segunda-feira, outubro 04, 2010

ROBERTO POMPEU DE TOLEDO

O dia seguinte
 Roberto Pompeu de Toledo 
Revista Veja 

Um mistério ronda a sucessão presidencial no Brasil. Não, não se trata de saber o que vai fazer o novo presidente. Trata-se de saber o que vai fazer o ex-presidente. Haverá, para o presidente Lula, existência possível sem os comícios, as inaugurações, os discursos na ONU, as viagens de chefe de estado? Sem o exército de assessores, os ministros, as ordens para as lideranças no Congresso? Ele sobreviverá à subtração dessa exclusividade da Presidência que é o permanente foco dos holofotes? Haverá a possibilidade de, sem graves danos psicológicos, aceitar a transição para a vida no apartamento de São Bernardo? Jamais um presidente chegou ao fim do mandato com tanta energia para gastar.

Falta ao Brasil o instituto da Ex-Presidência. Copiamos dos Estados Unidos o instituto da Presidência. Recentemente, chegamos ainda mais perto do modelo ao instituir a reeleição. Esquecemos de copiar o instituto da Ex-Presidência. Este tem sua base na proibição de o presidente concorrer uma terceira vez ao cargo. Elegeu-se e reelegeu-se, acabou. Não lhe sobra a possibilidade de, passados quatro anos, voltar a candidatar-se. Dada essa premissa, o costume fez o resto. Cabe ao ex-presidente o papel de político aposentado, por isso mesmo de estadista acima do bem e do mal, chamado eventualmente para missões internacionais ou para dar palpites em momentos críticos, e de resto dedicado às conferências, ao livro de memórias e à gestão de sua “Biblioteca”, como é conhecida por lá a instituição que cuidará dos papéis, das fotos, dos filmes e das tralhas diversas que lhe documentam o período presidencial.

No Brasil, a possibilidade de voltar a candidatar-se joga a aposentadoria para seus limites biológicos. Um presidente que deixa o cargo bem avaliado descerá da cadeira candidato à volta. Juscelino Kubitschek entregou a Presidência com a campanha “JK 65” (o ano no qual haveria novas eleições, não fosse o que se sabe) já no ar. Presidentes de menor estatura, como José Sarney e Itamar Franco, continuaram ciscando pelas bordas, no Senado ou nos governos estaduais. Fernando Henrique Cardoso é o único que se enquadrou no bom modelo americano: foi cuidar das conferências e de seu instituto, calcado no exemplo das “Bibliotecas” dos americanos.

Lula é um caso especialíssimo. Há precedentes de presidentes bem avaliados ao fim do mandato, mas não com 80% de aprovação. Há casos de presidentes que se envolveram na campanha para eleger o sucessor, mas não no mesmo nível. Já houve presidentes embevecidos com os próprios méritos, mas não inebriados. Ele completa o mandato como um bólido sem freios. A resposta às perguntas formuladas no início deste artigo é não. Não se concebe Lula entregue à paz de São Bernardo. Se ganha a oposição, dá para adivinhar seu roteiro de conduta: no dia seguinte volta aos comícios e caravanas, já instituído em candidato à próxima eleição. Ganhando sua candidata, abre-se um mar de dúvidas, decorrentes de nunca se ter visto um ex-presidente com tanto potencial (talvez tantas ganas) de atuar no governo seguinte.

As dúvidas começam pelo local que escolherá como base e evoluem para os modos de atuação. Montará ele um gabinete em São Bernardo? Em São Paulo? Brasília? Com que staff, em quantidade e qualidade? Participará de reuniões no governo? Dará algum conteúdo à sua antiga condição de presidente de honra do PT? Pretenderá fazer-se articulador da coligação governamental? Postulará missões de política externa? Essas interrogações têm, todas, implicações na futura relação entre o ex-presidente e a sucessora. A condição de subalterna que Dilma Rousseff aceitou, e nem tinha como deixar de aceitar, ao longo da campanha, não poderá ser mantida sem prejuízo de seu prestígio, de sua autoestima e da envergadura que se espera de um presidente.

Sobram para Dilma, por isso, pesados desafios. Como permitir a interferência do antecessor sem dar a impressão de ser conduzida por ele? Como repeli-la, sem magoá-lo? Como conciliar a afirmação no mais alto cargo com a existência de um patrono que é também potencial candidato à sua sucessão? Como evitar a fragilizadora impressão de estar apenas preservando a cadeira para devolvê-la ao legítimo proprietário? No limite, como equilibrar-se em meio a armadilhas diversas sem romper com o antecessor? E, rompendo, como tantas vezes já ocorreu entre criador e criatura, na política brasileira, como levar a cabo seu governo? O mistério que ronda a sucessão deita sombras sobre uma relação entre sucessor e sucedida potencialmente delicada como nunca se viu na história da Presidência.

MAÍLSON DA NÓBREGA

O risco não é de mexicanização
Maílson da Nóbrega 


Revista Veja

A percepção de que Dilma poderá ser a próxima presidente despertou os piores temores. O pavor não é de ruptura na política econômica - como em 2002 -, mas de retrocesso democrático: o projeto de poder em curso levaria à mexicanização do Brasil Não é por aí, a meu ver.

De fato, é difícil reproduzir aqui os setenta anos de domínio do Partido Revolucionário Institucional (PRI) mexicano, que impunha o medo, nadava em corrupção e controlava a imprensa. O presidente escolhia o candidato à sua sucessão e utilizava a máquina pública para tolher a oposição. Elegia todos os governadores.

Perguntará o leitor: o mesmo não está acontecendo no Brasil? Lula escolheu a candidata, usou o governo para popularizá-la e participou ostensivamente da campanha, sem ligar para a lei nem para a liturgia do cargo. Há indícios de corrupção e intenções de controlar a imprensa.

Haveria também uma estratégia para aniquilar a oposição. “Nós precisamos extirpar o DEM da política brasileira”. disse Lula. O presidente se esforça para que a sucessora tenha um Senado dócil, que não a contrarie. Talvez para restabelecer a CPMF.

Na campanha, a desfaçatez atingiu o impensável. No Dia da Independência, Dilma se excedeu na desconstrução dos antecessores de Lula. Sem se preocupar com o papel de Dom Pedro I, ela afirmou que a verdadeira independência veio com o pagamento da dívida com o FMI.

Para ela, “ninguém respeita devedor”. Será? Quem não respeita os Estados Unidos, o maior devedor do mundo? Quanto à antecipação do pagamento ao FMI, outros países, dispondo das mesmas condições, fizeram o mesmo: Argentina, Equador, Indonésia, Rússia, Venezuela, Zimbábue e até o pobre Haiti.

As declarações de José Dirceu assustaram. Para o ex-ministro, “a eleição de Dilma é mais importante do que a de Lula porque é a eleição do projeto político, porque a Dilma nos representa”. Seria o retomo das insensatas ideias econômicas do PT?

Felizmente, há muitas diferenças entre nós e o México dos tempos em que o PRI mandava e desmandava. A oposição pode eleger governadores de estados que representam mais de 40% do eleitorado. O Judiciário não é submisso. A imprensa é "livre, independente. competitiva e agressiva", como disse a revista The Economist.

A imprensa consolidou seu papel de fiscalizar os atos do governo, de defesa da democracia e de canal de denúncia de malfeitorias, particularmente o patrulhamento recente do estado e a corrupção. É pouco provável que as alas radicais do PT e a área de comunicação do governo concretizem seus piores instintos e consigam amordaçá-la.

O Brasil construiu instituições inibidoras do populismo econômico e do autoritarismo. Como ensina Douglass North, as instituições incluem as regras formais e as informais, como as crenças, os valores, as convenções e os códigos da sociedade. A imprensa é parte delas.

A gestão da economia se tornou mais transparente e previsível. A sociedade valoriza a estabilidade de preços. Dada a disciplina de mercado, o governo se contém em relação a medidas que arruínem a confiança e provoquem inflação, que corrói a renda dos trabalhadores e destrói a popularidade. Seria suicídio político.

Os investimentos em curso no setor privado e os relacionados aos grandes eventos esportivos e à exploração do petróleo do pré-sal podem viabilizar certo nível de crescimento no próximo quadriênio, mesmo sob um ambiente internacional não tão favorável quanto o prevalecente na era Lula.

O dinamismo, contudo, dificilmente será o mesmo. A ausência de reformas estruturais e o aparelhamento do estado - que tendem a se repetir com Dilma - cobrarão seu preço. A economia tende a perder ritmo, o que pode criar pressões para interferir no Banco Central para baixar a taxa de juros e desvalorizar o câmbio a qualquer preço.

Se ações desse tipo acontecerem, a inflação voltará e a recessão baterá à porta. A popularidade do governo despencará. Sem retrocesso democrático, a oposição, caso seja refundada, ganhará as eleições de 2014 com o desafio de reverter a situação.

