terça-feira, agosto 04, 2009

AUGUSTO NUNES

VEJA ONLINE

O discurso de estreia avisou que um fora-da-lei se fantasiara de inocente

4 de agosto de 2009

Em 12 de março de 2007, publiquei no Jornal do Brasil um artigo sobre o discurso de estreia do senador Fernando Collor. A obscena sessão desta segunda-feira informou que o prazo de validade do texto está longe de expirar. Confira:

Durou três horas a reapresentação do artista, agora no papel de representante de Alagoas naquilo que é chamado de “a mais alta Casa do Legislativo”. Terminado o discurso de estreia no Senado, abrilhantado por intervenções do coral multipartidário, Fernando Collor proporcionara aos brasileiros um espetáculo pouco edificante, mas muito pedagógico para osd que se animam a examinar, sem lentes deformadoras, as profundezas da alma nacional.

O desempenho demonstrou que o artista quando jovem era um pouco pior. Agora utiliza com mais parcimônia trechos que recomendam voz embargada. Troca o pranto exagerado e inconvincente pela lágrima furtiva, pelo soluço quase represado. Tenta reprimir esgares que traem a arrogância uterina. Até consegue fingir que estende a mão que perdoa a supostos carrascos. Louvado o esforço do ator, reafirme-se que a encenação nada teve de edificante.

Com a ajuda dos figurantes, Collor demonstrou que, no Brasil, um culpado não demora a reencarnar como vítima sem ter purgado os muitos pecados cometidos. Os acusadores de ontem são os espectadores cúmplices de hoje, prontos para juntar-se, amanhã, às testemunhas de defesa. O conteúdo do discurso, somado à reação amistosa de alguns senadores, à mudez de outros, ao sumiço da voz das ruas, sugere que estão prescritos os incontáveis crimes, violências, obscenidades e outros ultrajes ao Brasil decente ocorridos durante o reinado de Collor.

O pesadelo começou em 1º de janeiro de 1990, horas depois da chegada ao poder do homem que, nascido no Rio, fundiu na mocidade todos os defeitos da oligarquia gaúcha e do coronelato nordestino. Terminou formalmente em 28 de dezembro de 1992, com a renúncia de Collor, que apenas consumou a morte anunciada meses antes. Collor não deixou a vida política por vontade própria. Sangrava havia meses com os sucessivos escândalos. No dia da capitulação, o Brasil inteiro sabia que, durante dois anos, tivera na Presidência um aventureiro sem compromisso com valores éticos, com a lógica, com a lei.

Na versão exposta no discurso, Collor só cometeu uns poucos pecados veniais. Não deveria ter tungado a poupança dos brasileiros, exemplificou. Poderia ter sido mais clemente com os inimigos e mais generoso com os aliados, sobretudo os infiltrados no Poder Legislativo. Talvez devesse ter sido menos indulgente com alguns auxiliares. “Cometi equívocos”, concedeu. Nada grave. Nada que justificasse a perda do mandato, violência que debitou na conta do Congresso com a placidez dos farsantes, sem que um só dos presentes se atrevesse a exumar cadáveres ainda em decomposição ou insepultos.

E a gastança na Casa da Dinda? E os casos de extorsão promovidos por Paulo César Farias, o tesoureiro do reino? E o assassinato suspeitíssimo do chefe da quadrilha federal? E a história do Fiat Elba? E a fortuna criminosamente acumulada para financiar futuras campanhas? E a roubalheira institucionalizada? E a farsa dolarizada da Operação Uruguai? As perguntas continuam à espera de respostas. Nenhum senador ousou fazê-las.

“O tempo é o senhor da razão”, dizia a inscrição numa camiseta de Collor. O passar dos anos não absolveu o ex-presidente. Só mostrou que os pais-da-pátria conseguiram tornar o Brasil ainda mais cafajeste. Não é pouca coisa.

FAUSTO RODRIGUES DE LIMA

Vestes indecentes


Folha de S. Paulo - 04/08/2009

Bem se vê que o protesto dos "sans-cullotes" ainda não teve grandes efeitos, mesmo com as cabeças roladas das guilhotinas



O ADVOGADO Alex Smaniotto, ao presenciar uma pessoa "extremamente carente" sendo barrada na entrada do fórum de Vilhena (RO) por usar uma bermuda abaixo dos joelhos, reclamou ao CNJ (Conselho Nacional de Justiça).
No dia 12/5 deste ano, o CNJ, órgão responsável pelo controle externo da atividade judicial, em vez de rever essas práticas em todo o país, fez o contrário: intensificou a proibição.
De fato, o conselho vetou a entrada nas dependências judiciárias de pessoas trajando calção, short, bermuda, camiseta regata, minissaia, miniblusa, blusa com "decote acentuado", chapéus e bonés.
Além de barrar os cidadãos que não possuem as peças de roupas requeridas, o CNJ ainda se tornou o "guardião da moralidade" contra a indecência e os maus costumes, com especial atenção às mulheres, proibidas de usar minissaias ou "decotes acentuados". Aliás, já houve casos em que juízes admoestaram a Defensoria Pública porque as roupas "impróprias" de suas estagiárias estariam "extraindo a atenção dos jurisdicionados".
Meses antes, ativistas dos direitos humanos e do movimento de mulheres foram barradas no STJ (Superior Tribunal de Justiça). A segurança alegou que as calças femininas, principalmente as jeans, não eram adequadas no autointitulado "tribunal da cidadania". Homens, só com terno e gravata.
Detalhe: a corte julgava na ocasião se as mulheres brasileiras podiam apanhar de seus parceiros impunemente, sem a interferência obrigatória do Estado ou da sociedade (é compreensível que um país preocupado com a forma de vestir das mulheres ainda vacile em enfrentar a violência doméstica).
É, as roupas femininas ainda causam "frisson" no mundo. Em julho de 2009, um tribunal do Sudão condenou um grupo de mulheres sudanesas a receber 40 chibatadas por usar calças, peça considerada "indecente" pela lei islâmica (as que se declararam culpadas receberam punição menor: dez chicotadas).
Curioso que esses fatos ocorram mais de 500 anos após Joana d'Arc ter sido queimada na fogueira por, entre outras heresias, insistir em usar roupas masculinas.
Enquanto isso, as vestes talares (capas, togas e becas) seguem obrigatórias para juízes e promotores no Distrito Federal, por força de uma norma de 1961. Os recalcitrantes podem ser punidos. A promotora Rose Meire Cyrillo e a juíza Elisabeth Amarante, com feliz percepção, diagnosticaram o efeito de tais adornos: "Esconder o que há de humano em nós e criar uma percepção questionável de respeito, autoridade e sabedoria" ("O Divã nas Salas de Audiência", julho/2009).
Medida bem-vinda foi tentada pelo senador Gerson Camata (PMDB-ES), em outubro de 2008. Ele queria desobrigar servidores e parlamentares do uso de terno e gravata no Congresso Nacional. Justificativa: economizar a energia usada nos aparelhos de ar condicionado e, com isso, ajudar a proteger o meio ambiente.
Sem dúvida, o terno -importado das culturas geladas do Norte- é uma aberração num país tropical como o Brasil. Porém, seria mais republicano que se proibissem esses bagulhos não porque são antiecológicos, mas porque só servem para diferenciar a elite dos cidadãos de chinelos e bermudas nos joelhos.
Percebendo esse "perigo", alguns congressistas adiantaram a dificuldade de a proposta ser aceita: "A minha tendência é aceitar a ideia. O problema é que, no Congresso, todos são chamados de "Excelência" ou "doutor", e o traje despojado não lembra esse status" (deputado Fernando Gabeira, PV-RJ); "Essas pessoas estão acostumadas e compenetradas a um simbolismo de hierarquias e valores que passa pela roupa" (senador Garibaldi Alves, PMDB-RN).
Dito e feito! O Senado Federal rejeitou a proposta por unanimidade. Inconformado, o senador Camata disparou algumas verdades: "A dignidade da Casa não pode dispensar paletó, porque a dignidade do Senado é a das falcatruas, das licitações viciadas e do nepotismo" ("Correio Braziliense", 26/11/08).
Bem se vê que o protesto dos "sans-cullotes", aqueles que não usavam as calças chiques da nobreza francesa, ainda não teve grandes efeitos, mesmo com as cabeças roladas das guilhotinas nos idos de 1793-1794.

