A lei trabalhista prevê que, para que exista vínculo de emprego, devem ser preenchidos, de forma concomitante, alguns requisitos: habitualidade, onerosidade, pessoalidade e subordinação. Quando preenchidos simultaneamente estes requisitos, estará configurado o vínculo de emprego.
No entanto, algumas decisões de juízes e Tribunais Regionais do Trabalho estão decidindo de outra forma em relação ao reconhecimento de vínculo, causando certa curiosidade e, principalmente, insegurança jurídica. É o caso do Tribunal Regional do Trabalho da 3.ª Região, com sede em Minas Gerais, que neste último mês de julho reconheceu o vínculo de emprego entre um motorista e a Uber.
Sabemos que o aplicativo Uber se estabeleceu no Brasil em 2014, sendo uma plataforma americana prestadora de serviços eletrônicos na área do transporte privado urbano, e mais conhecido popularmente como “carona remunerada”. O Brasil é o segundo maior mercado da Uber, perdendo apenas para os Estados Unidos.
Reconhecer o vínculo de emprego entre motorista e a plataforma de transporte privado é decisão desconexa com a realidade tecnológica atual
Em um país em que tem cerca de 13 milhões de desempregados, o aplicativo veio para auxiliar pessoas a terem uma renda extra, ou mesmo como alternativa de trabalho para aqueles que estão desempregados. Afinal, quem deseja ser motorista do Uber tem a liberdade de utilizar o aplicativo quando necessário, sem qualquer tipo de cobrança de horário a ser cumprido ou subordinação. Portanto, o motorista pode ter uma atividade principal, não necessariamente de motorista, e durante seu período de folga pode utilizar a atividade de motorista de Uber para um complemento de renda.
Em nosso entendimento, a decisão do Tribunal do Trabalho de Minas Gerais é equivocada, não podendo ser reconhecido o vínculo de emprego entre motorista e a empresa Uber, pois não se acham presentes de forma concomitante os requisitos do artigo 2.º da CLT. Não há pessoalidade, pois não há a exigência de que seja o próprio usuário que esteja conduzindo o veículo. Qualquer pessoa pode se fazer representar pelo usuário, basta apenas que o celular esteja no carro com o aplicativo ligado para realizar as corridas. Não há onerosidade, pois não existe uma remuneração para os condutores. Eles ganham de acordo com sua quantidade de corridas realizadas. Quanto mais corridas realizadas, maior será seu ganho, mas não há exigência de um mínimo de corridas diárias. Não há subordinação, já que o aplicativo do Uber pode ser utilizado como bem entender o motorista. Ele pode trabalhar o dia que quiser e aceitar ou não a corrida ofertada pelo aplicativo. E, por fim, não há habitualidade, pois o motorista utiliza o aplicativo toda vez que entende necessário. Portanto, pode optar por trabalhar uma hora, dez horas, um dia, uma semana etc.
Portanto, como se pode perceber, não estão preenchidos os requisitos necessários para que seja reconhecido o vínculo de emprego. Ainda que supostamente se consiga preencher um ou outro requisito, isso não basta para o reconhecimento do vínculo, eis que todos devem ser preenchidos de maneira concomitante.
Reconhecer o vínculo de emprego entre motorista e a plataforma de transporte privado é decisão desconexa com a realidade tecnológica atual. Afinal, se for reconhecido o vínculo nestes casos, as empresas seriam praticamente obrigadas a se retirar do Brasil, o que ocasionaria um prejuízo grande à população, sem falar no aumento do número de desempregados sem qualquer renda. Afora isso, os encargos e obrigações trabalhistas no Brasil são muito exagerados para o empregador, em comparação com o que ocorre no restante do mundo. A persistir mais este entendimento equivocado, a Justiça apenas ajudará a agravar a imagem já existente, de que no Brasil não é fácil ser empresário, com certeza afugentando muitos investimentos estrangeiros no país.
Bruno Gomes da Silva é advogado trabalhista.
Depois reclamam quando sugerem que seja extinta a justiça do trabalho!
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