quarta-feira, agosto 24, 2011

CRISTIANO ROMERO - Esperando Dilma


Esperando Dilma
CRISTIANO ROMERO
VALOR ECONÔMICO - 24/08/11
Se cumprir o que está prometendo na área fiscal, a equipe econômica do governo Dilma Rousseff fará história. Falta, ainda, o aval da presidente, mas o plano é gerar anualmente, até 2014, superávits primários nas contas públicas de 3% do Produto Interno Bruto (PIB). A expectativa é que esse esforço seja suficiente para zerar o déficit público, no mais tardar, em 2015. O principal objetivo do Ministério da Fazenda é criar condições para o Banco Central (BC) reduzir drasticamente a taxa de juros (Selic), hoje em 12,5% ao ano.

O contexto da nova política fiscal deriva da percepção de que o recrudescimento da crise nos Estados Unidos e na Europa provocará desaceleração mundial e, por consequência, inflação menor no mundo.

A avaliação é que, com juros próximos de zero e por causa dos problemas fiscais, as nações ricas não têm margem para produzir crescimento e ficarão nessa situação durante um bom tempo.

Informações sobre esforço fiscal são contraditórias

Nesse ambiente, o Brasil também cresceria menos nesse período, muito provavelmente abaixo do potencial (hoje, estimado em 4% ao ano), mas aproveitaria o momento para resolver problemas que, 17 anos depois de iniciado o processo de estabilização, não foram solucionados, como a convivência com a maior taxa de juros do planeta. Se a estratégia der certo, o país chegará a 2014, de acordo com projeção da área econômica, com juros civilizados e situação fiscal incomparavelmente melhor que a da maioria dos países.

Antes do recente agravamento da crise mundial, o plano de voo do governo brasileiro era outro. Premido pela aceleração inflacionária, aumentou o superávit primário em 2011, cumprindo até agora, sem descontos, a meta cheia, de cerca de 3% do PIB. Para 2012, no entanto, a ideia era preservar do esforço fiscal investimentos previstos no âmbito do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), como deixou claro, em entrevista ao Valor na semana passada, um importante auxiliar da presidente Dilma.

Segundo esse ministro, o governo está satisfeito com os resultados da política de combate à inflação, mas reconhece que "(...) a Esplanada [dos Ministérios], hoje, está no chão". O colaborador da presidente confidenciou, na prática, a fadiga política provocada pelo controle das contas públicas este ano e contou que, em 2012, será diferente.

Em entrevista a Claudia Safatle, do Valor, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, assegurou que não haverá relaxamento fiscal em 2012 e que o governo mudou, "de forma permanente", o mix de política econômica. Ao desmentir um colega de ministério, declarou que, ao contrário do que ocorreu em 2008, a resposta à crise será mais monetária, via redução dos juros, do que fiscal (aumento dos gastos).

O esclarecimento de Mantega tranquilizou sua equipe, que vem trabalhando para botar em pé um ambicioso plano fiscal traçado para os próximos anos. A tarefa não é fácil, afinal já há um significativo aumento de despesa contratado para o próximo ano - o reajuste do salário mínimo (SM) em 14%.

Cerca de 60% dos benefícios sociais e a maior parte do seguro-desemprego estão atrelados ao SM. Mais importante: algo como 45% do gasto corrente da União acompanha a variação do mínimo. Por essa razão, a área econômica prepara medidas para compensar, do ponto de vista fiscal, o aumento de despesa previsto. Em termos nominais, o impacto do reajuste do salário mínimo será de R$ 23,3 bilhões, mas técnicos calculam que, termos reais (e líquidos), o montante a ser compensado é de R$ 10 bilhões.

Desde o início da nova fase da crise mundial, o ministro da Fazenda tem dito que o governo não abrirá a guarda fiscal. Na semana passada, também o presidente do Banco Central (BC), Alexandre Tombini, afirmou, em teleconferência com jornalistas estrangeiros, que "(...) a política fiscal apertada que temos praticado neste ano deve ser mantida para continuar diferenciando o Brasil no futuro próximo".

Mantega e Tombini são as autoridades máximas da equipe econômica. Certamente, não defenderiam a manutenção do esforço fiscal sem a bênção do Palácio do Planalto. Mas está claro, também, que falta a presidente Dilma vir a público reiterar a decisão anunciada por seus auxiliares. Seu silêncio gera dúvidas.

Em Brasília, sabe-se que a tal insatisfação da base parlamentar e mesmo de alguns ministros com o governo se deve ao ajuste fiscal em curso. O descontentamento dos funcionários públicos, que reclamam de reajuste salarial, também é crescente. O que a equipe econômica está dizendo é que o arrocho será mantido até o fim do mandato da presidente.

Há desconfianças entre os analistas quanto aos propósitos de Dilma. Há menos de duas semanas, o Valor revelou que ela teria recomendado cautela a um possível movimento de redução dos juros pelo Banco Central. O alerta foi entendido por observadores, como Mansueto Almeida, do Ipea, como um sinal de que a presidente não tem interesse em manter o esforço fiscal de 2011 nos anos seguintes por reconhecer que a agenda social, cujo principal componente é a política de correção do salário mínimo, e de investimentos do governo é incompatível com a redução permanente da taxa de juros.

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