quarta-feira, outubro 14, 2009

AUGUSTO NUNES

VEJA ON-LINE

O marechal da reforma agrária só conhece foice de bandeira

14 de outubro de 2009

Esse põe até a mãe no meio das histórias que inventa, pensei enquanto ouvia a resposta de João Pedro Stedile ao jornalista que lhe perguntara se é comunista. ”Minha mãe me ensinou a respeitar os preceitos da Igreja Católica”, recitou, esforçando-se para conciliar a pose de filho amoroso com o sorriso de quem não acredita no que diz. Se é que a mãe tentou, o menino não aprendeu. Caso resolva contar a um padre o que fez no mês anterior, Stedile não ficará menos de uma semana ajoelhado no confessionário.

“Também me ensinou a compreender que nada é mais importante que o trabalho”, continuou o teatrão no programa Roda Viva. Se adivinhasse o tipo de trabalho que o filho arranjaria, ela teria ressalvado que é melhor não fazer nada do que fazer coisas que deixam envergonhada a mais compassiva das mães. O casal de pequenos agricultores gaúchos criou João Pedro para cuidar da propriedade da família. Stedile prefere invadir a dos outros. Os pais pensaram que seria um bom lavrador. Virou chefe do MST e comanda guerreiros rurais com a patente de marechal, mas entende de colheita e plantio tanto quanto Lula entende de gramática e ortografia.

Stedile imagina que carrascal é um clube de torturadores aposentados e só conhece foice de bandeira. Se resolver empunhar alguma, pode entrar para a História como o primeiro revolucionário a decepar a própria cabeça. O que resta de juízo aconselhou-o a trocar objetos cortantes por microfones e hoje só visita a zona rural de vez em quando. Aos 57 anos, limita-se a determinar o dia e o alvo do ataque. Consumado mais um crime, o mandante ouve, em vez da voz de prisão, convites para mais entrevistas.

“O fato de a área ser grilada, confirmado pelo Incra, não é algo secundário. Esse é o fato”, resolveu Stedile na Folha neste domingo. O fato de o Incra ter sido reduzido a codinome do MST é mais que um fato: é um caso de polícia, retruca o Brasil que presta. As siglas companheiras sabiam que a Justiça já decidiu em segunda instância que a fazenda pertence à Cutrale. Nunca se importaram com juízes ou promotores. Consideram coisa de burguês o direito de propriedade e o regime democrático. A luta pela reforma agrária é só o disfarce conveniente na caminhada rumo ao paraíso socialista.

“O que fizemos foi demonstrar para o país um sentimento patriótico”, explicou Paulo Albuquerque, o general que Stedile escalou para liderar a ofensiva. “Alguém tem que defender este país contra latifúndio e monocultura”. O que precisa de defesa é o Brasil honesto, agredido impunemente pela única quadrilha do mundo sustentada com o dinheiro dos que pagam imposto.

A Constituição impõe ao governo a preservação do Estado de Direito, que exige o cumprimento da legislação em vigor por todos os cidadãos. Se continuarem a defender uma organização criminosa que luta pela implantação da ditadura, o presidente e ministros militantes terão abandonado a defesa do Estado de Direito para associar-se ao MST na tentativa de implodir as instituições democráticas. Nesse caso, o Brasil ao menos saberá que está no poder um governo fora-da-lei. E estará preparado para a notícia de que João Pedro Stedile virou ministro da Agricutura.

TUTTY VASQUES

DNA da grana!

O ESTADO DE SÃO PAULO - 14/10/09


A série "Você não nasceu pra ganhar dinheiro - desiste, vai!" não tem o objetivo de humilhar ninguém. Pelo contrário, surgiu noite dessas numa mesa de botequim justamente para consolar um cara inconformado por não ter sido ele o primeiro no Brasil a pensar num site de comparação de preços tipo Buscapé, vendido no mês passado por US$ 342 milhões para um grupo de mídia sul-africano.
Ganhar dinheiro é um dom! Nem sempre quem se prepara a vida inteira para vencer consegue chegar à situação financeira confortável dessa turma que nasceu com DNA talhado pra encher a burra. O noticiário está cheio de exemplos ilustrativos: no domingo passado, Jesus Namorado da Madona Luz faturou R$ 18 mil, fora os paparicos, por meia hora de seu trabalho como DJ em Camboriú (SC). Nesta semana, José Luiz Datena recusou proposta para ganhar R$ 800 mil por mês no SBT.
Tem também o caso do Eike Batista, mas aí já seria covardia com quem não sabe ganhar dinheiro. Não vale, né?!

PROPAGANDA ENGANOSA

A "vida inteligente na madrugada" vai levar ainda algumas semanas para se recuperar do papo de Serginho Groisman com Ana Maria Braga e Vitor Belfort, juntos, no Altas Horas de sábado passado.

FALTA CAIMENTO

Quem é o alfaiate da estátua de Bill Clinton no Kosovo? Ficou um monumento ao malvestido. Só se falava disso ontem na Pristina Fashion Week.

Ora pois!

Maitê Proença esclarece que não teve intenção de ofender ao destacar como são burros os portugueses em vídeo do Saia Justa que causou mal-estar na TV lusitana: "A gente também fala dos paulistas, que são estressados porque trabalham demais, ou do jeito devagar do baiano..." Ah, bom!

Grand Jean!

Carla Bruni está adorando dividir espaço na mídia com o filho do Sarkozy. Já estava cansada de sua superexposição na imprensa como mulher do presidente.

A vitória irrita

É incrível como a derrota faz bem a Muricy Ramalho. O técnico, que andava rosnando para jornalistas, recuperou a calma e o otimismo após o 3 a 0 que o Palmeiras tomou do Náutico.

Que líquido é esse?

O Corinthians diagnosticou a dificuldade de Ronaldo Fenômeno para chegar ao peso ideal como "problema de retenção de líquido". O que talvez nem seja grave para um jogador de futebol, mas, no caso de um garoto-propaganda de cerveja, francamente, capaz de o patrocinador reclamar.

É grave a crise

Contrariando velha promessa de campanha de Obama aos homens americanos, está faltando mulher nos EUA! Nada mais explica Marge Simpson na capa da Playboy.

Era só o que faltava!

Amy Winehouse baixou hospital de novo, mas, desta vez, só para revisão do implante de seios. Tabloides britânicos chegaram a suspeitar de overdose de silicone.

MARCOS SÁ CORRÊA

O futuro entre minhocas e galinhas

O Estado de S. Paulo - 14/10/2009


Outro dia, em um desses debates sobre sustentabilidade, mudanças climáticas e outros grandes assuntos planetários, o jornalista André Trigueiro contou ao auditório que um dos programas de maior audiência, na série sobre meio ambiente que faz para a TV, falava do Minhocasa.

Minho o quê? Ali, na hora, ninguém precisou perguntar, porque Trigueiro, imediatamente, explicou que se tratava do projeto de "uma meninada de Brasília". Brasília, como se sabe, não tem só político. O Minhocasa se materializa na vida dos interessados como um conjunto de três caixas de plástico e uma só tampa, mais um garfo de jardinagem, um saco de húmus e outro de minhocas.

Na prática, é um biodigestor de lixo doméstico. Não só o lixo orgânico, como até o papel que sobra depois de ler o jornal ou limpar a boca no guardanapo descartável. Vale também alimentá-lo com a poeira varrida do chão. Os restos de cabelo cortado. Quase tudo. Bota-se a porcariada na caixa. E, lá dentro, as minhocas se encarregam de transformar tudo em um xarope fértil e inodoro, que serve para vitaminar os vasos e o jardim.

