quinta-feira, outubro 27, 2011
CELSO MING - Reforço para os bancos
Reforço para os bancos
CELSO MING
O ESTADÃO - 27/10/11
Os chefes de Estado da União Europeia, reunidos ontem em Bruxelas, avançaram em decisões que procuram injetar anticorpos no bloco do euro para limitar o contágio e a propagação da crise. Se tiveram ou não sucesso é o que se verá nas próximas semanas.
A Grécia foi considerada caso perdido.
Ninguém falou assim, mas, uma vez admitido o calote de 50% a 60% da dívida que a chanceler da Alemanha, Angela Merkel, e o presidente da França, Nicolas Sarkozy, impuseram aos bancos credores, pressupõe-se que não há solução pelos outros caminhos antes tentados.
O problema é que nem com esse mega corte a dívida parece sustentável. A Grécia ficará agora anos e anos afastada dos mercados de crédito e terá de sustentar as despesas do setor público somente com o que vier a ser arrecadado.
E numa conjuntura de perda de receita, uma vez que a retomada do crescimento não acontecerá tão cedo.
A hemorragia dos bancos subsequente ao enorme calote terá de ser contida por meio da recapitalização e do reforço das provisões. Não ficou claro de onde virão recursos para blindar os bancos, porque o objetivo é empurrá-los a se abastecerem, primeiramente, nos mercados. Enquanto não completarem esse processo que tem prazo para terminar (julho de 2012), não poderão pagar nem dividendos nem bônus por desempenho a seus diretores.
Também não foi explicado por que o volume de dinheiro necessário para essa recapitalização foi reduzido à metade, dos 200 bilhões de euros anteriormente calculados pelo Fundo Monetário Internacional.
Talvez se espere que um significativo número de instituições financeiras se desfaça de boa parte dos seus ativos, para não depender em tanto da captação e dos aportes de fontes oficiais.
De todo modo, ficou definido que os bancos terão um nível de capitalização correspondente a 9% dos seus ativos, ponderados pelo risco. E essa ponderação pelo risco leva a crer que os títulos de dívida da área do euro serão classificados pelo seu valor de mercado. Ou seja, com reconhecimento oficial, acabou o tempo em que todos os títulos de dívida soberana do bloco devessem ser considerados tão bons quanto os da Alemanha.
Fica para ser avaliado até que ponto o corte da dívida grega não encorajará outras reestruturações e, antes disso,senão servirá de precedente para novos endividamento sem escala em outros países.
Assim,um dos focos da reunião do encontro de ontem foi matar ainda no ovo a crise sistêmica dos bancos. Agora resta saber de onde sairá o capital que não conseguirem levantar nos mercados pela venda de ações novas.
No mais, as enormes pressões políticas sobre o governo da Itália para que apresse suas reformas sugerem que, ao menos informalmente, acaba de ser admitido certo grau de ingerência nos assuntos internos dos países de governança mais fraca. Esse pode ser o embrião de uma unidade fiscal.
A cúpula dos 27 chefes de Estado da União Europeia terminou no início da noite de ontem. A ela se seguiu o encontro dos 17 da área do euro. O principal assunto da pauta é a forma de aumentar o poder de fogo (alavancagem) do Fundo Europeu de Estabilidade Financeira (EFSF, na sigla em inglês), criado para dar cobertura a crises de liquidez e,provavelmente, também para socorrer instituições financeiras em perigo.
-------------------------------
- Acima da previsão
Os diretores do Banco Central bem que se esforçam para ver sinais de moderação nas estatísticas. No entanto, o avanço do crédito está muito longe de se conter entre 15% e 16%, como anunciaram no início do ano.
Em 12 meses terminados em setembro, o crédito na economia cresceu 19,6%. No início de 2011, seu estoque no sistema bancário correspondia a 46,4% do PIB. Ao final de setembro, subiu para 48,4% do PIB.
Ou seja, continua contribuindo excessivamente para aumentar a demanda e não vem ajudando a controlar a inflação.
A Grécia foi considerada caso perdido.
Ninguém falou assim, mas, uma vez admitido o calote de 50% a 60% da dívida que a chanceler da Alemanha, Angela Merkel, e o presidente da França, Nicolas Sarkozy, impuseram aos bancos credores, pressupõe-se que não há solução pelos outros caminhos antes tentados.
O problema é que nem com esse mega corte a dívida parece sustentável. A Grécia ficará agora anos e anos afastada dos mercados de crédito e terá de sustentar as despesas do setor público somente com o que vier a ser arrecadado.
E numa conjuntura de perda de receita, uma vez que a retomada do crescimento não acontecerá tão cedo.
A hemorragia dos bancos subsequente ao enorme calote terá de ser contida por meio da recapitalização e do reforço das provisões. Não ficou claro de onde virão recursos para blindar os bancos, porque o objetivo é empurrá-los a se abastecerem, primeiramente, nos mercados. Enquanto não completarem esse processo que tem prazo para terminar (julho de 2012), não poderão pagar nem dividendos nem bônus por desempenho a seus diretores.
Também não foi explicado por que o volume de dinheiro necessário para essa recapitalização foi reduzido à metade, dos 200 bilhões de euros anteriormente calculados pelo Fundo Monetário Internacional.
Talvez se espere que um significativo número de instituições financeiras se desfaça de boa parte dos seus ativos, para não depender em tanto da captação e dos aportes de fontes oficiais.
De todo modo, ficou definido que os bancos terão um nível de capitalização correspondente a 9% dos seus ativos, ponderados pelo risco. E essa ponderação pelo risco leva a crer que os títulos de dívida da área do euro serão classificados pelo seu valor de mercado. Ou seja, com reconhecimento oficial, acabou o tempo em que todos os títulos de dívida soberana do bloco devessem ser considerados tão bons quanto os da Alemanha.
Fica para ser avaliado até que ponto o corte da dívida grega não encorajará outras reestruturações e, antes disso,senão servirá de precedente para novos endividamento sem escala em outros países.
Assim,um dos focos da reunião do encontro de ontem foi matar ainda no ovo a crise sistêmica dos bancos. Agora resta saber de onde sairá o capital que não conseguirem levantar nos mercados pela venda de ações novas.
No mais, as enormes pressões políticas sobre o governo da Itália para que apresse suas reformas sugerem que, ao menos informalmente, acaba de ser admitido certo grau de ingerência nos assuntos internos dos países de governança mais fraca. Esse pode ser o embrião de uma unidade fiscal.
A cúpula dos 27 chefes de Estado da União Europeia terminou no início da noite de ontem. A ela se seguiu o encontro dos 17 da área do euro. O principal assunto da pauta é a forma de aumentar o poder de fogo (alavancagem) do Fundo Europeu de Estabilidade Financeira (EFSF, na sigla em inglês), criado para dar cobertura a crises de liquidez e,provavelmente, também para socorrer instituições financeiras em perigo.
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- Acima da previsão
Os diretores do Banco Central bem que se esforçam para ver sinais de moderação nas estatísticas. No entanto, o avanço do crédito está muito longe de se conter entre 15% e 16%, como anunciaram no início do ano.
Em 12 meses terminados em setembro, o crédito na economia cresceu 19,6%. No início de 2011, seu estoque no sistema bancário correspondia a 46,4% do PIB. Ao final de setembro, subiu para 48,4% do PIB.
Ou seja, continua contribuindo excessivamente para aumentar a demanda e não vem ajudando a controlar a inflação.
ILIMAR FRANCO - Vetado?
Vetado?
ILIMAR FRANCO
0 GLOBO - 27/10/11
A tarefa do futuro ministro do Esporte
A saída de Orlando Silva não resolve os problemas da pasta, na visão de assessores no Palácio do Planalto. A presidente Dilma quer que o futuro ministro faça uma limpa, tirando os militantes que respondiam pelas áreas onde há irregularidades. Por isso, Dilma está refletindo sobre a capacidade de um novo ministro do PCdoB fazer o que tem de ser feito: cortar na própria carne. Segundo um assessor, "as coisas ainda não estão claras na cabeça da presidente". Além disso, há petistas contrários à nomeação de Aldo. Veem no ministério um trampolim para que ele volte a disputar a presidência da Câmara em 2013.
"Vamos acabar com essas prerrogativas do Ibama. O Ibama quer parar o Brasil. Não vai parar não” — Flexa Ribeiro, senador (PSDB-PA)
AFIRMATIVO. Buscando construir sua candidatura presidencial, o senador Aécio Neves (PSDB-MG) promoveu ontem uma sessão especial, para políticos e jornalistas, do filme “Tancredo, a travessia”, de Silvio Tendler. O político mineiro quer vincular sua imagem à luta pela redemocratização do país, enquanto é alvo de cobranças internas em seu partido para que assuma uma postura mais ativa e enérgica de oposição ao governo Dilma.
