sexta-feira, abril 01, 2011

TONY BELLOTTO

Deus gosta de brincar de Bin Laden
TONY BELLOTTO  
VEJA ONLINE

Giovanna, minha amiga atéia de Curitiba, enviou-me um e-mail semana passada. A frase Deus gosta de brincar de Bin Laden vinha assinalada no espaço referente ao “assunto” (subject, para os íntimos). Giovanna, com sua usual beligerância, abria a mensagem indignada: “Não é possível que depois do terremoto, tsunami e vazamento nuclear no Japão alguém ainda acredite em Deus. Quem é ele, afinal? Alguma espécie de super terrorista universal?”.

A mensagem seguia nesse ritmo, recheada de vitupérios e ofensas ao Todo Poderoso. Conheci Giovanna faz alguns anos em Curitiba, no lançamento do meu livro Bellini e os Espíritos. Durante um bate papo com leitores, que antecedia a sessão de autógrafos, uma mulher me perguntou – talvez inspirada pelos “espíritos” do título do romance – qual era meu grau, digamos assim, de “espiritualidade”, já que ela sentia exalar de mim uma nítida e avassaladora confirmação da mesma.

Tive de explicar, não sem antes pedir desculpas por uma eventual desilusão, que eu era – e continuo sendo – um ateu convicto e materialista praticante, embora – e eu frisei bastante esse detalhe – humanista radical. Apesar da palidez repentina, que denunciava a decepção, ela ainda insistiu na salvação de minh’alma com frases como “Você está errado. Não é possível que você seja assim, descrente. Com uma carreira tão bem sucedida e mulher e filhos tão bonitos… quanta ingratidão”, mas no fim das contas acabou se resignando (alias, a resignação é das mais admiráveis virtudes dos religiosos).

Após a sessão de autógrafos (não tinha muita gente), uma garota se aproximou timidamente e se apresentou como Giovanna – o sobrenome não revelo para não compremetê-la. “Quem bom saber que existem outras pessoas que pensam como eu. Eu também não tenho certeza da existência de Deus”. Naquela época, os livros de Richard Dawkins ainda não eram populares no Brasil e a discussão sobre ateísmo quase inexistente. Desde então tenho mantido contato regular com Giovanna, por e-mail, e acompanhei sua transformação de uma tímida e conflituada adolescente agnóstica numa ativista pró-ateísmo das mais radicais e intransigentes.

No e-mail ela me cobrava mais dedicação à causa. Sabedora da minha indisposição ao confronto e relutância em defender “causas”, sejam elas quais forem (vide minha crônica Impasses de um Ateu), Giovanna vive me cutucando para me declarar mais vezes e com mais convicção a favor dos ateus e de nosso direito a viver “livres de Deus”, segundo suas próprias palavras. “Além do mais”, prossegue Giovanna, “suas últimas crônicas não estão dando muito Ibope (quem está interessado em suas aulas de natação ou nas suas viagens pelo interior de Minas Gerais?) e você sabe que nenhum assunto é tão polêmico quanto a inexistência de Deus. Ou, talvez, a existência Dele, pressupondo-se que gosta de brincar de Bin Laden e não faz outra coisa que não nos assombrar e testar com doenças, catástrofes e outras formas de terrorismo. Não é à toa que os terroristas islâmicos são tão convictos da existência Dele…”.

Ok, Giovanna, aí está. Segure o rojão depois.

TUTTY VASQUES

O dia em que o dólar subiu

TUTTY VASQUES

O ESTADO DE SÃO PAULO - 01/04/11

Como se não bastasse a repentina recuperação da moeda americana frente ao real, tudo indica que a qualquer momento Jair Bolsonaro pedirá desculpas a todos os negros e homossexuais que tenham se ofendido com as bobagens que andou dizendo no CQC. Acredite se quiser: de uma hora pra outra, o Brasil desistiu dos aviões de caça, cancelou a exumação de Tim Maia, conteve o crédito, derrubou o visto de entrada nos EUA e cassou a filha do Roriz. Sério!

Dá só uma olhadinha nos jornais: Kadafi foi capturado, o acidente nuclear em Fukushima sanado, a epidemia de dengue debelada, a censura ao Estadão derrubada e a inflação, enfim, afastada. Mais: a paz voltou aos canteiros das obras do PAC e Camila Pitanga parou de sofrer na novela das 9.

Engarrafamentos nunca mais! Acabaram, também, os flanelinhas, os pontos de alagamento, as saidinhas de banco, a fome, a corrupção, o flagelo do crack e o Big Brother Brasil. O trem-bala saiu do papel, Gilberto Kassab voltou a falar coisa com coisa, José Alencar vive!

Salve o 1.º de abril, Dia Mundial Sem Más Notícias! As boas, como se sabe, são todas de mentirinha.

Melhor não!
Em respeito ao luto oficial decretado por Dilma Rousseff, a coluna deixará de comentar a figura do ex-presidente Lula paramentado com manto e borla - chapéu que representa sabedoria -, durante cerimônia honoris causa na Universidade de Coimbra.

Unanimidade
"CONCORDO COM SUA EXCELÊNCIA: RACISTA É O BOLSONARO!"
DEPUTADO JÚLIO CAMPOS, aquele que chamou o ministro Joaquim Barbosa de "moreno escuro", aparteando o colega Tiririca.

Boato infame

Não está rolando nada entre Hugo Chávez e Cristina Kirchner! E não se fala mais nisso, ok?

Teste 1º de abril

Qual dessas notícias é verdadeira:

a) Luana Piovani viverá o papel de Marina Silva no cinema;

b) Ronaldo começa hoje dieta alimentar;

c) Reginaldo Rossi se juntou a rebeldes líbios na retomada de Brega;

d) Muricy Ramalho fechou com o Santos. (resposta: b)

Graças a Deus!

Está tudo bem com o melhor amigo de Paulo Coelho em Fukushima! O escritor conseguiu, enfim, localizá-lo são e salvo em Tóquio.

Não custa nada

Tem gente no Conselho Deliberativo do Corinthians propondo que, além de psicólogo, o clube arrume tornozeleira eletrônica para o Imperador Adriano. Só pra garantir, né?!

Sem data pra acabar

Depois da derrota para o Santa Cruz, a diretoria do São Paulo já prepara festa para o centésimo gol contra sofrido por Rogério Ceni.

Nascido em 1º de abril

TUTTY/HUMOR completa hoje 3 anos de publicação no caderno Metrópole do Estadão. Lembro que, na época, parecia mentira.

ANCELMO GÓIS

Saliência já
ANCELMO GÓIS
O GLOBO - 01/04/11

Na reunião no Palácio paradiscutir as greves nas obras do PAC, o deputado Paulo Pereira da Silva, da Força Sindical, reclamou, acredite, da abstinência sexual dos trabalhadores em regiões isoladas de Rondônia: — Como é que bota na selva amazônica centenas de homens sem mulher? Era preciso ter bordéis nos canteiros de obras. É. Pode ser.

No que...
Gilberto Carvalho, o ministro que presidia os trabalhos, levou um susto e ficou mudo. 

Mundo novo 
A portuguesa Leya anuncia sua entrada no mercado de ebooks brasileiros associada a dois parceiros de peso: Editora Abril e Livraria Cultura. A distribuidora Saraiva e a Gato Sabido devem aderir a plataforma Leya. 

