domingo, janeiro 09, 2011

CELSO MING

Pouco progresso
Celso Ming 
O Estado de S.Paulo - 09/01/11


Há mais a levar em conta na evolução da economia dos Estados Unidos do que apenas a trajetória do índice de desemprego. E os Estados Unidos ainda são a principal locomotiva da economia global.

Sexta-feira, o Departamento do Trabalho americano anunciou o que, em princípio, poderiam ser boas notícias: a criação de 103 mil postos de trabalho em dezembro e o mergulho do índice de desemprego de 9,8% em novembro para 9,4% em dezembro.

No entanto, uma leitura mais atenta dos levantamentos mostrou duas coisas. Primeira, que as novas contratações ficaram aquém do esperado, abaixo de 150 mil vagas. E, segunda, houve uma forte redução da força de trabalho, aparentemente por fatores também negativos.

É preciso explicar melhor esse segundo ponto. Para que alguém integre as estatísticas de desemprego precisa estar à procura de emprego. E, nos últimos meses nos Estados Unidos, um enorme contingente da população ativa desistiu de procurar trabalho. Não há levantamentos que mostrem o que está acontecendo, mas dá para imaginar: muitos se aposentaram, outros mais estão vivendo de reservas pessoais e sabe-se lá quantos estão vivendo ao deus-dará.

Uma hora depois do anúncio feito pelo Departamento de Trabalho, o presidente do Federal Reserve (Fed, o banco central americano), Ben Bernanke, em depoimento no Comitê Orçamentário do Senado, lamentou o ritmo tartaruga da criação de empregos. "A essa velocidade, podem ser necessários cinco anos para normalizar o mercado de trabalho", disse. E, no entanto, outros indicadores demonstram que há uma expressiva recuperação da atividade econômica dos Estados Unidos.

Reforça-se, assim, a hipótese de que a produção nos países ricos será retomada sem contrapartida de criação de empregos. Ou seja, há um forte aumento da produtividade do trabalho ou porque, por medo do desemprego, o empregado está trabalhando mais com o mesmo salário; ou porque cresceu a utilização de tecnologia da informação, que é poupadora de mão de obra.

Do ponto de vista imediato, de grande interesse para o Brasil, define-se que o Fed não terá nenhuma razão especial para adiar ou rever o chamado afrouxamento quantitativo. Trata-se do compromisso de recomprar US$ 600 bilhões em títulos do Tesouro, a um ritmo de US$ 75 bilhões por mês, com simples emissão de moeda, para estimular o crédito e irrigar a economia americana.

É uma operação que vai contribuir para desvalorizar ainda mais o dólar nos mercados de câmbio e para inundar com mais recursos os países emergentes, entre os quais o Brasil. O resultado será a valorização do real e a perda de competitividade do setor produtivo nacional. Enfim, reforçam-se as condições para a guerra cambial que vem sendo denunciada pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega.

Como essa operação monetária acontecerá em clima de recuperação da economia americana, não dá para desprezar outro efeito: elevação da demanda por matérias-primas, petróleo e alimentos. Esse aumento da procura mais a desvalorização do dólar estão montando um cenário de novas escaladas de preços das commodities. De um lado, reforçarão as exportações do Brasil; de outro, contribuirão para a esticada da inflação.

Advertências

Sexta-feira, os presidentes dos dois mais importantes bancos centrais do mundo fizeram dramáticas cobranças de disciplina fiscal.

Olhem o rombo

Ben Bernanke, o presidente do Fed (banco central dos Estados Unidos), advertiu no Senado que "as autoridades americanas não podem ignorar os elevados déficits dos Estados Unidos e seus efeitos negativos sobre a economia no futuro. (...) Quanto mais esperarmos para agir, maiores os riscos e mais dolorosa será a inevitável mudança no orçamento".

Não cubro irresponsabilidade

Pouco antes, Jean-Claude Trichet, presidente do Banco Central Europeu (BCE), avisou as autoridades dos países da área do euro que "a responsabilidade na política monetária não pode ser substituto para a irresponsabilidade dos governos". Como alguns países estão fazendo reformas e outros estão atrasados, Trichet observou que as diferenças de competitividade entre países da área do euro estão se ampliando.

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