GOSTOSA


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COISAS DA POLÍTICA

O risco da arrogância e da antipatia política

Tales Faria
Jornal do Brasil - 04/08/2009

Alguém já disse que na política a versão vale mais que o fato. Uma simples impressão da opinião pública, quando se cristaliza, é capaz de provocar grandes reviravoltas. Veja-se o caso do líder do PMDB no Senado, Renan Calheiros (AL). Desde quando rompeu com o ex-presidente Fernando Collor de Mello e ajudou a apeá-lo do poder, tornou-se uma figura com a simpatia da imprensa. Gozou dessa boa relação durante todo o governo Fernando Henrique Cardoso, no qual apareceu como um ministro da Justiça atuante. Mesmo uma briga pública com o respeitado ex-governador tucano Mario Covas não foi capaz de desfazer seu bom relacionamento com jornais e revistas. Mas no momento em que alguns órgãos de comunicação começaram a fazer eco às denúncias de sua ex-amante Mônica Veloso, Renan, então presidente do Senado, irritou-se , brigou com alguns repórteres e desfez o semblante simpático e tranquilo de antes. Foi-se tornando mais e mais um sujeito amargurado, e acabou ficando com uma imagem pública de antipático. Até arrogante. E aí sua situação só piorou, até ter que renunciar ao comando da Casa.
O fato é que Renan Calheiros tornou-se o grande estrategista por trás da encrenca em que se meteu o presidente do Senado, José Sarney. E, inevitavelmente, o desgaste que se produziu sobre sua imagem pública acaba refletindo sobre Sarney. Pior. Outro que também tem uma imagem de arrogância, que em nada lhe serviu para impedir que sofresse impeachment, é o ex-presidente Collor.
Quando Renan e Collor se voltam, em rede nacional de televisão, para espancar um velhinho com fama de político honesto, como o senador Pedro Simon (PMDB-RS), é claro que saem perdendo os dois e, por tabela, o próprio Sarney e, mais anda, o Palácio do Planalto, preso a Sarney, ao PMDB de Renan e até a Collor, para manter a governabilidade no Senado em meio a um verdadeiro ataque especulativo da oposição e dos jornais e revistas em litígio com o Palácio.
Não foi à toa que o coordenador político do governo, ministro José Múcio Monteiro, passou o dia em pânico. Sabia que o discurso de Simon não era boa coisa para o governo. Tanto que, pela manhã e à tarde, Múcio nem conseguiu fazer a reunião com os líderes governistas, conforme estava prevista. À noite, correu para a TV e foi assistir ao
Jornal Nacional.
Múcio não admite que para o governo foi péssimo rever os olhos esbugalhados de Fernando Collor na TV, com o seu antigo e conhecido estilo, apontando a metralhadora contra o Bom Velhinho Simon. Afinal, o ministro está aí para apaziguar os ânimos, não para jogar mais lenha na fogueira. Mas dá o braço a torcer quando indagado se está preocupado.
– Evidentemente, não esperávamos que os ânimos voltassem do recesso tão exaltados. Para nossa surpresa a situação complicou-se. É hora de esfriarmos os ânimos e restabelecermos as relações interpessoais. Nesse nível é que não podemos ficar – disse José Mucio Monteiro, sem muito mais querer comentar. Apenas: – Vamos aguardar o fim da noite. Parece que precisaremos de longas conversas.
Simon, por sua vez, pode ter idade e jeito de velhinho. Mas, na verdade, é uma raposa política com anos de estrada. Apanhou, foi posto no canto do ringue por Collor e por Renan. Mas sabe que deu uma verdadeira surra nos dois. Sabia disso desde o momento em que foi publicado que o comando nacional do PMDB, empurrado por Renan, anunciara que poderia punir os dissidentes do partido que estivessem em campanha pela retirada de Sarney da presidência do Senado. Por isso decidiu ir à tribuna. Sabia que já sairia ganhando em desafiar Renan e companhia a puni-lo. Depois, porque sabia que, em qualquer embate no plenário, sobraria para Renan a imagem da arrogância. O que Pedro Simon não contava é que teria aquela ajuda de Fernando Collor de Mello. Uma tremenda ajuda.
Tanto que, procurado pela coluna, o presidente do PMDB, Michel Temer, se apressou em esclarecer:
– Pedro Simon é uma legenda do partido. Nunca se pensou em puni-lo. Houve, sim, mau uso de uma carta que enviamos na semana passada à revista
Veja, na qual, no finalzinho, a propósito da questão da janela partidária, dizíamos que nossos dissidentes podiam sair à vontade que não sofreriam punições.

