Um bispo e muitas polêmicas
REVISTA ISTO É
Dom Dadeus Grings coleciona declarações controversas e confusões na Justiça. A última causará um prejuízo de R$ 1,2 milhão à IgrejaFlávio CostaTOPETE Aos 75 anos, o líder da arquidiocese de Porto Alegre desafia a Justiça a prendê-lo
Aos 75 anos, o bispo dom Dadeus Grings tem apetite pela polêmica. De sua boca já saíram declarações controversas a respeito de temas espinhosos, como holocausto, homossexualismo e pedofilia. Mas a ausência de temperança do atual arcebispo de Porto Alegre custou caro à Igreja Católica, que terá de desembolsar perto de R$ 1,2 milhão para indenizar por danos morais um trio de advogados acusados por ele de “falta de lisura” nos anos 1990. Mesmo diante da derrota judicial, dom Dadeus se nega a calar. Divulgou recentemente uma carta na qual afirma que o Judiciário brasileiro é corrupto e o desafia a prendê-lo. “Não posso, por coerência e dever de consciência, acatar esta sentença inválida e desrespeitosa”, escreveu.
O processo judicial que resultou na condenação do religioso e da diocese paulista de São João da Boa Vista deu início em 1997, após uma família da cidade de Mogi-Guaçu obter um alto valor indenizatório da prefeitura local, decorrente da desapropriação de um terreno para a construção de um trecho da Rodovia dos Trabalhadores (atual Ayrton Senna). Bispo da região, entre 1991 e 2000, dom Dadeus se indignou com o valor e atacou os advogados da família beneficiada, afirmando em carta que eles não deixavam impressão de lisura. “Equivalia a mil carros populares, na época, o dinheiro que a prefeitura precisava pagar, estava muito acima do que valia o terreno”, afirmou dom Dadeus à ISTOÉ. Os advogados o interpelaram judicialmente e o religioso se recusou a rever a acusação. Pelo contrário, ele intensificou as críticas em artigos publicados em jornais da região e durante as missas nas paróquias da diocese. Nos autos do processo por injúria e difamação, os advogados Gildo Vendramini Júnior, Débora de Almeida Santiago e Gastão Dellafina de Oliveira, autores da ação, afirmam ter sofrido constrangimento público e prejuízos profissionais, pois chegaram a ficar um ano sem clientes por conta dos vitupérios de dom Dadeus. “Entreguei-os (os advogados) a Satanás”, afirmou o religioso. A condenação em primeira instância saiu em 2007 e obrigava o bispo e a diocese a pagar R$ 15 mil cada, acrescidos de juros, e mais 10% do valor como honorários. Os autores da ação recorreram ao Tribunal de Justiça de São Paulo e a corte paulista aumentou a indenização para R$ 300 mil. A decisão já transitou em julgado, o que impossibilita qualquer tipo de recurso. O cálculo atualizado chegou este mês a R$ 1,2 milhão. “Agi como cidadão e também não poderia me furtar ao meu dever de pastor”, diz dom Dadeus. “Esta decisão da Justiça é intromissão nos assuntos da Igreja e fere meu direto à liberdade de expressão.” A Associação de Juízes do Rio Grande do Sul (Ajuris) reagiu publicamente às acusações do arcebispo contra o Poder Judiciário. dom Dadeus já havia sido processado quase uma década atrás por uma magistrada gaúcha por chamá-la de ignorante. “Não podemos permitir que autoridades manifestem ofensas genéricas contra a Justiça brasileira pelo simples fato de não terem sido atendidas em suas demandas judiciais”, afirma o juiz João Ricardo Costa, presidente da Ajuris. A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) não quis se pronunciar sobre o caso, por considerar o assunto circunscrito à Diocese de São João da Boa Vista. A entidade já havia apagado outro incêndio provocado por dom Dadeus no ano passado, quando, durante assembleia geral, ele disparou contra homossexuais e acusou a sociedade de ser pedófila. Outras vítimas da incontinência verbal do religioso foram os judeus. Em maio de 2009, a comunidade israelita sentiu-se ofendida quando ele declarou que morreram mais católicos do que judeus na Segunda Guerra Mundial. Em outro escândalo, o arcebispo teve uma postura meritória. Há poucos meses, a arquidiocese de Porto Alegre foi o epicentro de uma confusão em torno do sumiço de R$ 2,5 milhões, entregues a uma ONG portuguesa para custear reformas em igrejas gaúchas. Investigações da polícia do Rio Grande do Sul acabaram por indiciar pelo desvio o ex-vice-cônsul português na capital Adelino Vera Cruz Pinto. Ele tentou subornar dom Dadeus com dinheiro e promessas de promoção a cardeal para convencê-lo a não investigar a fraude na igreja. O religioso recusou a oferta e o diplomata é considerado, desde então, foragido da Justiça brasileira. Procurado por ISTOÉ, o trio de advogados que ganhou a ação contra o arcebispo preferiu não falar publicamente, para “não fomentar mais polêmicas”. Para evitar a penhora de bens, a diocese de São João da Boa Vista ofereceu a eles um pagamento inicial de R$ 150 mil, três terrenos que valeriam outros R$ 250 mil e o parcelamento do restante da dívida. A negociação ainda está em andamento. “Quem sofre são os pobres beneficiados pelas ações sociais da diocese, que não é pródiga em recursos”, diz Vanderley Fleming, advogado da Igreja Católica local. Como está com 75 anos, dom Dadeus é obrigado a colocar seu cargo à disposição do Vaticano, que deverá transformá-lo em arcebispo emérito. Resta saber se a aposentadoria aquietará sua controversa eloqüência. |
Caro Murilo,
ResponderExcluircreio que esta matéria foi publicada na Revista Istoé, e não Época.
De qualquer modo, é uma ótima reportagem.
Parabéns pelo novo visual do blog. Só não se esqueça das "gostosas"...
Obrigado.
Júlio (São Paulo, Capital)
Obrigado Júlio, já fiz a correção.
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