Espera por Deus
Comentário maldoso de um economista assumidamente neoliberal, ao ler no Relatório de Inflação do Banco Central que o banco desistiu de alcançar a meta de 4,5% em 2011, mas que espera chegar lá no ano que vem: — O BC substituiu o regime de Metas para a Inflação pelo regime de Rezas para a Inflação. 

Mulatas do Lan
Lan, nosso grande cartunista, será enredo da Estácio de Sá no carnaval de 2012. Vai desfilar num carro cercado por 30 mulatas e passará na avenida desenhando. 

Mão leve alemão
Sônia Bridi, a coleguinha da TV Globo, teve sua carteira furtada, com passaporte, dinheiro e cartões de crédito, em Hamburgo, na Alemanha. Menos mal que a polícia foi ao hotel registrar a ocorrência. Mas deve ser terrível... você sabe.

Dilma e Deus

O “Le Monde” publicou um perfil simpático sobre Madame La Présidente Dilma. Ao comentar diferenças de estilo, o jornalão francês informou que Deus, muito presente nos discursos no tempo de Lula, praticamente não aparece nas falas dela. E mais: conta que Dilma
mandou retirar o crucifixo que ficava na sala de trabalho, nos anos do antecessor, para mostrar que o Estado é laico. 

Aplausos
Pedro Paulo Rangel, 62 anos, nosso grande ator, será o homenageado da 18a- edição do Festival de Teatro do Rio. Merece.

Cabelos longos 
Paola Oliveira, que vive a mocinha Marina em “Insensato Coração”, está de visual novo por conta de sua personagem. Pôs um megahair para alongar as madeixas. 

Cuidado redobrado
A Fundação Biblioteca Nacional está investindo R$ 1,2 milhão na implantação de sistema de detecção e alarmes contra incêndios, em seu edifício na Cinelândia. As áreas de obras raras e armazéns de livros receberão tecnologias mais sofisticadas. A casa, além de ter um corpo de voluntários para emergências, conta com uma brigada de incêndio que atua 24 horas. 

Bênção dos orixás
Passeando no Jardim Botânico, no fim de semana, uma carioca deparou-se com várias mães de santo no Espaço Tom Jobim. Havia ainda muitas galinhas. A observadora imaginou que fosse o ensaio de uma peça e foi até a porta: rolava um despacho dos grandes.

Mas.... 
Uma das participantes se aproximou para explicar: o teatro precisava de uma “limpeza”. Ah, bom! 

Maria do Caritó
Lilia Cabral, viva ela!, festeja domingo cem apresentações da peça “Maria do Caritó”, com direito a espumante no camarim. Em sete meses foram mais de 35 mil espectadores. 

Mestre Zu 

Zuenir Ventura grava dia 25 depoimento no MIS, no Rio. Será entrevistado por Ziraldo, Artur Xexéo, João Máximo e Roberto D’Ávila.

Sex symbol 
O vice-governador Pezão, outro dia, recebeu de uma ouvinte da Rádio Tupi uma carta endereçada ao... Sr.Tesão. Ui!

ZONA FRANCA
 Marie Annick Jacobs, delegada do LNE, chega dia 10 ao Rio. Vem visitar os fabricantes das embalagens para lixo Dover-Roll.
 O professor Evandro Tinoco, diretor do Pró-Cardíaco, fala hoje no IV Fórum Internacional de Qualidade em Saúde, em São Paulo, sobre segurança assistencial ao paciente.
 João Pedro Roriz lança hoje “Eros e Psique”, às 18h, na Paulus Livraria.
 Construtora Calçada lança Reserva Carioca, amanhã, na Barra.
 Hoje, a OAB-RJ fala sobre drogas. 
 Batuqueiros e Trio Calafrio fazem show hoje no Democráticos.
 Amanhã, a União da Ilha desfila na Cacuia, para festejar seu carnaval.
 Orienthai, delivery tailandês e indiano, funciona também para almoço.
● A Colher de Pau de Ipanema, lança café da manhã com bolo de brigadeiro.

VINÍCIUS TORRES FREIRE

Onde vai parar esse trem? 
VINÍCIUS TORRES FREIRE

FOLHA DE SÃO PAULO - 01/04/11

O LEILÃO do trem-bala deve ficar para agosto. Não deve ser mais em abril. Nessa concorrência, seria definido o consórcio de empresas privadas que vai construir e operar essa linha de trem de alta velocidade (TAV) entre Campinas e Rio de Janeiro, passando por São Paulo e sabe-se lá por onde mais.
O governo deve decidir pelo novo adiamento da concorrência porque as empresas interessadas no TAV não param de "encaminhar pleitos" ao governo e consideram que tiveram pouco tempo para estudar a viabilidade do negócio.
O TAV está emperrado mesmo com o caminhão de subsídios oferecidos pelo governo, na forma de financiamento a juros barateados e redução de pagamento de juros caso não existam passageiros suficientes para pagar a conta.
O governo está para adiar a concorrência mais por precisão do que por boniteza. Corria outra vez o risco de ver uma disputa com apenas um consórcio (como no final do ano passado) ou mesmo nenhum, como parece ser o caso agora.
Além de todos os problemas econômicos e da incerteza a respeito da engenharia da obra, o TAV tem cada vez mais um quê de licitação dos caças da FAB, uma disputa temperada por pressões de governos.
Um grupo forte na disputa é o dos coreanos, cheio de estatais. Os alemães entram na copa do TAV com um grupo liderado pela Siemens; o governo alemão faz um lobby forte para azeitar os trilhos de sua múlti. O governo francês tenta dar um jeito de facilitar a entrada das empresas do país no negócio, como a Alstom, que quer fornecer equipamento mas não está disposta a financiar a obra.
São tantos e tão confusos e desconfiados os lobbies que fica difícil entender a crítica específica ao projeto do governo -não que seja difícil espezinhar esse projeto temerário.
Obviamente, o problema principal é dinheiro. Mas não se sabe bem se, ao fazer um "pleito A", tal ou qual grupo na verdade estaria querendo obter "B". Até dezembro, os coreanos não reclamavam do custo da obra. Agora, reclamam. Por quê?
Além da disputa com o governo, há conflito entre estrangeiros e brasileiros sobre quem vai colocar mais dinheiro no negócio.
Todo mundo duvida que o conjunto da empreitada vá custar R$ 33 bilhões. Empreiteiros nacionais têm dito por aí que a despesa pode ser estimada agora em R$ 53 bilhões. Porém, ainda que pareça muito provável que o valor oficial seja baixo demais, ainda não dá para acreditar em empreiteiras, com seu histórico de superestimação de valores.
Se há incerteza sobre o custo, as empresas interessadas obviamente vão querer "flexibilidade" nas tarifas. No edital, a tarifa máxima que pode ser oferecida no leilão é de R$ 0,49 por quilômetro. As empresas querem derrubar o teto. Outras querem que o contrato permita ajustes de tarifa caso o custo da obra estoure ou a ocupação do trem-bala seja baixa demais. Ainda há quem peça eletricidade barata e "facilidades" na importação de equipamentos.
O governo diz por ora, pelo menos da boca para fora, que não mexe mais no edital. Que já arrumou financiamento subsidiado. Que haverá um sócio estatal na operação e outras estatais e seus caixas agregados aos consórcios privados .
Economicamente, o projeto do TAV era suspeito. Agora, vai valer a pena, politicamente, para Dilma?

