproveitar a primeira oportunidade que tiver para visitar esse país asiático. Ao chegar a Pequim, certamente vai se surpreender com a limpeza, as largas avenidas cercadas de álamos e os jardins bem cuidados. Em Xangai, vai ficar boquiaberto com o cenário de Blade Runner da majestosa fileira de arranha-céus iluminados e coloridos. No interior do país, vai se admirar com a aparência e o tamanho de cidades com nomes que não ouviu antes.

Essa é a nova China - a velha, em Pequim, Xian, Guilin e Guangzhou, é também admirável. Mas a China modernizou-se e enriqueceu a uma velocidade incrível nas últimas décadas e o fez ao mesmo tempo em que abria sua economia para o exterior, tornando-se um grande parceiro comercial do Ocidente.

Não há nenhuma dúvida de que o Brasil pegou carona nesse enriquecimento e nessa modernização chinesa. Basta olhar a evolução do comércio entre os dois países. Em 2001, o intercâmbio ficava em modestos US$ 3,2 bilhões. Dez anos depois, em 2011, o valor alcançou US$ 77,1 bilhões, ou seja, foi multiplicado por 24.

É apressado e superficial afirmar que o Brasil olhou para a China nos últimos anos e desprezou o mercado dos Estados Unidos. O que ocorreu foi crescimento em ritmo chinês no comércio com a China e em ritmo americano com os Estados Unidos.

O volume total de intercâmbio do Brasil com os Estados Unidos, em 2001, era de US$ 27 bilhões por ano, valor que subiu para US$ 60 bilhões no ano passado. Houve nesse período, portanto, um crescimento de 122%, nada mal.

Exceto em 2009, ápice da mais grave crise americana desde os anos 1930, as exportações brasileiras sempre aumentaram para os EUA durante os últimos dez anos. No ano passado, por exemplo, com o início da recuperação americana, as exportações cresceram 33% e somaram US$ 26 bilhões, nível só inferior ao de 2008 na década. Há, atualmente, segundo dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, 6,6 mil empresas brasileiras que exportam para o mercado americano.

Além de atender ao ritmo chinês de expansão, da ordem de 10% ao ano, as exportações para a China multiplicaram-se em razão da enorme demanda de commodities minerais e agrícolas, itens nos quais o Brasil é sabidamente especialista.

No ano passado, 85% das vendas brasileiras à China foram de produtos básicos (US$ 37,6 bilhões dos US$ 44,3 bilhões exportados) e apenas 4,5% de manufaturados (US$ 1,4 bilhão). Quatro itens da pauta (minério de ferro, soja, petróleo e celulose) concentraram uma receita de US$ 36 bilhões. Entre os manufaturados, só aviões tiveram valor expressivo na pauta exportadora, com US$ 619 milhões.

As economias do Brasil e da China são, portanto, complementares, o que não ocorre com os Estados Unidos, concorrentes ferozes na produção de commodities agrícolas, principalmente a soja. Por isso, a pauta de exportação brasileira para os EUA é mais "virtuosa", segundo as avaliações tradicionais, porque agrega um grande volume de manufaturas. No ano passado, 45,5% das exportações foram de manufaturados, numa relação bastante pulverizada, com aviões, motores, máquinas, peças, calçados e até pneus.

É apressado dizer que o Brasil olha apenas para a China

Estados Unidos e China são, assim, parceiros igualmente importantes para o Brasil. A corrente de comércio com a China é ligeiramente maior que a com os EUA, mas ambos os países têm dado contribuição indispensável para a formação dos superávits comerciais brasileiros.

Nos últimos dez anos, o saldo brasileiro acumulado foi de US$ 23 bilhões com a China e US$ 30 bilhões com os EUA. Desde a crise global de 2008, porém, a balança se desequilibrou muito no caso dos americanos e o Brasil acumulou um déficit de US$ 20 bilhões nos últimos três anos. No primeiro trimestre deste ano essa tendência se manteve e o déficit foi de US$ 769 milhões.

Na semana passada, o Valor mostrou que o comércio com a China teve uma clara desaceleração no primeiro trimestre deste ano. As exportações aumentaram apenas 10,6% e as importações, 13,9%. Nada surpreendente. O comércio se adapta ao possível novo ritmo chinês, ditado pela previsão do governo central de crescimento menor do PIB do país asiático, de 7,5% em 2012, ante 9,2% em 2011.

Redução de ritmo não significa redução de demanda, que certamente continuará a aumentar em compasso semelhante ao do PIB chinês. Além disso, poucos economistas chineses acreditam que essa meta de desaquecimento, anunciada pelo premiê Wen Jiabao, será cumprida. Em artigo no Valor, o presidente da China Society of World Economics, Yu Yongding, previu que os governos regionais do país lutarão com todas as forças para alcançar o maior crescimento possível, seguindo apenas "da boca pra fora" a convocação de Wen.

Sobre a China, enfim, a única certeza que se tem no ocidente é que esse país é insondável. É impossível saber se a meta do desaquecimento será cumprida ou não. Em qualquer hipótese, entretanto, vale a pena continuar de carona nessa gigante economia asiática, cujo PIB deve fechar o ano com US$ 7,7 trilhões, metade do americano.

O mesmo vale para os Estados Unidos, é claro.

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