BRASÍLIA - DF

Quinta-coluna


Correio Braziliense - 04/08/2009



Os oito senadores petistas que defendem o afastamento do senador José Sarney (PMDB-AP) da Presidência do Senado estão sendo tratados no Palácio do Planalto como uma espécie de “quinta-coluna”. A expressão faz parte do jargão da esquerda. Surgiu durante o Cerco de Madri, na Guerra Civil Espanhola, quando quatro colunas das tropas do general Francisco Franco se preparavam para tomar de assalto a cidade sob controle dos republicanos. O general Quepo de Llano cunhou a expressão ao se referir aos simpatizantes franquistas: “A Quinta Coluna está esperando para nos saudar dentro da cidade.” Ontem, em desagravo ao líder da bancada Aloizio Mercadante (PT-SP), o senador petista Flávio Arns (PR) reiterou que a maioria da bancada quer o afastamento de Sarney do cargo e que a nota da liderança defendendo essa posição tem o devido respaldo. A posição será reiterada ao presidente do PT, Ricardo Berzoine (SP), e ao ministro das Relações Institucionais, José Múcio Monteiro (PTB-PE), que vão à reunião para enquadrar a bancada, marcada para hoje. Ambos vão deixar claro que o presidente Lula quer a bancada do PT firme na defesa de Sarney.


Troco// As pressões do Palácio do Planalto sobre os oito senadores que defendem o afastamento de Sarney está colocando em risco a indicação de José Múcio Monteiro para o Tribunal de Contas da União (TCU). Na bancada petista já há senadores que pretendem sabotar sua indicação em plenário. É o troco por desautorizar a bancada publicamente no caso Sarney.


Freudiana


A bancada do PT no Senado está mesmo precisando de um divã de psicanalista para tratar da sua crise de identidade. A ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva (foto), do PT-AC, por exemplo, se compara à rebelde Corbélia, da peça O Rei Lear, de Shakespeare, que, ao contrário das irmãs Goneril e Regana, “só sabia sentir e não se sujeita a ter que fazer uma declaração de amor ao pai, obrigando-o a perceber esse amor no único lugar onde deveria estar: no resultado afetivo de suas relações pessoais.” Por isso foi preterida. Como diria Sherlock Holmes, é “elementar, meu caro Watson”: trata-se de um recado da petista desiludida para o presidente Lula.


Estilos

O líder do PMDB, Renan Calheiros (AL), o cabra da peste, adiou viagem a São Paulo e voltou ao plenário do Senado para comandar a defesa de Sarney quando o senador Pedro Simon (PMDB-RS), o franciscano, foi à tribuna defender a renúncia do presidente do Senado. Recebeu o reforço do ex-presidente Collor de Mello (PTB-AL), o carateca, que pela manhã fora ao gabinete de Sarney para lhe manifestar irrestrita solidariedade. Em apartes a Simon, os dois protagonizaram momentos de alta tensão. O líder do PSDB, Arthur Virgílio (AM), o “jiujiteiro”, também voltou ao plenário, mas afinou: foi manso no aparte em apoio a Simon.


Tour

A despeito da crise institucional por que passa o Congresso Nacional, o número de turistas na Casa em julho foi o segundo maior desde de a abertura das visitações. Ao todo,
24.541 pessoas estiveram na Câmara dos Deputados e no Senado, 36% a mais que no mesmo mês do ano passado.


Caças

A Suécia apela ao desejo do Brasil de integrar o Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU) como parte de sua estratégia para vencer os concorrentes do programa FX-2 com seu caça, o Gripen NG. Com exceção dos membros permanentes — Estados Unidos, China, Rússia, França e Reino Unido — , o país escandinavo é o único com linha própria de produção de caças. A proposta sueca prevê que a Embraer possa assumir a linha mundial de produção dos Gripen nos próximos anos.


Retaguarda


Advogados do PDT maranhense pedirão ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para juntar o relatório da operação Boi Barrica da Polícia Federal à ação em que pedem a cassação do diploma da governadora Roseana Sarney (foto), do PMDB. Investigação da PF aponta que os R$ 2 milhões em espécie sacados pelo irmão Fernando Sarney, em 2006, financiariam a campanha da peemedebista. A turma do ex-governador Jackson Lago (PDT) tenta enquadrá-la com uma acusação de caixa 2.



Assento/ A oposição no Senado concluiu ter esgotado o debate em torno do ingresso na Venezuela no Mercosul. O recente fechamento de rádios contrárias ao governo de Hugo Chávez será um pretexto a mais para barrar a adesão venezuelana. O presidente da Comissão de Relações Exteriores da Casa, Eduardo Azeredo (PSDB-MG), colocará a matéria em votação no fim de agosto.

Go home / O presidente colombiano Álvaro Uribe visitará o presidente Luiz Inácio Lula da Silva na quinta-feira para explicar o acordo militar com os Estados Unidos, que causou atritos com a Venezuela e descontentamento explícito do presidente Lula. A transferência das bases militares ianques do Equador para a Colômbia altera o equilíbrio estratégico-militar no subcontinente e reforça a tese predominante no Ministério da Defesa de que a maior ameaça à soberania brasileira na Amazônia não são as FARC, mas o pacto militar EUA-Colômbia.

Castelhano/ A vice-presidente da Espanha, Maria Teresa Fernández de la Vega, e o ministro da Educação, Fernando Hadad, assinam carta de intenção para o Instituto Cervantes aperfeiçoar e formar professores de espanhol no Brasil. A partir do ano que vem, as escolas de ensino médio serão obrigadas a oferecer aulas de castelhano aos seus alunos, o que exigirá pelo menos 26 mil mestres habilitados.

ARI CUNHA

Sarney fica na Presidência do Senado


Correio Braziliense - 04/08/2009


O presidente Lula não quer que Sarney deixe a Presidência do Senado. Houve época em que abria o verbo e se proclamava amigo. Continua a favor. E não cita o nome. Não assume a responsabilidade. Diz Lula que, se Sarney deixar a Presidência, o Senado será ocupado pela oposição. Sarney é avalista da presença do PMDB junto ao governo da República. Essa vantagem é numérica, e defende Lula para que não haja a CPI da Petrobras. Há rolo por baixo dos lençóis, e o presidente não deseja que a notícia vá parar no exterior. Lula deseja ficar como dono da bola. Não quer o bem-estar, muito menos o bem-querer. Deseja não largar os bilros da almofada onde desenha tipos de rendas com trabalhos difíceis e linha fina. Ou usa o alfinete de mandacaru para ser realista ou o aproveita de outra forma.