NELSON MOTTA

Delação premiada à cubana

NELSON MOTTA
O Globo - 01/04/2011

Cuba está inovando na repressão politica com um novo formato intimidatório: na série de televisão "As razões de Cuba", agentes secretos saem das sombras e, de cara limpa e apresentados como heróis, contam como se infiltraram em grupos de dissidentes, de blogueiros de oposição, e até das Damas de Branco. Arrá ! Sabemos quem vocês são, inimigos da Revolução a soldo do Império, é o recado dos espiões de crachá. Mas ninguém se intimidou, muito pelo contrário.

"Ele se mostrou tão solidário e curioso que logo desconfiamos que poderia ser um espião, temos grande know how na matéria", contou em vídeo uma blogueira cubana, às gargalhadas, ao identificar um "amigo" no programa. "Ninguém ligava para ele, não havia nada a esconder, afinal, nós não queremos o poder, mas apenas viver dignamente do nosso trabalho, expressar nossas opiniões em liberdade, viajar, ter acesso a novas tecnologias. Quem não quer?"

O programa "Ciberguerra" foi sensacional - para os blogueiros de oposição. Nem se tivessem encomendado o serviço a um marqueteiro seria melhor: um "comercial" de uma hora em horário nobre, contando quem são e o que fazem esses inimigos do povo - os combatentes da liberdade que estão rompendo a cortina de chumbo da informação em Cuba. Deram os nomes, fotos e links dos contrarrevolucionários para a execração pública e - como no episódio em que Collor pediu verde e amarelo e a população saiu de preto - a delação premiou os delatados: no dia seguinte, os blogs explodiram com mensagens de apoio. O telefone de Yoani Sánchez, estrela da nova mídia independente, não parou, e ela quase não pôde andar na rua, de tantos cumprimentos. Novos tempos. Antes, ela seria cercada por um "comitê de repúdio", as brigadas de militantes ferozes que gritam, xingam e agridem quem tem opinião diferente da oficial.

Mas velhos slogans e palavras de ordem patrióticas já não conseguem conter a ofensiva da realidade: o comunismo tropical faliu. Quando chegar o cabo de fibra ótica da Venezuela e os cubanos tiverem amplo acesso à internet, como prometeu o governo, a ditadura estará com os megabites contados.

ROGÉRIO L. FURQUIM WERNECK

Discurso torto

ROGÉRIO L. FURQUIM WERNECK

O Globo - 01/04/2011

O governo ainda não conseguiu mostrar que tem uma política macroeconômica coerente com a volta da inflação à meta. Uma fonte de preocupação tem sido a política fiscal, que se debate com dificuldades que vão da timidez dos cortes de gastos ao descrédito das contas públicas. A tais dificuldades, veio agora se somar um problema grave de credibilidade, advindo do lamentável discurso com que o governo vem tentando racionalizar a expansão do gasto público direcionado ao investimento.

Indagado pela mídia sobre a contradição envolvida nas novas e vultosas transferências do Tesouro ao BNDES, na contramão do corte de gastos que havia sido anunciado, o ministro da Fazenda tem recorrido à seguinte explicação: "Não tem contradição. Uma coisa é gasto e outra, financiamento para investimento. Investimento não pressiona a inflação, ele a alivia, porque significa maior oferta de produtos, mais produtividade e redução de custos" (O GLOBO, 4/3/2011). A mesma alegação tem sido feita pelo BNDES. (http://economia.estadao.com.br/noticias/not_57657.htm).

O argumento não faz sentido. E é triste ter de gastar papel, tinta e tempo do leitor para esclarecer questão tão elementar. Um aumento de gastos de investimento não só afeta diretamente a demanda agregada, como deflagra ondas sucessivas de consumo que acabam dando lugar a impacto total sobre a demanda bem maior do que o aumento inicial dos gastos de investimento. Trata-se do efeito multiplicador, conceito bem conhecido por qualquer aluno de primeiro ano de economia.

No devido tempo, o aumento de gastos de investimento - em construções, instalações, máquinas e equipamentos - dará lugar a uma elevação de capacidade instalada, que, sim, poderá ampliar a oferta de bens e serviços da economia. Mas, até que isso ocorra - o que não é imediato e depende do prazo de maturação das inversões feitas -, o efeito dominante do aumento de investimento será pelo lado da demanda.

O leitor menos afeito ao economês pode se beneficiar do noticiário recente para perceber, de forma mais nítida e concreta, a distinção entre o efeito inicial do aumento do investimento, que se dá sobre a demanda agregada, e o efeito posterior, que, afinal, se traduz em ampliação de capacidade de produção. Há poucas semanas houve uma rebelião no canteiro de obras da usina hidrelétrica de Jirau, em Rondônia. O clima de inquietação logo atingiu outras obras importantes do PAC. Na cobertura dessa rebelião e seus desdobramentos, a mídia tem dado destaque aos vastos contingentes de trabalhadores empregados nessas obras. Só em Jirau trabalham nada menos que 22 mil operários.

Os gastos de investimento ali feitos, financiados com recursos do Tesouro, incluem a folha de pagamento desses trabalhadores. Parte do salário é despendida pelos próprios operários e outra parte remetida às famílias em suas cidades de origem, dando lugar a uma primeira onda de consumo que se propaga por boa parte do País. Outras ondas se seguirão, à medida que esses dispêndios de consumo estimularem a atividade econômica nas comunidades em que forem feitos. É o efeito multiplicador.

Na verdade, o impacto da construção de Jirau sobre a demanda é bem maior, já que os gastos de investimento não se resumem à folha de salários da obra. Envolvem também dispêndios com fornecedores, prestadores de serviços, materiais de construção e equipamentos. Até que a primeira turbina de Jirau comece a gerar energia, em meados de 2012, quatro anos após o início da obra, o impacto dos investimentos estará restrito à demanda.

O governo ainda não se deu conta da péssima impressão que vem causando o discurso oficial de que investimento não pressiona demanda. Tal argumento trouxe desalento ao debate sobre a condução da política macroeconômica. Soou como a 13ª batida do relógio, que diz mais sobre o relógio que sobre as horas. E o mais grave é terem deixado que argumento tão desabonador, forjado no eixo Fazenda-BNDES, fosse usado pela própria presidente Dilma Rousseff na entrevista ao "Valor Econômico" de 17 de março.

MARCELO SUANO

Nova lenda urbana
MARCELO SUANO
O Globo - 01/04/2011

Será a substituição de Roger Agnelli, presidente da Vale, mais uma dessas lendas urbanas? Uns dizem que sim, outros dizem que não. O fato é que, nos últimos dois anos, periodicamente surgem notícias de que o governo quer substituir Agnelli na presidência da empresa. As razões nunca são postas na boca de quem de direito: os acionistas.

São sempre veiculadas a partir de "fontes" e referem-se a um eventual desagrado político com a gestão do atual presidente. Curiosamente, nunca se critica a sua gestão como administrador. Nem mesmo seus resultados. Como se a futrica política fosse muito mais importante do que entregar resultados claros e concretos.

Outro dia, um analista de mercado dos Estados Unidos comparou o desempenho de Roger Agnelli com o de Jack Welch, que dirigiu a GE. Agnelli conseguiu realizações semelhantes, em termos de criação de valor para seus acionistas por ano, às que Welch conquistou em seus 20 anos de GE. Finalizou seu raciocínio dizendo que se Agnelli morasse nos Estados Unidos teria se transformado em um guru empresarial.

Evidentemente que os principais acionistas da Vale devem ser aqueles que escolhem o presidente da empresa. Incluindo a Previ, fundo de pensão dos funcionários do Banco do Brasil. Porém, a questão política tem afetado desnecessariamente o valor da empresa com evidente prejuízo para os seus acionistas.