Estrago menor
Tinha gente no PCdoB lamentando ontem que o partido não tivesse construído uma saída para o ministro Orlando Silva (Esporte) na última sexta-feira, quando ele conversou com a presidente Dilma, antes da abertura do inquérito pelo STF.
Ser ou não ser
As bancadas do Rio e do Espírito Santo estão divididas quanto à obstrução da DRU para pressionar o governo a negociar a redistribuição dos royalties do petróleo. A maior entusiasta é a vice da Câmara, deputada Rose de Freitas (PMDB-ES). "Está todo mundo com medo de obstruir a DRU. Temos que mostrar que nós existimos", disse ela. No grupo dos moderados está o deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ). Ele ponderou que a medida vai implodir todas as pontes de negociação com o governo.
Dois senhores
O governador Eduardo Campos (PE) fez ontem discurso sob medida para a festa do heterogêneo PSD: elogiou o ex-presidente FH pela regulamentação do sistema financeiro nacional; e o ex-presidente Lula, pelo combate à pobreza.
Pressão
Os líderes governistas na Câmara condicionaram a votação da DRU, no dia 8, à liberação das emendas parlamentares. O xeque-mate foi dado ontem, em reunião, com as ministras Ideli Salvatti, Gleisi Hoffmann e Miriam Belchior.
A DEPUTADA Luciana Santos (PCdoB-PE) ganhou um entusiasta defensor de sua nomeação para o Ministério do Esporte: o governador Eduardo Campos (PSB-PE). O outro cotado, Aldo Rebelo, concorreu com sua mãe, Ana Arraes, que ontem assumiu o TCU.
A MINISTRA Ideli Salvatti (Relações Institucionais) comemora. O Pronatec foi aprovado em seis meses, o ProUni demorou dois anos.
O PRESIDENTE do PSDB, deputado Sérgio Guerra (PE), conseguiu, na terça-feira, convencer o deputado Berinho Bantim (RR) a não migrar para o PSD.
ANTÔNIO CARLOS DE MEDEIROS - Ao estilo mineiro
Ao estilo mineiro
ANTÔNIO CARLOS DE MEDEIROS
O GLOBO - 27/10/11
Sem alarde, está em curso uma concertação política no Brasil do governo Dilma Rousseff. Os governadores ampliam a sua inserção nos diálogos políticos. Os movimentos sociais também. A mídia ocupa-se da "faxina" e contribui para melhorar a imagem simbólica da presidente Dilma. E os diálogos com o Congresso permanecem tensos, mas em processo de distensão. Enquanto isto, a imagem da presidente e do governo melhora nas classes médias.
Elementos para uma concertação não anunciada. Tímida ainda. Mas já em curso. No eixo dos governadores, tanto o programa Brasil Sem Miséria, lançado em São Paulo ao lado dos governadores do Sudeste, quanto a - mesmo tensa e prolongada - negociação sobre os royalties do petróleo, para citar apenas dois exemplos, colocam a Federação em movimento e ajudam o governo a ampliar a capacidade política.
Esta ampliação de capacidade política advém, portanto, da mudança de eixos e canais da ação governamental e da ação política. Trata-se de uma travessia que exige novas âncoras e uma agenda para o país.
Ao movimentar a Federação e fortalecer o federalismo, criam-se âncoras e ampliam-se as capacidades de interlocução e negociação, ou seja, de mediação política. Isto é muito importante. Uma agenda mais condizente com a realidade brasileira deve mesmo partir de uma visão político-institucional do federalismo, conforme têm sinalizado vários governadores, como Marcelo Déda e Eduardo Campos, por exemplo.
É importante colocar ênfase no eixo da relações políticas entre os três níveis de governo. O federalismo é fundamental na produção de flexibilidade e de mediação de conflitos do nosso (complexo) sistema político. Ele contribui para a canalização das complexas relações sociais que se movimentam na heterogênea sociedade brasileira. O nosso processo político real continua sendo tecido muito mais por situações de continuidade, do que por situações de ruptura. O "moderno" continua convivendo com o "tradicional".
A política brasileira continua com inequívoca dimensão regional, centrada nos estados. Os partidos selecionam seus candidatos no âmbito estadual. Os políticos mantém estreitos vínculos políticos locais e paroquiais. Tudo somado, acaba-se reforçando a necessidade do federalismo na consolidação democrática. Ele desempenha importante papel de mediação política.
O governo Dilma Rousseff dá sinais práticos e inequívocos de articular o fortalecimento do eixo federativo tanto na articulação política quanto na prestação de serviços. Conjugando o eixo federativo com a melhoria das interlocuções com o movimentos sociais e com a política real e simbólica da "faxina", Dilma também ganha aceitação nas classes médias e, portanto, fôlego político para atravessar a crise com poucos solavancos. São sinais de uma concertação sem alarde, bem ao estilo mineiro.
ANTÔNIO CARLOS DE MEDEIROS é cientista político.
RUI NOGUEIRA - Os bolinhos de Laguna e o ministro com validade vencida
Os bolinhos de Laguna e o ministro com validade vencida
RUI NOGUEIRA
O ESTADÃO - 27/10/11
Embora a gota d"água para tirar Orlando Silva do Esporte tenha sido a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) pela abertura de inquérito para investigar o ministro, a presidente Dilma Rousseff montou na semana passada uma pilha de argumentos para justificar a demissão. As reações e ameaças políticas do PC do B e o apoio do ex-presidente Lula à resistência de Orlando adiaram o desfecho, mas Dilma só usou o STF como carta final de um jogo que estava jogado desde o dia 20.
Em viagem à África, a presidente recebeu dos assessores informações de três tipos: 1) com base em auditorias da Controladoria-Geral da União, feitas em 2008 e 2009, e de relatórios de auditores do Tribunal de Contas da União, a "gestora" Dilma viu que o Esporte padecia de uma "congestão" de convênios com fraudes grosseiras; 2) uma radiografia política mostrou que as únicas ações sob controle do ministério eram os convênios negócio de interesse direto do PC do B, como os da vereadora Karina Rodrigues (PC do B), dona da ONG Bola Pra Frente, de Jaguariúna (SP); 3) uma lupa sobre o organograma e o vaivém de secretários e assessores de Orlando revelou que o ministro havia transformado os cargos executivos da pasta em rodízio de trampolim eleitoral para os "meninos da UNE". Eles abandonaram as universidades para serem empregados comissionados do ministério e "donos"de orçamentos públicos bilionários -o próprio Orlando,Wadson Ribeiro, Ricardo Capelli e Ricardo Gomyde são exemplos de estudantes que não fizeram mais que "cursar cursos".
Com essas radiografias prontas, Dilma desembarcou na noite de quinta-feira em Brasília e, ao final da reunião com o "gabinete de crise", no Alvorada, decidiu o óbvio: tirar Orlando porque estava diante de um "desgaste político irreversível".
Um assessor da presidente leu o Anexo 1 ao Relatório 224.387/2009, da CGU, que descreve o que foi feito com R$ 170 milhões do programa Segundo Tempo. A auditoria atingiu convênios em 18 Estados. Até um leitor desatento tropeça nos "malfeitos": fraudes grosseiras na compra de alimentos, notas frias a granel, dinheiro público depositado em contas privadas e cadastros em duplicidade para inflar o número de crianças atendidas.
O desmando era tão explícito que as crianças e adolescentes de Laguna (SC) chegaram a receber lanches duas vezes por semana, em vez de cinco vezes por semana. Pior: "Os lanches eram entregues por uma van que se deslocava de Brasília para fazer a entrega em todos os núcleos do Estado de Santa Catarina. Um bolinho (fornecido no lanche) chegou aos núcleos com prazo de validade vencido". Assim como a groselha vencida descoberta pela reportagem do Estado, em fevereiro.
Orlando Silva era mesmo um ministro com prazo de validade vencido.
ALON FEUERWERKER - Em pleno voo
Em pleno voo
ALON FEUERWERKER
CORREIO BRAZILIENSE - 27/10/11
O ministro do Esporte perdeu sustentação e o desfecho ficou óbvio. Mas o problema é estrutural. Ou Dilma Rousseff promove alguma reengenharia nos ministérios, ou irá de crise em crise. Sempre esperando pela próxima explosão.
A administração dela é uma construção herdada. Um governo velho, de presidente nova. Isso já foi tratado aqui, como risco, e os fatos se encarregam de materializar a previsão.
"O que poderia ter sido" não é instrumento de análise política, mas talvez Dilma tenha cedido demais ao continuísmo. Na hora pode ter soado confortável, mas as consequências aparecem agora.
As forças políticas empenhadas na vitória dela tinham essa expectativa. Quem é governo e trabalha para eleger o candidato do governo espera continuar. É humano.
Há maneiras e maneiras de promover essa continuidade. A opção de Dilma foi preservar verticalmente as máquinas. Não mexeu nelas, ou mexeu pouco.
Poderia ter promovido algum rodízio, fazer uma rotação de cabeças para abrir espaço. Manter todo mundo, mas rodar as cadeiras. Para permitir a abertura das porteiras. A oxigenação nos escalões inferiores. Não fez. Porque não quis ou não pôde, tanto faz.
