segunda-feira, fevereiro 22, 2010

BRASIL S/A

Dilma e o funcionalismo

Luciano Pires
Correio Braziliense - 22/02/2010

O próximo desafio é dar racionalidade aos sistemas, simplificar e qualificar os serviços ao cidadão, cobrar produtividade e estabelecer metas para os servidores

No discurso que fez durante o Congresso do PT que oficializou seu nome para a disputa das eleições presidenciais deste ano, a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, disse que a “missão” de suceder Luiz Inácio Lula da Silva não lhe foi repassada apenas pelo partido que a adotou como filha. Segundo a candidata, intelectuais, trabalhadores, movimentos sociais, empresários e tantas outras forças (visíveis ou não) a encorajam a subir no palanque. Com uma retórica impecável, Dilma fez questão de incluir nesse grupo também os servidores públicos.

Não era para menos. O funcionalismo recebeu tratamento pra lá de especial ao longo dos dois mandatos petistas. Sob Lula, os burocratas emergiram a uma nova condição dentro do complexo mundo do trabalho. De forma sistemática e generalizada todas as áreas da administração acabaram sendo contempladas. Houve pelo menos dois grandes pacotes de reajustes salariais, além de investimentos em infraestrutura e renovação de processos, mais contratações e uma política de reorganização importante que culminou com o resgate de funções de Estado antes esquecidas.

As repartições souberam retribuir à altura. Apesar da chiadeira desgastada de setores que acham que poderiam ter conseguido mais, as greves nem de longe incomodaram o Palácio do Planalto. Diferentemente de outras épocas, os sindicatos se alinharam de tal modo à agenda oficial que, no meio acadêmico, seus dirigentes são ironicamente chamados de neopelegos. A massa, formada, sobretudo, por funcionários do Executivo, está satisfeita. Sem medo de se arrepender, o servidor padrão dá seu voto de confiança à escolhida por Lula. Se esse voto será ou não computado na urna em outubro, essa é outra história.

Plano de voo

Na cabeça de Dilma, o trabalho pesado já foi feito por Lula. A melhoria dos contracheques e o reforço dos quadros tiveram papéis fundamentais na reconstrução da máquina. O próximo desafio é dar racionalidade aos sistemas, simplificar e qualificar os serviços ao cidadão, cobrar produtividade e estabelecer metas para os servidores. Dilma é obcecada por eficiência. “Alguns falam todos os dias de ‘inchaço da máquina estatal’”. Omitem, no entanto, que estamos contratando basicamente médicos e profissionais de saúde, professores e pessoal na área da educação, diplomatas, policiais federais e servidores para as áreas de segurança, controle e fiscalização”, justificou a ministra-candidata aos correligionários que abençoaram sua candidatura.

Um ex-ministro que guarda boas recordações de Dilma nos anos em que esteve na Esplanada traça um perfil da ministra. “Ela é objetiva. Diz exatamente o que quer, de que modo quer e em quanto tempo a tarefa deve ser entregue. Tem gente que se assusta com isso”, analisa. Em relação ao funcionalismo, o observador é claro: “Já deve estar tudo engatilhado”.

Se for eleita, Dilma diz que continuará valorizando o servidor e o serviço público. Tudo a seu modo, claro. A “reconstituição do Estado” preconizada por ela toda vez que compara ações deste a de outros governos, passa, necessariamente, pela melhoria do gasto com o funcionalismo. Daí a necessidade de uma reforma administrativa – grande frustração pessoal da ministra. “Deveríamos ter feito isso, mas não foi possível”, admitiu ela em um programa de TV no ano passado.

Heranças malditas

Por falta de proatividade política e, em outros casos, por pura omissão técnica, muita coisa ainda precisa ser feita. Como mostrou o Correio ontem, equilibrar a Previdência do funcionalismo é uma delas. Pagar aposentadorias e pensões a servidores dos três Poderes, incluindo os militares, tem sido uma tarefa cada vez mais custosa para o Estado. Em 2009, a União amargou deficit recorde de R$ 38,1 bilhões. Para este ano, o rombo saltará para R$ 43,4 bilhões. Gerenciar as despesas com inativos será um fantasma para o próximo presidente da República.

Isso porque os aumentos concedidos a todos que têm o governo federal como patrão definiram novos patamares para o sistema de previdência do servidor: em 2003, por exemplo, o montante destinado a ex-servidores foi de R$ 36,5 bilhões. No ano passado, o gasto explodiu, saltando para R$ 67 bilhões. O Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), também deficitário, paga 27 milhões de benefícios. O universo de aposentados e pensionistas da máquina federal é de 985.647.

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