terça-feira, maio 12, 2020

Secretária da sucata - EDITORIAL FOLHA DE SP

FOLHA DE SP - 12/05

Regina Duarte pode ter ganho sobrevida à custa da pacificação do setor cultural


O Brasil perdeu nas últimas semanas uma galeria de nomes ilustres da cultura nacional. Dos contistas Rubem Fonseca e Sérgio Sant’Anna aos compositores Moraes Moreira e Aldir Blanc, passando pelo artista plástico Abraham Palatinik.

Em nenhum momento autoridades do governo federal, a começar pela secretária de Cultura, Regina Duarte, demonstraram publicamente algum tipo de pesar —o que, infelizmente, não surpreende diante das constantes demonstrações de aversão ao conhecimento científico, às artes e à educação.

Dado que a riqueza cultural acumulada passou de “soft power” reconhecido internacionalmente a alvo de guerrilhas ideológicas, não se poderia esperar coisa diferente.

O obscurantismo nesse terreno desafia limites. A ocupação massiva dos órgãos do setor por uma malta de despreparados e fanáticos —teleguiados, não raro, pelo guru do ideário cultural bolsonarista, o escritor Olavo de Carvalho— parecia encontrar uma pausa na nomeação da atual secretária.

De fato, quando da escolha da atriz, chegou-se a imaginar que se avizinharia uma trégua. Foi, infelizmente, um engano.

A secretária, que já se notabilizara pela omissão e pela falta de capacidade para o exercício da função, deu uma passo a mais em entrevista que concedeu ao canal CNN Brasil. Na ocasião, uma descontrolada Regina Duarte desfiou uma série espantosa de sandices, que foi da nostalgia em relação ao ufanismo da ditadura militar ao desprezo pelas vidas —e não apenas as dos grandes nomes da cultura— que se perdem aos milhares com a pandemia do novo coronavírus.

À sua maneira e por outros caminhos, a secretária repetiu na TV a sinistra performance de seu antecessor, Roberto Alvim, que encenou um pastiche nazifascista para anunciar seus planos para o setor.

A permanência da atriz no cargo se afigura pouco promissora, embora nas cavernas do bolsonarismo suas palavras tenham encontrado eco e, quem sabe, lhe assegurado alguma sobrevida.

Nessa lógica de sinais trocados, em que o pior é visto como melhor, uma eventual substituição não daria lugar a nada de minimamente auspicioso, de todo modo.

Importa menos que a área tenha sido rebaixada ao segundo escalão do Executivo, abrigada na inexpressiva pasta do Turismo. Pior é observar o aparelhamento ideológico e a indigência do pensamento que emana das repartições culturais.

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