O risco não é de mexicanização, mas de perda, ainda que temporária, de conquistas da sociedade. Que Dilma dissipe esse risco, se de fato vencer.

SONIA RACY - DIRETO DA FONTE

Lulão...
SONIA RACY

O ESTADO DE SÃO PAULO - 04/10/10 

Lula, autoconfiante, ordenou no sábado ao brigadeiro Joseli Camelo, chefe de sua assessoria militar: " Você tem de pedir outro avião. Neste não vai caber mais o meu... ego."

Dupla eterna

E nem tudo é tormenta entre Serra e FHC - que mais se assemelham àqueles casais que divergem, discutem e nunca se divorciam.

Na sexta à noite, depois de uma visita a Luiz Gonzaga Belluzzo, no Sírio-Libanês, ambos entraram no carro de Andrea Matarazzo e rumaram, os três, até o bairro da Mooca, onde o candidato tucano nasceu. Sem seguranças ou comitivas, atacaram algumas pizzas. Foram recebidos com aplausos na Dom Pedro.

Dia D

Dilma, logo depois de colocar seu voto na urna, em Porto Alegre, passou na casa de sua filha Paula, onde brincou, durante mais de uma hora, com seu único neto, Gabriel.

Visita feita, embarcou para Brasília para assistir à apuração ao lado de Lula.

Dia D 2

Depois de votar no Colégio Santa Cruz, Serra foi para casa de Sonia e Andrea Matarazzo, onde almoçou vitela e risoto. Com o candidato tucano estavam a mulher, Monica, a filha, Verônica, e seus netos.

Dos aliados, levou somente Indio da Costa.

Dia D 3

Marina cumpriu seu direito cívico e viu a apuração no apartamento de seu vice, Guilherme Leal, na Vila Nova Conceição.

Exemplo

Casa de ferreiro, espeto de pau. Se Serra esperou para votar como todos, dois fiscais da Justiça Eleitoral furaram a fila da Zona 68 do Santa Cruz.

Estranha, a vida

Sábado à noite, Serra foi ao teatro ver a peça... Ensina-me a Viver, estrelada por Glória Menezes. Para aprenderem também, convidou Goldman, Alckmin e Andrea Matarazzo, com suas respectivas mulheres.

Ombro amigo

Dilma preferiu passar o sábado em Porto Alegre. Saiu apenas à noite, para uma conversa com seu ex-marido, Carlos Araujo. Na casa dele.

Primário

A declaração supostamente escrita à mão por Tiririca, entregue à Justiça Eleitoral como prova de que o candidato não é analfabeto, passou por perícia sexta-feira no Instituto de Criminalística. Fruto de desconfiança da Promotoria Eleitoral de que quem redigiu a declaração não seria a mesma pessoa que a assinou.

Resultado da análise? "O autor dos manuscritos examinados possui uma habilidade gráfica maior do que aquela que ele objetivou registrar ao longo do texto." Traduzindo: o redator fez garranchos de maneira proposital.

E agora, Francisco?

Reconhecimento

Surpresa desta eleição - apesar de alguns, como Guilherme Afif, terem previsto -, Aloysio Nunes reconheceu. Assim que soube que havia sido eleito senador, ligou para FHC agradecendo seu apoio.

Azul + Verde

Da série fair-play. José Gregori e família cercaram Ricardo Young e Guilherme Leal, no Colégio Santa Cruz. Entre apertos de mãos e elogios mútuos, acertaram que, caso houvesse segundo turno, a primeira reunião de estratégia seria na casa de... Gregori.

Barraco chique

Enquanto duas "peruas" brigavam por vaga de carro na frente de colégio eleitoral na Vila Nova Conceição, um PM cochichou com outro: "Adoro essas baixarias. Ô gente metida. Moram aqui ao lado e vêm de carro."

E assim sendo, assistiu à cena se recusando a sair do lugar.

Boca de risos

O CQC divertiu as ruas. Ao ser indagada por Ricardo Young se poderia beijá-la, Monica Iozzi atirou: "Para quem já foi beijada pelo Serra..."

E Danilo Gentili resolveu alfinetar Marta: "Quer dizer que no Senado agora estarão a vovó, o vovô e o... "netinho""?

DIOGO MAINARDI

Agora, Mozart!
Diogo Mainardi 
REVISTA VEJA


Demi Moore tem um Toto. Brad Pitt tem um Toto. Madonna tem um Toto. Leonardo DiCaprio tem um Toto. Nesta semana, imitei-os e também encomendei um Toto.

O que é Toto? Toto é um vaso sanitário. Mais exatamente: Toto é uma marca japonesa de vasos sanitários. O modelo que encomendei foi o Neorest 550. Uma reportagem da revista Barron’s apelidou-o de “Maserati do encanamento”. Para mim, foi a reportagem do ano.

O Neorest 550 tem a tampa aquecida. Segundo a Barron "s, Whoopi Goldberg, que mandou instalar vasos sanitários da Toto em seus seis banheiros, aprecia particularmente essa característica. A tampa sobe e desce automaticamente. E se higieniza depois de cada uso. Para abafar os sons provenientes do banheiro, o Neorest 550 toca Mozart. Enquanto isso, um catalisador se encarrega de eliminar os odores mais repulsivos.

O motivo que me levou a encomendar o Neorest 550, porém, foi outro. Ele possui um mecanismo interno que, acionado por controle remoto, funciona como um bidê, borrifando água morna do centro, da parte dianteira e da parte traseira. Em seguida, um jato de ar quente enxuga a área umedecida. Tito, meu menino mais velho, tem uma série de impedimentos motores, mas faz quase tudo sozinho, exceto ir ao banheiro. Com o Tato, Tito poderá superar também essa barreira.

Nos últimos oito anos, publiquei um monte de artigos sobre Lula. A partir deste domingo, com a escolha de um novo presidente, ele ficará para trás. Nunca mais terei de citar seu nome. Nunca mais precisarei saber o que ele diz. Poderei me dedicar a temas menos passageiros, como o vaso sanitário da Toto.

Pessoalmente, meu interesse por Lula sempre foi nulo. Em 2002, quando foi eleito pela primeira vez, eu o via como um gordinho oportunista. Agora, em 2010, depois de dois mandatos sucessivos, continuo a vê-lo da mesma maneira: como um gordinho oportunista. Entre Lula e o vaso sanitário da Toto, interesso-me muito mais pelo vaso sanitário da Toto. Se o maior mérito de Lula, reconhecido por todos, foi ter evitado mexer na economia, posso garantir que o vaso sanitário da Toto, em seu lugar, teria mexido ainda menos. E teria tocado Mozart para abafar os sons provenientes do PT.

Mas, assim como Lula aparelhou a Anac, ele aparelhou também, por longo tempo, minha coluna. Semanalmente, ao abrir a gaveta de minha escrivaninha, eu me surpreendia com o que encontrava e dizia: “Caraca, mais um aparentado de Erenice Guerra está escondido aqui dentro!”. E, em vez de escrever sobre o vaso sanitário da Toto, acabava escrevendo outro artigo sobre Lula.

Neste domingo, Lula tentará eleger uma aparentada de Erenice Guerra como sua sucessora. Será seu ato fina1. Depois disso, acabou. Escrevo seu nome pela última vez em minha vida: Lula. E agora? Agora, Mozart! 

TV DO VAGABUNDO A SERVIÇO DE DILMA CABEÇA OCA


TV Brasil mostra Dilma e esconde Serra

LAURO JARDIM
VEJA ON-LINE
Em sua cobertura do primeiro turno das eleições, a TV Brasil transmitiu na íntegra o pronunciamento feito por Dilma Rousseff após o anúncio da Justiça Eleitoral de que a disputa presidencial terá segundo turno. Horas depois, no entanto, a rede pública de tevê não interrompeu a transmissão do filme cubano La Noche de los Inocentes para passar o discurso de José Serra. Os dirigentes da TV Brasil detestam o apelido corrente da emissora – TV do Lula -, mas é difícil fugir dele…

MARCELO DE PAIVA ABREU

Costeando alambrados
Marcelo de Paiva Abreu
O Estado de S. Paulo - 04/10/2010

Escrevo antes de ser conhecido o resultado do primeiro turno da eleição presidencial. Será Dilma Rousseff vitoriosa no primeiro turno? Ou será que a reversão do apoio à candidata oficial detectada nos últimos dias foi suficiente para assegurar um segundo turno? Do ponto de vista da economia brasileira, a opção entre José Serra e Dilma Rousseff não é caracterizada por contrastes muito marcantes. Em ambos os casos há motivos para preocupações, a despeito do clima de euforia de manada.

A eleição de Dilma no primeiro turno remove apenas parcialmente as incertezas com relação à natureza do novo governo. Numa eleição marcada pela ausência de programas coerentes, os eleitores ficam à mercê de conjecturas quanto às políticas que mais provavelmente serão adotadas pelos candidatos.