Relatórios de bancos apontam perdas no valor das ações de muitos bilhões de dólares. A quem interessa desvalorizar a Vale a partir de futricas e intrigas? Este é o enigma que está na cabeça de muita gente, inclusive dos mais de 250 mil trabalhadores brasileiros que investiram seus depósitos de FGTS nas ações da empresa. Ou os 3,5 milhões de beneficiários dos fundos de pensão que são acionistas controladores da empresa. Será que eles querem perder dinheiro em nome de sabe-se lá o quê?

A gestão da Vale não deveria ser um problema político de governo. Até mesmo pelo fato inconteste que a gestão da empresa é altamente lucrativa para o Brasil. Os números em termos de empregos, impostos, divisas e investimentos são excepcionais.

De qualquer maneira, essa discussão é emblemática: trata-se de opor um país no qual regras e contratos não são respeitados ao Brasil que, como disse Obama em seus discursos em Brasília e no Rio durante sua visita oficial, não é mais uma promessa de futuro, e sim o próprio futuro.

JOSÉ SIMÃO

Buemba! Bolsonaro sai do armário! 
JOSÉ SIMÃO

FOLHA DE SÃO PAULO - 01/04/11

BUEMBA! BUEMBA! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República!
Placa no Paraguai: "Caldo de piranha contra dengue". Olha, se piranha curasse dengue, não ia ter epidemia no Brasil! Rarará!
E esta: "Polícia Ambiental prende traficante com uma tonelada de maconha". De onde é o traficante? CHAPADÃO DO SUL!
E olha a faixa que uma menina pendurou num outdoor do Ford Ka: "Beto, volte pra mim! Mas volte num carro como esse daí de cima. Carol!". Rarará!
E a manchete do Piauí Herald: "Bolsonaro sai do armário". Rarará! E tem uma foto dele pescando com o Ricky Martin e o Elton John! Bolsonaro sai do armário e vai pescar com Ricky Martin e Elton John!
Esse é o grande babado da semana: deputado Bolsonaro. Numa única entrevista pro "CQC", ele conseguiu ser racista e homofóbico! Não é pra qualquer um.
E, após a entrevista, ele cuspiu no chão, empurrou uma quenga e cortou uma árvore?! Rarará!
A Preta Gil devia dar uma voadora nesse Bolsonaro! E a ironia: ele é da Comissão de Direitos Humanos! Rarará!
E tem vários modos de sair do armário. A filha duma amiga minha menstruou e gritou: "Mamãe, mamãe, eu virei mulher". E o irmão aproveitou: "Eu também! Eu também!". Rarará!
O castigo pro Bolsonaro: ir ao show da Preta Gil e esticar na The Week. Recuperação. Pra recuperar o tempo perdido! Rarará! E depois se afogar numa muqueca de carambola com muita pimenta feita por um pai de santo gay, na barraca da Keka, prima da Preta Gil. Rarará!
E sabe o que uma biba disse sobre os homofóbicos? Todo pitbull é uma lassie enrustida. Rarará! É mole? É mole, mas sobe!
E o Bolsonaro não está sozinho. Olha o Twitter do deputado federal e pastor Marcelino Feliciano: "Sendo possível o primeiro ato de homossexualismo da história, a maldição de Noé sobre Canaã toca seus descendentes diretos, os africanos".
Socuerro. E péssimas notícias: "Antropólogo exibe pedra maia para desmentir o fim do mundo em 2012". Evento cancelado! Eu vou jogar uma pedra nesse antropólogo! O mundo TEM que acabar em 2012! Rarará! Nóis sofre, mas nóis goza!
Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno!

MÔNICA BERGAMO

MUDANÇA AUTOMÁTICA
MÔNICA BERGAMO
FOLHA DE SÃO PAULO - 01/04/11

A ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) deve baixar já em abril resolução normativa com novas regras para a portabilidade, quando as pessoas migram de um plano de saúde para outro sem ter que cumprir novas carências para começarem a ser atendidas. Uma das mudanças é a ampliação de dois meses para quatro meses no prazo para a escolha de um novo convênio. As novas regras valem para os que têm planos individuais ou de adesão associativa, ou cerca de 16 milhões de pessoas.

GÔNDOLA
A ANS deve lançar também em abril as novas regras para quem migra de contratos antigos, que são mais baratos mas têm um leque menor de coberturas médicas, para um novo. As empresas terão que aceitar essa nova clientela cobrando um reajuste máximo de 20,59% em relação ao convênio que as pessoas já tinham.

OUTDOOR
O TST (Tribunal Superior do Trabalho) decidiu que, como os jogadores de futebol, os vendedores de lojas têm o direito de decidir se vão ou não estampar em camisetas propaganda de produtos vendidos nas lojas. A Ricardo Eletro foi condenada a pagar indenização de R$ 5.000 por uso de marcas em uniforme sem a autorização do trabalhador. O ministro Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira decidiu que isso "viola o direito de imagem" e "os direitos da personalidade", com "manifesto abuso do poder diretivo do empregador".

CANÇÕES DE CRIANÇA

Milton Nascimento e Djavan interpretarão músicas de infância em um show no Theatro Municipal do Rio, em maio. O evento promoverá a ONG Childhood Brasil, da rainha Sílvia, da Suécia, que luta contra a exploração sexual de crianças.

XUXA ARRECADA R$ 2 MILHÕES E DIZ QUE NÃO SABE PEDIR
"Acho que os lotes masculinos vão sair por [um valor] mais caro", palpitou a empresária Ana Lúcia Zambon pouco antes de começar o leilão beneficente que a Fundação Xuxa e o Hospital de Câncer de Barretos promoveram anteontem no Palácios dos Bandeirantes.

As chuteiras nº 40 do jogador Dentinho saíram por R$ 4.500, enquanto o par de botas nº 39 de Xuxa arrecadava R$ 4.000. "Escolheram mal o tipo de peça. Não dá para usar um vestido de uma mulher [Xuxa] de um metro e oitenta", disse a empresária Mônica Senhorini. Ela comprou as botas porque queria o casaco que vinha no mesmo lote. "Minha filha pode brincar com os sapatos. Vai amar." Outra pessoa levou o vestido por R$ 240 mil.

"Me falta meio metro para usar roupa da Xuxa!", disse a ex-cunhada da loira, Viviane Senna, na entrada, guardada por nove recepcionistas morenas. Ela foi ao evento pela "história de carinho entre as duas famílias".

A namorada do sertanejo Gian, Tatiana Morais, até pensou em comprar sua primeira roupa de segunda mão. "Não usaria coisa de brechó. Mas da Xuxa até pode ser, né?" Hebe colaborou doando um perfume para o leilão, "meu cheiro secreto!".

Samuel Cirnansck vestiu a estrela. "A Xuxa está entre minhas clientes "top 10"." Tanto por causa do corpo quanto pelo fato de comprar até três vestidos de uma vez.

"Eu não sei pedir", dizia Xuxa. "No ano passado, vim aqui e fiquei roxa [de vergonha]. Preciso aprender." A apresentadora explicava que cada criança "custa só R$ 330 por mês". Guilhermina Guinle e Murilo Benício anunciavam no palco que vão arcar com os custos de uma.

As crianças e adolescentes da Fundação Xuxa passam a distribuir um formulário, que diz "vou apadrinhar ( ) crianças". Entre os parênteses vai o número de "adoções".