Não poderia ser mais simples, limpo, barato e prático. Mas o Minhocasa não entrou aqui por ser novidade. Eu, por exemplo, tenho um desses em casa faz tempo. Ele veio ao caso pelo desejo de voltar à terra firme, depois que decolou no governo Lula a proposta de levar à conferência do clima em Copenhague o compromisso de reduzir em 80% os índices nacionais de desmatamento. Ou congelar os danos ambientais em 20%, embora faltem até agora, segundo o Tribunal de Contas da União, uns 100% de providências institucionais para o País cumprir ao pé da letra seja lá o que for na Amazônia. E lá, por ser o último a sobrar, é o primeiro lugar para onde se olha no Brasil, na hora de medir desflorestamento.

Oitenta por cento é um número que os brasileiros já ouviram antes. Ele corresponde, por coincidência, à porcentagem de reservas legais nas propriedades rurais da Amazônia, onde nunca foi levado a sério. Se os velhos 80% tivessem vingado, pelo menos na Amazônia, dificilmente o governo estaria inventando os novos 80%.

Trocada em miúdos, essa é uma boa notícia. Mas as boas notícias oficiais parecem ultimamente grandes demais para caber em nossas expectativas. Enquanto as minhocas, trabalhando em silêncio, sugerem que o futuro pode estar mais à mão do que se pensa. Ou, semanas atrás, a revista New Yorker não teria dado seis páginas à história da escritora Susan Orlean, futura biógrafa do Rin Tin Tin, e as galinhas que ela está criando em casa, em um esquema que lembra o Minhocasa.

O kit de Orlean foi comprado via internet. Seu galinheiro é um legítimo Eglu, da marca Omelet. Lavável, portátil e de plástico. No gênero, a última palavra em design europeu. As matrizes chegaram pelo correio, cacarejando na embalagem.

Além de ovos no terreiro, ela agora tem o prazer de dividir o jardim com a criação ciscando na relva. Com esse modesto investimento, ingressou em uma vasta confraria, que consome revistas especializadas como Backyard Poultry, ou seja, Aves de Quintal.

Conheceu um ativista que está em campanha para convencer o presidente Barack Obama a criar galinhas nos parques da Casa Branca, como um exemplo nacional a seguir. E constatou que, na beira do abismo, as pessoas tendem a dar um pequeno passo para trás.

PANORAMA POLÍTICO

Intenção oculta

Ilimar Franco

O GLOBO - 14/10/09


A criação da Contribuição Social da Saúde (CSS), com alíquota de 0,1%, que está para ser votada no Congresso, é só o começo. O diretor do Departamento de Economia da Saúde do Ministério da Saúde, Elias Antônio Jorge, disse ontem achar “ridícula” a CSS de 0,1%. “Não resolve o problema da saúde e é um desgaste brutal”, disse ele, ao defender uma alíquota de 0,3%. A da CPMF era 0,38%. Como diz o ditado: onde passa boi passa boiada.

Uma proposta amazônica única

O governo brasileiro está articulando uma reunião dos países amazônicos (Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname e Venezuela) para debater uma proposta conjunta a ser apresentada na Conferência das Nações Unidas sobre o Clima, em Copenhague, em dezembro. O presidente Lula anunciou ontem a proposta que o Brasil pretende assumir, a de reduzir em 80% o desmatamento da floresta até 2020. O assessor para Assuntos Internacional, Marco Aurélio Garcia, disse ontem, num seminário no Ministério de Relações Exteriores, que o presidente Lula quer evitar que cada país tenha sua tese própria na conferência.
O futuro é o melhor presente para dar a uma criança: o futuro sem desigualdade, sem violência, sem corrupção, um futuro sem essa desigualdade social brutal” — Cristovam Buarque, senador (PDT-DF)

GABEIRA NO SENADO. O PV do Rio prefere garantir a eleição de Fernando Gabeira para o Senado e arranjar um plano B para disputar o governo e garantir um palanque para Marina Silva. "Em geral, para um governador não se reeleger, tem que ter sido catastrófico. O governo Cabral não é uma Brastemp, mas também não é uma catástrofe", disse o presidente do PV do Rio, Alfredo Sirkis, que disputará vaga para a Câmara dos Deputados.

Olodum

A Comissão de Combate à Intolerância Religiosa articula a criação de uma bancada federal pela liberdade religiosa.
O diretor do Olodum, João Jorge, se filiou ao PV e vai concorrer a deputado federal com esse objetivo nas eleições de 2010.

Fora da pauta

Os líderes dos partidos foram informados ontem pelo presidente da Câmara, Michel Temer (PMSB-SP), que a PEC dos Cartórios não será votada. A proposta sofre persistente oposição do presidente do STF, ministro Gilmar Mendes.

Engessando o orçamento

O Congresso está prestes a aprovar mais uma vinculação do Orçamento da União, além dos gastos obrigatórios com saúde e educação. Comissão especial da Câmara aprovou ontem proposta de emenda constitucional estabelecendo que, durante os próximos 20 anos, serão destinados 2% das receitas da União e 1% das receitas dos estados e dos municípios para o Fundo de Habitação de Interesse Social.

Uma conversa sem fim

O presidente Lula anda atrás do senador Garibaldi Alves (PMDB-RN). Candidato ao Senado, Garibaldi prefere apoiar para o governo o nome da senadora Rosalba Ciarlini (DEM), que vai estar no palanque presidencial do PSDB. Pelos seus cálculos, os potiguares vão eleger a governadora Wilma Faria (PSB) para o Senado e a outra vaga será da chapa de Rosalba. Avalia que será mais fácil derrotar Agripino Maia (DEM) se estiver na mesma chapa dele para o governo estadual.

O COMANDO do Exército está recrutando atletas de alto rendimento para o programa Estágio Básico de Sargento Temporário. Há vagas para 60 homens e 20 mulheres. Na agenda, os Jogos Mundiais Militares no Rio, em 2011, e as Olimpíadas de Londres, em 2012.

O GOVERNO apanhou ontem no Senado por causa da retenção da devolução do Imposto de Renda.

O PRESIDENTE nacional da OAB, Cezar Britto, informa que a entidade ingressará com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade no STF caso o Congresso aprove a Contribuição Social da Saúde.

BRASÍLIA - DF

Casa nova

CORREIO BRAZILIENSE - 14/10/09



O governador de Minas, Aécio Neves (PSDB), marcou a mudança do primeiro grupo de funcionários para a futura sede do governo do estado, no bairro Serra Verde, em Belo Horizonte, para 15 de janeiro. O último pilar de sustentação da futura sede do governo — o maior prédio suspenso do mundo — já foi retirado. Inicialmente, serão transferidos para a Cidade Administrativa, projetada por Oscar Niemeyer, a Governadoria, a Vice-Governadoria e as Secretarias de Estado de Planejamento e Gestão e de Governo. Cerca de 16 mil servidores serão transferidos ao longo do primeiro semestre.

No ar

No Brasil, três obras ficaram famosas por desafiarem a engenharia, o Museu de Arte de São Paulo (Masp), a ponte Octávio Frias de Oliveira, em São Paulo, e a ponte Hercílio Luz, em Florianópolis (SC). O prédio da Cidade Administrativa do Estado de Minas Gerais, com quatro andares, envidraçado, está suspenso pelo teto por apenas duas colunas. Tem vão central de 80 metros e duas balanças de 35 metros. Ou seja, tem o comprimento de 150 metros

A foto de Pirapora

O governador da Bahia, Jaques Wagner (PT), desembarcou ontem à noite em Brasília. Motivo: pegar uma carona hoje de manhã com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva para Pirapora (BA), onde começa a Caravana do São Francisco de Dilma Rousseff (PT), a ministra candidata que precisa subir rápido nas pesquisas. Lula guarda na memória a primeira grande incursão pela região, em 1994, quando perdeu para Fernando Henrique Cardoso mas começou a conquistar o coração dos nordestinos. Uma foto sua coalhada de crianças, às margens do São Francisco, é uma de suas favoritas.