Uma das maiores contribuições de Leonel Brizola ao folclore político nacional foi a difusão da expressão gaúcha "costear o alambrado" - própria para designar comportamento de gado propenso à fuga - para caracterizar políticos que se preparam para trocar de lado. A expressão é também útil quando aplicada a mudanças abruptas de postura em relação a promessas eleitorais.

Dilma Rousseff tem experiência em costear alambrado do ponto de vista partidário: depois de longa militância pedetista, terminou no PT, já no século 21. É alto o risco de que volte a costear o alambrado, agora renegando compromissos eleitorais, especialmente em relação à política monetária e ao gasto público. De fato, seria um costeio do alambrado na contramão de cambalhota anterior, pois voltaria às suas posições originais de hostilidade à coerência da política macroeconômica. De fato, a sua revisão de posições adotadas no passado foi bastante facilitada pela resistência que marcou a campanha de José Serra em fazer uso da herança macroeconômica do governo FHC.

No último biênio, em especial, a postura do governo Lula com relação a gasto público tem sido extremamente imprudente. A racionalização anticíclica brandida de início deixou de ser válida e, mesmo assim, o governo foi em frente, usando de expedientes canhestros para tornar menos transparentes as suas estripulias financeiras. O clima é de gastança a todo vapor. Impera o banzo da política econômica do homem cordial, uma recidiva de outros tempos em que, nas palavras de Lucas Lopes, nas suas reminiscências sobre JK, reinava um desenvolvimentismo à outrance que pouco se incomodava em como as obras seriam financiadas.

Talvez por conta do passado pedetista da candidata governista, têm sido frequentes as análises que enfatizam a continuidade entre o lulismo - e, portanto, o dilmismo, seu caudatário integral - e o varguismo. Getúlio Vargas, segundo a versão canônica do folclore oficial, assegurou um governo "nacional e popular", baseado na "aliança entre a classe trabalhadora, o empresário nacionalista e o estamento militar". Visão bastante deformada do caudilho que se democratizou. A sua escolha de ministros dificilmente poderia caracterizar um governo "nacional e popular". Horácio Lafer e Oswaldo Aranha, nos anos 50, foram nomes de compromisso na área econômica, tal como haviam sido os ministros econômicos antes de 1945. De fato, a fórmula varguista, baseada na escolha de nome de compromisso para estar à frente da equipe econômica, poderia estimular Dilma Rousseff a emulá-lo e seguir o mesmo caminho. Os indícios, entretanto, são de que isso dificilmente ocorrerá.

Dilma provavelmente acabará saltando de volta o alambrado, dando continuidade à política econômica do segundo mandato de Lula, e não à política prudente herdada de FHC, mantida por Lula no primeiro mandato. O que impressiona no momento atual é um certo embotamento da capacidade coletiva de percepção - no Brasil e no exterior - de quão sério tem sido o reposicionamento da coalizão governista quanto à política macroeconômica. Com o leite derramado, qualquer correção de rumos será certamente muito mais custosa.

Mesmo que haja segundo turno, a vitória da candidata oficial ainda seria muito mais provável do que a vitória da oposição. Os riscos relativos à condução da política econômica apontados acima seriam semelhantes. A diferença relevante seria, talvez, a preservação de uma coalizão oposicionista menos frágil e consequentemente mais eficiente nas críticas às ações do governo. É muito difícil a vitória final da oposição e, ainda assim, não seria sem riscos, em vista da patente falta de compromisso do principal candidato oposicionista com a política econômica adotada no governo FHC.

A campanha eleitoral mostrou a força da democracia e, também, as debilidades do processo político brasileiro, em especial o quase completo desaparecimento de partidos e, mais ainda, de programas críveis. É lamentável que, para não perder a oportunidade magnífica de decolar economicamente, na esteira das descobertas do pré-sal e da expansão da fronteira agrícola, o Brasil ainda deva depender tanto da sorte e tão pouco de suas lideranças políticas. Apertem os cintos.

MÔNICA BERGAMO

CHAPA QUENTE
MÔNICA BERGAMO
FOLHA DE SÃO PAULO - 04/10/10

 O preço do pãozinho francês subiu 0,38% em agosto, em SP, segundo o Índice de Preços no Varejo da Fecomercio (Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de SP). De acordo com Júlia Ximenes, economista da entidade, o aumento se deve ao fato de o Brasil não produzir trigo suficiente para suprir a demanda interna. "Além disso, a Rússia, principal exportadora de trigo para o país, está passando por uma seca que a fez suspender as vendas", diz.

SEGREDO DELICADO
O governo de São Paulo lança hoje uma cartilha para orientar os profissionais de saúde sobre como revelar o diagnóstico de HIV/Aids para crianças e adolescentes. O material diz que o primeiro passo é averiguar se o paciente já tem "capacidade para manter segredos". Se não tiver, deve se falar apenas da importância dos medicamentos e da ação do vírus no organismo, sem mencionar o diagnóstico de HIV.

CONVERSA FRANCA
Entre outros tópicos estão a utilização de recursos lúdicos -um "kit diagnóstico", com brinquedos -, a exigência de autorização dos pais ou responsáveis para a revelação e uma conversa com eles para saber se a criança já possui noções de sexualidade, para definir se esse tema pode ser abordado.

RAÇA
Milton Nascimento será o homenageado do Troféu Raça Negra, no dia 15 de novembro, na Sala São Paulo.

PELÉ NA FLORESTA
A convite de Luciano Coutinho, presidente do BNDES, Pelé desembarca hoje na cidade de Alta Floresta, em Mato Grosso, para conhecer dois projetos de prevenção e combate ao desmatamento do Fundo Amazônia, administrado pelo banco. A amizade do Rei com Coutinho começou quando o BNDES entrou com participação na reforma do edifício do Museu Pelé, em Santos.

TRÊS NÃO É DEMAIS
O Fórum Nacional de Entidades Civis de Defesa do Consumidor e o Idec entraram com uma moção no Ministério Público pedindo para que seja mantido o número de três procuradores responsáveis pela defesa do consumidor no órgão, em SP. O pedido é uma contraposição à resolução que reduz para dois o número de profissionais dessa área.

CRACOLÂNDIA NA TELA
Silvio de Abreu, autor da novela "Passione" (Globo), recebeu uma carta de Paulina Vieira Duarte, secretária-adjunta da Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas, elogiando a construção do personagem Danilo (Cauã Reymond), viciado em crack. Ela escreve que a novela tem sido responsável "por inserir o tema, de maneira realista e sem preconceitos", na pauta da sociedade brasileira.

DUSSEK PACINO
Em viagem ao Rio para lançar o filme "Federal", do brasileiro Erik de Castro, de que participa, o ator americano Michael Madsen ("Cães de Aluguel") propôs um brinde ao "melhor vilão que eu vi desde Al Pacino em "Scarface'". Falava do colega de elenco Eduardo Dussek, que faz um traficante no longa que estreia no dia 29.
"Quase caí para trás", diz o cantor e ator, que ainda ouviu de Madsen: "O Tarantino precisa descobrir você. Vou levar o filme para ele".

NA SALA ESCURA A cineasta Eliane Caffé promoveu pré-estreia para convidados de seu terceiro longa, "O Sol do Meio Dia". Os atores Chico Diaz e sua mulher, Silvia Buarque, Claudia Assunção e Luiz Vasconcelos participaram do coquetel no Cine Sabesp, na Vila Madalena.

CURTO-CIRCUITO
A exposição "Anotações Visuais de Aldemir Martins", com desenhos inéditos do artista, morto em 2006, começa hoje, no Espaço Cultural Citi, na avenida Paulista.

O Hospital Israelita Albert Einstein inaugura hoje, às 17h, o Auditório Moise Safra, com palestras do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, do presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, e do ex-ministro Celso Lafer, no Morumbi.

A cantora Anna Gelinskas e o pianista Daniel Grajew fazem hoje, às 21h, o pocket show "Hollywood Monday", dirigido por Ana John, no restaurante Trindade. Livre.

A pizzaria Mercatto do Morumbi promove hoje, a partir das 19h, a "Pizzada do Bem", com renda revertida para ajudar as vítimas do incêndio da favela Real Parque.

Christiane Tricerri estreia no dia 14 o espetáculo "As Pagus", em comemoração do centenário da modernista Patrícia Galvão, no Sesc Consolação. Classificação: 12 anos.