E desde que o mundo é mundo o poder envelhecido apresenta certas características.
Agora Dilma anda às voltas com o desafio de consertar o avião em pleno voo, quando antes poderia ter reparado a aeronave em terra. E o problema não está apenas na remoção dos focos de irregularidades.
Está na dificuldade de exibir marcas novas, de abrir novos horizontes, de mostrar disposição para atacar frentes até agora intocadas.
Pois se as pesquisas mostram alguma folga na imagem presidencial, trazem também desconforto com o desempenho de áreas sensíveis.
Um produto imediato do envelhecimento é o foco numa agenda negativa, que bebe de diversas fontes, inclusive pela abundância de matéria-prima.
Mas há outras razões, inclusive a tendência presidencial a anular os ministros. Eles hoje em dia parecem ter mais medo de errar do que vontade de acertar.
A máquina de produzir notícias positivas, que funcionava tão bem com Luiz Inácio Lula da Silva, parece algo emperrada.
Há alguma lógica nisso, pois Dilma opera a reconcentração de poder numa Esplanada que recebeu pulverizada. E Dilma não é Lula. Não tem a perícia do antecessor na comunicação.
Cada um com suas características, mas de qualquer modo tem faltado à presidente certa habilidade essencial ao governante: montar uma máquina que seja dela e ao mesmo tempo agregue força e brilho à chefe.
Falta certa capacidade de usar em proveito próprio o ativo alheio.
Como andam?Escrevi dias atrás que a crise do Esporte é também uma oportunidade, como diz o chavão.
Que talvez esteja na hora de olhar para o andamento geral das coisas relativas à Copa do Mundo e às Olimpíadas.
Tem sido um problema nas trocas ministeriais. Ministros vão, ministros vêm, mas nunca se olha com atenção específica para o trabalho deles, para além até da busca de possíveis encrencas.
Troca-se o ministro e o trabalho da pasta some do noticiário. Como se o único interesse da sociedade estivesse na regularidade da aplicação do dinheiro.
O Programa Segundo Tempo, por exemplo. Talvez seja boa ocasião para avaliar não apenas se está sendo operado com correção, mas também os resultados.
Ele já tem quase uma década. O que efetivamente produziu? Aliás, o que pretendia produzir? Ninguém sabe, ninguém viu.
Os últimos governos, tucanos e petistas, mais estes que aqueles, foram pródigos em alavancar políticas públicas voltadas à chamada inclusão social.
Uma característica desses programas é distribuir dinheiro público. Pois uma função do Estado é cobrar de quem tem para ajudar quem não tem.
Mas não se vê maior esforço para avaliar resultados e medir o retorno do que foi investido. Uma pena.
A realocação de recursos de programas que não funcionam seria uma bela maneira de achar dinheiro para coisas que eventualmente poderiam funcionar.
SONIA RACY - DIRETO DA FONTE
Caminhando
SONIA RACY
O ESTADÃO - 27/10/11
Procurado ontem,Abilio confirmou a conversa mas não quis falar sobre a pauta. Ulisses Kameyama, do Casino, também confirmou o encontro. “Mas não conheço o conteúdo”.
Estranho horário
Roquinho Barbiere voltou a apontar sua artilharia para Dilmo dos Santos, anteontem, no plenário da Assembleia paulista. Mas também agradeceu o Conselho de Ética por ter sido convidado, e não convocado, a falar sobre o escândalo das emendas. Da tribuna, disparou: “Não vão me tratar como bandido”. Eram 9h da noite.
Ele é carioca
Criado para fazer frente ao Fórum de Davos, o Global Economic Summit 2012 será no Rio. Em parceria com a FGV-RJ.
Martelo soou anteontem, em seleto jantar no restaurante La Tambouille, para 15 pessoas. Oferecido pela empresa patrocinadora-mor, Bertelsmann Stiftung, com presença de seu CEO, Gunter Thielen.
Negociação
Além da parceria com a SulAmérica, a francesa Axa quer comprar a parte do ING na seguradora brasileira.
Bê a bá
O Sírio-Libanês faz escola. No sábado, o ministro da Saúde da Eslovênia visitou o hospital; anteontem, foi a vez de seu par iraquiano. Levaram, na bagagem, ideias de gestão para seus países.
Vida e obra
Washington Olivetto não está dando pitaco no filme da O2 sobre sua vida. Baseado no livro Na Tocados Leões, de Fernando Morais, o longa não se limitará a seu sequestro. O diretor? WolneyAtalla.
Voltei?
Ronaldo está confirmado para o jogo de domingo, no Pacaembu, contra o Avaí. Não, não se trata de reforço de peso para o Corinthians na reta final do Brasileirão. É só parte dos compromissos de marketing do Fenômeno.
Escalada
O Ibope concluiu pesquisa de intenção de voto para a presidência da OAB-SP. Rui Fragoso, da oposição, aparece em primeiro, com 31%; Alberto Toron tem 9%. Na sequência, dois nomes da situação: Sergei Cobra Arbex, 5%, e Marcos da Costa, 4%. Foram ouvidos 500 advogados inscritos na Ordem, entre 15 de setembro e 3 de outubro, em questionário direcionado.
Sem pai
Indagados pela coluna, oposição e situação negam a encomenda da pesquisa. O Ibope informa não poder revelar o cliente. E o campeão Fragoso avisa: “Ainda não decidi se entrarei na disputa”.
Limonada
Norman Foster, um dos maiores arquitetos da atualidade, tentou aterrissar em Trancoso, domingo, pilotando seu avião Falcon 7X – cujo interior e parte externa foram projetados por ele para a empresa NetJets.
Impedido pela chuva, veio a Sampa,jantou na casa de Isabella Prata, passou pela Pinacoteca,quis conhecer Isay Weinfeld e a Casa de Vidro, de Lina Bo Bardi - – na qual fará intervenção com curadoria do renomado Hans Ulrich Obrist.
Em tempo: Foster desenhou o novo Estádio de Wembley e os aeroportos de Hong Kong e Pequim.
Mouse verde
Petição online já conta mais de 30 mil assinaturas pedindo ao Senado para que barre novo projeto de lei do Código Florestal. Aação, do Comitê Brasil em Defesa das Florestas, bomba no Twitter.
Na frente
Conforme antecipado nesta coluna, no dia 18, a nova fábrica da VW no Brasil é de Pernambuco. Ponto para Eduardo Campos.
Raquel Arnaud recebe hoje, em sua galeria, José Resende para um bate-papo sobre a produção artística e o mercado das artes.
Fábio Barbosa comanda a palestra O Brasil que Queremos Construir. Hoje, no Colégio Santa Cruz, em SP.
Acontece, hoje, o Leilão Beneficente Rino Mania. No Jockey Club de São Paulo.
Fernanda Trevellin abre individual. Hoje, na Arte Contemporânea.
A Lamp Berger Paris aterrissa na loja de Esther Giobbi.
Georges Henri Foz e Juan Troccoli pilotam festa dos 11 anos do Azucar. Hoje.
Ontem, na hora do almoço, antes mesmo de qualquer confirmação sobre a queda de Orlando Silva, a assessoria do Instituto Millenium já oferecia nomes para comentá-la. Eita eficiência.
EDITORIAL O ESTADÃO - Novo assalto ao FGTS
Novo assalto ao FGTS
EDITORIAL
O ESTADÃO - 27/10/11
O governo tenta novamente meter a mão no Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), patrimônio do trabalhador, para desperdiçá-lo em maus negócios. A ideia, desta vez, é investir recursos do fundo em obras para a Copa do Mundo de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016. Se a manobra der certo, o dinheiro poderá ser aplicado em estádios, centros esportivos de treinamento e "empreendimentos hoteleiros e comerciais". A proposta foi incluída no texto da Medida Provisória (MP) 540 pelo relator do projeto na Câmara, deputado Renato Molling.
Essa MP trata da política industrial proposta no Plano Brasil Maior, mas seu texto foi alterado e seu objetivo ampliado durante a tramitação. A primeira grande mudança foi a inclusão de cinco emendas por interferência da Receita Federal. Essa alteração deveria resultar num grande aumento de impostos sobre algumas operações.
Esse lance foi denunciado em reportagem do Estado. Não houve manifestação pública nem da Receita Federal nem do gabinete do Ministério da Fazenda, mas o assunto chegou ao Palácio do Planalto. Por ordem do gabinete presidencial, as emendas foram eliminadas. Mas o projeto continuou muito ruim, porque outros defeitos não foram corrigidos e, além disso, o governo introduziu no texto a autorização para uso do Fundo de Investimento do FGTS (FI-FGTS) para o custeio de obras vinculadas à Copa e à Olimpíada.