Wagner poderia esperar a comitiva na Bahia, como bom anfitrião, mas aí a foto do desembarque seria capitalizada pelo ministro da Integração Nacional, Geddel Vieira Lima (PMDB), seu desafeto, que desafia o petista com o propósito de tomar o seu lugar no Palácio de Ondina. Foi o próprio presidente Lula quem solicitou a presença do governador baiano no voo presidencial. Há quem aposte que usará seu poder de sedução para fazer nova tentativa de reaproximar Geddel e Wagner, garantia de um único palanque governista para Dilma. Não será tarefa fácil, a não ser que Geddel jogue logo a toalha, mas esse não é do feitio do tinhoso peemedeebista. A aliança PT-PMDB na Bahia hoje não existe.

Participativo/ O relator-geral do Orçamento, deputado federal Geraldo Magela (PT-DF), discute, hoje, às 9h, a previsão de gastos e investimentos do governo federal para 2010. Participarão do debate os representantes do Fórum Brasil do Orçamento (FBO), que reúne entidades de todo o país que acompanham a execução do orçamento público. Além de apresentar propostas, se discutirá a destinação de recursos para o incentivo à participação das entidades civis no controle dos gastos públicos.

Traslado/ A Comissão de Relações Exteriores do Senado aprovou, em caráter terminativo, proposta que obriga o governo a arcar com os custos de repatriação de brasileiros falecidos no exterior quando sua família for de baixa renda. Preocupado com o impacto no orçamento da estrutura consular, o Itamaraty não gostou da iniciativa. O Ministério do Planejamento também está ressabiado com a nova despesa.

Cautela/ Apesar da vontade de ser vice na chapa da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, o presidente da Câmara dos Deputados, Michel Temer (SP), não deve abandonar a agenda no interior paulista. Para todos os efeitos, até as convenções partidárias de 2010, o peemedebista não quer descartar a possibilidade de disputar a reeleição a deputado federal.

Armas/ A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou uma PEC que proíbe, pelo prazo de 10 anos, o arrocho de verbas destinadas ao reaparelhamento das Forças Armadas. Pela proposta, os recursos também não poderão ser usados para engordar o superávit, durante o período.

Arrocho

A CPI das Tarifas de Energia Elétrica, presidida pelo deputado Eduardo da Fonte (PP-PE), vai realizar, nesta quarta-feira, audiência pública com o diretor-presidente das empresas do Grupo AES-Eletropaulo, Britaldo Soares. Quer esclarecimentos sobre as tarifas cobradas dos consumidores paulistas.

Sem essa

Apesar do empenho do ministro da Saúde, José Gomes Temporão (foto), do PMDB, o novo imposto do cheque agoniza. Se depender da conversa entre líderes partidários na casa do presidente da Câmara, Michel Temer (SP), ontem, a derrubada da Contribuição Social da Saúde (CSS) será a moeda de troca para se votar, enfim, a regulamentação da Emenda 29 na Câmara. Os deputados não querem ouvir falar da criação de novos tributos às vésperas de ano de eleição.

Benção

O governador de Sergipe, Marcelo Déda (foto), do PT, continua internado no Hospital Sírio Libanês, em São Paulo. Ainda se recupera da cirurgia a que se submeteu há 10 dias para a retirada de um nódulo no pâncreas, sem previsão de alta. De acordo com os médicos, o governador reage bem aos tratamentos e em breve deve ser liberado. Fará fisioterapia em casa. No feriadão, recebeu a visita do arcebispo de Aracaju, dom José Palmeira Lessa, que foi a São Paulo exclusivamente para orar pela saúde do petista.

ROBERTO DaMATTA

Colunas de colunas de colunas

O Globo - 14/10/2009


Meu ponto de partida são dois fatos paradoxais. O primeiro é o de eleger um país procrastinador como o Brasil, que só libertou seus escravos anteontem e até hoje adora salvadores da pátria em vez de construtores de instituições, como dono da Copa do Mundo de 2014, tendo — ademais— o Rio de Janeiro como sede dos Jogos Olímpicos de 2016. O segundo é o de dar ao senhor da guerra, o presidente dos Estados Unidos, país que tem uma guerra para cada geração e a capacidade de destruir o mundo, o Prêmio Nobel da Paz. Eis um outro desafio positivo que obriga — como no caso do Brasil — a lembrar o que se quer esquecer e a esquecer o que se deseja lembrar. Ou seja: o número infinito de colunas que, por cima de outras colunas, ajudam a suportar o insuportável.

Inspira-me uma história atribuída ao filosofo inglês Bertrand Russel e repetida pelo meu eminente colega Clifford Geertz, que conheci em Princeton e me impressionou pela timidez, em contraste com o escritor loquaz, talvez por se encontrar diante da raridade de um antropólogo brasileiro.

Eis a história: Um jovem cientista pronunciava (na Índia, terra de todas as (im)possibilidades), uma conferência na qual expunha como a terra girava em torno do sol e como, por sua vez, o sol orbitava o centro de uma vasta coleção de astros chamada galáxia.

Quando terminou a palestra, uma velhinha que estava no fundo da sala, reagiu: “O que o senhor nos contou é absurdo! O mundo é, na realidade, uma folha apoiada nas costas de uma tartaruga gigante.” O cientista deu o troco com um sorriso de superioridade: “Mas minha senhora — disse em estilo PhD — onde se sustenta essa tartaruga”? “Você é, de fato, muito inteligente — retorquiu a velhinha. — Em outra tartaruga, é claro!”; e, adivinhando a próxima pergunta do estrangeiro, ela fechou: “E daí para baixo, doutor, só tem tartarugas sobre tartarugas sobre tartarugas...” n n n n n n Repetir é humano. É, dizia Thomas Mann, um modo de abolir a diferença entre “ser” e “ter sido”. É eliminar, como aprendi com Claude Lévi-Strauss e reaprendo com um autêntico (e raríssimo) mestre-pensador da antropologia social brasileira contemporânea, Eduardo Viveiros de Castro, o estranhamento determinado pelo inexorável seguir do passado para o presente e daí para o futuro que, conforme descobrimos se recebemos o dom de passar dos setenta anos, transcorre rápido demais para essa corajosa e incrivelmente heróica consciência do mundo cuja finalidade é, entre outras coisas, ser obrigada a apaziguar o tempo.

Quem se lembra de tudo, como aquele famoso herói de Borges, transforma-se — como Capitu — num caso de polícia, digo, literário.

Se os eventos têm todos o mesmo peso e não podem ser classificados como mais ou m e n o s d r a m á t i c o s , não há alternância e não se obtém o que chamamos de gente ou pessoa. As identidades que muito de perto não existem, ou existem em demasia, se fazem justamente nessas escalas de repetições e sustentações: de memorizações e de esquecimentos.

n n n n n n Há a terra dos mortos e a dos vivos.

Mas há também a terra dos que lembram e a dos que esquecem de lembrar, como na maravilhosa música “Remember”, de Irving Berlin, que diz: “Você jurou jamais me esquecer, mas você se esqueceu de lembrar” que, neste exato momento, chega forte na minha memória, na voz de Billy Eckstein.

O fosso intransponível — exceto para bruxos como eu e alguns outros xamãs — que separa a terra dos vivos da dos mortos é parecido com essa bizarra terra dos que, por um terrível distúrbio, esquecem de lembrar.

Não é que não se lembrem de coisa alguma. Não! É que eles sofrem da ausência deste dado básico, constitutivo da recordação, que é o lembrar do lembrar, o lembrar de esquecer e o esquecer de lembrar. Por isso, não podem mais usar o tempo como cúmplice e aliado. Entram nos quadros dos que não sentem saudade, pois estão incapacitados de transformar momentos de dor e amargura que precisam ser esquecidos em memórias generosas, demarcadoras do amor que deve ser o sumo de todas as vidas. Perdem, como o herói de Borges, a capacidade de dar peso ao que lembram porque esquecem antes de lembrar, mostrando como é mesmo complicado e ilusório viver apenas no presente. Estamos condenados ao passado e ao futuro que fazem o nosso presente: esse fio de malabarista do qual volta e meia caímos estrondosamente.