Val Marchiori comemora aniversário amanhã com uma festa com show de Paulo Ricardo, em seu apartamento, nos Jardins.

com DIÓGENES CAMPANHA e LÍGIA MESQUITA

RUY CASTRO

O grosso e o fino
RUY CASTRO
FOLHA DE SÃO PAULO - 04/10/10

RIO DE JANEIRO - Fred Flintstone, criação da dupla William Hanna e Joseph Barbera nos quadrinhos e nos desenhos animados, acaba de fazer 50 anos. Todo mundo conhece. A graça dessa saga é que ela se passa na pré-história, mas eles já têm os nossos confortos do século 20: automóvel, televisão, geladeira, telefone, cinema, elevador, batedeira de bolo etc. A diferença é que é tudo movido a lenha.
Antes dele, outro herói das cavernas era Brucutu, criado em 1932 por V. T. Hamlin e também até hoje na praça. Graças à máquina do tempo do Professor Papanatas, Brucutu tem livre trânsito de antes a depois de Cristo e vice-versa, e já fez de tudo, desde imprimir um jornal na Idade da Pedra até chegar de dinossauro para embarcar num foguete. Em Brucutu, impera a alta tecnologia; em Flintstone, a baixa.
O Brasil poderia ser cenário dessas duas sagas simultaneamente. Aqui, o avanço e a modernidade convivem tão bem com o atraso que poucos se dão conta da esquizofrenia que isso envolve. Por exemplo: tem o sistema de votação e apuração de votos mais confiável do mundo -para eleger certos políticos em que ninguém, em sã consciência, confiaria o cachorro para passear na rua. E há uma evidente contradição em entrar naquela cabine do século 21 e fazer surgir na tela o nome e a imagem do Tiririca, não? (Não que ele seja o pior.)
O país tem recursos inimagináveis em energia e ferramentas de última geração para explorá-los. Mas os ministérios a que tais riquezas se subordinam, de alta especialidade, são entregues a políticos profissionais de quem se duvida que saibam extrair uma raiz quadrada. Nossas favelas têm computadores, TVs de plasma, gatonet e microondas, mas não têm esgoto -os apartamentos de luxo da Barra da Tijuca também não. E por aí vai.
É Flintstone e Brucutu no mesmo quadrinho, o grosso e o fino no mesmo Brasil profundo.

DORA KRAMER

De novo o inesperado 
Dora Kramer 

O Estado de S.Paulo - 04/10/2010

Para o PT o segundo turno tem um travo de derrota, por dois motivos: primeiro porque a vitória no primeiro começou a ser cantada antes mesmo de a candidata Dilma Rousseff ultrapassar o adversário José Serra nas pesquisas e a realidade não foi tão generosa.

Além disso, é a quinta eleição que Luiz Inácio da Silva não consegue ganhar no primeiro turno. Duas ele ganhou no segundo, duas perdeu no primeiro e o desempate será visto em 31 de outubro.

Apesar do baque, não convém imaginar que o PT se deixará abater. Ao contrário. Em 2006 houve também o inesperado - o segundo turno entre Lula e Alckmin - e o partido já no primeiro dia foi à luta com entusiasmo redobrado, a campanha rapidamente reformulada e adaptada à emergência.

O PSDB agora não quer repetir o erro da época e anuncia que a campanha recomeça hoje e totalmente mudada.

E Serra vai aceitar?

"Ele não está mais em condição de querer nada: precisa aceitar o que precisa ser feito e ponto", dizia Aécio Neves na noite de quinta-feira no intervalo do debate da TV Globo.

Qual a mudança crucial?

"É preciso abrir a campanha, as decisões não podem ser solitárias", acrescentava o agora senador eleito que dois dias antes havia dado entrevista falando longamente sobre a necessidade de um "freio de arrumação" na seara oposicionista para enfrentar um segundo turno.

Mesmo assim, é raríssimo o tucano que manifesta esperança de vitória na etapa final. Entre eles a unanimidade são as críticas ao marqueteiro Luiz Gonzalez, mas todos concordam que tentar mudar agora seria pior.

Já o PT por motivos óbvios não quer mudança alguma. Nos bastidores os petistas tratavam o segundo turno como uma possibilidade muito mais real do que diziam em público.

"Espero estar exausto de tanto comemorar", respondia José Eduardo Martins Cardozo no estúdio da TV Globo a quem lhe perguntava onde estaria na segunda-feira (hoje). E se não der para ganhar de primeira?

"Paciência, vamos tocar exatamente como fizemos até agora, está tudo perfeito e funcionando bem", respondia.

Mais resistente a pensar alto sobre o segundo turno, o PV oficialmente prefere assistir de camarote por alguns dias. "Só há uma decisão tomada: não tomaremos uma decisão de imediato", dizia Alfredo Sirkis.

A aposta geral, no entanto, é que Marina Silva optará pela neutralidade e o PV apoie Serra. A questão é para onde irá o eleitorado que deu a ela um resultado surpreendentemente positivo.

RENATA LO PRETE - PAINEL DA FOLHA

Levada pela onda
RENATA LO PRETE
FOLHA DE SÃO PAULO - 04/10/10

A confirmação de segundo turno presidencial indica que o entorno de Dilma Rousseff subestimou a dimensão da "onda verde". Até a undécima hora, petistas repetiam que o crescimento de Marina Silva seria insuficiente para impedir a vitória da petista ontem. Diziam ainda que, quando o eleitor conhecesse a face mais conservadora da "verde", sua votação murcharia. Mas foi Dilma quem se atrapalhou com os evangélicos no assunto aborto. Comentário de um aliado: "A internet, na qual o PT tanto apostou, acabou ajudando a arrastar Dilma para o segundo turno".

Amigável A votação obtida por Marina sugere que, ao longo do processo de derretimento de Dilma na última quinzena de campanha, o eleitorado buscou uma alternativa que não representasse "traição" a Lula.

Muito natural Lula, que estava no Palácio da Alvorada com Dilma e todo o alto comando da campanha, cuidou de lembrar repetidas vezes que suas duas vitórias se deram no segundo turno.

Caixa Tendo sobrevivido ao 3 de outubro, a campanha de José Serra (PSDB) já iniciou discussão sobre assunto bem concreto: recursos.

Revezamento Geraldo Alckmin e Alberto Goldman darão a largada na transição em São Paulo num encontro até quarta. A partir daí, comitê coordenado pelo secretário da Casa Civil, Luiz Antonio Marrey, apresentará diagnóstico por pastas.

Ritual O formato do grupo de trabalho e seu rito foram desenhados pelo presidente da Imprensa Oficial, Hubert Alqueres, e é similar ao de 2006, quando Serra assumiu no lugar de Cláudio Lembo (DEM), que havia herdado a cadeira de Alckmin.

Prova dos nove O trabalho será uma espécie de teste de "ambientação" para alckmistas e serristas. Mesmo com as secretarias franqueadas a Alckmin na campanha, resistem divergências na área da educação.

Para depois O segundo turno na eleição presidencial adiou as férias planejadas por Alckmin. O governador eleito havia programado uma semana de descanso a partir da próxima segunda.

A postos Com as urnas ainda abertas, Marta Suplicy (PT) disse ontem, depois de votar, que pretende ser o "braço direito" de Dilma. Mais tarde foi constatado que a candidata petista ao Planalto terá de enfrentar um segundo turno eleitoral.

Especial O primeiro telefonema de agradecimento de Aloysio Nunes (PSDB), que superou Marta e Netinho (PC do B) e obteve a maior votação para o Senado em São Paulo, foi dado a Fernando Henrique Cardoso, que pediu votos para seu ex-ministro na propaganda de TV.

Luz, câmera Na reta final da campanha, Aloysio atuou como dublê de marqueteiro: escreveu ele mesmo muitos textos de seu programa de televisão.

Voto caro Paulo Skaf (PSB), que projetou gastar até R$ 35 milhões na campanha para o governo paulista, obteve 4,6% dos votos válidos. Se confirmada a estimativa de despesas, terá "investido" R$ 35 por eleitor.

Capital Os altos índices obtidos por Eduardo Campos (PSB-PE) e Renato Casagrande (PSB-ES) chamaram a atenção do PT. Candidatos a governador do partido eleitos em primeiro turno não chegaram perto dos números dos aliados pessebistas.

com LETÍCIA SANDER e FABIO ZAMBELI

tiroteio

"Onde será que o Planalto e o PT vão guardar o chope e os fogos da festa da Esplanada?"

DO DEPUTADO ACM NETO (DEM-BA), sobre a antecipação dos petistas em organizar uma comemoração para a suposta vitória, que acabou frustrada ontem com a confirmação de segundo turno na disputa presidencial.

contraponto

Direito autoral


No debate da Globo, Geraldo Alckmin se defendia de adversários que apontavam tímido crescimento em São Paulo durante os governos do PSDB:

-Essa informação está errada. Inclusive, Araraquara foi a cidade do país com as melhores taxas!

Membro da claque petista no estúdio, Edinho Silva, presidente do PT-SP e ex-prefeito da cidade, brincou:

-Finalmente concordo com o Alckmin. Só faltou dizer que os números são da minha administração, em 2007. Ou seja, cresceu, mas no governo do PT!