A criação do FI-FGTS, em 2007, para financiar obras de infraestrutura nos setores de rodovias, ferrovias, hidrovias, portos, energia e saneamento, já foi uma péssima ideia. O País precisa de investimentos em todas essas áreas, mas não tem sentido usar um patrimônio do trabalhador, destinado a dar-lhe segurança, para financiar empreendimentos desse tipo. Financiar a ampliação e a modernização da infraestrutura é tarefa para ser dividida entre o Tesouro público e o capital privado de acordo com o custo e as possibilidades de retorno de cada projeto.
A Caixa, responsável pelas aplicações do FI-FGTS, obteve um péssimo resultado com os investimentos em 2010. Dez das 15 companhias selecionadas para receber os investimentos tiveram prejuízo e a rentabilidade do fundo ficou abaixo da prometida pela Caixa. As compras de participação foram concentradas no setor de energia elétrica e houve atraso nas obras das empresas selecionadas. Segundo o superintendente de Fundos de Investimento Especiais da Caixa, as empresas não poderiam ter gerado receita por não estarem produzindo. Mas tudo mudará, disse ele ao Estado, quando começarem as operações comerciais e as empresas tiverem suas ações cotadas em bolsa.
A explicação tem sentido, mas a justificativa não vale para o caso do FI-FGTS. Não é razoável usar um fundo de segurança do trabalhador para investimentos sujeitos a atrasos e a múltiplos acidentes de percurso, como têm sido, no Brasil, os investimentos no setor energético.
O governo simplesmente agiu de forma irresponsável ao aplicar esse dinheiro em empreendimentos com baixo grau de segurança quanto a prazos, custos, e até quanto à possibilidade de conclusão. As autoridades, no entanto, parecem nada ter aprendido com essa experiência, e agora propõem usar o FI-FGTS para outros investimentos de qualidade muito duvidosa. Os investimentos necessários à realização dos grandes eventos de 2014 e 2016 já estão atrasados, seus custos já foram revistos mais de uma vez e ninguém sabe quanto dinheiro ainda consumirão e qual será seu retorno. Alguns projetos podem resultar em elefantes brancos, como ensina a experiência.
Em vez de ensaiar mais esse atentado ao patrimônio do trabalhador, o governo deveria ter cuidado de corrigir defeitos flagrantes da MP 540. Um deles é a tributação do faturamento para compensar a desoneração da folha salarial de alguns setores. A cobrança estipulada pelo governo poderá, como já se advertiu, resultar em aumento da carga tributária para várias indústrias. Isso comprova o despreparo do governo para a elaboração de políticas setoriais. A presidente Dilma Rousseff deveria preocupar-se com isso antes de se arriscar em novas aventuras.
VINICIUS TORRES FREIRE - Mentiras sinceras interessam
Mentiras sinceras interessam
VINICIUS TORRES FREIRE
FOLHA DE SP - 27/10/11
TALVEZ A MANEIRA menos imprecisa de prever o que vão fazer os líderes políticos europeus a respeito da quizumba financeira continental seja trocar o sinal do que eles diziam faz, digamos, uns seis meses.
Agora, afirmam que não haverá dinheiro público para recapitalizar bancos ameaçados de quebra pelo calote "organizado" da Grécia. Logo, é razoável supor que, daqui ao primeiro trimestre de 2012, bancos ou parte deles serão estatizados.
Não se trata de exagero de sarcasmo. Basta reler o que disse a elite político-econômica da eurozona desde 2009, quando ficou evidente que a Grécia adernava.
Todas as decisões tomadas de modo atropelado a fim de evitar catástrofe iminente consistiram de medidas negadas e renegadas pela Comissão Europeia, pela Alemanha e pelo Banco Central Europeu.
A conversa fiada começou ainda no final de 2009: a Grécia não precisaria de "ajuda". Houve "ajuda".
Quando se admitiu abertamente que a Grécia quebrara, lá por abril de 2010, dizia-se que uns € 40 bilhões e arrocho fiscal dariam conta do recado. Não deram, claro. A conta pode chegar ao trilhão.
Quando se notou o tamanho do rombo, lá por maio, com os urubus do mercado já bicando o cadáver grego e dando rasantes sobre Portugal, dizia-se que o BCE não compraria papéis da dívida pública dos países periféricos nem socorreria bancos por baixo do pano. No mesmo mês de maio, o BCE teve de comparecer e, na prática, ajudar bancos a financiar indiretamente parte da dívida pública.
O resto é história mais recente. O pacote de maio de 2010 durou até maio de 2011. Então se tornou um fundo de cobertura de calotes e assemelhados, o presente fundo de estabilização, de € 440 bilhões, que também já nasceu com insuficiência financeira aguda.
Pouco antes disso, a cúpula europeia declarava que a hipótese de calote grego era inegociável: não haveria renegociação de prazos ou valores da dívida, nada. Semanas depois, haveria a "renegociação voluntária": os bancos que assim o desejassem poderiam alongar seus empréstimos à Grécia.
Na verdade, os bancos já sentiam fazia tempo o cheiro de queimado e, então, achavam que um calotezinho na forma de alongamento de prazos talvez resolvesse o enrosco.
Era tudo besteira, como se viu. Passou-se a admitir um calote de uns 20%, em julho deste ano. Agora, discute-se a perda para os bancos credores será de 50% a 60%.
Enfim, a liderança política europeia, Alemanha e BCE em particular, aceitou fazer tudo o que deveria ter implementado muito antes, mas jurava de pés juntos que não faria. Nesse ínterim, a inação e as bazófias ajudaram a deprimir a economia mundial, sem que nenhum problema financeiro ou econômico europeu fosse resolvido.
Agora, discutem o tamanho do rombo e quem vai assumi-lo. As ações de bancos europeus estão desvalorizadíssimas. Se tiverem de recapitalizar-se a esse preço, os atuais acionistas tomarão tundas monumentais (vão perder participação). Resistem, pois, ao calote de 60%. E querem ajuda estatal. A novela ganhou uma nova trama.
Por fim, nada disso vai impedir que boa parte da eurozona fique estagnada ainda por cinco anos. Com risco de mais tumulto social.
Agora, afirmam que não haverá dinheiro público para recapitalizar bancos ameaçados de quebra pelo calote "organizado" da Grécia. Logo, é razoável supor que, daqui ao primeiro trimestre de 2012, bancos ou parte deles serão estatizados.
Não se trata de exagero de sarcasmo. Basta reler o que disse a elite político-econômica da eurozona desde 2009, quando ficou evidente que a Grécia adernava.
Todas as decisões tomadas de modo atropelado a fim de evitar catástrofe iminente consistiram de medidas negadas e renegadas pela Comissão Europeia, pela Alemanha e pelo Banco Central Europeu.
A conversa fiada começou ainda no final de 2009: a Grécia não precisaria de "ajuda". Houve "ajuda".
Quando se admitiu abertamente que a Grécia quebrara, lá por abril de 2010, dizia-se que uns € 40 bilhões e arrocho fiscal dariam conta do recado. Não deram, claro. A conta pode chegar ao trilhão.
Quando se notou o tamanho do rombo, lá por maio, com os urubus do mercado já bicando o cadáver grego e dando rasantes sobre Portugal, dizia-se que o BCE não compraria papéis da dívida pública dos países periféricos nem socorreria bancos por baixo do pano. No mesmo mês de maio, o BCE teve de comparecer e, na prática, ajudar bancos a financiar indiretamente parte da dívida pública.
O resto é história mais recente. O pacote de maio de 2010 durou até maio de 2011. Então se tornou um fundo de cobertura de calotes e assemelhados, o presente fundo de estabilização, de € 440 bilhões, que também já nasceu com insuficiência financeira aguda.
Pouco antes disso, a cúpula europeia declarava que a hipótese de calote grego era inegociável: não haveria renegociação de prazos ou valores da dívida, nada. Semanas depois, haveria a "renegociação voluntária": os bancos que assim o desejassem poderiam alongar seus empréstimos à Grécia.
Na verdade, os bancos já sentiam fazia tempo o cheiro de queimado e, então, achavam que um calotezinho na forma de alongamento de prazos talvez resolvesse o enrosco.
Era tudo besteira, como se viu. Passou-se a admitir um calote de uns 20%, em julho deste ano. Agora, discute-se a perda para os bancos credores será de 50% a 60%.
Enfim, a liderança política europeia, Alemanha e BCE em particular, aceitou fazer tudo o que deveria ter implementado muito antes, mas jurava de pés juntos que não faria. Nesse ínterim, a inação e as bazófias ajudaram a deprimir a economia mundial, sem que nenhum problema financeiro ou econômico europeu fosse resolvido.
Agora, discutem o tamanho do rombo e quem vai assumi-lo. As ações de bancos europeus estão desvalorizadíssimas. Se tiverem de recapitalizar-se a esse preço, os atuais acionistas tomarão tundas monumentais (vão perder participação). Resistem, pois, ao calote de 60%. E querem ajuda estatal. A novela ganhou uma nova trama.