Crescer (ou seja: ir rumo ao passado ou ao futuro) é muito difícil.

Um amigo e leitor, cuja esposa sofre de Alzheimer, falou-me dessa experiência não como um “mal”, mas como um caso oblíquo, de lidar com as temporalidades e com a repetição.

Com aqueles seus olhos velhos, vivos e lacrimejantes de pena de si mesmo e dos outros, ele comparou sua companheira de vida a um viajante que dentro do trem abandona a viagem. Perde o estranhamento das novidades que passam pelas janelas e não escolhe mais onde descer. Como os contadores de história quando perdem a noção do inicio meio e fim da história que estão contando. E sequer entendem que essas pausas memoráveis onde o presente remete ao passado e vice-versa, esse estofo dos mitos e das parábolas, é o ponto onde a lembrança vira saudade.

Pois é contando que tentamos evitar o passaporte para o qual todos nós — nobres ou pobres, com ou sem biografia, sendo o “cara” ou um merda — estamos fadados a receber.

O da entrada naquele território dos esquecidos no qual, antes mesmos de termos nascidos, temos plena cidadania


ROBERTO DaMATTA é antropólogo

FERNANDO RODRIGUES

O lobby com regras

FOLHA DE SÃO PAULO - 14/10/09



BRASÍLIA - Quem já entrou no Congresso conhece a cena. Em dias de votação, os salões ficam lotados de gente engravatada sem identificação aparente. São os lobistas.
Trabalham tranquilos. Inexistem limites. Levam deputados e senadores para almoçar, jantar, viajar. Nada fica registrado. Atravessam a rua e oferecem os mesmos benefícios para ministros e assessores. Assim nascem as leis.
Há mais de uma década tramitam no Congresso projetos propondo regulamentar o exercício do lobby.
Ontem, o presidente da Câmara, Michel Temer, acenou com a possibilidade de tocar adiante o debate.
Sem se comprometer com prazos, disse: "Nós queremos ver é se há possibilidade democrática de disciplinar os vários grupos de pressão".
É uma decisão corajosa do possível candidato a vice-presidente na chapa de Dilma Rousseff ao Planalto em 2010.
O lobby tem regras em países com instituições mais sofisticadas que as do Brasil. Temer não falou, mas o governo também tem um texto quase pronto para estabelecer limites aos lobistas. Criado no âmbito da Controladoria-Geral da União, o projeto fala em "conferir transparência" ao lobby.
Pelo projeto de lei do governo, os lobistas serão todos cadastrados.
Usarão crachá ao visitar prédios oficiais. Autoridades passarão a ser obrigadas "a publicar suas agendas e pautas em sítio eletrônico" a respeito de "contatos e audiências realizados com indivíduos ou lobistas interessados em decisões sob sua competência".
Os lobistas também terão de apresentar anualmente "relatório contendo informações sobre (...) os valores recebidos e gastos realizados no ano anterior". Seria ingênuo imaginar regras assim vingarem com rapidez. Mas já é um avanço o tema voltar à agenda. Em caso de aprovação, Michel Temer ajudará a mitigar um pouco a atual imagem dilapidada do Congresso.

ARI CUNHA

Marcha a ré na poupança


Correio Braziliense - 14/10/2009


Presidente Lula da Silva foi informado de que deveria cobrar imposto sobre a caderneta de poupança. Era desejo que os poupadores migrassem para outras fontes. A notícia foi recebida como bomba entre os que usam a caderneta de poupança. Veio a interpretação. O cidadão acha que, quando o governo quer dinheiro, sabe que deve se abastecer nas cadernetas de poupança. Houve marcha a ré nessa caminhada. Lula abriu mão do assessoramento. Sabe do que o povo gosta. Está liberada a poupança. Evitado o mal pior. Caiu a taxa pretendida. Lula sabe como dar o recado. Enalteceu quem faz poupança e condenou quem lhe deu informação de que o povo tem dinheiro.

A frase que não foi pronunciada


“A água sempre descobre um meio.”
» Presidente Lula, pensando ao visitar as obras do São Francisco.


Senado
» Correm os dias e tudo que aparece de culpa é dos senadores. Mais de 80 pessoas que formam o quadro do plenário são imunes a tudo. É que se um senador falar de outro, a Terra vai rodar ao contrário. O silêncio é criminoso, mas uma salvação.

Patrocínio
» Senador Pedro Simon dispara da tribuna que o governo está pondo a mão no que é dos outros. Era o dinheiro da poupança. Tudo volta ao normal, para que o povo não perca a alegria.

Reeleição
» Comentário de Carlos Chagas na Jovem Pan fala que mais de 60% do Congresso estão fazendo planos para a volta. Para o eleitor, como para o comentarista, é grande o número dos que correm atrás das vantagens legislativas. Filósofo de Mondubim não perde tempo e dispara: “É tempo de murici. Cada qual pensando em si”.

Muita gente
» Desfazendo o nó da curiosidade humana, a ONU fez estudo sobre estrangeiros de forma irregular que vivem nos países em desenvolvimento. No “exercício dessa liberdade”, a ONU afirma que o Brasil melhorou o Índice de Desenvolvimento Humano. Mas manteve a mesma posição: 75ª. Dentre as 10, é das mais desiguais.

Longe e perto
» Distância vai perdendo o significado à medida que a tecnologia avança. A perfeição da transmissão de imagem e som é o objetivo da Skype. A empresa anuncia a compra da Tandberg por quase US$ 3 bilhões. Teleconferências serão o meio comum de uso educacional, empresarial, e sempre que o objetivo for o contato com alguém que estiver longe. Por enquanto, só entre seres vivos.

Cartórios
» Depois da pressão, está arquivada a PEC dos Cartórios. E a OAB avisa que, se sair da gaveta, ela volta ao contra-ataque. Cezar Brito, presidente da Ordem, disse em entrevista que cartório não é capitania hereditária. Os 5 mil servidores que esperam ser públicos precisam convencer 308 deputados, dos 513.

Segurança
» Desde 2001, foram publicadas pelo Ministério Público do DF análise e proposição de medidas para a ação do Grupo de Apoio à Segurança Escolar. O estudo trazia a situação precária das escolas sem possibilidade de impedir a passagem de estranhos. Quase 50% das escolas estavam sem agentes de portaria ou vigias. Iluminação precária também foi dado registrado. É hora de fazer valer o Batalhão Escolar, que foi criado para dar segurança.

Carroceiros
» Um caminhão da Secretaria de Agricultura e Pecuária do DF recolhia na N2 os cavalos com sinais de maus-tratos que puxavam carroça. Os catadores de papéis que circulam na administração pública de Brasília participam de vários projetos sociais da Seapa e da UnB. Alguns não aproveitam a oportunidade.

Agenda
» A Galeria Lourenço de Bem será inaugurada em grande estilo. Além da exposição de Lourenço e amigos, desfile da coleção de Leonardo d’Andrade e mostra de videoarte com produção de Joana Limongi estão programados. Dez da noite será o show de Isabela Paz. Na MI 8, entre o Varjão e o Paranoá.

