sábado, junho 29, 2019

Guerra de titãs - ADRIANA FERNANDES

O Estado de S. Paulo - 29/06

A equipe econômica trabalha em um plano de corte de renúncias fiscais

O presidente Jair Bolsonaro deflagrou uma guerra de titãs ao antecipar, nas redes sociais, que o governo vai reduzir o Imposto de Importação (II) de produtos de tecnologia, como computadores, celulares e jogos eletrônicos.

A alíquota vai cair de 16% para 4% para fomentar a concorrência e a redução dos preços dos produtos fabricados no Brasil, avisou o presidente.

Extremamente sensível e polêmico, o tema vinha sendo tratado com extrema reserva pelo Ministério da Economia – para não atrapalhar as negociações para votar a reforma da Previdência antes do fim do recesso parlamentar.

Ao usar suas redes sociais para anunciar uma decisão que ainda não foi tomada oficialmente, o presidente acabou chamando para a briga, antecipadamente, toda a indústria nacional e a Zona Franca de Manaus – que fazem uma grande articulação para barrar essa política dentro e fora do Congresso.

Na segunda-feira, o próprio Bolsonaro recebeu, em agenda marcada de última hora e sem publicidade, o presidente da Superintendência da Zona Franca de Manaus, Alfredo Menezes, e o senador emedebista Eduardo Braga (AM).

A disputa com a equipe econômica se antecipara porque, na segunda-feira, o governo publicou uma portaria que altera o processo produtivo básico do terminal portátil de telefonia celular industrializado na Zona Franca.

Na conversa, o senador e o presidente da Suframa reclamaram a Bolsonaro que a norma (muito técnica e datada do dia 21) mexia com a fórmula de cálculo dos produtos importados no Brasil, atingindo em cheio não só a Zona Franca, mas também a indústria de outros Estados, como São Paulo, Paraná e Bahia.

O argumento dado ao presidente é o de que a mudança afeta uma indústria estabilizada e que gera 500 mil empregos no País. Eles cobraram de Bolsonaro um “freio de arrumação” e que ouça também o “outro lado”.

A equipe econômica defende a estratégia de abertura como um processo necessário para o crescimento do País. É ponto central da política do ministro da Economia, Paulo Guedes, de aumento da produtividade e competitividade do País.

Mas procurado oficialmente pela coluna, o time de Guedes não quis comentar o encontro com o setor – que ocorreu no mesmo dia, logo depois da reunião de Bolsonaro, em Brasília.

Bolsonaro ouviu as críticas e prometeu comandar a primeira reunião ordinária do Conselho de Administração da Zona Franca, marcada para o próximo dia 12. Foi um passo considerado importante para a abertura de diálogo.

A polêmica portaria é só mais um episódio das disputas entre a área econômica e a Zona Franca. O Ministério da Economia considerou um desastre a decisão recente do Supremo Tribunal Federal (STF) que ampliou os subsídios para a região em R$ 49,7 bilhões nos próximos cinco anos.

Em abril, o Supremo decidiu que as empresas de fora da Zona Franca, que compram insumos produzidos na região – portanto, isentos de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) – terão direito a contabilizar, como crédito tributário, como se o imposto tivesse sido pago. Fatura considerada inaceitável por Guedes e sua equipe em um momento de correção do déficit fiscal e corte de benefícios.

Como mostrou reportagem do Estado, a equipe econômica trabalha em um plano de corte de renúncias fiscais na tentativa de reduzir os subsídios em mais de um terço do montante atual.

A intenção é cortar o equivalente a 1,5% do PIB até o fim de 2022, ou cerca de R$ 102 bilhões em valores de hoje. Em 2018, o governo abriu mão de R$ 292,8 bilhões em receitas, ou 4,3% do PIB. É claro que a Zona Franca é um dos principais alvos desses cortes.

O embate de corte dos subsídios se soma à política de abertura comercial, à guerra dos concentrados de refrigerantes e à reforma tributária. A PEC de reformulação do sistema tributário, apresentada pelo líder do MDB, Baleia Rossi (SP), é mortal para a Zona Franca ao dar fim a todo tipo de incentivo – ponto fundamental da reforma. Essa briga vai longe e aponta uma guerra sangrenta no Congresso.

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