A frase que não foi pronunciada


“Brasil. Um país de todos... os partidos.”
Duda Mendonça, pensando no mote da realidade.


Trem para Guarulhos
O Ministério Público aponta falhas e defende o meio ambiente. Governador Serra deseja o projeto. Trem para o aeroporto será marcado como ponto de recepção aos turistas durante a Copa do Mundo de 2014. O principal plano de transportes é bloqueado. População reclama, porque seria atendida também.

Bens
Sandra Cavalcanti, com passagem pelo governo Carlos Lacerda na Guanabara de então, estranha que neste governo não haja distinção entre bem público ou particular. No governo, diz Sandra, o dinheiro aparece misturado.

Honestidade
Nessa época, havia um arrecadador fiscal que, no bolso direito, tinha o dinheiro do erário. No esquerdo, de sua propriedade. Quando o esquerdo ficava liso, unia os dois dinheiros, e se julgava correto como bom funcionário do Fisco.

Não parar
Filósofo de eras antigas comentava que o universo tinha bilhões de anos e nunca parou. Para não perder a marcha do progresso. Políticos modernos param a marcha do progresso para ficarem com o dinheiro da conta bancária urdida pelo Congresso.

Muda o dono
O Fundo de Amparo ao Trabalhador muda de mãos com os aplausos
do governo Lula da Silva.

A verba é muito
grande. Pode ser usada pelo Partido dos Trabalhadores. A vitória foi espúria. Ganha o governo. Os protestos somem como
palavras ao vento.

Soberania
Favorecer a entrada de estrangeiros no Brasil por causa da Copa não se justifica. Nenhum país que sediou os jogos abriu mão da burocracia para a emissão das exigências aos estrangeiros. Na Câmara dos Deputados, correm 15 projetos sobre mudanças na concessão de visto.
Entre eles o que dispensa o visto a norte-americanos, de autoria
do deputado Cadoca.

Vigilância Sanitária
Membros das associações de defesa do consumidor foram convidados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para participar do décimo aniversário da entidade. Solenidades acontecerão hoje e amanhã na sede, em Brasília. A única representante do Rio será a Associação Brasileira do Consumidor (Abracon).

É meu
Cada dia é mais comum ver a particularização de estacionamentos públicos. Vagas reservadas a diretores e autoridades dos ministérios impedem pessoas comuns de estacionar o carro.

Informação
Caderno especial do Jornal do Senado traz as novas regras eleitorais que serão discutidas até setembro. Limitações para o uso da internet, a relação partido e candidato, doações, concursos públicos. O trabalho da equipe do periódico foi minucioso e é de grande valia para os que têm interesse em se atualizar sobre o assunto.

História de Brasília


O sr. Jânio Quadros é o principal responsável pelo recorde de vendas de livros sobre Abraham Lincoln, grande
líder norte-americano.(Publicado em 5/2/1961)

CLÓVIS ROSSI

A fraude na lenda da desigualdade


Folha de S. Paulo - 04/08/2009

O presidente do Ipea (Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas), Marcio Pochmann, adere hoje à lenda da queda da desigualdade ao divulgar um "Comunicado da Presidência" no qual se afirma que "desigualdade e pobreza apresentam melhora histórica no Brasil".
Mais do que lenda, é fraude intelectual. O "comunicado" diz, com todas as letras, que o resultado se ampara apenas na Pesquisa Mensal de Emprego, do IBGE.
Como o próprio nome indica, o que se está medindo é apenas a renda derivada do emprego, do salário, não todas as rendas.
Voltemos agora ao Marcio Pochmann de antes de ser governo, em artigo para o jornal "Valor Econômico" publicado no dia 12 de julho de 2007.
"Em resumo, a parte da renda do conjunto dos verdadeiramente ricos afasta-se cada vez mais da condição do trabalho para aliar-se a outras modalidades de renda, como aquelas provenientes da posse da propriedade (terra, ações, títulos financeiros, entre outras)", escrevia então o hoje presidente do Ipea quando era apenas professor da Unicamp.
Qualquer criancinha de pré-escola sabe que essa frase vale hoje como valia em 2007, mas Pochmann não a incluiu no "press release" em que se anuncia o seu comunicado de hoje. Espero que tenha a integridade intelectual de fazer essa ressalva fundamental durante a entrevista coletiva on-line em que será anunciado o "comunicado".
Espero que acrescente também outro dado do artigo citado: "Verifica-se que, em 2005, a participação do rendimento do trabalho na renda nacional foi de 39,1%, enquanto em 1980 era de 50%. Noutras palavras, a renda dos proprietários (juros, lucros, aluguéis de imóveis) cresceu mais rapidamente que a variação da renda nacional e, por consequência, do próprio rendimento do trabalho".

MÍRIAM LEITÃO

Dados e sensações

O GLOBO - 04/08/09

Que eu me lembre, o primeiro semestre de 1990 foi pior do que este que passou. Houve o auge da hiperinflação e o confisco num semestre só. Sem dinheiro algum, a economia despencou. Nos seis primeiros meses de 2009, o Brasil até melhorou um pouco mês a mês. Estatística é diferente de sensação, e a queda de 13,4% da indústria no primeiro semestre deste ano é maior até do que a de 8,2% de 1990.

O dado de ontem foi apresentado como a pior queda da produção industrial desde o começo da série, em 1975. E no número foi mesmo.

Mas, como sempre, os números precisam de explicação e contexto. Pegando o dado por outro ângulo, podese dizer que o Brasil teve seis meses seguidos de sutis melhoras.

Em junho, foi de apenas 0,2% em relação a maio, mas um dos setores mais afetados pela crise, o de bens de capital, teve aumento de 2,1% na produção.

O resumo de todos os números divulgados pelo IBGE é que a grande queda foi mesmo no fim do ano passado e começo deste ano, e que no segundo trimestre houve até uma alta na comparação com o trimestre anterior. Mas o Brasil ainda está longe de chegar aos níveis em que estava antes da crise. O economista Alexandre Schwartsman tinha dito numa entrevista que me concedeu na semana passada que a produção havia caído 20%, se recuperado 7%, e que só em meados de 2010 voltaria ao ponto de partida. Os números de ontem confirmaram o cálculo dele: a recuperação até agora foi de 7,9%, mas está longe de zerar a perda.