História de Brasília


O caso da presidência da Novacap parece que será resolvido mesmo para os lados do Ceará. O major Virgílio Távora não quis o cargo, e, ao que se diz, a nomeação cairá no nome do deputado Perilo Teixeira, representante daquele estado nordestino. (Publicado em 11/2/1961)

VINÍCIUS TORRES FREIRE

Telebrás, TeleLarga e Largabrás

FOLHA DE SÃO PAULO - 14/10/09



ALÉM DA Petrosal, da "Nova Eletrobrás" e da SuperPetrobras, o governo brasinha de Lula estuda criar algo como a TeleLarga. Quer dizer, a Nova Telebrás.
Há quase três anos se discute se a Telebrás subirá dos mortos a fim de desenvolver o serviço de internet por banda larga no país, em especial na extensão da rede para serviços públicos em regiões remotas. Neste outubro, o Ministério das Comunicações (contra a Telebrás) e o do Planejamento (a favor) têm trocado insultos na defesa de seus projetos para a expansão da banda larga.
As idas e vindas no caso são tantas quantas as esquisitas e enormes variações do preço das ações da ex-holding da telefonia estatal, história que já foi parar na CVM . A Telebrás foi eviscerada na privatização das teles de 1998. Só não foi extinta porque serviu de gambiarra na contratação de funcionários para a Anatel. Tem uns 200 funcionários, muitos processos judiciais, dá prejuízo e não tem atividade operacional.
Em meados de setembro, Lula havia dado um prazo de 45 dias para que o comitê oficial que estuda o tema acabasse de elaborar o "Plano Nacional de Banda Larga". O ministro Hélio Costa, das Comunicações, diz em público que não faz sentido algum o governo criar ou recriar uma estatal para ampliar e ramificar o serviço de banda larga. Costa tem discute com as teles um sistema em que as empresas privadas ofereçam mais e mais extensos serviços em troca de coisas como redução de impostos e "melhorias regulatórias". O secretário de Logística e TI do Ministério do Planejamento, Rogério Santanna, defende abertamente a (re)criação de uma estatal.
Do que se depreende da barafunda de projetos, o governo estuda combinar a rede de fibras óticas de uma empresa falida em 2003, a Eletronet, com a de estatais como a Petrobras e as subsidiárias da Eletrobrás (que era acionista da Eletronet, com a AES). Mas, até agosto passado, os destinos da rede da Eletronet e das dívidas de centenas de milhões da empresa eram um rocambole jurídico na Justiça do Rio. Foi então que o Tribunal de Justiça deu direito ao governo, via Eletrobrás, de retomar a rede de fibras óticas e de permitir que o governo federal pague em títulos públicos a dívida da Eletronet. Agora, o governo pode combinar essa rede com a das estatais.
Discute-se a morta-viva Telebrás ficaria com os ativos da Eletronet, cerca de 16 mil quilômetros de fibras óticas e 18 Estados. Apesar das divisões e insultos no governo, a retomada da rede da Eletronet e a pane da banda larga da Telefônica, em São Paulo, reesquentaram o projeto da estatal.
As teles fazem lobby intenso contra o projeto, que começou a vazar em dezembro de 2006, criado ou encampado pela Casa Civil de Dilma Rousseff, quando se chamava "Infovias do Brasil". Integrantes do Ministério das Comunicações dizem que o projeto de estender a rede de banda larga parar locais remotos e para prefeituras, delegacias, hospitais, postos remotos do governo federal etc. custaria mais de R$ 9 bilhões (afora outras complexidades, de ramificar e integrar a "espinha dorsal" dessa rede nacional à "ponta" dos usuários, em cada cidade). No Planejamento, diz-se que o programa pode custar de R$ 1 bilhão a R$ 3 bilhões, a depender do projeto.

CELSO MING

Procura-se a oposição

O ESTADO DE SÃO PAULO - 14/10/09



Está difícil de encontrar a oposição no Brasil.


Isso não acontece apenas porque a política econômica colocada em prática pelo governo Lula pouco mudou em relação à do governo anterior. A oposição está sumida porque não consegue ter alguma opinião consistente sobre o que é realmente relevante na economia e também na política.

Tome-se um dos temas mais importantes para o futuro do País, que é o marco regulatório do pré-sal. O governo levou mais de um ano para definir um modelo e encaminhou ao Congresso alguns projetos de lei que, para o bem e para o mal, mudam muita coisa.

Durante esse meio tempo, a oposição não se preparou, não discutiu, não formou opinião. E agora se comporta passivamente diante das propostas. Não foi até aqui capaz de propor nada de substancialmente novo e parece conformada com o sistema de partilha, com a criação de uma nova estatal para administrar a renda proveniente do pré-sal e com o papel que será confiado à Petrobrás no desenvolvimento e na exploração dos novos campos.

Entre as 258 emendas aos projetos do governo encaminhadas pelos parlamentares, nenhuma questiona de maneira relevante nem melhora efetivamente o que está proposto. As poucas críticas que pipocaram na imprensa pareceram irrelevantes e vêm sendo facilmente rebatidas pela Petrobrás ou pelas autoridades da área no governo.

Em outra matéria importante, a da reforma política, a oposição vinha balbuciando propostas a respeito da adoção do sistema de financiamento público de campanha, do voto distrital e do novo tratamento a ser dado à questão da fidelidade partidária. Mas discussões sobre o tema morrem nas vacilações e na pouca convicção de que é preciso mudar o sistema em vigor.

Outro assunto de grande relevância é a questão ambiental, que será objeto da 15ª Conferência do Clima das Nações Unidas (COP 15), a ser realizada dentro de dois meses em Copenhague, na Dinamarca.

Embora também vacile nesses temas e pouco tenha a propor, o governo até que vem buscando algumas posições a serem defendidas na Conferência. Mas a oposição está completamente parada; parece incapaz de sugerir e incapaz de confrontar eventuais fragilidades da posição do governo.

Lá de vez em quando alguém do PSDB ou do DEM faz um pronunciamento contra o processo de aparelhamento do Estado pelo PT e por outros partidos da base do governo. Mas não se vê nenhum plano de ação, nenhuma consistência de proposta para acabar com a apropriação do patrimônio público.

E não é coisa diferente disso que se pode dizer a respeito dos demais projetos de reforma: Reforma da Previdência, Reforma Tributária, Reforma Trabalhista. Todas essas iniciativas de outrora dormem em alguma gaveta de Brasília.

Paradoxalmente, a oposição parece hoje em melhores condições de eleger o futuro Presidente da República. No entanto, não se tem a menor ideia das bandeiras que submeterá ao crivo do eleitor. Isso acontece provavelmente porque ela não tem bandeiras diferentes das de tudo o que está aí. E não as tem não porque elas não existam, mas porque seus líderes não pensaram, não discutiram, não formaram posição sobre nada de importante.

Confira
Derretendo - Não é só em relação ao real que o dólar perde substância. Esta é a trajetória do dólar em relação ao euro. Os produtores europeus olham desolados para esta curva e pedem que as autoridades façam algo para inverter esse jogo.

ALEXANDRE SCHWARTSMAN

Para fugir do dr. Einstein

FOLHA DE SÃO PAULO - 14/10/09


Se alguém quer enfraquecer o real, basta adotar política fiscal oposta à que temos posto em prática hoje