O martelo parou de bater depois da meia-noite, com R$ 2 milhões arrecadados -metade para o hospital de Barretos e o outro meio para os baixinhos de Xuxa.

SUSTOS NOS JARDINS
O restaurante Pasta & Vino, na rua Barão de Capanema, nos Jardins, teve TVs e outros objetos furtados no fim de semana. O local passa por uma reforma e não está aberto para os clientes. Na mesma rua, a banca de revistas da esquina com a Peixoto Gomide sofreu tentativa de furto de sábado para domingo. O alarme tocou e os bandidos fugiram. No sábado à tarde, uma manicure foi assaltada na mesma esquina por homens que estavam em uma moto. Levaram R$ 100.

CUNHADO É PARENTE

O deputado Jair Bolsonaro vai mostrar no "CQC" da próxima semana uma foto de seu cunhado, "75% negro e 25% branco", para mostrar que não é racista.

A CIDADE E A SERRA

Monica Serra diz que irá vender seu carro, um Vectra. E logo: precisa pagar a blindagem "especial" de um Honda Civic recém-comprado. "É uma nova tecnologia. Um vidro que pesa menos do que a blindagem normal, e tem garantia mais longa."

CURTO-CIRCUITO

Lulina e Flu fazem show no projeto Ybmusic, às 17h, na estação Paraíso do metrô.

Jum Nakao dá workshop, às 9h, na Belas Artes.

O livro "2022 - Propostas para um País Melhor no Ano do Bicentenário" (Campus/Elsevier) será lançado na segunda, às 18h30, na Livraria Cultura do Conjunto Nacional.

com DIÓGENES CAMPANHA, LÍGIA MESQUITA, THAIS BILENKY e CHICO FELITTI

BARBARA GANCIA

Só não esquecemos de beber
BARBARA GANCIA

FOLHA DE SÃO PAULO - 01/04/11

SEGURA, PEÃO! O homem está sentindo falta dos holofotes. Achei que o nosso amantíssimo ex-presidento (ué?) Lula ia precisar de mais tempo para se recuperar da superexposição dos últimos oito anos. Teria apostado um picolé de limão como ele ia dar um período de, no mínimo, um ano antes de aparecer matraqueando ao microfone novamente.
Ora, quem diz que ele consegue? Problema é que agora não pode mais recorrer a uma "supernanny" que lhe diga com firmeza: "Veja bem, senhor ex-presidente, talvez não seja uma boa ideia o senhor se oferecer para gravar mensagem de boas-vindas ao Adriano. Corintiano ou não, é prudente lembrar que as pessoas ainda guardam fresca na memória a imagem do jogador fazendo os símbolos de C, de Comando, e V, de Vermelho, com a mão".
Sei não, mas algo me diz que ainda vamos ver o ex-presidente inaugurando a bunda nova da Lucilia Diniz depois de um "extreme makeover" ou entregando diploma de conclusão de curso de agility para um dos cães da Vera Loyola.
Está certo que qualquer malabarismo é válido para evitar passar a tarde jogando tranca com a dona Marisa, mas vamos e venhamos, um estadista da importância de Lula reaparecer, depois de tanto tempo quieto, em vídeo para celebrar o Adriano é de uma falta de bom senso que desafia ao Gaddafi.
Do alto do seu dever cumprido, Lula tem liberdade de gravar mensagem para quem bem entender. E o Adriano que também fique à vontade para afirmar quantas vezes desejar que sua única doença é a família (foi inclusive aplaudido quando disse isso na apresentação ao clube, olha só quanta gente esclarecida havia por perto) e que "da outra" (doença, presumo) já se curou.
Respeitosamente, gostaria de perguntar: e o consumo abusivo de álcool, como é que fica? Quando vamos parar com a hipocrisia?
De uns tempos para cá, o país inteiro resolveu fingir que não existe mais problema com álcool. Esquecemos da lei seca, dos execráveis comerciais de cerveja e até demos para desacreditar nas formas mais efetivas de tratamento.
Em todo lugar, os Alcoólicos Anônimos são super-respeitados. Nos EUA, que estão a anos luz de nós na abordagem da doença, membros famosos de AA falam abertamente sobre a irmandade e são aplaudidos. Entre nós, a indústria de bebida, o lobby farmacêutico e a classe médica juntam forças para desacreditar 80 anos de bons serviços prestados. Que tal comparar os índices de sobriedade obtidos pelos médicos da Unifesp aos do AA?
Recentemente, o ator Charlie Sheen foi demitido por uso de drogas. Ele nega ter problemas, mas seus episódios são públicos e notórios. Será que Clinton e Bush lhe dariam tapinhas nas costas publicamente? Não nos faltará consciência e seriedade sobre um problema social gravíssimo?
Adriano não se crê doente, mas apresenta comportamento tipicamente errático. Deveria começar respondendo ao questionário do AA que está no Google. São 12 perguntas. Quatro ou mais respostas "sim" já dão indício de que o camarada deve abrir o olho. Exemplos: 1) Nos últimos 12 meses você faltou ao trabalho por causa da bebida? 2) Nos últimos 12 meses você brigou com a família por causa da bebida? 3) Nos últimos 12 meses você se envolveu com a polícia por causa da bebida? 4) Inveja as pessoas que podem beber sem criar problemas? Já posso parar, não?

RODOLFO LANDIM

A escolha de Sofia 
RODOLFO LANDIM
FOLHA DE SÃO PAULO - 01/04/11

VIVEMOS HOJE em um mundo onde a cada dia aumenta a consciência dos povos sobre o ambiente e onde são debatidas ações globais para a redução dos impactos causados pela presença humana no planeta.
Assim, inúmeros estudos têm sido elaborados sobre a poluição dos mananciais de água potável, a destruição de florestas e a redução da biodiversidade. Mas talvez a ameaça vista isoladamente com mais apreensão esteja ligada ao processo de aquecimento global, em que boa parte da responsabilidade é atribuída aos gases de efeito estufa.
O principal vilão é considerado o grande volume de CO2 (gás carbônico) que resulta do consumo de enormes quantidades de lenha e combustíveis fósseis (carvão, derivados de petróleo e gás natural) em processos industriais e na geração de energia em todo o mundo.
Ocorre que será necessário modificar drasticamente a matriz energética atual para que a humanidade continue a ter níveis de conforto crescentes, consumindo mais energia e ao mesmo tempo atendendo à redução dos níveis de emissão de CO2 conforme estabelecido no Protocolo de Kioto.
Parece que somos e ainda seremos dependentes da utilização de derivados de petróleo em meios de transporte por muitos anos.
No caso da geração de energia elétrica, a mudança também não é fácil. Já existe um enorme parque gerador baseado em combustíveis fósseis nos países que são grandes consumidores de energia, cuja lógica de implantação buscou não só os menores custos de geração, mas também as disponibilidades locais de combustíveis, conceito ligado à segurança estratégica da nação.
Assim, Estados Unidos e China, que possuem a primeira e a terceira maiores reservas de carvão, são muito dependentes desse combustível, que responde por quase metade da geração da energia elétrica no primeiro e cerca de dois terços no segundo.
A Rússia, que detém a segunda maior reserva do mundo, só não tem a maior parte de sua eletricidade baseada em carvão porque também possui as maiores reservas de gás natural do planeta, combustível no qual é mais centrado seu parque de geração.
Uma alternativa para solucionar o problema seria o uso mais intensivo de energias renováveis, dentre as quais estão as hidrelétricas, hoje responsáveis por 17% da energia elétrica consumida no mundo.
Mas seu potencial de expansão é limitado e são poucos os países como o Brasil, que têm a privilegiada posição de ter mais de 80% de sua geração de origem hídrica e ainda possuir um enorme potencial dessa natureza a desenvolver.
Fala-se muito de outras energias renováveis, dentre as quais são destacadas a eólica, a solar e os biocombustíveis. Infelizmente, elas não parecem ser soluções abrangentes. A primeira, apesar de seu alto custo de implantação vir sendo reduzido, tem um potencial de geração pouco significativo em relação ao consumo mundial.
O uso de energia solar só faz sentido para pequenos consumos em locais não atendidos por redes de transmissão, pois, além de cara, tem a desvantagem de consumir grande quantidade de energia na produção dos painéis fotovoltaicos.
Já os biocombustíveis têm um potencial importante, mas não podemos esquecer que, para produzi-los em grande escala, será necessária a ocupação de vastas áreas agricultáveis do planeta, o que impactaria ainda mais o preço das commodities agrícolas e o consumo de água.
A principal alternativa para a geração de energia elétrica em grande escala e sem a emissão de gases de efeito estufa, apesar de cara, é a nuclear. Essa importante fonte responde hoje por cerca de 13% da energia elétrica gerada no planeta.
No entanto, o recente acidente ocorrido em Fukushima, no Japão, colocou o mundo novamente em dúvida quanto à eficácia dos sistemas de segurança das usinas nucleares.
Cada vez mais a sociedade questiona se o risco das aterrorizantes consequências de um acidente nuclear não é um preço muito alto pelo uso dessa fonte de energia.
Não existe solução ampla sem grandes custos, riscos ou efeitos colaterais. O difícil é escolher o "menos ruim". 

