quarta-feira, junho 10, 2020

Maquiagem de mortos foi tiro contra o próprio pé - JOSIAS DE SOUZA

UOL - 10/06


Quem observa a maneira como a área da Saúde passou a ser administrada imagina que os responsáveis pelo setor sofrem de insanidade. Isso é um engano. Eles não sofrem. Na verdade, encontram um certo prazer na insanidade. Só a loucura prazerosa pode explicar o surgimento da suposição de que seria possível maquiar a contagem dos mortos do coronavírus. O novo sistema não foi nem implantado e uma liminar do Supremo, expedida por Alexandre de Moraes, já ordenou o restabelecimento da sistemática de divulgação anterior.

Em encontro com parlamentares, o general Eduardo Pazuello, ministro interino da Saúde, referiu-se às mudanças como mero projeto. Conversa fiada. Se fosse mera cogitação, o modelo anterior não teria sido virado do avesso antes que a sociedade fosse informada sobre as mudanças pretendidas. Em reunião ministerial, o general afirmou que a planilha que apresenta a soma total de contaminados e de mortos não fornece informação digna para o povo brasileiro. Faltou definir dignidade.

Até a semana passada, o ministério fornecia diariamente a soma das mortes confirmadas no dia acrescidas dos óbitos ocorridos em dias anteriores e que dependiam de exames para confirmar o diagnóstico de covid-19. O que planejava fazer o governo? Divulgar apenas as mortes confirmadas nas últimas 24 horas, desconsiderando as pendências de dias anteriores. Além disso, retardou-se a divulgação dos dados de 19h para 22h, apenas para que a pilha de corpos sumisse dos telejornais no horário nobre.

O problema é que ocultar milhares de cadáveres não é tão simples como esconder Fabrício Queiroz. E a insanidade do esconde-esconde ofereceu material para a desmoralização do sistema oficial de estatísticas sobre o coronavírus e matéria-prima para que o Supremo atravessasse na traqueia de Bolsonaro mais uma derrota judicial. O presidente e seus auxiliares vão se especializando num esporte doloroso: o tiro contra o próprio pé.

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