As duas piores quedas do PIB de 1975 para cá ocorreram no começo dos anos 80 e no começo do governo Collor. Na recessão de 1981, após o colapso cambial e a maxidesvalorização, a retração foi de 4,25%.

Em 1990, o Brasil viveu todos os desaforos possíveis: um governo que chegava ao fim completamente desgovernado, aquela inflação disparada, e depois, o confisco do Plano Collor. Pior impossível.

No ano, a recessão foi de 4,35%. Por isso, deve ser relativizada a ideia de que esta foi o pior queda da série num primeiro semestre. No final deste ano, a queda do PIB será menor que 1%.

Isso não significa que a crise atual é um passeio. A tentativa frequente de subestimála é perigosa porque isso leva a erros no tratamento.

A recuperação que houve até agora foi turbinada por renúncias fiscais para setores específicos. Como se comportará o consumo quando acabar o efeito dessas reduções tributárias? O mercado, que atualmente demanda otimismo, e o governo, por razões políticoeleitorais, têm tentado supervalorizar cada número bom e desprezar os negativos. Mas o melhor é não desprezar nada que os dados trazem. A produção de bens de consumo duráveis, onde estão os produtos mais beneficiados pelas renúncias fiscais, está ainda com uma queda acumulada de 19%. A produção de bens de capital está um quarto menor; no primeiro semestre do ano passado estava crescendo a 25%.

O nível de produção industrial neste primeiro semestre foi igual ao que ocorreu no primeiro semestre de 2006, um recuo de três anos. Esta crise bateu violentamente na indústria brasileira e o país está fazendo lentamente o caminho da volta. Em outubro do ano passado, quando até as pedras já sabiam que o Brasil tinha sido atingido pela crise, o Focus previa que em 2009 o país teria uma alta de 4% na produção industrial. Bom, agora, a previsão é de queda de 6%.

A Abimaq acredita que o pior momento da crise ficou para trás, em janeiro, mas ainda não consegue prever com clareza qual será o resultado do setor no final do ano. Na melhor hipótese, não haverá mais demissões, além dos 20 mil empregos perdidos no ano. Na pior, mais 10 mil postos podem fechar.

Por isso, o vice-presidente da entidade, Carlos Pastoriza, afirma que a alta de 2,1% no segmento de bens de capital entre maio e junho não é ainda o início de uma recuperação forte.

— O nosso sentimento não é de melhora na margem principalmente porque o real se valorizou frente ao dólar no período. Isso prejudica as exportações, que representam um terço da produção.

Além disso, continuamos sofrendo com o excedente de produtos, principalmente chineses, que têm entrado no Brasil a preços de liquidação — afirmou.

Dos 30 setores que compõem a Abimaq, apenas dois tiveram aumento no faturamento este ano, movidos por investimentos da Petrobras. Todos os outros caíram, com quedas que chegam a 70% no primeiro semestre, como no caso de Máquinas e Equipamentos para Madeira.

— Os investimentos foram cortados pelas empresas junto com o cafezinho.

Até mesmo quem cresceu neste ano, como o setor de alimentos, cancelou investimentos.

Por isso, nosso faturamento despencou 20% no primeiro semestre na comparação com 2008 — afirmou Pastoriza.

Em setembro de 2008, o faturamento do setor foi de R$ 8 bilhões. Em janeiro deste ano, caiu para R$ 3,8 bi, e agora, em junho, voltou para R$ 5 bi. Ainda longe do topo, mas mais perto da média de 2008, que foi R$ 6,6 bi.

A esperança da entidade está na nova linha de financiamentos promovida pelo BNDES para pequenas e médias empresas. Elas poderão pegar crédito para a compra de máquinas, com carência de dois anos e prazos de pagamento de até 10 anos.

Mas recuperação mesmo só acontecerá quando o país voltar a investir.

PAINEL DA FOLHA

Decibeis e números


Folha de S. Paulo - 04/08/2009

A tropa de choque do PMDB e seus satélites optaram pelo confronto aberto com os que pedem o afastamento do presidente do Senado, José Sarney, mas, ao cabo da sessão de pugilato verbal de ontem, os líderes mais ponderados da Casa vaticinavam: o que vai definir suas condições de ficar no cargo não é a capacidade de gritar mais alto, mas o número de senadores a sustentá-lo na cadeira.

Nesse cenário, as atenções se voltam novamente para o PT, que se reúne hoje para discutir a crise. Mais que notas retóricas se espera que a bancada liderada por Aloizio Mercadante responda uma pergunta singela: votará pela abertura de processo contra Sarney no Conselho de Ética?




Briefing. Foi o próprio Sarney quem enunciou a versão segundo a qual Pedro Simon (PMDB-RS) o odeia desde que foi preterido como vice de Tancredo Neves. "Ele é a memória viva disso tudo", afirma um neoaliado.

Rinha. Sarney queria confrontar Simon em plenário, mas foi dissuadido pelos aliados. Um deles avisa: "Agora todo dia vai ter resposta".

On-line. Do plenário, coube a Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE) informar pelo telefone o grupo demo-tucano, Sérgio Guerra (PSDB-PE) e José Agripino (DEM-RN) à frente, que se reuniu com o governador José Serra (PSDB) em SP.

Circa 1992. Além da dobradinha entre Renan Calheiros (PMDB-AL) e Fernando Collor (PTB-AL) em plenário, outra cena a lembrar a República de Alagoas foi a de Collor correndo a plenos pulmões para chegar a tempo de fazer o aparte em que mandou Simon "engolir" suas palavras.

Vale tudo. No auge do quebra-pau, havia um carateca (Collor), um ex-boxeador (Eduardo Suplicy) e um lutador de jiu-jitsu (Arthur Virgílio) em plenário.

Plantão. Após o bate-boca, Cristovam Buarque (PDT) foi ao serviço médico fazer um eletrocardiograma. Os médicos disseram que estavam de plantão com desfibrilador e maca, porque Collor tem pressão alta, o pedetista tem arritmia cardíaca e Simon inspira cuidados, pela idade.

Beijo do gordo. José Serra grava hoje exibição nos três blocos do "Programa do Jô".

Roteiro. Apesar do discurso rechaçando pré-campanha, Serra definiu ontem na reunião com líderes de PSDB e DEM, em São Paulo, mais dois destinos para visitar no Nordeste: vai à Bahia no dia 10, e depois ao Rio Grande do Norte em setembro.