XICO SÁ

A secada perfeita
XICO SÁ

FOLHA DE SÃO PAULO - 01/04/11

AMIGO TORCEDOR, amigo secador, telegrama urgente do corvo Edgar, direto do Dragão, festivo ambiente familiar da av. Beberibe, Recife: "Nunca cheguei tão perto do meu ideal da secada perfeita".
"Como assim, lazarento?", indago. A ave do agouro ludopédico explica: "Derrota do São Paulo, depois de toda a badalação do centésimo gol do Rogério, de festa pirotécnica para o Fabuloso e da quebra de tabu contra o Corinthians".
Tento dizer que são coisas do futebol, um revés não apaga o foguetório são-paulino etc. Ele interrompe: "Pra completar, com gol contra, meu sonho de consumo; Deus do céu, como amo essa espécie de suicídio da bola".
Há realmente uma estranha beleza quando alguém marca contra a sua própria equipe. Um gesto que guarda o encanto de um poema maldito. O gol contra pode ser também um ato falho. É uma vontade que dorme no sótão do inconsciente. Igual quando a gente sabota o grupo ou a nós mesmos.
A noite perfeita, a noite perfeita. O corvo engancha a agulha no disco, enche o saco. "O todo-poderoso, não sei quantas vezes campeão da América e do universo, sucumbe diante do Santinha, não o Santa de Nunes e Fumanchu, o tricolor da quarta divisão do Brasileiro", lasca.
Alto lá, agourento. O Santa ressuscitou qual um Lázaro, é líder do Pernambucano, nem parece mais aquele time vitimado por cartolas que o levaram ao subsolo das divisões nacionais.
Simpático ao tricolor do Arruda, embora tenda a secá-lo domingo, no Clássico das Multidões contra o Sport, o corvo diz, em uma rara vez na vida, que o seu dono está certo. Gracias, miséria ovípara.
Edgar só tem um time: o Íbis, batismo de agourento pássaro do Egito. É o único à prova de decepções. "A gente já sabe a desgraça que vai acontecer de véspera", argumenta. No mais, ele seca, sua grande arte. "Torcer é coisa de ingênuo, não submeto as batidas do meu pobre coração denunciador a essa cartolagem", diz, arrogante.
A noite perfeita. "Rogério Ceni ainda tentou apitar o jogo", sopra a ave lazarenta. "Pode custar a vaga à Libertadores, a obsessão tricolor por excelência", prossegue o repetitivo sujeito.
P.S.: Dedico a coluna a Christopher Jácome, 17, torcedor do Cúcuta assassinado na Colômbia, sábado. O caixão com seu corpo foi levado ao estádio para que o morto se despedisse do seu time. O jogo foi 1 a 1 contra o Envigado. Há quem atribua o "gol espírita" de empate, no final, ao jovem defunto.

DORA KRAMER

No tempo do onça
DORA KRAMER

O ESTADO DE SÃO PAULO - 01/04/11

Quase ninguém percebeu, inclusive porque o assunto não mereceu grande destaque nem suscitou debates: por conta de uma lei (12.034) aprovada pelo Congresso em 2009, a partir da eleição presidencial de 2014 os votos dos eleitores serão impressos assim que teclados nas urnas eletrônicas.
Com isso, a Justiça Eleitoral será obrigada a instalar impressoras em todas as cerca de 500 mil urnas que, calcula-se, serão utilizadas naquela eleição.
A iniciativa foi do PDT, que conseguiu aprovar a proposta por meio de um acordo suprapartidário feito quando da aprovação de uma "minirreforma" eleitoral que liberou o uso da internet para campanhas políticas, permitiu propaganda paga e doações de pessoas físicas na rede.
O argumento principal foi o de que a impressão do voto confere mais segurança e impede fraudes, pois permite a conferência do ato eleitoral no papel.
De certo a inspiração do PDT, partido fundado por Leonel Brizola, ainda é resquício do trauma do caso Proconsult. Aconteceu em 1982, quando da eleição de Brizola para o governo do Rio. Uma tentativa de fraude que consistia na transferência dos votos nulos e brancos para o principal adversário de Brizola, Moreira Franco, executada no sistema informatizado de apuração montado pela empresa Proconsult.
O ardil foi descoberto e denunciado pela rádio Jornal do Brasil, que fazia apuração paralela e percebeu a discrepância nos resultados.
Uma situação em nada comparável ao sistema de urnas eletrônicas, cuja eficácia - apuração de 92,5% dos votos em 1h04 na eleição do ano passado - e confiabilidade despertam interesse no mundo todo e nunca foram contestadas por partidos ou candidatos desde sua adoção.
No entendimento da Justiça Eleitoral, trata-se de um retrocesso e na percepção da Procuradoria-Geral da República, de uma ilegalidade.
Em janeiro deste ano a procuradoria entrou no Supremo Tribunal Federal com uma ação direta de inconstitucionalidade, argumentando que a impressão viola o artigo 14 da Constituição que assegura a inviolabilidade do voto, porque permitiria a identificação do eleitor por meio da associação do conteúdo do voto com a assinatura digital na urna.
"A garantia da inviolabilidade do eleitor pressupõe a impossibilidade de existir, no exercício do voto, qualquer forma de identificação pessoal, a fim de impedir qualquer tipo de coação", sustenta a ação.
A procuradoria argumenta também que há perigo de quebra do sigilo em caso de falha na impressão ou travamento da urna eletrônica porque desse modo os votos ficariam expostos à pessoa responsável por solucionar o problema do equipamento.
Essas questões serão examinadas pelo Supremo, que ainda não tem previsão para votar a Adin. Mas, a julgar pela posição dos ministros em relação ao avanço que representaram as urnas eletrônicas e o transtorno provocado pela produção de toneladas de papéis inúteis, é provável que o STF reveja mais uma decisão do Congresso tomada por razões alheias à lógica dos fatos.
Ordem unida. Não houve intermediários nem meias palavras: a presidente Dilma Rousseff determinou ao governador Omar Aziz, do Amazonas, que aderisse ao PSD a ser criado pelo prefeito de São Paulo. Aproveitou o ensejo para mandar um recado ao senador Sérgio Petecão, do Acre, orientado a fazer o mesmo.
Ambos são filiados ao PMN, da base do governo.
Mercado futuro. Kassab já disse a mais de um interlocutor que sua ideia não é concorrer ao governo de São Paulo em 2014.
Ele quer disputar sim uma eleição majoritária, mas o alvo é o Senado.
O gato comeu. Inflação subindo, custo de vida disparando, risco de uma explosão de preços, e os tucanos, em cujo governo se derrubou a inflação e se estabilizou a moeda, calados.
Depois não sabem por que lhes roubam a bandeira da estabilidade. 

