domingo, novembro 13, 2011

CELSO MING - Apertar ou desapertar?


Apertar ou desapertar?
 CELSO MING
O ESTADÃO - 13/11/11

Por todos os cantos da Europa repete-se uma pergunta intrigante: se os programas de austeridade e de sacrifícios afundam ainda mais as economias nacionais na recessão, no desemprego e na queda de arrecadação, por que, então, insistir nessa receita idiota que, além de piorar as coisas, tende a provocar graves distúrbios políticos?
Questão subsequente: por que, em vez desses insuportáveis programas de arrocho e de desestabilização, não aproveitar a velha e bem-sucedida recomendação do maior economista do século 20, John Maynard Keynes, e incentivar despesas públicas que criem renda e impulsionem o consumo, a produção e o emprego?
Essa última foi uma política anticíclica vitoriosa no New Deal acionado pelo então presidente dos Estados Unidos, Franklin Roosevelt, que, a rigor, tirou a economia americana da Grande Depressão. E foi vitoriosa depois na Europa destruída pela 2.ª Guerra, quando os Estados Unidos providenciaram o Plano Marshall, que financiou a reconstrução e a retomada da atividade econômica no continente.
Ao contrário do que diz muita gente que assimilou mal os ensinamentos de Keynes, esses programas não consistiam em expandir permanentemente despesas correntes dos governos, mas, sim, em estimular grandes investimentos, geralmente em obras de infraestrutura, que se encarregassem de gerar encomendas e de mobilizar capacidades ociosas, ou seja, de empregar mão de obra parada para criar renda e ajudar a colocar em marcha uma economia estagnada pela crise. Quando terminavam, esses projetos não eram retomados. Eram investimentos tipo once for all, como dizem os ingleses.
O grande obstáculo para aplicar essa fórmula nos dias de hoje é que não há de onde tirar esses enormes volumes de recursos. Os países ricos – tanto os Estados Unidos como as principais potenciais da Europa – estão quebrados. Já detêm dívidas insuportáveis. Não poderiam nem financiar sistemas assim nem se endividar ainda mais se encontrassem financiadores.
Esse foi o principal motivo pelo qual os sócios do bloco do euro, de olho nas reservas trilionárias da China, tentaram passar o chapéu entre os países emergentes. Mas não levaram em conta que reservas externas são recursos dos bancos centrais. Se eles próprios não querem que o Banco Central Europeu (BCE) seja responsável por monetizar um pedaço de suas dívidas, por que, então, bancos centrais de economias emergentes teriam de despejar as quantias necessárias?
A conclusão é de que não há como aproveitar a proposta keynesiana tal como foi concebida no passado. As condições são outras. Como disseram os economistas Kenneth Rogoff e Carmen Reinhart, também nesse ponto, "desta vez é diferente". E diferente tem de ser também a política anticíclica que se incumbirá, em primeiro lugar, de desarmar corações e mentes. E, em seguida, de reconstruir a economia dos países avançados. Tudo indica que as coisas têm mesmo de começar com emissões de moeda pelo BCE para recomprar títulos públicos hoje rejeitados.

CONFIRA
A aprovação do plano de austeridade da Itália no Senado, somada à indicação do economista Mario Monti para ocupar o cargo de primeiro-ministro interino após a renúncia de Silvio Berlusconi, melhorou o astral dos mercados na sexta-feira. Sugeriu que a Itália começa a caminhar na direção correta. É o que mostra a queda do rendimento (yield) cobrado pelos detentores de títulos da dívida italiana.
Ainda tem muito chão. Mas ainda é cedo para identificar mudanças expressivas no quadro geral de crise no bloco do euro.

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