Acostamento. Com a adesão de governistas, ganhou corpo a resistência na Câmara Municipal às novas regras de restrição a ônibus fretados imposta pela Prefeitura de São Paulo. Dois vereadores da base de Gilberto Kassab (DEM) se articulam com a oposição para alterar a regulamentação: Ricardo Teixeira (PSDB) e Goulart (PMDB).

Baú. Uma das alternativas em gestação na Câmara, proposta pela bancada do PT, é ressuscitar o modelo dos extintos ônibus "executivos", com menos paradas pela cidade e por meio de processo licitatório para a escolha da empresa prestadora do serviço.

Novo front. Além de provocar representação do DEM no Tribunal de Contas da União, a decisão de Lula de triplicar a taxa paga ao Paraguai pela energia de Itaipu será bombardeada pelo PSDB na Câmara, sob o argumento de que faltam mecanismos de fiscalização brasileiros na operação de venda. A medida precisa de aval do Congresso.

Domicílio. Na contramão de rumores dando conta de sua candidatura a deputado federal pela Bahia, onde nasceu, o ministro Orlando Silva (Esporte) deverá disputar vaga na Câmara por São Paulo, onde vive e vota há 16 anos.


com VERA MAGALHÃES e SILVIO NAVARRO

Tiroteio

"Jesus Cristo também é suplente. O Espírito Santo é segundo suplente. Deus é o titular."


Do senador WELLINGTON SALGADO (PMDB-MG), primeiro suplente do ministro Hélio Costa (Comunicações), defendendo o atual sistema de escolha de substitutos no Senado.

Contraponto

Autocongratulação Na última quarta-feira antes do recesso, deputados avançaram madrugada adentro de modo a concluir a votação das regras para a eleição de 2010. Finda a sessão, Michel Temer (PMDB-SP) viu motivo para comemorar:
-Quero dizer que não apenas Flávio Dino (PC do B-MA) e os líderes dos partidos, mas todos os 513 deputados merecem aplausos da sociedade...
No plenário que já se esvaziava, alguém ponderou:
-Menos presidente, menos...
Encabulado, Temer refez o cumprimento:
-Bom, então pelo menos os que aqui restaram vamos aplaudir uns aos outros...

ANCELMO GÓIS

CENA CARIOCA

O GLOBO - - 04/08/09

De Sérgio Cabral, pai, ao ser abordado por uma repórter e um fotógrafo para falar de Nelson Sargento, numa homenagem pelos 85 anos do grande mangueirense, na Rádio Roquette-Pinto, no Rio:
– Vocês são de que jornal?
– Somos da comunicação social do Palácio Guanabara – respondeu a repórter.
– Ah, também tenho um filho que trabalha lá.
NO QUE...
Acredite. A coleguinha ficou em dúvida e já ia perguntar quem era, até se dar conta de que o filho do velho Cabral era o... próprio governador.
Há testemunhas.
CADÊ A OPOSIÇÃO?
José Serra está em campanha, em seu Twitter, para mudar o calendário do futebol brasileiro e adaptá-lo ao europeu. Isto poderia impedir a saída de jogadores no meio do Campeonato Brasileiro.
Até nisso o governador paulista e Lula estão de acordo.
ALIÁS...
Domingo, ao visitar Exu-PE, terra de Luiz Gonzaga, José Serra ouviu de uma senhorinha chamada Raimunda: “O senhor parece muito com... o senhor mesmo! É que tem político que vem aqui e é muito diferente na televisão.”
Dona Raimunda é a antiga cozinheira do Rei do Baião e, até hoje, toma conta da casa dele.
O CLIMA NÃO PEDE
Lula cancelou uma agenda que teria quinta agora no Maranhão de José Sarney.
TURISTA DA FUMAÇA
Veja esta. Uma agência de viagens de Ipanema recebeu um pedido inusitado de uma cliente. Além de reservas em hotel etc., a jovem senhora pediu para, ao chegar ao destino, encontrar no quarto um... “cigarrinho de maconha”. Há testemunhas.
TANQUE CHEIO
A BR bateu seu recorde de vendas de combustíveis em julho: foram, acredite, 3 bilhões, 753 milhões de litros.
No que José Eduardo Dutra, presidente da estatal, gaiato, enviou e-mail aos gerentes: “Parabéns. Espero que não seja pelo entusiasmo da turma com as notícias da saída do presidente.”
PMDB AÍ, GEEEENTE!
Em Brasília, na política, tudo acaba em samba.
A Beija-Flor selecionou quatro composições de autores do DF para disputar a escolha de seu samba de 2010, cujo enredo será Brasília. Sei não. Periga o PMDB querer uma vaguinha.
POLÍCIA DE BATOM
O jornalão inglês The Guardian publicou reportagem sobre as mulheres em cargos de chefia na polícia do Rio.
No texto, o coleguinha Tom Phillips cita graçola que ouviu do chefe de polícia, Allan Turnowski: “Talvez eu seja o último chefe homem. Quem sabe?”.
INVERNO DO MEDO
Um grande escritório de direito empresarial, com sedes em Brasília, São Paulo e Rio, trocou os copos de vidro por descartáveis, com medo da gripe suína.
QUE NO TE METAN
A propaganda da Fundação Libertad, que promove campanha para reduzir o preço da gasolina no Paraguai, virou polêmica no país vizinho. Feministas criticam um outdoor em que uma bela modelo aparece com uma mangueira de gasolina apontada, digamos, para sua retaguarda, ao lado do slogan “Que no te metan...”, em letras garrafais, seguido da continuação da frase, em tipo muito menor, “...la mano en el bolsillo.”

ARNALDO JABOR

O mundo dos desejos programados

O GLOBO - 04/08/09

"Tudo bem. Pode ser que eu seja um terrorista, mas eu me sinto um benfeitor da humanidade. Não, não...eu não sou benfeitor de porra nenhuma, sou apenas um defeito que sobrou - hoje, neste ano da graça de 2089.

Estou dentro do Pavilhão dos Homens Bons -que eu observo aqui do meu canto. De vez em quando, eles entoam um choro meloso, evocando paz e harmonia, mas que soa como um uivo doce, um cantochão que lembra as sirenes que circulavam em Nova York, no século 21. Eles são brancos como lagartas, olhos tristes, uma santidade gelada na boca. Eu também sou um "homem bom", um "HB", mas comecei a mudar quando vi com mais clareza o que ninguém vê.