MERVAL PEREIRA

Maioria virtual 
MERVAL PEREIRA

O GLOBO - 01/04/11

O comentário da presidente Dilma Rousseff sobre a dificuldade de lidar com o Congresso, mesmo o governo tendo uma esmagadora maioria, reflete bem as distorções de nosso sistema político-partidário, ainda mais se levarmos em conta que a conversa com o presidente de Portugal, Cavaco Silva, deu-se no contexto das dificuldades próprias do governo português, que tem um regime parlamentarista.
O presidente se lamentava pela situação que vive o governo português, que não conseguiu aprovar no Congresso um plano econômico essencial para a recuperação do país e perdeu por isso seu primeiro-ministro José Sócrates, do Partido Socialista, que teve que renunciar por falta de maioria.
Nada disso corre o risco de acontecer no Brasil, até mesmo porque no nosso presidencialismo de coalizão é quase impossível perder a maioria. As coalizões existem justamente para garantir a governabilidade.
No nosso caso, então, a maioria é tão esmagadora a favor do governo que dificilmente ele perde uma votação e tem condições até mesmo de aprovar emendas constitucionais, que exigem quorum maior.
A queixa da presidente Dilma evidencia apenas uma distorção do nosso presidencialismo de coalizão, que obriga o presidente, seja de que partido for, a fazer alianças parlamentares que nada têm de programáticas, chegando ao ponto máximo nos oito anos de governo Lula, que juntou sob o mesmo guarda-chuva agremiações políticas tão distintas quanto o PCdoB e o PRB da Igreja Universal.
Se bem que a nossa política é tão estranha que o mesmo o PCdoB se tornou o maior aliado do agronegócio e foi demonizado pelas esquerdas ecológicas, por ter proposto mudanças no Código Florestal que beneficiam os produtores rurais.
Mas, voltando às negociações congressuais, o governo Dilma aprofundou essa mesma linha de ação, acrescentando mais partidos à já ampla coligação que apoiava Lula, e agora ainda tem a possibilidade de contar com votos do futuro PSD, que se dispõe a não fazer oposição sistemática ao governo.
Pois mesmo assim, com a redução da oposição parlamentar, que hoje tem a menor representação dos últimos tempos, a presidente Dilma sabe que não tem tranquilidade para aprovar questões polêmicas no Congresso, e por isso não se mostra disposta a enfrentar as negociações para reformas constitucionais que seriam fundamentais, como a reforma da Previdência ou a fiscal.
Mais que isso, sabe que, mesmo nas situações mais banais, pode ter grave problema político se eventualmente desagradar a um dos partidos de sua base supostamente aliada, em especial se esse partido for o PMDB.
A virtual maioria do governo, montada à base da troca de favores, não é real, nem a fidelidade de seus aliados pode ser levada ao pé da letra.
Por todos esses motivos da realpolitik, é difícil que saia do Congresso uma reforma política que torne menos desorganizada a relação do Congresso com o governo.
Segundo alguns especialistas em legislação eleitoral, uma reforma deveria buscar o equilíbrio do sistema para que ele seja realmente representativo, sem favorecer sub-representação, e garanta uma eficiência governativa, produzindo atores políticos que atuem no Legislativo.
Não seria desejável ter um sistema de partidos fortíssimos, mas sim que o partido tenha representatividade, evitando assim a fragmentação excessiva do Congresso.
A aprovação do sistema de lista fechada pela comissão de reforma do Senado acendeu uma luz de advertência na Câmara, que também tratará do assunto.
Esse sistema eleitoral é o preferido do PT, o partido atualmente que recebe mais votos apenas de legenda, e é o partido preferido do eleitor de acordo com as pesquisas.
Talvez o PMDB também se beneficiasse desse sistema, pelo qual o partido faz uma lista de candidatos e apresenta ao eleitor, que votará apenas na legenda.
As cadeiras a que o partido tiver direito de acordo com a sua votação serão preenchidas pelos candidatos da lista, em ordem de colocação feita pela direção partidária.
Se um partido tiver direito a eleger cinco deputados em um determinado estado, os cinco primeiros da lista serão os escolhidos.
Os critérios para a colocação na lista são definidos internamente por cada partido.
O temor dos políticos é que as direções partidárias fiquem cada vez mais fortes, o que em alguns países que adotam esse sistema é chamado de "partidocracia".
O mais provável, portanto, é que a reforma política empaque mais uma vez diante da ameaça de que os deputados percam a autonomia que hoje têm em relação ao partido, mesmo que a fidelidade partidária seja uma limitação a essa liberdade, que já foi bem maior.
Duas medidas, no entanto, poderiam ser tomadas para reduzir o número de partidos em atuação no Congresso.
A mais provável de ser aprovada é o fim das coligações proporcionais, que distorcem a vontade do eleitor, que vota em um candidato de determinado partido e acaba elegendo outros, até mesmo de uma legenda de posição política oposta. Com isso os pequenos partidos tendem a desaparecer, a não ser aqueles que têm substância ideológica, como o PSOL, ou programática, como o Partido Verde.
Outra medida saneadora seria a volta das cláusulas de barreira, que foram aprovadas com anos de antecedência para reduzir o número de partidos com atuação no Congresso e acabaram sendo vetadas pelo Supremo Tribunal Federal por questões técnicas.
Elas poderiam ser ativadas novamente como maneira de limitar a ação congressual aos partidos que realmente sejam representativos.
Se estivessem em vigor, em vez de 28 partidos no Congresso, teríamos hoje cerca de meia dúzia, o que permitiria negociações políticas menos dispersas. 

ILIMAR FRANCO

Dominó
ILIMAR FRANCO
O GLOBO - 01/03/11

Os senadores do PMDB não tratam mais de cargos no governo Dilma Rousseff antes que sejam resolvidos os casos dos ex-senadores Hélio Costa (MG) e José Maranhão (PB). Foi esse o recado que o ministro Palocci (Casa Civil) recebeu anteontem do líder Renan Calheiros (AL). Para o PMDB do Senado, sem resolver as prioridades, não dá para avançar no restante das posições.

Ligações perigosas

Estavam na conversa com Palocci, além de Renan Calheiros, Romero Jucá (RR) e José Sarney (AP). Eles disseram que era um desprestígio para o PMDB a não nomeação de Costa e de Maranhão. “O Hélio foi candidato a governador no segundo colégio eleitoral, Minas Gerais, onde a Dilma venceu. Não tem sentido nomear o (Fernando) Pimentel, que perdeu duas vezes, para o Aécio (Neves) e o Itamar (Franco), e não colocar o Hélio em lugar nenhum”, protestou Renan. Palocci explicou que Hélio Costa estava no limbo junto
à presidente Dilma por sua ligação com o deputado Eduardo Cunha (PMDB-MG) no caso de Furnas.