EDUARDO PORTELLA


O próximo baile de máscaras

EDUARDO PORTELLA
FOLHA DE SÃO PAULO - 04/10/10



O saldo da redemocratização tem sido bastante modesto, ou até mesmo deficitário; é cada dia mais urgente mobilização cidadã contra a corrupção

O nosso país vem conseguindo incorporar o baile de máscaras ao trivial variado do seu cotidiano político. E com evidente, embora não louvável, tenacidade.
Se a nossa qualidade de vida depender diretamente da qualidade de nossa democracia, ainda vamos ter de esperar um bom bocado.
O modelo republicano eurocêntrico, de que tanto nos orgulhávamos em dias remotos, é apenas um retrato na parede, mas sem doer.
Desfiguraram e denegriram a promessa do "bem-estar", para prover a falácia do "estar seguro".
Diga-se de passagem, até agora sem resultados satisfatórios. O precário estado de saúde da nossa democracia (quase fui tentado a falar em estado terminal) reduz a nossa confiança no amanhã.
O abandono real da reforma política tem facilitado a circulação inaceitável dos "fichas-sujas", mais ou menos imundos. Os escândalos se sucedem sob o manto das pequenas desculpas. O eleitor, desamparado, contrainformado, vem sendo refém de processo inescrupuloso.
Torna-se cada dia mais urgente a mobilização cidadã contra a corrupção. O saldo da redemocratização tem sido bastante modesto, ou até mesmo deficitário.
Não é de agora que o Brasil vem sendo considerado o forte candidato a medalha de ouro na fraca Olimpíada da desigualdade. Ou mesmo da falência democrática.
Minado de um lado pela corrupção, e do outro pela impunidade (esses dois elementos costumam atuar combinadamente), o vazio institucional se alastra.
É quando as balas perdidas passam a rondar as portas do Estado desorganizado e manipulado.
De nada adianta recorrer a qualquer tipo de retórica, intelectualizada, populista ou popularesca: a qualidade de vida ou é democrática ou não é. O baixo acesso à educação, à saúde e aos direitos do cidadão se constitui em sérios focos de perturbação.
As pesquisas idôneas nos deixam mais do que preocupados com a sorte do nosso ensino superior.
A controvertida hierarquização da pesquisa científica, e sua avaliação por peritos improvisados, nos inquietam. Já é hora de reavaliar a universidade brasileira, hoje colocada no 232º lugar no ranking internacional.
A boa notícia da temporada nos vem da reforma e possível extinção de cursos anunciada pelo Conselho Universitário da USP.
No mais, as coisas não vão muito bem das pernas nem da cabeça. A convocação de professores leigos para atender à demanda quantitativa no ensino médio passa ao largo da obrigação qualitativa. A aprovação automática é mais automática do que aprovação.
A tão falada Bolsa Família não parece passar de um assistencialismo desviante, sem assistência e acompanhamento. O programa eleitoral, esse Carnaval fora de época, exibiu, sem o menor constrangimento, lances altissonantes da comicidade mais barata.
Nunca foi tão difícil escolher a fantasia que vamos vestir no próximo baile de máscaras.




EDUARDO PORTELLA, 77, escritor e professor de pós-graduação da UFRJ, é diretor de pesquisas do Colégio do Brasil e fundador e diretor da "Revista Tempo Brasileiro". Foi ministro da Educação, Cultura e Esportes (governo João Figueiredo), diretor-geral-adjunto e diretor-geral-substituto da Unesco (Paris, 1988-1993) e presidente da Conferência Geral da Unesco (Paris, 1994-1996).

MARIA CRISTINA FRIAS - MERCADO ABERTO

TIM fecha contrato de R$ 36 mi com governo de SP 
Maria Cristina Frias 

Folha de S.Paulo - 04/10/2010

A TIM fechou um contrato com o governo do Estado de São Paulo para oferecer mais de 25 mil acessos móveis destinados à administração pública direta e indireta (em empresas prestadoras de serviços que trabalham nas estruturas governamentais).
Segundo a TIM, é o maior contrato do mercado de telefonia móvel no país em 2010, no valor aproximado de R$ 36 milhões.
A companhia oferecerá ligações locais e interurbanas em todo o país, internet móvel nacional e no exterior, pacotes de dados e "roaming" internacional de dados.
O contrato foi fechado no último dia 28 e terá duração de 24 meses a contar da data da assinatura do acordo.

MAIS ENERGIA NO BTG

Os antigos sócios da Coomex, maior comercializadora independente de energia do Brasil, adquirida pelo BTG Pactual, começam hoje a dar expediente nas instalações do banco em São Paulo.
José Manoel Biagi Amorim, Cláudio Monteiro da Costa e Cassiano Agapito permanecem na gestão da empresa de energia como executivos e passam a integrar o quadro societário do BTG Pactual.
Os três executivos levam cerca de 30 pessoas para os escritórios do banco.
A assinatura final do contrato de compra de 100% da Coomex ocorreu apenas na sexta-feira passada, segundo o BTG Pactual.

RETOMADA DOS GANHOS

O salário base dos executivos da área financeira de grandes empresas no Brasil cresceu 11% neste ano, segundo pesquisa da consultoria Hay Group.
Já o rendimento total (salário mais bônus) recebido teve crescimento maior, de 19% em relação ao ano passado.
A valorização deste ano é bem superior a de 2009, quando o total recebido havia crescido apenas 3%.
A pesquisa, realizada anualmente pela consultoria, ouviu 3.129 executivos, de 256 organizações.

Faturamento da Price cresce 1,5% em época de crise

A PricewaterhouseCoopers faturou US$ 26,6 bilhões no ano fiscal encerrado em 30 de junho, com pequena alta de 1,5% sobre o ano anterior, segundo balanço que será divulgado hoje.
A Deloitte, outra global de auditoria, teve crescimento similar, de 1,8%, e também receita de US$ 26,6 bilhões.
"A economia global levou mais tempo do que prevíamos para se recuperar e o ritmo lento dos negócios em muitas regiões ainda traz consequências", afirmou Dennis M. Nally, CEO da PwC, em comunicado.
As empresas da PwC nas Américas do Sul e Central tiveram aumento de 11,3%. Já na Europa central e oriental houve retração de 6,6%.
A receita com consultoria para negócios teve o melhor desempenho, com alta de 9,5%. O resultado reflete a recuperação da economia e a receita com aquisições estratégicas, segundo a PwC.
A demanda por auditoria cresceu, porém não resultou em receita maior, devido à pressão sobre os preços provocada pela competição no mercado, informa a empresa.

INSPEÇÃO

A alemã Dekra -fornecedora de serviços para o setor automobilístico- completou a integração com as brasileiras Linces, DNA Secutrity e Checkauto, que adquiriu em 2009.
Agora, a Linces inicia a expansão da sua rede de franquias. A empresa passa a oferecer serviços de vistoria e inspeção de veículos ao consumidor final.
"A ideia é atender também pessoas que queiram uma avaliação independente ao comprar um veículo usado, por exemplo", afirma Marco Antonio de Lucca, presidente da Dekra no Brasil.
Mais de 50 lojas serão abertas nos próximos quatro meses em São Paulo. "Depois temos plano de expandir em outros Estados."

BAGAÇO REAL

A Novozymes vai inaugurar no Brasil, até o final do primeiro semestre, um prédio dedicado a pesquisa e desenvolvimento.
O investimento será de ao menos R$ 4 milhões, apenas em estrutura.
A companhia, cuja unidade brasileira recebeu condecoração do príncipe Henrik da Dinamarca pelo desempenho nas exportações, liderarou o índice Dow Jones de sustentabilidade no setor de biotecnologia, segundo Sustainable Asset Management.
O índice, que avalia 2,5 mil grandes companhias de todo o mundo, considera governança corporativa, relações com o consumidor e outros quesitos.
"A avaliação é global, mas leva em conta as unidades", diz Pedro Luiz Fernandes, presidente da empresa na América Latina.
"Temos auditoria ambiental e de qualidade que certifica matérias-primas usadas e que em nossa cadeia produtiva não há trabalho infantil nem escravo, afirma Fernandes ."

Parado A incerteza de renovação das concessões de uso de área no Campo de Marte, na zona norte de São Paulo, está afetando os negócios, segundo empresários ligados à Fiesp, que relatam que a insegurança atrapalha novos investimentos por criar situação de instabilidade. A nova legislação impede a Infraero de renovar os atuais contratos e obriga a fazer novas licitações.

Maturidade... O investidor em franquia está mais qualificado. Hoje, 18% deles já comandaram outro negócio antes de ingressarem no modelo franqueado, segundo dados da Franchise Store.

...na franquia A pesquisa foi feita com 6.546 pessoas e considerou 67 marcas de diversos segmentos.

Estratégia... Os ministros da Defesa do Brasil e do Chile, Nelson Jobim e Jaime Ravinet abrem a 7ª Conferência de Segurança Internacional do Forte de Copacabana, em novembro, no Rio.