Por fim, nada disso vai impedir que boa parte da eurozona fique estagnada ainda por cinco anos. Com risco de mais tumulto social.
JOSÉ SERRA - Decifra-me ou te devoro
Decifra-me ou te devoro
JOSÉ SERRA
O ESTADÃO - 27/10/11
"Decifra-me ou te devoro". Esse era o desafio da Esfinge de Tebas. Ela eliminava aqueles que se mostrassem incapazes de responder a um enigma: "Que criatura tem quatro pés de manhã, dois ao meio-dia e três à tarde?". Todos os que ensaiaram a resposta haviam sido estrangulados. Édipo acertou: "É o ser humano! Engatinha quando bebê, anda sobre dois pés quando adulto e recorre a uma bengala na velhice". A Grécia traz hoje um novo enigma. Existe uma Esfinge de Tebas simbólica a assombrar a União Europeia (UE). Quem der a resposta errada será estrangulado, como no mito.
"O fracasso da Grécia seria o fracasso de toda a Europa. Não é possível deixá-la cair". São palavras de Nicolas Sarkozy, presidente da França. A quebra de um país que representa menos de 3% da economia europeia pode empurrar a Eurolândia para uma depressão profunda e, mais do que isso, desorganizá-la. Como é possível?
A Grécia abusou do gasto público desde que aderiu ao euro. Seu déficit fiscal em 2009 superava os 15% do PIB; o déficit primário, 10%! A dívida pública grega, que em 2009 chegava a 130% do PIB, cresceu ainda mais em decorrência da crise, estimada em 150% neste ano e 170% em 2012.
Pior, em vista de aumentos salariais além da produtividade e de inflação acima da média europeia, o país perdeu 27% de competitividade em relação à região sem ter, em razão da moeda comum, taxa de câmbio nominal para ajustar: seu déficit externo em conta corrente superou os 8% do PIB.
Mas os gregos não carregam toda a culpa. No fim de 2009 o país pediu ajuda ao Fundo Monetário Internacional (FMI). O spread dos seus títulos em relação aos alemães era só de 2%. Naquele momento, a UE e o Banco Central Europeu (BCE) foram contra a ajuda do FMI. Por quê? Razões corporativas do BCE, falta de descortino e excesso de oba-oba dos líderes europeus. Seis meses de discussões estéreis, com a economia grega rolando num tobogã, até que a necessidade do acordo se impôs, só que em muito piores condições.
Quando o FMI fez o empréstimo, o spread já era de 9% e a deterioração da economia, galopante: o PIB, que já caíra 2% em 2009, declinou 4,5% em 2010 e em 2011, mais 4%. Compôs-se o círculo vicioso: enfraquecimento do setor privado, aumento do desemprego, queda da receita tributária, pressão sobre o déficit... Como nas tragédias gregas, depois da excitação da vitória, que traz consigo a irresponsabilidade, aconteceu a reversão do destino.
Reestruturar a dívida grega não bastaria, dado o tamanho do déficit fiscal. Daí também a imposição de um brutal ajuste, à procura de um superávit primário de 6% do PIB. Assim, em dois anos o governo grego deveria reduzir seus gastos primários em cerca de 16% do PIB! Isso com atividade econômica em queda. Mais ainda, sem uma taxa de câmbio para desvalorizar, o enfrentamento do desequilíbrio externo exigiria também uma inflação menor do que a média europeia, fortes redução de custos e aumentos da produtividade.
Parte da reestruturação da dívida grega já se fez, mas o desconto do valor presente dos títulos em mãos privadas tem de passar dos 20% de hoje para mais de 60%. O precedente, os impasses e a sensação de que se trata de um buraco sem fundo já contaminaram as expectativas em relação a outros países, como Espanha e Itália, que detêm perto de um terço do PIB da união monetária. E boa parte dos créditos à Grécia e a esses países tem origem em bancos de países da UE. A reestruturação abre o precedente para as demais economias em dificuldades, representando um caso exemplar de risco moral (moral hazard), além de ser financeiramente inviável no caso das economias grandes.
A Argentina, em situação parecida com a da Grécia, no início da década passada declarou o default, desvalorizou sua moeda, recuperou o nível de emprego e obteve melhora nas suas contas correntes com o exterior à custa de cortes de financiamento externo privado e da instabilidade de preços. Para a Grécia esse caminho implicaria o abandono da moeda única e a hiperinflação a curto prazo, sem que dispusesse do boom de preços de commodities que tanto beneficiou a Argentina pós-calote. Deixaria escombros terríveis para a UE, que teria de convencer o mundo de que não haveria efeito dominó.
Mas por que a UE não foi capaz de corrigir desequilíbrios localizados que, ao subsistirem, trazem perigo para todo o sistema? O problema é a rigidez provocada pela decisão política de criar uma moeda única no início dos anos 1990, forçando o caminho para a criação do que Churchill chamou de Estados Unidos da Europa. A nobre razão política chocou-se com a racionalidade econômica e a criação do euro resultou no maior erro de política econômica da segunda metade do século 20.
Moeda única exige uma economia nacional, com plena mobilidade de mão de obra e de capitais, o que não existe na Europa, onde tampouco há política comum de previdência e benefícios sociais. União monetária exige união fiscal, mas o orçamento da UE é de 1% do PIB, quando no Brasil ou nos EUA a União (governo federal) detém mais de 20% do PIB - instrumento poderoso de compensações econômicas e sociais.
É fácil também compreender que, não existindo um Tesouro Nacional Europeu, nem um BCE que seja emprestador de última instância, a elasticidade da insegurança de credores dos governos e do setor privado da UE seja altíssima diante de situações de maior incerteza.
A União Europeia, que engatinhou durante tanto tempo, de forma promissora, já está de bengala. O abandono do euro pioraria as condições econômicas de todos e representaria um retrocesso político de consequências incalculáveis, numa região que fez duas guerras mundiais no último século. Mas manter euro, e fazer a economia navegar de forma mais segura, exige saltos políticos bem maiores do que parecem exequíveis a curto e médio prazos. Eis um impasse que, à moda dos enigmas de Tebas, pode devorar a Europa.
FERNANDO REINACH - Vírus provoca suicídio
Vírus provoca suicídio
FERNANDO REINACH
O ESTADÃO - 27/10/11
Pais forçam filhos a lavar as mãos e governos levam pessoas a morrer pela pátria. São exemplos de como uma pessoa é capaz de determinar o comportamento de outra pessoa.
Normalmente, não pensamos que o comportamento do filho é resultado de genes no corpo do pai agindo sobre o corpo do filho. Preferimos falar em convencimento, autoridade ou persuasão. Mas, quando esse fenômeno é observado entre animais de diferentes espécies, fica difícil imaginar que o comportamento induzido não resulte da ação direta de genes.
A capacidade de um gene, localizado em um ser vivo, de agir sobre outro ser vivo foi proposta inicialmente por Richard Dawkins, que chamou o fenômeno de fenótipo estendido. Muitos duvidavam da existência desses genes. Agora, pela primeira vez, um desses genes foi isolado e caracterizado.
No final do século 19, cientistas alemães observaram um comportamento estranho nas lagartas de uma espécie de mariposa chamada Lymantria dispar. Lagartas normais passam a noite se alimentando de folhas na copa das árvores. Antes do amanhecer, elas descem e se escondem. Esse comportamento evita que sejam devoradas pelos pássaros.
Mas em algumas vezes as lagartas parecem enlouquecer. Antes do raiar do dia, vão para o topo das árvores, agarram-se às folhas e ficam imóveis, esperando a morte. Que chega pelo bico de um pássaro. Décadas mais tarde, foi descoberto que elas “enlouquecem” após serem infectadas por um baculovírus.
Do ponto de vista do vírus, o comportamento suicida das larvas é perfeito. Após o vírus ter se multiplicado no interior das larvas, elas rumam para o topo das árvores e esperam. As aves comem as larvas infectadas, levando o vírus para outras árvores. O vírus se espalha rapidamente pela floresta. Se a larva infectada morre no seu esconderijo diurno, a disseminação do vírus é lenta, pouco eficiente. O vírus parece “convencer” a larva a mudar seu comportamento. Mas como isso é possível? Seguramente não rola um papo entre vírus e larva.
Quando os cientistas sequenciaram o genoma do baculovírus, descobriram um gene estranho, que parecia não ser necessário para a sobrevivência do vírus. Esse gene, chamado de EGT, produzia uma enzima capaz de inativar o hormônio 20-hidroxiecdisona, que controla o desenvolvimento das larvas. Quando a quantidade desse hormônio aumenta, a larva se transforma em pupa, produzindo o casulo do qual emerge a mariposa adulta.
Cientistas imaginaram que talvez o aumento e a diminuição diária dos níveis desse hormônio, antes da pupação, seria o responsável pela migração da larva para a copa da arvore ao anoitecer e sua volta para o esconderijo ao amanhecer. Será que o vírus, destruindo o hormônio no hospedeiro, estaria manipulando seu comportamento, induzindo a larva ao suicídio?