DIZIA EINSTEIN que a definição de insanidade consiste em fazer as mesmas coisas, do mesmo jeito, e esperar que os resultados sejam diferentes. Lembrei-me disso ao ler artigo publicado na semana passada acerca da possibilidade de o Tesouro passar a intervir no mercado cambial com o objetivo de evitar a apreciação do câmbio. Visto que a intervenção ocorreria da mesma forma que a praticada pelo Banco Central, se há quem espere um resultado distinto, o dr. Einstein não se furtaria a alguns minutos de conversa e um bela dose de haloperidol. Vamos entender o porquê.
Ao adquirir dólares, o BC deposita reais na conta do banco vendedor, que não deixa esses recursos ociosos, mas tenta emprestá-los, trocando-os por títulos públicos, levando assim à queda da taxa de juros. Entretanto, como o BC tem uma meta para a taxa Selic, fixada pelo Copom, ele está comprometido a tomar e a emprestar recursos ao mercado àquela taxa (hoje, 8,75% ao ano). Assim, caso a taxa de juros caia abaixo da meta, o banco sempre pode optar por emprestar o dinheiro ao BC a 8,75%, na prática comprando dele títulos públicos presentes em sua carteira, reduzindo assim a liquidez.
Isso ocorreria até que a taxa de juros de mercado voltasse a ficar igual à meta da Selic, ou seja, quando toda a moeda criada pela compra de dólares fosse reabsorvida pelo BC. Essa forma de intervenção, caracterizada pelo "enxugamento" da liquidez criada pela compra de moeda estrangeira, é chamada de "esterilizada", pois o BC torna os reais "estéreis" (no sentido bíblico do termo) ao trazê-los de volta para seu cofre.
Agindo dessa forma, o BC consegue comprar dólares sem pôr em risco a meta para a inflação. Não consegue, contudo, evitar a apreciação cambial. Poderia fazê-lo se optasse por não enxugar os reais emitidos para adquirir moeda estrangeira, mas, nessa hipótese, não teria como perseguir a meta de inflação.
Ou pelo menos era o que se pensava até economistas (?) pátrios descobrirem a pedra filosofal, afirmando que caso fosse o Tesouro a comprar os dólares, não haveria criação de liquidez. Assim o Banco Central poderia ainda buscar a meta de inflação e a moeda se desvalorizaria. Esse raciocínio (se é que podemos assim chamá-lo) perde de vista que o Tesouro tem que obter os recursos para comprar dólares de apenas três fontes. Ele poderia, por exemplo, sacar reais da Conta Única que mantém no BC, mas isso criaria liquidez adicional que, se não enxugada, ameaçaria a meta de inflação, replicando rigorosamente a situação acima descrita.
Alternativamente, o Tesouro emitiria títulos, receberia os reais e os usaria para comprar dólares. Bastam, porém, dois neurônios para concluir que se trata da mesma operação anterior, exceto que a venda de títulos agora precede a compra de dólares; quer dizer, em ambos os casos, faríamos a mesma coisa, do mesmo jeito. Apenas na ausência de haloperidol pode-se imaginar que isso traria algum resultado diferente do que obtemos hoje.
Resta a terceira alternativa: o aumento do superavit primário para comprar dólares. Nesse caso, não haveria criação de liquidez e as compras poderiam desvalorizar a moeda. Isso, todavia, ocorreria mesmo sem a compra de dólares, pois o superavit maior levaria à queda da taxa de juros necessária para se atingir a meta de inflação. Ou seja, se alguém quer enfraquecer o real, basta adotar política fiscal oposta à que temos posto em prática. É mais eficiente do que pôr duas instituições governamentais batendo cabeça no mercado de câmbio e, principalmente, evitaria a visita ao dr. Einstein.

ALEXANDRE SCHWARTSMAN, 46, é economista-chefe do Grupo Santander Brasil, doutor em Economia pela Universidade da Califórnia (Berkeley) e ex-diretor de Assuntos Internacionais do Banco Central.

TODA MÍDIA

Grandes negócios

NELSON DE SÁ

FOLHA DE SÃO PAULO - 14/10/09


"De repente, está todo o mundo falando do Brasil", escreve a "Forbes", em reportagem que lista Jogos, Copa, Brics entre os motivos para aplicar no país. No título, "Buy into Brazil", compre no Brasil.
Daí a manchete da Folha Online, início da noite, "Bolsa tem o maior nível em 15 meses; dólar atinge o menor valor em 13 meses".
Daí também, do Valor Online ao "Financial Times", "Tullett Prebon compra Convenção Corretora". A "centenária corretora inglesa" comprou a brasileira, de um ex-presidente da Bolsa.
É só "a mais recente britânica a mostrar interesse em entrar no mercado de capitais do Brasil", agora que "o significado do país para os investidores virou ímã para os corretores especializados em negócios entre grandes aplicadores, não indivíduos". Antes já entraram a BGC Partners e a Icap.

A MAIOR DIFERENÇA
"Mencione o Brasil e vem a adulação", abre o "Christian Science Monitor". "Sua luta contra a pobreza, sua crescente classe média, sua ascensão como potência são estudadas como modelos." Mas, reage o texto de dois correspondentes:
"Em uma área o país está muito atrás: desigualdade de renda. Num novo estudo, o Brasil está no fim da lista de 18 países da região, no pagamento a mulheres e minorias pelo mesmo trabalho de um homem branco".

NO CANDEAL
No longo relato "Músico muda o tom de uma vila empobrecida", o "NYT" saudou ontem ações de Carlinhos Brown em seu bairro, em Salvador

"COLUNA LULA"
Na manchete do portal Terra, fim da tarde, "Moradora do São Francisco promete voto em Dilma, mulher de Lula". Em meio à comitiva de jornalistas que segue a visita às obras de transposição, no que o site chama de "Coluna Lula", entre aspas, o enviado Bob Fernandes ouve de uma mulher que saiu de casa para ceder lugar ao canal: "O povo aí já está dizendo que vai votar na esposa dele.

MAIS E MAIS
Destaque ontem no Congresso em Foco, com foto de Lula ao lado de Dilma na Ferrovia Norte-Sul, num trem, "Senado aprova injeção de R$ 50 bi no PAC"

MAIS DA VALE
No site "Brasil Econômico", "Brasil elevará imposto sobre mineração para igualar a outros países". É o que diz o ministro de Energia, citando os royalties de 2% no Brasil e 8,5% na Austrália.
Já a Reuters, em longa "Análise", deu que "Governos latino-americanos querem uma parte maior no boom da mineração". Sublinha leis em preparo no México e no Brasil e a ameaça das empresas de ir para "outras regiões".

BANDA ESTATAL
Na manchete do "Valor", "Plano de inclusão digital vai atingir 4.245 municípios", 162 milhões de pessoas. Sai em um mês, com a definição da estatal que deve administrar a nova rede nacional.
O "FT" deu ontem pesquisa Cisco mostrando o Brasil no grupo menos desenvolvido em banda larga, junto com a China. EUA, Austrália e Reino Unido também não estão bem e até "estudam investimento governamental".

VERDE-E-AMARELO
Ontem na TV Globo, "a comemoração dos operários", com direito a uma bandeira do Brasil, porque "o megatatuzão concluiu o túnel da linha 4 do Metrô" em São Paulo

"BOOM"
No "Guardian", "Jornais brasileiros celebram aumento na circulação". Diz que a escolha do Rio para os Jogos "não é a única razão por que os jornalistas brasileiros estão festejando" e saúda o "boom da imprensa na maior economia da América do Sul".

JOSÉ NÊUMANNE PINTO

Será que Lula está testando seu teflon?


O Estado de S. Paulo - 14/10/2009
Desde que noço líder genial dos povos da floresta, Luiz Inácio Lulinha Paz e Amor o Cara da Silva, envergou a toga, travestindo-se ao mesmo tempo de supremo magistrado perdoador dos amigos e condenador dos adversários tornados inimigos e senador romano defensor do lema "in dubio pro reo" ("na dúvida, a favor do réu"), seus desesperados adversários tucanos e dêmicos se torturam com a imbaixável (apud Magri) popularidade dele. E foi aí que cunharam a teoria do teflon. Pois é. Sabe aquela película que é posta nas frigideiras para evitar que a fritura adira a elas? Sua Insolência também teria tal propriedade, pois sujeira nenhuma gruda nele. Por mais evidências que surjam à tona sobre a eventual participação de assessor próximo, amigo do peito, senhorio compadre ou filho prático, sua imagem sempre sai, impávido colosso, de quaisquer complicações, sem máculas nem sequer nódoas de gordura. Nem os dólares na cueca do irmão do companheiro o sujaram.