...de segurança A edição deste ano discutirá orçamento de defesa no pós-crise, desarmamento nuclear e segurança estratégica.

Marola A temporada de cruzeiros marítimos terá 415 roteiros, ante 407 da anterior. "O número de roteiros cresceu porque a procura sobe a cada ano. Os 29 milhões de brasileiros que ascenderam à classe média nos últimos anos têm poder econômico para fazer um cruzeiro", diz Ricardo Amaral, presidente da Abremar (associação do setor).

FERNANDO DE BARROS E SILVA


Onda verde, marola tucana 
Fernando de Barros e Silva
FOLHA DE SÃO PAULO - 04/10/10



SÃO PAULO - A erosão na candidatura de Dilma Rousseff foi maior do que as pesquisas realizadas nos dias que antecederam a eleição conseguiram captar. O tucano José Serra se beneficiou, sobretudo, da arrancada final de Marina Silva, que atingiu quase 20% dos votos válidos e, no Nordeste, teve um desempenho bem acima do esperado.
Embora maior do que vinha sendo anunciada, a "onda verde" não foi o único fator que desgastou Dilma. Houve ainda, em menor escala, uma onda tucana na reta final.
Ela foi particularmente expressiva em São Paulo, onde as pesquisas projetavam até a véspera uma vitória de Dilma. Serra derrotou a petista em casa, o maior colégio do país.
Apesar do revés, Dilma segue como favorita para vencer no segundo turno. Mas terá de administrar a frustração de um resultado amargo, à luz das expectativas e da euforia alimentadas no campo lulista.
Como em 2002, contra Lula, Serra chega ao segundo turno como azarão, mas talvez não seja muito exagero dizer que, desta vez, ressuscitou das cinzas. Sua morte política foi decretada sucessivas vezes no decorrer da campanha.
O efeito eleitoral da sobrevida do tucano, para muitos inesperada, é algo que ainda está por ser conhecido. Em 2002, Serra ficou com 38,7% dos votos válidos no segundo turno, índice muito parecido ao de Geraldo Alckmin em 2006 (39,2%), contra o mesmo Lula. Pode ser um padrão, mas não é um destino.
Mais do que obter o apoio formal de Marina (que, em princípio, tem a intenção de se manter equidistante), as campanhas terão de mapear e conquistar os "marineiros". Do eleitor evangélico aos jovens ricos e instruídos dos centros urbanos, este não é um eleitorado homogêneo.
Segundo o Datafolha, 50% dos eleitores de Marina tendem agora a optar por Serra, enquanto 29% se inclinam por Dilma. Os 21% restantes não escolhem, por ora, nenhum dos dois. É um retrato que pode mudar, mas que já aponta para uma disputa mais difícil do que parecia.

CELSO MING

A grande ausência 
Celso Ming 
O Estado de S.Paulo - 04/10/2010

A política econômica foi o maior cabo eleitoral do governo nestas eleições e, no entanto, foi a principal ausência dos debates entre os candidatos.

Também em 1994, Fernando Henrique Cardoso foi eleito porque sua candidatura estava identificada com o sucesso de um fenômeno econômico de alta relevância, o Plano Real. Mas, na época, pelo menos houve enfrentamento. O PT, por exemplo, caiu na esparrela de proclamar nos palanques que o Plano Real era uma enganação ou, na expressão do então assessor de Assuntos Internacionais do PT, Marco Aurélio Garcia, não passava de um "Rolex fabricado no Paraguai, com corda pra só um dia". A população votou a favor do Plano e o resultado foi FHC oito anos na Presidência.

Agora, no entanto, não houve nenhum debate econômico. Até mesmo o candidato da oposição José Serra, que desde 1995 vem pregando que a atual política econômica está errada, preferiu não cutucar a colmeia que produziu tanto mel para a candidata da situação.

A rigor, não houve debate nenhum, nem sobre economia nem sobre temas relevantes para a sociedade como educação, saúde e segurança. Desde o tempo das eleições diretas não se via tanta falta de substância e discussões tão chochas.

Nenhum candidato foi duramente questionado sobre as questões econômicas que estão todos os dias nos jornais: os juros na Lua, o câmbio derretendo, o insuportável custo Brasil, o rombo das contas externas e da Previdência Social...

Ninguém explicou como o País vai arrumar tantos recursos para os programas de investimento que já estão em curso: para o pós-sal, pré-sal, PAC, trem-bala, obras da Copa e da Olimpíada...

Na sexta-feira, o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, avisou que, em 2011, o investimento não será superior a 21% do PIB. Ou seja, é insuficiente para garantir o crescimento econômico e, portanto, do emprego, de 5% ao ano. Nenhum dos candidatos chegou a dar uma pista sequer sobre como equacionar a dramática insuficiência de poupança do Brasil e como evitar que o atual surto de avanço do PIB morra logo aí, como voo de galinha.

A percepção de que os bons resultados na economia foram decisivos tanto para a escalada do presidente Lula nas pesquisas de avaliação de governo como para a disparada da candidata Dilma Rousseff nas pesquisas de intenção de voto tem pelo menos um lado bom: mostrou para os políticos que em matéria de macroeconomia não se pode inventar.

Em 2002, quando se preparava para a campanha eleitoral, o PT bem que tentou romper com tudo o que vinha sendo construído. Foram alguns dos seus maiorais, já no governo a partir de 2003, que tentaram impor a reação à tal "herança maldita". Mas foi a continuação das linhas mestras da política econômica adotada no período de oito anos imediatamente anterior e também a brilhante decisão do presidente Lula de cumprir os compromissos da Carta ao Povo Brasileiro, de 2002, que produziram os frutos econômicos e eleitorais que estão sendo colhidos agora.

É improvável que algum aventureiro pretenda mexer nessa equação de sucesso eleitoral. Mas isso não basta. O que passou, passou, como diz a velha canção. Agora, é preciso garantir o futuro.

Mesmo sem debates, o eleitor está votando automaticamente "na política econômica que está aí". Mas não tem como escolher seus candidatos, porque não sabe o que eles pensam.

Grandes saltos

Não dá para dizer que as exportações estejam fazendo feio. Numa época de crise global, nos nove primeiros meses de 2010, cresceram nada menos que 28,9% sobre igual período do ano passado.

É a despesa pública

O problema é que as importações estão avançando mais ainda: 45,1%, no período. É um desempenho que só em parte tem a ver com o dólar barato. Tem mais a ver com a disparada do consumo interno, que por sua vez é consequência do avanço das despesas públicas e do crédito.

ANCELMO GÓIS

Uma campanha e dez biografias 
Ancelmo Góis

O Globo - 04/10/2010 

1 Marina Silva — Sai destas eleições maior do que entrou. Um gaiato diz que a verde lembra o velho Lula, antes de o presidente se esbaldar com Roberto Jefferson, Sarney, Renan e outros.

2 Paulo Skaf — Saiu menor. Era o poderoso presidente da Federação das Indústrias de São Paulo. O capitalista resolveu se candidatar por um partido socialista. O eleitor não entendeu o samba do crioulo doido.

3 Weslian Roriz — Madame, até há uma semana, era apenas das prendas do lar. Virou candidata forte na Capital da República em cima da hora por causa da ficha suja do marido, Joaquim Roriz.

4 Ciro Gomes — Saiu pior. O cearense mudou o título para São Paulo. Lançou-se, “por imperativo moral”, candidato a presidente. No final, expulso do jogo, mandou um adversário para “o caralho”.

5 Tiririca — Saiu maior. Antes da campanha, era um artista de segunda, dos que fazem show no interior por uns trocados. Virou celebridade. Ganhou capas de revistas. Ainda acaba no programa “A Fazenda”.

6 Ana Amélia Lemos — A jornalista gaúcha radicada em Brasília resolveu este ano se candidatar para o Senado pelo insosso PP. Deu certo.

7 Plínio de Arruda Sampaio — Figuraça. Trouxe um pouco de humor e ideias para a campanha. Mas com ele, desta vez, o PSOL, que com Heloísa Helena obteve 7% dos votos em 2006, quase se escafedeu das urnas.

8 José Eduardo Dutra — Ao contrário de alguns “comissários” do seu partido, conduziu a campanha da Dilma, ao lado de Palocci, com moderação e respeito aos adversários.

Ainda se revelou um bem-humorado tweeteiro.

9 Lindberg Farias — Outro que saiu da campanha maior do que entrou. Vai dar trabalho ao quarteto Cabral/Pezão/Paes/Régis.

10 Lula — Ainda assim conseguiu transferir um caminhão de votos para, quase, um poste. É sucesso de público aqui e de crítica lá fora. Cerca de 80% dos brasileiros acreditam nele, contra, por exemplo, 59% dos que acreditam em Deus. É o cara.

No mais...Marina é fofa.