"O governo quer resolver, mas não encaixou uma solução” — Romero Jucá (PMDB-RR), líder do governo no Senado, sobre as indicações prioritárias do PMDB

SPOT INFELIZ. O comercial de rádio veiculado pela Auditar, entidade dos auditores fiscais do TCU, segundo o ministro José Múcio, promove “um enfrentamento” quando pergunta: “O que você prefere: um nome técnico ou um indicado pela Câmara?” Múcio lembra que a Câmara já elegeu para o tribunal Aroldo Cedraz, quando este estava sem mandato, e que o Senado fez ministro um ex-secretário-geral da Mesa da Casa, Raimundo Carrero. “Eles deveriam articular e não provocar”, resume Múcio.

Explicação

A Auditar enviou nota em que nega “qualquer antagonismo com relação aos parlamentares”. A entidade diz que pretende apenas participar da escolha do futuro ministro do TCU, sugerindo um nome de origem técnica à Câmara dos Deputados.

O escolhido
O candidato dos auditores fiscais para a próxima vaga no TCU é o engenheiro mecânico Rosendo Severo dos Anjos. Servidor do tribunal desde 1990, ele trabalha há 18 anos como auditor de controle externo. Ele recebeu 43,6% dos votos.

Linha de crédito para mulheres
O governo Dilma vai lançar uma linha de crédito para mulheres, com juros mais baixos. Esse foi o último ato assinado por Maria Fernanda Coelho na presidência da Caixa Econômica. A ministra Iriny Lopes (Política para Mulheres) quer fechar acordo também com o Banco do Brasil. Para entrar em vigor, estados e municípios precisarão fazer convênios. O combate à feminização da pobreza é a principal bandeira do ministério.

Cadastro eleitoral
O governo de São Paulo pede o número do título de eleitor no cadastro da nota fiscal paulista, que devolve 30% do ICMS recolhido pelo estabelecimento a seus consumidores. A justificativa é “aumentar a confiabilidade do seu cadastro”.

Se a moda pega
O ministro Mário Negromonte (Cidades) levou para trabalhar na pasta a fiel assessora Maria da Costa, conhecida como “Wilma”. Mas ela continua recebendo salário pela Câmara, onde é comissionada. O salário do Executivo é mais baixo. 


 O CONSELHO de Administração da Eletrobras aprovou ontem a recondução do presidente da Eletronuclear, Othon da Silva. A presidente Dilma elogia sua postura no debate gerado pela crise nuclear do Japão. 
 NESTE MÊS passa a valer o reajuste do Bolsa Família. Desde que foi instituído, ele repassou R$ 67,6 bilhões. O benefício médio subirá de R$ 96 para R$ 115.
● O DIÁRIO OFICIAL publica hoje ato de criação do Ministério das Micro e Pequenas Empresas, vinculado à Presidência da República. Pela Lei de Diretrizes Orçamentárias, esse é o prazo final para a criação de cargos na administração federal.

CELSO MING

Apostas de risco
CELSO MING

O ESTADO DE SÃO PAULO - 01/04/11

Quando desistiu do ataque frontal à inflação deste ano e optou por cumprir a meta só em 2012, o Banco Central não dispunha, como não agora, de certezas. Fez algumas apostas no escuro e enfrenta riscos que, no seu conjunto, são possivelmente maiores do que os que correria se partisse logo para o ataque.
A primeira dessas apostas é a de que a redução da velocidade do crescimento do PIB do Brasil, de 7,5%, em 2010, para 4,0%, em 2011, é fator que, por si só, derrubará a inflação. O problema é que não é certo que o PIB crescerá apenas 4,0%. O Orçamento da União, por exemplo, prevê crescimento de 5,5%. E, mesmo que seja de apenas 4,0%, a demanda tende a aumentar bem mais do que a produção interna, porque a renda seguirá turbinada pelo crédito e pelo salário mínimo (veja ainda a sexta e a sétima apostas).
A segunda aposta assumida com algum temor é a de que os preços internacionais das commodities, responsáveis por boa parte da esticada da inflação nestes dois primeiros meses do ano, irão agora estabilizar-se ou, até mesmo, recuar. O risco dessa aposta é a de que a retomada da economia mundial, com que conta o Banco Central, produza efeito oposto. E que, assim, os preços das commodities continuem em alta, talvez não tão forte como a apresentada neste início de 2011, mas o suficiente para continuar insuflando a inflação brasileira. (Veja, ainda, o Confira.)
Terceira aposta: a atual meta do superávit primário (sobra de arrecadação para pagamento da dívida), de R$ 117,9 bilhões, em 2011, será cumprida à risca pelo governo, o que ajudará a segurar a inflação. Os resultados de fevereiro, ontem divulgados (veja o gráfico) foram apontados como indicação de que o pressuposto está correto. Bem, se a arrecadação crescerá menos (porque o PIB também avançará mais devagar), aumentarão as pressões sobre os governos (federal, estaduais e municipais) para que não cumpram suas metas fiscais.
Quinta: O Banco Central entende que as medidas macroprudenciais são instrumentos tão poderosos para derrubar a alta dos preços quanto o aperto monetário (alta dos juros). Objeção: não há evidência disso e a escalada dos preços dos serviços mostra que um importante segmento não é atingido por essas medidas.
Sexta aposta: o crédito, forte propulsionador do consumo exacerbado, não avançará mais do que 15% em 2011. Ora, nos dois primeiros meses do ano, cresceu 21% e não há certeza de que o Banco Central contenha a corrida às operações de crédito nem mesmo dos bancos estatais.
Sétima: o crescimento da renda vai ser contido nos dois próximos anos. Essa aposta é incompatível com o reajuste já contratado do salário mínimo em 2012, de pelo menos 13,9%.
Para resumir, o Banco Central, instituição da qual se espera que opere sempre com alto grau de segurança, assume forte dose de risco. Pode perder algumas ou todas essas apostas. Se perder, à medida que isso acontecer, ficará com sua credibilidade comprometida.
Esta é boa hora para relembrar frase do ex-jagunço Riobaldo, personagem do Grande Sertão, de Guimarães Rosa: "Diverjo de todo o mundo? Eu quase que nada não sei. Mas desconfio de muita coisa".

CONFIRA
Menos dinheiro lá fora?

Uma das razões que levam o Banco Central do Brasil a contar com a estabilização nas cotações das commodities é a alta dos juros a ser praticada pelos grandes bancos centrais.

Puxada dos preços
É que um dos fatores apontados para a alta das commodities é a abundância de dinheiro nos mercados, em consequência da política monetária frouxa dos bancos centrais. Essa abundância estaria levando os investidores a colocar dinheiro nos mercados futuros de commodities. Mas ninguém espera para tão cedo o aperto dos juros pelos bancos centrais dos países ricos, especialmente, pelo Fed, o banco central americano.

Correção
O Banco Central pede um "ajuste" nas declarações do diretor de Política Econômica, Carlos Hamilton Araújo, ontem citadas nesta coluna.
Hamilton Araújo não disse: "Não sei se a inflação é o maior problema do Brasil". Mas disse: "Não sei se o problema (da inflação) é maior no Brasil do que no resto do mundo".