Lula comporta-se como se desfilasse despido em praça pública, mas num carro protegido por um permitido insulfilm (o teflon da indústria automobilística) que evita que o guri xereta lhe aponte o dedo e berre à multidão que o aplaude: "O reizinho está nu." Mas, magnânimo, como seria um califa de mil e uma urnas abarrotadas de votos, Sua Insolência aventura-se às vezes a testar a consistência da camada protetora que mantém sua efígie imaculada, enfrentando desafios nunca antes arriscados por quaisquer antecessores mais temerários. É o caso de apostar nisso neste momento em que ele surfa sobre mais de 80% de aprovação do eleitorado a um ano de se tornar paraninfo da eleição da chefe de sua Casa Civil, Dilma Rousseff, que enfrentará o ogro favorito da oposição, José Serra, na sucessão presidencial. Nunca antes na história deste governo seu chefe desafiou com tanto destemor os favores dos fados benfazejos.

Sua Insolência mandou, por exemplo, que os generais da política econômica desafiassem o dogma da poupança intocável. E fez mais: permitiu que os econometecas do governo cometessem a suprema blasfêmia de fixar como limite da taxação R$ 50 mil, lembrando os Cr$ 50 mil da medida governamental mais impopular da História do Brasil: o confisco da poupança por seu antecessor Fernando Collor e pela ministra dele Zélia Cardoso de Melo, que dizem alguns engraçadinhos ter sido a primeira piada a se casar com um humorista. A única explicação próxima da lógica para a lambança da taxação da poupança seriam os arrepios de náusea que essa modalidade popular de investimento para evitar a corrosão da moeda provocam hoje nas instituições financeiras. Se essa hipótese de maledicentes da oposição for absurda, resta o dilema atroz provocado pelo anúncio da medida: para que mexer nesse vespeiro em véspera de eleição difícil com candidato pesado para enfrentar adversário favorito? Só pode ser a disposição de Lula de testar a consistência de seu teflon.

Ousada? Pode ser. Tanto que o próprio Lula, ao que tudo indica, mandou a turma da economia voltar atrás na medida, não por ser absurda, mas por não haver razões políticas para adotá-la. E ainda houve outras piores. Que tal essa de o governo não devolver o dinheiro, tomado antecipadamente das pessoas físicas, do Imposto de Renda? O próprio presidente disse que esse empréstimo compulsório sem devolução à vista não atende aos princípios elementares da economia, pois o governo quer é ver o cidadão com dinheiro no bolso para poder comprar, gastando mais. O comentário seria de uma lógica cristalina se não fosse o comentarista chefe do governo que tomou a medida antipática, apostando na certa no fato de a grande maioria do eleitorado, residente nas favelas que ardem e nos morros que deslizam, não ter um tostão guardado com o infidelíssimo depositário federal. E mais: lembrou que já houve similares batidas de carteira do contribuinte no passado. Quer dizer, então, que para a tunga - e só para a tunga - não vale o refrão "nunca antes na História deste país", é? Tá bom!

Os exemplos de Lula testando seu teflon se multiplicam, não havendo aqui espaço para citar todos. Vamos apenas a mais um. O Ministério da Educação (MEC) contratou uma empresa privada para cuidar das provas do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), que vinha reunindo cacife para substituir o vestibular como uma forma mais transparente e justa de selecionar universitários. Alguns funcionários temporários da gráfica carregaram a prova impressa debaixo da blusa e dentro da cueca, evidenciando o vazamento, do qual saíram prejudicados milhões de estudantes que se beneficiariam com a inclusão da nota do Enem para terem acesso à universidade. Chamar os autores da façanha de "pés de chinelo" seria exagerado: não chegam a sê-lo. A Polícia Federal (PF) detalhou as falhas da segurança da empresa contratada e elas atingem as raias do incrível. Ainda assim, a PF das operações espetaculares, a PF republicana que não dá mole para bandidos, forjou um perdão para o contratante de fazer corar frade de pedra. "A fragilidade foi da empresa contratada, que ganhou a licitação. Não houve fragilidade do governo", disse seu superintendente, Fernando Duran.

A mesma Federal não teme prender banqueiros que promotores e juízes consideram inescrupulosos, mas não dá ao Ministério Público uma informação que o autorize a pedir a prisão de Valdomiro Diniz, o factótum da Casa Civil do tempo de Zé Dirceu, que confessou ter achacado um empresário da jogatina e passeia sua impunidade pelo Planalto Central. Uma pergunta que não quer calar é se essa dubiedade pode explicar o teflon de Lula. Outra é se o insulfilm que impede a visão da nudez real não resultaria da suspeição inepta da oposição, incapaz de apontar o dedo por temer que vejam que ele não está muito limpinho.

ZANDER NAVARRO

O mundo rural brasileiro

FOLHA DE SÃO PAULO - 14/10/09


É surrealista a manutenção de caríssimas estruturas governamentais destinadas ao programa nacional de reforma agrária


O LANÇAMENTO do Censo Agropecuário 2006 gerou monótona repercussão impressionista e nenhuma análise. Comparados com o censo anterior, algumas facetas foram meramente descritas, como a expansão dos estabelecimentos com eletricidade, o vigoroso crescimento da soja ou a forte redução no pessoal ocupado, entre outras transformações que são de imensa relevância.
O principal dado divulgado, porém, reitera a assimétrica distribuição da propriedade da terra, pois os índices de Gini que aferem essa concentração estão entre os mais altos do planeta.
O outro foco repetido, incensado sob espantosa ingenuidade, refere-se à agricultura familiar, agrupamento que seria oposto a um indefinido agronegócio. Resultado de uma sociologia indigente e de um primário marxismo caiopradista, a noção é igualmente um delírio ideológico, pois seria segmentação que, assim se diz, estimularia a luta de classes no campo.
Mas não vivemos em Bizâncio, e mais rigor é preciso.
O censo certamente incentivará estudos reveladores de significativas mudanças no mundo rural brasileiro, sobretudo nas últimas duas décadas.
Ressalto como mais relevantes três aspectos, talvez os principais.
O fato mais decisivo se refere à inédita monetarização que hoje determina a vida social rural, deixando para o passado o paroquialismo comunitário, a busca do autoconsumo e o padrão produtivo movido só por aumento da área plantada, marcas antes tão entranhadas na história rural.
O censo é enfático, acentuando que 55% do total dos estabelecimentos responderam por 81% do valor da produção, também sinalizando a crescente especialização e profissionalização dos produtores e a dominação, agora, de um princípio férreo de produtividade. Goste-se ou não, é a consagração definitiva de uma sociabilidade capitalista que passou a comandar o cotidiano rural.
O segundo tema nos remete à agricultura familiar. Esta é uma expressão meramente descritiva, mas não um conceito. Não está associada a nenhuma teoria do desenvolvimento rural nem embute comportamentos sociais virtuosos, como certos grupos parecem acreditar.
Surgiu nos anos 90 exclusivamente para democratizar o acesso ao crédito rural e, dessa forma, enraizar ainda mais aquela sociabilidade. Ante tal objetivo, a oposição citada se torna ainda mais ilusória, pois todos os produtores se integram ao agronegócio (ou seja, aos circuitos mercantis), embora sob formas distintas.
Que grupos de esquerda julguem que um arbitrário corte empírico, ainda que definido em lei, possa separá-los entre "puros e progressistas", de um lado, e "diabólicos capitalistas reacionários", do outro, é parte do bestialógico autenticamente nacional. Surpreende, assim, a decisão de preparar um censo específico para os familiares, um indicativo, novamente, de nossas insuficiências analíticas.
Finalmente, sobre a estrutura agrária brasileira, ainda insistimos na denúncia de fantasmagóricos latifúndios improdutivos, seguindo uma leitura míope que ecoa os anos 50. Não se trata de brigar com números, pois é indesmentível a concentração da propriedade. Mas duas ressalvas são cruciais.
Primeiro, a propriedade rural não é mais a causa fundante das desigualdades sociais e políticas, que hoje são processos sobretudo urbanos. Os produtores rurais, de fato, são atualmente elo subordinado das cadeias produtivas, sendo marginal na economia brasileira a fração dos grandes proprietários fundiários e sua riqueza.
Segundo, ainda que uma mágica propusesse uma radical transformação agrária, não haveria cidadãos interessados em retornar ao campo, pela mesma razão da urbanização.
Ou seja, é surrealista a manutenção de caríssimas estruturas governamentais destinadas ao programa nacional de reforma agrária, inexistindo demanda socialmente significativa.
O futuro é inescapável: manteremos no campo uma conformação heterogênea e dual, sem ser dualista, com propriedades em grande escala convivendo com propriedades de menor porte. Houvesse racionalidade, a principal diretriz governamental deveria inspirar-se na ciência e na difusão de seus produtos tecnológicos para todos os produtores, fiscalizando particularmente os marcos impositivos das leis trabalhistas e ambientais.
Sob interpretações tão desencontradas acerca do mundo rural, a eficácia governamental acaba sendo gravemente afetada. Leituras tão distintas, quando transformadas em ação, atiçam o teatro da política, mas limitam o desenvolvimento rural.
Que os futuros candidatos presidenciais e seus programas corrijam esse rumo, que não serve ao Brasil.