O negócio do Ibope Durante as eleições, o nome do Ibope é levado aos céus com direito a aparecer toda hora no “Jornal Nacional”.

Mas a cada ano que passa o percentual das pesquisas políticas no faturamento da empresa mingua. Hoje é de uns 6%.

Aliás...
Na largada, Carlos Augusto Montenegro, do Ibope, pisou na bola ao minimizar a força de Lula na eleição.

Já Marcos Coimbra, do Vox Populi, errou feio nas contas de chegada. Agiu como torcedor de Dilma. Com todo respeito.

Sexo liberado
A prefeitura do Rio finalmente autorizou a realização de uma feira de produtos eróticos no Monte Líbano. A Hot Fair começa dia 28 deste mês.

A feira ia ocorrer em abril, mas foi proibida sob alegação de que havia uma creche no Clube.

Uma lei de Cesar Maia proíbe a existência de sex shops a menos de 200m de igrejas, creches e escolas.

Agora, com o alvará, a creche vai passear com os alunos.

LembrandoSão Paulo realiza há 16 anos uma feira deste tipo que movimenta R$ 250 milhões

ColeguinhasA BBC, ontem à noite, falando das eleições no Brasil, mostra Serra exibindo um quatro e um cinco com as mãos (45 é o número dos tucanos) e não hesita: — Nove, o número dele.

Calma, santa
De uma senhorinha num salão de cabeleireiro na Barra: — Passei a vida inteira juntando dinheiro para ir morar na Barra. Agora, que consegui sair do Méier, acabei como vizinha de Valeska Popozuda.

Parece preconceito. E é.

Marina MocidadePaulinho Mocidade, o grande intérprete de sambas-enredos, foi notícia no “The Guardian”, o jornalão inglês, neste fim de semana eleitoral.

O conceituado diário britânico contou que o sambista, autor do jingle de Marina Silva, já compôs, acredite, 84 músicas para campanhas eleitorais.

Mas...Nosso sambista foi sincero ao responder se vota nos candidatos que o contratam: — Eu não tenho partido. O negócio é o jingle lá para quem encomenda. É o dindim. Porque a gente precisa dar um sorriso, né? Botar um iogurte na mesa, um sucrilhozinho...

Contra burguês...Candidato miúdo sofre.

Zé Maria, candidato do PSTU à Presidência, aquele do “contra burguês, vote 16”, amargou, como cidadão comum, loooonga espera na fila para votar, ontem, na Escola Celso Machado, em Belo Horizonte.

Eleição 2014Com a consagradora reeleição, Cabral assegura que em 2014 a sucessão presidencial vai voltar a passar pelo Rio. E a estadual vai passar pelo gabinete do vice Pezão.

Aliás, enquanto Cabral se recuperava de uma lesão no joelho, Pezão, na moita, percorreu todos os municípios do estado.

Pai e filhos
O almoço de domingo na casa dos Picciani vai ser curioso: o pai, patrono da família, não vai ter mandato. Ficará cuidando de suas cabeças de gado.

Mas ele elegeu um filho deputado federal e outro, estadual.

Calma, genteNo Condomínio Pontões da Barra, no Rio, uma moradora acusa o cachorro da vizinha de fazer xixi na varanda. Diz que o líquido indesejado cai na sua área, infestando o apartamento com o cheiro.

A dona do animal nega. A moradora incomodada promete levar o barraco para a Justiça.

Às voltas que...O pessoal de Milton Temer, 72 anos, candidato do PSOL do Rio a senador e ex-oficial da Marinha cassado em 1964, panfletava ontem no Leblon quando um senhorzinho bradou: — Quero dizer que não concordava com as ideias do Temer na Marinha! Mas hoje dei a ele o meu voto por sua honestidade e coerência!

É que...Era o almirante Ronaldo Santoro, velho colega de turma e oponente do comunista Temer na Marinha.

PAULO GUEDES

A guerra cambial 
Paulo Guedes
O GLOBO - 04/10/10


O dólar continua em queda nos mercados de moeda. Enfraquece ainda mais contra o real. As autoridades brasileiras estão inquietas. O ministro da Fazenda e o presidente do Banco Central advertiram em fórum internacional quanto aos perigos de uma iminente "guerra cambial". As desvalorizações provocadas pelas mais importantes economias do mundo ameaçam deflagrar reações em cadeia na busca de competitividade e em defesa do emprego, o que seria uma verdadeira bomba nuclear contra o comércio mundial.

A manifestação simultânea de Mantega e Meirelles disparou expectativas de que o governo poderia recorrer ao aumento do imposto sobre operações financeiras (IOF) e também reforçar as habituais compras de reservas internacionais pelo Banco Central por meio de aquisições programadas para o Fundo Soberano recentemente criado. Medidas típicas de um arsenal macroeconômico convencional, o imposto para calibrar fluxos financeiros em resposta a diferenciais de taxas de juros foi usado pelos americanos, enquanto a sustentação das taxas de câmbio por meio das compras de dólares por fundos soberanos nacionais é de uso corrente na Ásia e no Oriente Médio.

Uma enxurrada de dólares corre para o Brasil. A estabilidade política, o mercado interno de consumo de massa, as expectativas favoráveis de inflação e crescimento, além das elevadas taxas de juros, atraem para o país capitais de todos os tipos. A força gravitacional é ainda maior enquanto as economias avançadas permanecem atoladas no baixo crescimento. E tudo indica que vá levar tempo para que saiam desse pântano.

Pois foram devastadores os efeitos de excessos financeiros cometidos contra os regimes fiduciários e as redes de solidariedade que sustentam a civilização ocidental contemporânea.

A "guerra cambial" é apenas um sintoma de um fenômeno bastante mais complexo: a "guerra mundial por empregos", há muito deflagrada e para a qual só agora o Brasil desperta. Os asiáticos praticam há décadas a flutuação cambial "suja", roubando empregos dos demais países em tempos de desaceleração econômica mundial. O aumento do IOF e a flutuação "suja" pelas compras do BC e do Fundo Soberano são recursos válidos, mas de efeitos moderados. Armamento poderoso para a "guerra cambial" é a mudança para um regime fiscal robusto, sustentável, que permita derrubar os juros, desvalorizar o real e acelerar o ritmo de crescimento econômico.

CARLOS ALBERTO DI FRANCO

Horizonte autoritário
Carlos Alberto di Franco 
O Estado de S.Paulo - 04/10/10



Escrevo este artigo antes da abertura das urnas. Mas o quadro nacional, independentemente do resultado das eleições, desperta graves preocupações. O presidente Lula começa a descer a rampa do poder. Em janeiro, agasalhado por uma popularidade sem precedentes, cravará seu nome na História. A caneta, no entanto, mudará de dono.

O Brasil de hoje, independentemente dos problemas que assombram a economia mundial, é um emergente respeitável. Os tucanos, com razão, atribuem nossa boa performance às sementes plantadas no governo FHC. Já os petistas, colados nos notáveis índices de aprovação presidencial, jogam todas as fichas na conta do presidente da República. Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva, com seus erros e acertos, contribuíram positivamente para que chegássemos ao atual patamar. Fernando Henrique modernizou o Estado. Lula iniciou o resgate da fatura social.

O Brasil melhorou. É indiscutível. Mudamos de patamar. Tal desempenho, apropriado sem pudores pelo governo petista, decorreu de um cenário internacional muito favorável ao País. Mas internamente é, em parte, uma consequência das políticas sociais adotadas pelo governo.

O Bolsa-Família foi um instrumento de promoção social. Mas é preciso que essa ferramenta de inclusão seja a porta de entrada da cidadania. E isso não aconteceu. Os programas sociais, cuja validade não contesto, renderam milhões de votos, mas não fizeram cidadãos. Só a educação é capaz de transformar eleitores de cabresto em pessoas livres e conscientes. A última fase do governo Lula, marcada por constantes episódios de corrupção, cumplicidade com oligarquias nefastas e manifestações de desprezo pelas liberdades públicas, vai ganhando contornos de um indesejável populismo autoritário. O lulismo que se avizinha lembra muito o peronismo que empurrou a Argentina para o lusco-fusco do desenvolvimento.

Lula manifesta irritação com o trabalho da imprensa independente. Seus sucessivos e reiterados ataques à imprensa, balanceados com declarações formais de adesão à democracia, não conseguem mais esconder a verdadeira face dos que, mesmo legitimados pela força dos currais eleitorais, querem tudo, menos democracia. Para o presidente da República, um político que deve muito à liberdade de imprensa e de expressão, imprensa boa é a que fala bem. Jornalismo que apura e opina com isenção incomoda e deve ser extirpado.

O presidente da República, travestido em chefe de facção, deveria olhar para os desmandos que transformaram a Casa Civil num autêntico balcão de negócios. Mas não é o que o presidente faz. Ao contrário. Num exercício incrível de leniência, o presidente da República abraça os corruptos e ataca os que denunciam a corrupção.