Tudo começou no século 21, com o primeiro homem clonado. Sob os protestos, os cientistas diziam: "E´ para o bem da ciência, o bem da medicina!" Papo furado, pois o que estava por baixo mesmo era a grana, o intento de igualar todo mundo num só consumidor ideal.

No século 21, a única resistência a ciência sem limites foi de Osama Bin Laden, o Maomé II , o precursor que tentou interromper essa marcha para um futuro de apavorante progresso. O Ocidente balançou com a queda das torres gêmeas em 2001, mas a fome do capital reorganizou tudo, os membros mutilados cresceram de volta, uma chuva de "hambúrgueres" pacificou o Islã e se reconstruiu a utopia mercantil. Dali para frente, a ciência redobrou seus esforços e cada gene foi decifrado, cada forma de morte foi catalogada e saneada. Começamos a viver muitos anos, (eu estou com 107, mas com corpinho de 60), o que gerou problemas previdenciários, resolvidos depois por extermínios periódicos.

Mas, o grande mercado da Ciência não se deteve. Não bastava a perfeição dos corpos "clonados".

Era inconcebível que, com tanto progresso, o Ocidente ficasse ainda à mercê de neuroses, de angustias improdutivas que em nada contribuíam para o bom funcionamento do mercado do entretenimento e prazer das massas.

Ai surgiu a grande idéia: começaram a programar geneticamente os desejos.

Nas combinações da "dupla hélice" do DNA, pulsões e instintos foram identificados e reprogramados: genes da paixão, genes do tesão, ciúme, inveja, todas as partículas elementares da mente. Os imprevistos do corpo e da alma passaram a ser controlados para o bom funcionamento social.

Em vez do jogo de "tentativa e erro" para adivinhar o gosto do público, veio a idéia genial: inverter tudo, catalogar os desejos de consumo e felicidade, de modo a livrar o mercado dos irritantes sobressaltos da liberdade.

Era mais prático para a industria e comercio mudar o freguês em vez do produto.

Foi nesta época, por volta de 2086, que percebi que eu era diferente de todos a minha volta. O mundo ficou de uma clareza insuportável. Eu andava pelas ruas de New York e observava com espanto crescente as "legiões desejantes" que passavam. A todos os anseios a industria do desejo tinha de atender. Havia os pelotões clonados dos "Amantes Felizes", por exemplo, beijando-se incessantemente de olhos brilhantes e bocas úmidas numa intolerável ausência de tédio ou cansaço.

Havia também os grupos adeptos do orgasmo total, herdeiros da utopia de William Reich (velho psicólogo esquecido), todos desfilando com seios, vaginas e pênis recriados para desempenho perfeito, arfando e se mordendo com gritos de tesão, correndo para os "motéis do povo". Eu via também as violentas legiões de neo- punks (para usar um nome antigo), legiões de sádicos e psicopatas liberados arrebentando caras e narizes de seus parceiros antitéticos, seus opostos, os Masoquistas Tolerantes , nostálgicos de humilhações e porradas. Eu via multidões das "Madames Prostitutas", felizes, tomando chá elegantemente, esperando os esquadrões de PFs, ("Professional Fuckers") que as violavam em brutais relações selvagens.

Havia também os "AA"s ("Artistas Artificiais"), trabalhando com os olhos faiscantes de talento programado, para abastecer o mercado com "best sellers" comandados por editores: "Este é o ano do realismo; agora a volta ao lirismo; agora, pornografia sangrenta; agora, nostalgia, esperança".

Tudo parecia harmônico e organizado, mas, reparei com espanto que, depois da passagem de cada legião, restava um silêncio aterrador e os grupos se paralisavam como bonecos sem engonço, robôs sem corda, animais domesticados para a dor e o riso, vermes inúteis sob as estrelas.

Aos poucos, meu terror foi aumentando. Fui descobrindo que a imensa dor, a infelicidade que me dilacerava o peito não tinha sido programada por ninguém era real, essa coisa remota. Eu estava só na cidade. Eu era um defeito de fabrica. Entendi que tinha uma missão: eu seria o anjo da morte, um herói em busca da "imperfeição salvadora" a única salvação para a humanidade.

E iniciei minha destruição criadora, minha guerra solitária em busca do passado real. Disfarçado de "andróide sádico" não causei suspeita alguma quando explodi o Mega Gene Center; depois, os "Spas" dos "Amantes Eternos", em seguida os "Motéis do Orgasmo Absoluto".

E hoje, depois de muitas vitórias, já vou mais longe. Carrego em minha maleta um detrito do passado, uma velha bomba atômica que dormiu por mais de cem anos no fundo do rancor de minha família. E ninguém sabe que, sob meu manto, guardo o retrato de meu antepassado e inspirador, Osama, o profeta.

A cidade vai desaparecer sob uma nuvem luminosa. Eu vou morrer também, feliz em meu martírio, pois sou o guerreiro do acaso, sou o santo que vai restituir a duvida, o vazio, o medo. Eu sou o alivio da insuportável perfeição. Sou o Salvador, mas ninguém sabe. Sou maravilhosamente ilógico. Nos tempos que correm, ninguém imagina que eu possa existir".

GOSTOSA


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ELIANE CANTANHÊDE

"Firmíssimo"

FOLHA DE SÃO PAULO - 04/08/09

BRASÍLIA - Como estava escrito nas estrelas, o fim do recesso e o reinício dos trabalhos do Senado providenciaram um triste espetáculo para a opinião pública. Mais um.
Antes, atos secretos. Agora, palavras explícitas. Atos e palavras mostrando o quanto o Senado se torna inútil, inchado de funcionários, caríssimo na sua distribuição de favores e agora palco de agressões e de revisão da história.
Sentado solenemente na presidência, José Sarney assistiu a parte da sessão, enquanto sua tropa de choque recuperava velhas histórias para distribuir agressões e insinuações aos que insistem na renúncia. Em vez de presidir uma instituição, preside uma guerra que tende a se transformar numa guerra de pizzas.
Renan Calheiros, que não tem muito a perder depois de meses de pressão, da renúncia melancólica e da volta pelas urnas, é não apenas o líder da reação para manter Sarney na presidência que já foi sua e lhe escapou pelas mãos. É também o autor do script "bateu, levou".
Aliás, ao lado de Fernando Collor, outro que também já passou por tudo isso e aproveitou a confusão para apresentar ao vivo e em cores a sua versão de que tudo o que gerou CPI, renúncia e caras-pintadas, 15 anos atrás, foi uma farsa "urdida nos subterrâneos".
Renan luta para sobreviver e se agarrar à importância que, em simbiose com Sarney, ainda tem no PMDB e nos caminhos do partido em 2010. Collor luta para renascer de fato e lavar sua biografia para além dos limites de Alagoas.
A novidade no quebra-quebra de ontem é que Pedro Simon, que sempre jogou a pá de cal em cargos e mandatos moribundos, desta vez não pôde brilhar sozinho. Enfrentou duras reações, atrapalhou-se mais de uma vez, cansou.
Cristovam Buarque no seu novo papel de acusador, Wellington Salgado se destacando como defensor, Mão Santa com ar de sono presidindo o final da sessão. Tudo surreal. E todos afundando juntos.