Para testar essa hipótese, cientistas construíram baculovírus recombinantes em que o gene EGT foi inativado. O vírus modificado infectou a larva e se reproduziu normalmente. Mas as larvas infectadas acabavam morrendo, cheias de vírus, não no topo das árvores, mas em seu esconderijo, longe das aves.
Esse resultado demonstra que o baculovírus carrega em seu genoma um gene cuja única função é destruir o hormônio que controla o comportamento das larvas, forçando sua exposição às aves famintas. Esse gene não somente altera o comportamento das larvas, mas indiretamente induz as aves a comer as larvas e espalhar o vírus.
Nada mal para um vírus que não tem cérebro nem estudou estratégia de marketing em um MBA. Provavelmente, ocorreu que uma cópia do gene EGT acabou inserido acidentalmente no genoma de um baculovírus em algum momento do passado. Por se reproduzir mais rapidamente, o vírus com esse novo gene acabou se tornando o baculovírus predominante nas florestas europeias.
À medida que mais espécies tiverem seus genomas sequenciados, mais exemplos de genes com fenótipos estendidos serão descobertos. Será que os genes que permitem que o cérebro de um pai argumente com seu filho e o induza a lavar as mãos antes do almoço não podem ser considerados genes com fenótipos estendidos? E os genes que permitem a um recém-nascido emitir um choro capaz de fazer os pais correrem até o berço? Eles podem ser considerados genes com fenótipo estendido?
JOSÉ SIMÃO - Pandilma! Arremesso de ministro!
Pandilma! Arremesso de ministro!
JOSÉ SIMÃO
FOLHA DE SP - 27/10/11
E sabe o que eu vou vender na Esplanada dos Ministérios? Xampu antiqueda!
Buemba! Buemba! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República!
Primavera Árabe! Adorei o nome do partido que ganhou as eleições na Tunísia: NAHDA! O quê? Tanta coisa pra NAHDA? Ganhou o Nahda. E a manchete: "Nahda vence". Precisamos dum partido desse. Em quem você votou? No Nahda!
E esta outra buemba: "Marca de vans chinesas Chana troca de nome e agora se chama Changan". Entendi, chana em chinês é changan. Changan é chana em chinês. Com batelia lecalegável. Chana ching ling! Rarará! E a manchete do Sensacionalista: "Ednanci Silva é o novo ministro dos Esportes". Rarará! Combina mais.
Orna mais! Também quero. Queremos a Edinanci!
Diz que o novo ministro é o Aldo Rebelo! Com aquela cara de lombriga com febre amarela? É o antiesporte.
Não consegue subir nem numa esteira ergométrica! E será que ele tem o REBELO PRESO? Rarará!
A Dilma é ouro em arremesso de ministros! PANDILMA! Rarará! Placa em Brasília: "Sai de baixo! Queda de Ministros". Tem que andar com capacete de motoqueiro! Tem que botar cama elástica em Brasília! E sabe o que eu vou vender na Esplanada dos Ministérios? Xampu antiqueda!
E o Pan com ovo? Adorei a comentarista: "A ginasta já participou de vários pães". Rarará! O plural de Pan é pães! E as argentinas foram pro Pan para aPANhar! Eu queria ouro em esporte de rico: hipismo, iatismo e onanismo. Hipismo quem tem que ganhar a medalha é o cavalo!
E o Orlando Enrolando Rolando Elzando Silva ganhou uma MERDALHA. Uma merdalha de ouro!
E o site QMerda localizou um torcedor do Pan com a faixa "Eu amo Chana". "A goleira do handebol?" "Não, qualquer uma." Rarará! É mole? É mole, mas sobe!
E mais uma predestinada! Eu queria convidar os meus leitores para uma palestra no Instituto Oswaldo Cruz com a especialista em meio ambiente e vigilância sanitária: MARTHA BARATA! Rarará! Ela devia abrir uma dedetizadora!
E aquele aplicativo do novo iPhone, o Siri. Você pergunta e o Siri responde. "Quero comer num restaurante francês." "Vá na rua tal, número tal." Aí um amigo, pra sacanear o Siri, falou: "Quero comer um Siri". "Vá comer a tua mãe!" Rarará! Nóis sofre, mas nóis goza!
Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno!
REGINA ALVAREZ - Papel do Fundo
Papel do Fundo
REGINA ALVAREZ
O GLOBO - 27/10/11
A ajuda do FMI em qualquer tipo de plano para salvar a zona do euro só pode ser dar por empréstimos a países, sempre vinculados a um programa de ajuste fiscal. Para receber os recursos, os países precisam atacar seus problemas estruturais, reduzindo dívida e déficit.
Um dos mecanismos disponíveis para viabilizar essa ajuda é o aumento das cotas dos países, mas esse processo é lento e um tanto complexo, pois depende da aprovação de todos os países membros do Fundo, que em alguns casos precisam do sinal verde de seus parlamentos.
Uma maneira mais fácil, que já foi usada na crise de 2008, é os países emprestarem recursos ao FMI, que os repassaria aos governos encrencados da zona do euro. Neste caso, apenas um grupo de 35 dos 187 países membros do Fundo participam do esforço. São aqueles que têm melhor situação financeira e moedas conversíveis. Na crise de 2008, o Brasil participou com uma cota de US$ 10 bilhões, e a China, com US$ 40 bilhões.
Mas é claro que os emergentes não fariam um novo esforço desse tipo de graça. Os empréstimos de 2008 foram convertidos em cotas do Fundo, mas só depois de muita discussão. Agora, os emergentes trabalham no mesmo sentido para uma solução casada. Juntos, detêm 45% de participação no FMI, enquanto os países avançados têm 55%.
Assim, se estenderem a mão para os endividados da zona do euro provavelmente vão querer, em troca, mais cinco pontos percentuais de participação no FMI, ficando em condições de igualdade com os avançados nas decisões e na governança do Fundo.
Olhando para frente
O governo já cogita afrouxar o arrocho no crédito adotado no começo de 2011 para conter a inflação, mas a expansão de 19,6% em setembro ainda está acima do patamar de 17% considerado adequado pelo BC.
— Ainda estamos falando de um crescimento forte — analisa a economista Alessandra Ribeiro, da consultoria Tendências.
A lógica do governo é que a economia roda em um ritmo muito mais lento do que no começo do ano e, com o cenário externo adverso, o crédito tende a encolher. A avaliação da economista é parecida:
— É de se esperar que empresas e consumidores fiquem mais cautelosos para tomar crédito. Do lado da oferta, os bancos também ficam mais seletivos. Ainda que a crise não bata forte aqui, a situação externa é levada em conta.
Caixa forte
A Eletronuclear espera receber hoje R$ 308 milhões do BNDES referentes à segunda parcela do empréstimo de R$ 6,1 bilhões para a construção de Angra 3. O dinheiro será usado na compra de máquinas e equipamentos e na contratação de serviços. A empresa ainda conta com R$ 890 milhões da Eletrobras para o empreendimento.
Apetite
O Departamento de Pesquisas e Estudos Econômicos do Bradesco prevê que o ingresso de investimento estrangeiro direto (IED) ainda continuará forte no último trimestre, financiando o déficit em conta corrente com certa folga. A estimativa é que o déficit fechará em 2,05% do PIB, um pouco abaixo de 2010, quando alcançou 2,3% do produto. Em nove meses, o Brasil recebeu US$ 50 bilhões de investimentos diretos.
KENNETH MAXWELL - Shakespeare?
Shakespeare?
KENNETH MAXWELL
FOLHA DE SP - 27/10/11
Os moradores de Stratford-upon-Avon estão em pé de guerra. Cobriram a estátua de William Shakespeare (1564-1616), o mais famoso filho da cidade, com lençóis.
Objetam vigorosamente ao novo filme produzido pela Sony em Hollywood, segundo o qual Shakespeare, na verdade, era uma fraude e não escreveu as famosas peças, sonetos e versos cuja autoria lhe é atribuída. O verdadeiro autor, alega o filme, foi Edward de Vere, conde de Oxford, um homem viajado e poliglota.
Nessa interpretação, Shakespeare é um beberrão analfabeto e sem educação formal, incapaz do conhecimento detalhado necessário à composição dessas obras.
Edward de Vere, por outro lado, era um aristocrata, amante da rainha Elizabeth 1ª. Não pôde assumir a autoria dos textos porque escrever para o teatro, no século 16, não era profissão para um aristocrata, o que explica sua necessidade de permanecer anônimo -como no título do filme: "Anonymous".
A teoria é velha. Circula pelo menos desde a era vitoriana. Os vitorianos, como os norte-americanos modernos, adoravam teorias da conspiração e não conseguiam acreditar que um homem de origens humildes como Shakespeare pudesse ter escrito as grandes peças que portam seu nome.