ZANDER NAVARRO , 58, sociólogo, é professor associado da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e pesquisador visitante do Instituto de Estudos sobre o Desenvolvimento da Universidade de Sussex (Inglaterra). Atualmente integra a Assessoria de Gestão Estratégica do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.

JANIO DE FREITAS

A caravana passa


FOLHA DE SÃO PAULO - 14/10/09


A presença de Dilma Rousseff às obras do rio São Francisco denunciam os numerosos comícios e sua motivação. Farto pedaço do governo prevê sair em caravana hoje cedo, Lula à frente, para percorrer trechos do rio São Francisco nos Estados de Minas, Bahia e Pernambuco. A previsão original é de pelo menos sete ministros presentes, mais assessores diversos, deputados, senadores e aderentes incontáveis pelo caminho afora, encabeçados pelos governadores e prefeitos da extensa região. No roteiro, palanques vários. Cada um deles é uma denúncia.

Serão três dias de viagem e duas finalidades. Para efeito oficial, o objetivo é inspecionar as obras da mal denominada transposição do rio. Para efeito público, os palanques e a presença de Dilma Rousseff denunciam os numerosos comícios e sua motivação. Com interesse especial na baiana Barra, do bispo Luiz Flávio Cappio, objeto da precaução de retirá-lo da diocese por uns dias para não criar constrangimento, com sua extremada oposição à obra, ao chefe da caravana.

Entre um ponto de comício e outro, reuniões já programadas com os governadores e outros políticos para buscar conciliá-los, em suas disputas locais e nas divergências partidárias, de modo a se eliminarem arestas prejudiciais à ação eleitoral por Dilma Rousseff.

É o governo em ação. Muito mais ação que a do Tribunal Superior Eleitoral e do Ministério Público.

A concessão do Nobel da Paz a Barack Obama produziu um debate público que, se tem precedente, está perdido no tempo. É possível que todas as explicações para a concessão, das mais simplórias às mais sofisticadas, estejam todas presentes e certas nas razões suscitadas em favor de Obama. A crítica à falta de resultados justificadores, porém, atende a outra ordem de considerações.

Pode ser proveitoso lembrar que Itzak Rabin e Iasser Arafat também foram premiados por uma paz que jamais fizeram, e mal prometiam procurá-la de fato. Enquanto considerava, com Nixon, crimes de guerra cada vez maiores contra civis do Vietnã do Norte, do Laos e do Camboja, Henry Kissinger recebeu o prêmio pelas 'conversações de paz', em Paris, com o representante norte-vietnamita Le Duc Tôt, com quem dividiu o Nobel. Mas não pôde dividir o resultado da guerra com os vitoriosos vietnamitas. Agromorte.

A entrevista de João Pedro Stedile a Eduardo Scolese (Folha, 12/10) chamou atenção por tratar do acusado 'vandalismo' do MST. A meu ver, este outro trecho, muito ligeiro dadas as circunstâncias, é um dos retratos perfeitos do caráter de incúria gananciosa predominante no Brasil: 'Usar 713 milhões de litros de venenos agrícolas por ano, que degradam o meio ambiente, também é vandalismo'. E nos envenenam a todos, não só ao meio ambiente, em um genocídio lento e doentio, que nos é servido em nossa própria mesa. Sem reação de ninguém.

ELIO GASPARI

Vale x Planalto, um jogo a ser degustado

O GLOBO - 14/10/09

HÁ MUITO TEMPO não aparecia uma briga tão interessante como a da Vale com o comissariado petista. A mineradora é a segunda maior empresa do país, emprega 53 mil pessoas e em 2008 lucrou R$ 21,3 bilhões. Seu negócio é vender minérios e a briga destina-se a decidir quem manda nela.
A Vale foi privatizada em 1997. Num lance exemplar da privataria tucana, o dinheiro da Viúva continua lá, mas a senhora não manda. Somando-se as participações de seus fundos de pensão (Previ e Funcef) à do velho e bom BNDES ela teria votos suficientes para mandar na empresa, caso se tratasse de uma padaria. Um acordo de acionistas entregou o leme da Vale ao Bradesco, que tem 21% do capital votante. Foi do Bradesco que saiu o atual presidente da empresa, Roger Agnelli, em cujo mandarinato dobrou-se a produção e quintuplicou-se o lucro.
Apesar desses resultados fantásticos, a Vale carrega a urucubaca de exportar minério e importar navio. A empresa está fechando um negócio de US$ 1 bilhão com a indústria coreana, mas quem conhece as mumunhas do cartel naval brasileiro acha que ela faz muito bem.
Lula e Agnelli estabeleceram uma relação afetuosa. O empresário entrou na vaquinha que pagou a reforma do Alvorada, recrutou diretores no BNDES e tornou-se figura fácil nas celebrações do Planalto. Esqueceu-se que Nosso Guia é um urso devorador de donos.
Em dezembro de 2008, num episódio inesquecível, Agnelli propôs o congelamento de um pedaço da legislação trabalhista ("medidas de exceção") para conjurar a crise. Em seguida a Vale iniciou uma política de demissões que já desempregou mais de 2.000 pessoas. Lula reclamou das medidas, contrariado porque não o avisaram. Olhando-se a crise pelo retrovisor, fica entendido que a diretoria da Vale apavorou-se.
Assim como sucedeu com as empresas de telefonia, os comissários dos fundos de pensão começaram a se desentender com os controladores da empresa. Como o Bradesco não é nenhum Daniel Dantas, a briga será boa. Ela melhorou com a entrada em cena de um novo ator, o magnata Eike Batista.
Batista e Agnelli são empresários-celebridade. Em uma semana o presidente da Vale fala mais que Augusto Trajano de Azevedo Antunes, o grande potentado do minério brasileiro, em todos os seus 90 anos de vida. Eike Batista, o fulgurante bilionário do conglomerado dos X, faz força para ser Warren Buffett, mas a cada dia parece-se mais com Donald Trump. Ele quer comprar uma parte das ações do Bradesco, senão todas. Numa trapaça da história, Eike é filho do grão-duque da Vale estatal, o engenheiro Eliezer Batista.
Brigas desse tipo estimulam uma tendência para se tomar partido logo que o jogo começa. É muito melhor acompanhá-las dando razão aos dois lados. A Viúva tem as ações e não manda? Os fundos de pensão querem mandar para mensalar a Vale? Eike Batista sentado no conselho da empresa terá mais a oferecer que os atuais mandarins? Ele viria a ser a esperada figura do bilionário-companheiro do PT? Se a Vale despejar dinheiro em projetos industriais brasileiros fará bem ao país ou à megalomania dos sábios do Planalto?
Uma coisa é certa: a permanência ou a saída de Agnelli na presidência da Vale é uma irrelevância diante da verdadeira briga, pelo controle da segunda empresa do país. A primeira é a Petrobras e já está dominada.