CLÁUDIO HUMBERTO

“A paz não adianta aqui”
JARBAS VASCONCELOS (PMDB-PE), DURANTE O BATE-BOCA DE ONTEM, NO SENADO FEDERAL

SARNEY PARTE HOJE PARA O ENFRENTAMENTO
O presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), deverá fazer, nesta terça-feira, mais um discurso sobre a crise política da Casa. Mas, desta vez, o tom será mais vigoroso, na sequência da estratégia de enfrentamento que o PMDB resolveu adotar. O comportamento dos senadores do partido ontem, em defesa de Sarney, arrancou do presidente Lula um comentário de admiração: “Isto é que é ter bancada”.
O MISTÉRIO DA...
No bate-boca com Pedro Simon (PMDB-RS), Renan Calheiros perguntou se o colega lembrava de uma empresa “Porto Sol”. Simon não respondeu.
... PORTO SOL
A Porto Sol seria uma empresa de empréstimos consignados de familiares muito próximos a Pedro Simon.
MAIOR FORÇA
Lula cancelou a viagem ao Maranhão de Roseana Sarney. Ele também nunca foi ao Maranhão do ex-governador cassado Jackson Lago (PDT).
FARÁ FALTA
Após carreira muito admirada na magistratura, o ministro Paulo Benjamin Fragoso Gallotti se aposentou ontem no Superior Tribunal de Justiça.
LULA PREMIA JADER E A IMPUNIDADE
Após autorizar o deputado Jader Barbalho (PMDB-PA) a transferir a concessão da sua TV RBA, atolada em dívidas, para uma nova empresa criada pela família, o presidente Lula vai presentear seu aliado, nesta terça, com autorização para digitalizar o sinal de transmissão da tevê. A regalia é reservada só a emissoras em dia com o Fisco, mas fonte da Receita estima o débito da emissora dele em mais de R$ 80 milhões.
EM CAMPANHA
Ex-ministro do Tribunal de Contas da União Marcos Villaça tem tudo para ser o próximo presidente da Academia Brasileira de Letras.
ÍNDIO QUER APITO
Os espanhóis estão de olho no trem-bala Rio-São Paulo, de R$ 34 bilhões. Em contrapartida, oferecem obras a empreiteiras brasileiras.
ALÍVIO PORTENHO
Por causa da gripe suína, a TAM cancelou 28 voos para a Argentina em julho. E a Gol reduziu em 30% sua frequência para Buenos Aires.
PORNO-GRÁFICA
Vencedora da licitação para fazer 150 milhões de cartões da raspadinha, cobrando 53% do valor estimado pela Caixa, o site da gráfica Minister, do Rio, divulga sua tecnologia de impressão sob o título “What porra is this?”
CULTO AO ÓDIO RACIAL
Fizeram um Congresso dos Negros e das Negras do Brasil, no Rio Grande do Sul. Escapariam da Lei Afonso Arinos os organizadores de um eventual Congresso dos Brancos e das Brancas do Brasil?
ALEA JACTA EST
O experiente senador Epitácio Cafeteira (PTB-MA), 85, lembrou ontem: colegas “terão julgamentos mais difíceis no Conselho de Ética que o presidente José Sarney”. Referia-se ao líder tucano Arthur Virgílio (AM).
AGRESSIVIDADE
Autor dos mais violentos discursos contra José Sarney, o líder tucano no Senado, Arthur Virgílio, achou ontem “muito agressiva” a postura surpreendente de colegas do PMDB em defesa do presidente da Casa.
EXPLICAÇÕES
Desembarca em Brasília esta semana o assessor de Segurança Nacional da Casa Branca, Jim Jones. Vem explicar a ampliação da presença militar norte-americana na América do Sul a partir da Colômbia.
CORRIDA AO INVESTIDOR
O Banco do Brasil se prepara para o cenário de juros baixos. Competirá com a poupança, que remunera 6,17% ao ano mais TR, reduzindo a taxa de administração dos fundos de renda fixa e a faixa de aplicação mínima.
EMBRAPA NA ÁFRICA
Recém-empossado presidente da Embrapa, estatal que é orgulho do Brasil, Pedro Arraes parte para inserir a empresa no cenário internacional. Vai desenvolver projetos em Angola e Moçambique.
PAÍS DO FUTURO
O chefe de operações da gigante de gás e petróleo espanhola Repsol, Miguel Martinez, chamou os investimentos de sua companhia no Brasil, através da subsidiária Gás Nacional, de o “futuro da empresa”.
NINGUÉM MERECE
No Piauí e no DF, 98,9% e 96,7% dos orçamentos do Judiciário, este ano, estão destinados à folha de pagamento. Já os serviços ao cidadão...

PODER SEM PUDOR
PEGADINHA DE PRESIDENTE
Eleito presidente, em 1994, FHC foi com a mulher, Ruth, passar uns dias no Pantanal, perto da fronteira com a Bolívia. A bordo de um barquinho, o casal avançou em território boliviano até encontrar um posto policial. Ele desceu e, só para experimentar o gostinho do cargo que iria ocupar, apresentou-se ao policial como o presidente eleito do Brasil, pedindo ao incrédulo homem transmitisse os seus cumprimentos ao presidente Sánchez de Lozada.
– Até hoje ele deve estar desconfiado que era mentira – diverte-se FHC.

TERÇA NOS JORNAIS

- Globo: Indústria brasileira tem a maior queda em 34 anos


- Estadão: Grupo de Sarney ameaça adversários com dossiês


- JB: Rio ganha R$ 296 milhões para saúde


- Valor: Juro menor reativa procura de financiamento no BNDES


- Jornal do Commercio: Estado tem primeira morte pela gripe