Vanessa Redgrave interpreta a rainha Elizabeth 1ª (na velhice), enquanto sua filha, Joely Richardson, interpreta a rainha jovem. Joely Richardson nasceu em 1965, quando Vanessa Redgrave era casada com Tony Richardson. O casamento, que durou de 1962 a 1967, terminou em divórcio depois que Richardson traiu a mulher com a atriz francesa Jeanne Moreau.
Richardson foi um famoso diretor da "new wave" do cinema britânico. "Tom Jones", filme que ele dirigiu em 1963, baseia-se no romance de Henry Fielding (que está sepultado no cemitério inglês de Lisboa), e o roteiro foi escrito pelo dramaturgo John Osborne.
É a exuberante história do filho adotivo de um membro da pequena nobreza rural inglesa, saltando de cama em cama através da Inglaterra, estrelado por Albert Finney, Susannah York e Edith Evans. O filme foi parcialmente rodado em Crowcombe Court, uma casa de campo do começo do século 18 em West Somerset, perto de onde passei a infância.
Vanessa é filha de sir Michael Redgrave. Os Redgrave, apesar de seu radicalismo político, são a aristocracia do teatro britânico. Contudo a Sony parece ter hesitado, no momento do lançamento, e por isso o filme será exibido em apenas 250 salas.
A produtora espera que a reação dos espectadores e, sem dúvida, também a dos moradores de Stratford-upon-Avon sirva como publicidade para o filme.
NINA HORTA - História das coisas
História das coisas
NINA HORTA
FOLHA DE SP - 27/10/11
"Bill Bryson resolveu escrever esse livro ao ver como sabia pouco ou nada sobre o mundo incrível e ao mesmo tempo cotidiano que o envolvia em sua casa. Por que temos um saleiro? Por que gostamos mais de pimenta do que de cardamomo? O livro chama-se "Em Casa -uma Breve História da Vida Doméstica", de Bill Bryson, Companhia das Letras.
É bom para fazer pensar na evolução de cada cômodo, originários de um só espaço, onde todos dormiam, comiam, trabalhavam e se divertiam, e com certeza brigavam por aquele pedacinho de chão que ficava ensolarado até mais tarde.
Pensei que iria se concentrar nos objetos, nos utensílios, mas não. Fala muito mais do aparecimento das tecnologias que propiciaram a evolução dos cômodos e da sua capacidade para gerar conforto.
Podemos começar da cozinha e dos elementos que fizeram dela o que é hoje. É preciso ficar pensando de olho parado para conseguir imaginar como era a casa antes que nos acostumássemos com tudo.
Para começar, o gelo. Conservar a comida, gelar a bebida, fazer sorvete, transportar produtos de um lugar a outro, carne fresca, peixe fresco. O crescimento incrível da produção de alimentos, ah, o gelo, esse civilizador!
Uma casa do seu condado em 1851. A cozinha não tinha pia, pois era cozinha, para cozinhar, não para lavar... Conforme o tamanho da casa, muitas copas e despensas, pois os materiais de limpeza eram fabricados "in loco", goma para colarinhos, graxa, sabonetes, veneno para ratos, velas.
E como os ricos comiam bem! Havia excesso de comida, de lagostas, ostras, esturjões, aves, caças, muito cozinheiro e ajudante, e pouco conforto para eles. E apareceu a sala de jantar. E os horários. O garfo surge com dois dentes, chega a seis e volta para quatro. Cento e quarenta e seis tipos de talheres, sei lá quantos copos, e inevitavelmente os manuais de como se comportar à mesa, que deveria ser uma espécie de pós-graduação, tantas regras era preciso saber.
O modo de se produzir o vidro, o tijolo, o aço, o cimento, a possibilidade de sustentação de mais um andar. E o banheiro? Podemos imaginar a extensão do conforto vindo de um banheiro?
Essa ideia foi a melhor de todas, fico de cara vermelha só de pensar na dificuldade que seria para Virginia Woolf, por exemplo, escrevendo aqueles livros de uma delicadeza absurda e tendo que parar para ir num pequeno fosso fora de casa, na beira do rio. Credo, de baixar o chiquê de qualquer um...Um exercício de humildade e realidade.
E saiu também um livro de memórias de família de Edmund de Waal. "A Lebre com Olhos de Âmbar", editora Intrínseca, que, com a desculpa de descobrir o caminho de uma coleção de netsukes japoneses, vai atrás das casas, mobílias e quadros e objetos de arte de sua riquíssima família judaica na Europa. França, Viena... E história. O caso Dreyfus. Seu tio foi usado por Proust para delinear o personagem Swann, só esse passeio pelo mundo de "A la Recherche..." já seria interessante. A descrição das casas, dos quartos, das coleções compradas, da moda de "japonaiseries". Para quem gosta de "coisas", vale a pena.
CONTARDO CALLIGARIS - Teorias conspiratórias (e histéricas)
Teorias conspiratórias (e histéricas)
CONTARDO CALLIGARIS
folha de sp - 27/10/11
O protagonista do novo (e ótimo) romance de Umberto Eco, "O Cemitério de Praga" (Record), é um falsário do fim do século 19.
Você, emissário de sei lá qual governo ou grupo, quer fomentar o antissemitismo, provando que os judeus conceberam um plano diabólico de domínio do mundo? Devidamente contratado, o falsário criará "Os Protocolos dos Sábios de Sião", prova cabal de um complô judaico. O texto, uma vez "descoberto", alimentará o antissemitismo mundo afora, durante décadas.
Hoje, a tecnologia digital facilita o trabalho dos falsários, e, graças à internet, um boato se transforma rapidamente numa certeza coletiva.
Mas, de qualquer forma, nunca foi muito árduo inventar conspirações ocultas e espalhar desconfiança e delírios segundo os quais os misteriosos "eles" estariam tramando na sombra. O fato é que o público adora uma teoria conspiratória.
Ou melhor, sejamos sinceros: em regra, adoramos entender o mundo como fruto de conspirações que tentam nos enganar. Por que será?
Uma resposta está no livro (já clássico) de Elaine Showalter, "Histórias Histéricas" (Rocco, esgotado -tente www.estantevirtual.com.br).
Showalter lembra que, para negar a existência e o surgimento de desejos sexuais em seus corpos e almas, as histéricas começam por atribuir esses desejos aos outros ou, como se diz, por projetá-los nos outros. Logo, elas fogem dos ditos outros (que se tornaram zumbis portadores dos desejos delas) ou os acusam de seduções e estupros.
Moral da história, a histérica pode dizer: 1) eu não desejo nada, sou e me mantenho pura, pois o sexo não vem de mim, mas dos outros, que querem me sujar e 2) eu sei quem o outro "realmente" é, sei quais desejos vergonhosos ele esconde atrás de sua aparência bem-comportada. Em suma, 3) posso negar que tenho desejos, não preciso me responsabilizar nem me envergonhar por eles e, além disso, pretendo saber desvendar o lado obscuro de qualquer um.
Desvantagem: assim fazendo, eu me afasto irremediavelmente de meu próprio desejo.
E os homens, nessa história? Segundo Showalter, sobretudo hoje, a histeria dos homens aparece, justamente, na crença em teorias conspiratórias: as meninas acham que os outros querem seduzi-las e violentá-las, e os meninos acham que os outros querem enganá-los e manipulá-los.
(Antes de continuar, uma nota: pode ser que imaginar teorias conspiratórias e acreditar nelas seja uma forma de histeria masculina, mas isso não significa que as conspirações não existam. Ao contrário, como mostra o romance de Eco, sempre existe, no mínimo, a conspiração dos que constroem e espalham teorias conspiratórias.)
Mas voltemos à histeria dos homens segundo Showalter. Eis quatro vantagens para os que gostam de conspirações escusas.
1) Quem entende o mundo à força de "desvendar" conspirações só pode se perceber como uma exceção: ele acredita ser o único, ou quase, que enxerga as tramas nefastas dos outros -o único ou um dos poucos que "eles" não estão conseguindo enganar.
2) Com a ideia de que sempre há outros que tentam nos manipular e controlar, a gente se oferece uma volta à infância e à relação com os pais. Há um prazer nostálgico na suposição de que haja adultos os quais, num conluio entre si, decidem nosso destino, sem nos explicar nem de longe o que realmente acontece.
Há um prazer nostálgico na ideia (infantil e pré-adolescente) de estarmos nas mãos de outros todo- poderosos e de sermos os únicos que, heroicamente, resistem à sua sedução e desvendam suas mentiras.
3) Uma hipotética conspiração, por mais hostil que ela nos seja, permite-nos confiar numa ordem do mundo -boa ou ruim. Se há intenções escondidas, nada ou pouco acontece por acaso, o mundo obedece a um plano -da divina providência, do demônio ou dos conspiradores, tanto faz: de qualquer forma, a existência de um plano é consoladora.
4) Para as histéricas, atribuir o desejo sexual ao outro é um jeito de negar sua própria sexualidade.