Recente manifesto de juristas, intelectuais e artistas, divulgado em São Paulo, no Largo de São Francisco, acendeu a luz amarela no cenário da nossa democracia. "O País vive um caudilhismo que se impõe assustadoramente", declarou José Carlos Dias, ex-ministro da Justiça de Lula. "Na certeza da impunidade (Lula), já não se preocupa mais nem mesmo em valorizar a honestidade", disse Hélio Bicudo, um dos fundadores do PT. É o grito de lideranças insuspeitas. Gente que lutou contra a ditadura denuncia o presidente da República como demolidor das instituições. É muito sério.

Na verdade, cabe à imprensa um papel fundamental na salvaguarda da democracia. O presidente da República, seu partido e sua candidata, independentemente das declarações de ocasião em favor da liberdade de imprensa, resistem ao contraditório e manifestam desagrado com o exercício normal das liberdades públicas. Não tenhamos receio das renovadas tentativas de atribuir à imprensa falsos propósitos golpistas. Trata-se de síndrome persecutória, uma patologia política bem conhecida.

A biografia do presidente Lula foi construída graças aos seus méritos pessoais e aos amplos espaços que a democracia oferece a todos os cidadãos. Mas o poder fascina e confunde. E os bajuladores, de ontem, de hoje e de sempre, são o veneno da democracia. Preocupa, e muito, o entusiasmo do presidente da República, de sua candidata e de seu partido com modelos políticos capitaneados por caudilhos.

Não é de hoje a fina sintonia do petismo com governos autoritários. O Foro de São Paulo, entidade fundada por Lula e Fidel Castro, entre outros, e cujas atas podem ser acessadas na internet, mostra que não há acasos. Assiste-se, de fato, a um processo articulado de socialização do continente de matriz autoritária. E o presidente da República é um dos líderes, talvez o mais expressivo, dessa progressiva estratégia de estrangulamento das liberdades públicas. A fórmula "Lulinha paz e amor" acabou. Agora, com o Estado aparelhado, o Congresso dominado (a aliança governista terá ampla maioria no Legislativo) e a imprensa fustigada, o lulismo mostra sua verdadeira cara: o rosto do caudilhismo.

Cabe à imprensa, num momento grave da história da democracia, denunciar a tirania que vem por aí, mesmo quando camuflada pela legitimidade das urnas. Respeitamos, por óbvio, o processo eleitoral. Mas denunciamos as estratégias gramscianas de tomada do poder. O papel da imprensa não é estar do lado do poder, muito menos aplaudir unanimidades momentâneas. Nossa função é mostrar o que é verdadeiro e relevante.

Tentativas de controle dos meios de comunicação, flagrantemente inconstitucionais, serão repudiadas pela imprensa séria e ética, pelos formadores de opinião (que não vendem sua consciência em balcões de negócios) e pela sociedade. Os brasileiros apreciam a democracia. Assim como condenaram os regimes de exceção, não aceitam projetos autoritários que, sob o manto da justiça social, anulam um dos maiores bens da vida: a liberdade.

DOUTOR EM COMUNICAÇÃO, É PROFESSOR DE ÉTICA E DIRETOR DO MASTER EM JORNALISMO

CLÁUDIO HUMBERTO

“Defenderei, aconteça o que acontecer, a liberdade de imprensa” 
JOSÉ SERRA, CANDIDATO DO PSDB, SOBRE AS AMEAÇAS DOS PETISTAS ÀS LIBERDADES

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Zona de perigo
A popularidade de Lula sobe quase na mesma proporção em que o dólar cai perigosamente. Deve ter algum simbolismo nessa gangorra.

LULA TRANSFERIU VOTOS... PARA O SEGUNDO TURNO 
Com que cara fica “o cara” agora? Nem as pesquisas pré-eleitorais, nem a popularidade de 74% do presidente influenciaram os números que brotaram das urnas, neste 3 de outubro. Tudo indica que a “bichinha palanqueira”, como diz Lula, enfrentará mais palanques – não alçou voo sozinha, abatida pelos escândalos da amiga e ex-braço “direito” Erenice Guerra (& Filhos). O tucano José Serra, terá de se virar: deu sorte, diante da “candidata sem experiênciaadministrativa”. 

MARINA ‘PINTOU’ 
A conversa do PV de Marina Silva com o PSDB Serra já começou: o “fenômeno” desta eleição contaminou o “meio ambiente” de Dilma. 

SEGUNDO ROUND 
Dilma terá de “descarregar” escândalos que emperraram seu caminho no primeiro turno. Serra preparar-se para não sobrar também para ele. 

A FESTA TERÁ DE ESPERAR 
Como revelamos, sábado, Dilma posou como presidente para revistas semanais. O presidente Lula montou uma grande “festa da vitória”. 

ERENICE GUERRA VIRA ‘SEM-TETO’ NO DOMINGO, 17 
A ex-ministra da Casa Civil Erenice Guerra terá de deixar em 17 de outubro a mansão no conjunto 15 da SHIS QL 12, na exclusiva Península dos Ministros, em Brasília, quando acaba o prazo de 30 dias após a exoneração, publicada no Diário Oficial da União. Ela deixou o cargo dia 16 (quinta). Na segunda, 18, dará adeus aos cinco meses de mordomias de praxe. Em último caso, poderá morar com os parentes.

CRIANÇA É UMA CACHAÇA 
Uma cachaçaria de Brasília vai dar brindes infantis no Dia da Criança para “promover o relacionamento com o futuro consumidor”. 

ZÉ E RAFA 
O Brasil espera que a rebelião no Equador não vire o “golpe” de Honduras. Ainda bem que o presidente Rafael Correa não usa chapéu. 

PÕE NA CONTA 
O Ibope errou outra vez no DF. Sua “boca de urna” previu que Agnelo Queiroz (PT) venceria no primeiro turno com 52% dos votos. Deu 48%.

O VENCEDOR LEVA TUDO 
O grande vencedor desta eleição, o ex-governador Aécio Neves, mostrou que de “menino do Rio” nada tem: o tucano surfou em Minas, reelegendo Anastasia. Senador eleito, Aécio é “o cara” de 2014. 

PRATO SERVIDO FRIO 
Aliado de primeira hora do governo Lula, o governador de Pernambuco Eduardo Campos (PSB) devolveu a humilhação imposta por Jarbas Vasconcelos (PMDB) ao avô Miguel Arraes. Foi de goleada: 82x14%.

OUTRO CAMPEÃO 
Ser aliado de Lula não garantiu necessariamente bom desempenho. No Amazonas, ao contrário, seu ex-ministro dos Transportes Alfredo Nascimento foi triturado por Omar Aziz (PMN) nas urnas: 63x25%. 

O EXPRESSO TIRIRICA 
E o palhaço, o que é? Campeão de votos no espetáculo montado pelo PT, o candidato 2222 arrastou o voto expresso dos que acham que “pior não fica”. Ou acreditam que do fundo do poço algo sai. Debalde. 

O PÉ ESFRIOU 
Lula marcou com Dilma e Agnelo comemorar ontem suas vitórias em primeiro turno, em Brasília. Estava tudo organizado. Mas com seu pé-frio, teve de celebrar Tarso Genro (RS), que ele tanto detesta.

AÇÃO ENTRE PRIMOS 
Com a retomada do controle do PMDB-SP por Michel Temer, o partido deverá mesmo ganhar o reforço do prefeito paulistano Gilberto Kassab, que sai do DEM para não ter de negociar uma aliança com o PSDB de Geraldo Alckmin na escolha do candidato à sua sucessão na prefeitura.

NOS BRAÇOS DE DILMA 
Filiando-se ao PMDB de Michel Temer, o prefeito Gilberto Kassab espera se aproximar do eventual governo de Dilma Rousseff, oferecendo a ela o reforço de uma fornida bancada federal kassabista.

DÚVIDA EXISTENCIAL 
A dúvida aflige muitos meninos: aonde fica o bicho de goiaba quando não é tempo de goiaba? Já velho, assalta-o a dúvida transcendental pós-eleitoral: aonde fica Eymael quando não é tempo de Eymael?

PENSANDO BEM... 
...será de arrepiar um segundo turno no... Dia das Bruxas.

PODER SEM PUDOR
TUCANOS À VENDA 
O presidente tucano FHC falava a senadores sobre o escândalo de tráfico de influência no Sistema de Vigilância da Amazônia. O saudoso catarinense Vilson Kleinubing quis saber de sua conversa com Bill Clinton sobre o caso.
– Com ele eu falei apenas sobre a venda dos Tucanos – esclareceu FHC, referindo-se ao avião de treinamento produzido na Embraer.
Bate-pronto de outro catarinense, Esperidião Amin, arrancando risadas:
– Mas, presidente, o senhor queria vender todos os tucanos ou só alguns?