sábado, agosto 27, 2011

CLAUDIO J. D. SALES - Verdades inconvenientes



Verdades inconvenientes
CLAUDIO J. D. SALES
O Estado de S.Paulo - 27/08/11

Um dos temas mais polêmicos que recaem sobre o governo atual envolve a definição sobre o que será feito com as concessões de energia que começam a vencer a partir de 2015. São inúmeras usinas, linhas de transmissão e distribuidoras que carecem de rápida definição sobre seu destino porque suas concessões envolvem planejamento e financiamento de longo prazo.

Conceitualmente, o governo tem duas alternativas: renovação da concessão para o atual concessionário ou relicitação da concessão para empresas estatais e privadas, dentre as quais o atual concessionário poderia ser um dos competidores.

Seria bom que o processo de tomada de decisão governamental fosse baseado em alguns princípios: contestação pública, respeito a contratos e à regulação vigente, isonomia competitiva e promoção da eficiência. Tudo em prol de um princípio maior: o interesse público.

Se o governo puser o interesse público como prioridade, sua decisão precisa sair da arena política e se basear em critérios técnicos e econômicos, porque cada tipo de concessão (geração, transmissão ou distribuição) implica uma análise diferente.

Para a geração e transmissão de energia, talvez seja mais fácil para o governo argumentar a favor da retomada da concessão seguida de licitação, porque para esses dois elos um leilão seria um mecanismo de contestação pública que permitiria verificar se há outros interessados em operar aquela usina ou linha de transmissão por menor custo. Aliás, é sempre bom deixar a ideologia de lado e esclarecer que: 1) licitar não é "privatizar", porque uma estatal pode ser a vencedora do leilão; e 2) o próprio concessionário atual poderia vencer o leilão.

Mas isso não quer dizer que os "cálculos" propagados por alguns grupos de pressão estejam corretos. Cada concessão é um caso diferente e seu valor de reversão (valor que é devolvido ao concessionário atual no caso de retomada da concessão pela União) precisa cobrir os investimentos ainda não amortizados. O valor de reversão precisa ficar longe de palanques eleitorais.

No caso das distribuidoras de energia, o raciocínio pode ser diferente, porque as distribuidoras já têm sido submetidas, a cada quatro anos, a um processo de contestação pública: as revisões tarifárias periódicas conduzidas pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). Como não haveria rendas inframarginais a serem extraídas numa eventual licitação, para esse elo da cadeia haveria um argumento a favor da renovação. Se esse for o caminho, o governo novamente precisará olhar para cada concessão de forma individual e, se optar pela renovação onerosa, deverá calibrar muito bem a regra para definir a tarifa de forma a manter a concessão equilibrada e capaz de fazer frente às necessidades de investimento.

Como se vê, a decisão é complexa e não é possível criar uma regra geral. Cada concessão precisará ser individualmente analisada. Talvez seja por isso que o governo esteja sendo cauteloso nas suas declarações, atitude louvável porque dá indícios de que não haverá politização da questão.

A sobriedade e a serenidade do governo, no entanto, contrastam com o comportamento de outros grupos, e o assunto começa a tomar uma direção perigosa: o populismo em prol de interesses eleitorais e pessoais. Mas isso não é surpresa: o mesmo grupo de pressão que acaba de iniciar massiva campanha publicitária já deu mostras no passado de que, quando se trata de assuntos do setor elétrico, sua estratégia é a de nutrir os mitos, porque a realidade não atende a seus interesses.

Os formuladores de políticas públicas precisam se isolar das pressões de pequenos grupos e pensar com um olhar de longo prazo que beneficie toda a sociedade. O governo tem uma ótima oportunidade para provar que fatos ainda valem mais do que slogans de campanhas publicitárias milionárias e para dar um sinal inequívoco: o setor elétrico não deve ser plataforma de alguns políticos em busca de uma "causa" para as próximas

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