Para os homens não é muito diferente: a invenção de uma conspiração maléfica lhes permite ignorar seus próprios desejos "políticos" sombrios, os que eles preferem esconder de si mesmos.
Afinal, o conspirador, ao qual atribuo a vontade de me enganar e manipular, é quase sempre uma projeção, ou seja, é minha própria criação, à imagem e semelhança de mim.
MÔNICA BERGAMO - DEUS NA TV
DEUS NA TV
MÔNICA BERGAMO
FOLHA DE SP - 27/10/11
DANÇA DAS CADEIRAS
O mandato de Tereza Cruvinel na presidência da EBC termina neste mês. Até ontem candidatos do Planalto e de Lula, como Nelson Breve e Ottoni Fernandes, estavam cotados para o lugar. O professor Murilo Ramos, da Universidade de Brasília, continuava correndo por fora.
FOGO BAIXO
Pesquisa Ibope para a eleição do novo presidente da OAB de São Paulo, marcada para o próximo ano: Rui Fragoso aparece com 31% dos votos. Em segundo lugar vem Alberto Toron (9%), seguido por Sergei Cobra (5%).
Quase a metade dos 500 entrevistados, ou 45%, disseram que vão votar em branco, nulo ou simplesmente não souberam responder.
FOGO ALTO
Uma estagiária da Defensoria sofreu uma tentativa de homicídio, na sexta passada, em pleno Fórum Criminal da Barra Funda. Ela prestava atendimento ao servente Ricardo Silva Santana quando ele a atacou com uma chave de braço e tentou esganá-la, dizendo que iria matá-la. Foi socorrida por dois policiais, que a ouviram gritando. Santana foi preso em flagrante.
NOVO ENDEREÇO
O departamento de recursos humanos da Defensoria está em contato com a estagiária para uma eventual transferência, caso ela não queira mais trabalhar na Barra Funda.
MULHER FEITICEIRA
O diretor teatral Roberto Lage montará a peça "Medeia". No elenco, pretende contar com os atores Caco Ciocler, Genézio de Barros e Renata Zhaneta.
MÃOS AO ALTO
Gisele Bündchen foi fotografada em Nova York para a capa do primeiro número da edição brasileira da "Harper's Bazaar". O ensaio feito pelo americano Terry Richardson com a top pode ser visto a partir de amanhã nas bancas.
UMA PALHAÇADA
Selton Mello fez pré-estreia, anteontem, de "O Palhaço", filme que dirige e protagoniza, ao lado de Paulo José. A atriz Maria Manoella foi ao evento, no Cinemark Iguatemi.
SELAS E ACESSÓRIOS
Mariana Auriemo e Maria Anna do Valle Pereira foram ao almoço de abertura da Copa Hermès de Hipismo, na Fazenda Boa Vista. Filha de Fábio Jr., Krizia Kartalian Galvão era uma das competidoras.
BANQUINHO VAZIO
João Gilberto está tendo dificuldades para lotar também seu show em Brasília, no dia 19 de novembro. Só na pista Gold, de 414 lugares, 207 ainda estão disponíveis. Preço: R$ 1.400. Na pista mais barata, 378 ingressos, num total de 510, estão livres, por R$ 600.
BANQUINHO VAZIO 2
As entradas em SP também encalharam: mais de mil lugares do Via Funchal, onde ele se apresentará no dia 5, ainda estão à venda.
FÔLEGO DE SOBRA
O duo de música eletrônica Groove Armada fará um DJ set na festa oficial pós-festival Planeta Terra, na madrugada de 6 de novembro, no D-Edge. Algumas horas antes, os ingleses se apresentam no Terra, no Playcenter.
CABELO DE ANJO
O ex-Beatle Ringo Starr, vegetariano como Paul McCartney, pediu legumes e frutas para fazer seu próprio suco e macarrão tipo cabelinho de anjo com molho pesto para o camarim de seus shows em SP. Ele se apresenta em novembro no Credicard Hall.
ARTILHARIA
Neymar é o jogador preferido das mulheres: pesquisa da Sport+Markt, que tem como clientes multinacionais e clubes, mostra que ele é hoje o queridinho de 28,8% delas. Em seguida vêm Ronaldinho Gaúcho (25,5%) e Kaká (4,6%). O santista desbancou o galã do Real Madrid, que em 2010 era o líder, com 19%. Ronaldinho lidera no público masculino (26%). A agência entrevistou 8.235 torcedores (5.764 homens e 2.471 mulheres).
CURTO-CIRCUITO
O Iasp (Instituto dos Advogados de São Paulo) realiza hoje, às 19h, o debate "A Cobertura da Imprensa nos Grandes Escândalos", sob a coordenação de José Luis de Oliveira Lima.
Ara Vartanian lança nova coleção de joias hoje.
com DIÓGENES CAMPANHA, LÍGIA MESQUITA e THAIS BILENKY
ALBERTO TAMER - Investimento, só externo
Investimento, só externo
ALBERTO TAMER
O ESTADÃO - 27/10/11
Os investimentos diretos no Brasil bateram novo recorde, US$ 50,4 bilhões,este ano, superando de longe os US$ 48 bilhões de todo o ano passado. Um ótimo resultado, sim, mas revela um fato que deveria preocupar.
Os investimentos externos não financeiro aumentam,mas os internos, privados ou do governo, recuam este ano e não dão sinais de melhora. Em 2010, eles representavam 66% do total e no primeiro semestre deste ano - últimos dados disponíveis no Ministério do Desenvolvimento - apenas 32,2%; a participação dos recursos de origem estritamente estrangeira passou de 23% para 56% no primeiro trimestre.Ou seja, a grande verdade é que não fossem os investimentos diretos, que não param de aumentar, a formação de capital no Brasil teria caído para bem abaixo de 18%.
A Confederação Nacional da Indústria afirma que esse baixo resultado dos investimentos internos se deve à alta taxa de juros, ao câmbio e às incertezas externas. É uma explicação parcial porque o mercado interno mantém os mesmos níveis de crescimento do ano anterior e a produção agroindustrial continua crescendo.
Eles salvam. A verdade é que os investimentos externos no setor produtivo estão salvando a formação de capital fixo no Brasil. Uma participação consistente, que vem crescendo mês a mês.
Segundo dados do Banco Central, ela passou de US$ 2,9 bilhões em janeiro para US$ 7 bilhões em fevereiro e se manteve em torno de US$ 6 bilhões em agosto.
Para o governo, a estabilidade da economia brasileira, que, mesmo com sinais de acomodação, deve crescer 3% nos próximos anos é a causa principal dessa atração. O Brasil, mais prudente, não foi atingido pelo clima de depressão mundial, até se beneficiou porque continua crescendo em um clima de estabilidade econômica, financeira e fiscal.
Mas há outra explicação: a maior parte dos investimentos externos que aumentou este ano se concentra em alguns setores como petróleo e gás, telecomunicação, indústria automobilística e, agora, informática, com a chegada do capital asiático.
"Os investimentos na indústria automobilística devem totalizar US$ 21 bilhões até 2014", informou esta semana o presidente da Anfavea,Cledorvino Belini.
Entre 2007 e 2010, foram apenas US$11 bilhões.Há novos incentivos e as empresas estrangeiras estão sendo atraídas para produzirem no País. Tendo em vista os investimentos já anunciados em todas as áreas, o Ministério do Desenvolvimento não esconde otimismo.
Devem passar de US$ 165 bilhões.
Estão sendo liderados pelos Estados Unidos,com US$ 32 bilhões divulgados no primeiro semestre, Grã-Bretanha - mais de US 30 bilhões na área de petróleo e gás - e Taiwan, US$ 12 bilhões, da Foxconn na fabrica de tablets.
O governo tem se mostrado receptivo ao forte estímulo tributário se as empresas estrangeiras atendem a maior participação nacional. A questão em aberto é saber se a indústria brasileira terá capacidade de expandir para atender ao aumento decorrente da demanda.
E, muito mais ainda, se além dos incentivos tributários, o governo está mesmo decidido a desburocratizar os processos e enfrentar as barreiras ambientais.
Mas são apenas projetos. Das 364 intenções de investimento externos, mais de 60%já estão em fase avançada.
Para Eduardo Celino, coordenador da Rede Nacional de Informações sobre Investimento, do Ministério do Desenvolvimento, o interesse das empresas estrangeiras no Brasil é crescente porque há mais ovas oportunidades, como confirmam os dados do primeiras e mestre, bem superiores aos do ano passado. As previsões para os próximos meses podem se confirmar pois haverá ainda a atração da Copa e Olimpíada. "A queda de atividade econômica nos Estados Unidos e na Europa canaliza investimentos e fez aumentar o interesse pelo país em que há expectativa de bom desempenho da economia." Mesmo assim,os economistas não acreditam que os investimos totais no Brasil cheguem a 18% do PIB este ano. Os indicadores atuais apontam para 16% ou menos. O Brasil precisa de no mínimo 25%. Está longe disso.