domingo, maio 05, 2019

Depois de jogos brilhantes contra gigantes, Ajax não é uma zebra - TOSTÃO

FOLHA DE SP - 05/05

Time de jovens resgata filosofia de jogo de Cruyff e alcança grandes resultados

O Ajax, uma equipe de jovens, considerado no início da ChampionsLeague um time médio, tem grande chance de ser finalista e pode ser campeão. Eliminou Real Madrid, Juventus e ganhou, fora de casa, na primeira partida contra o Tottenham.

O time holandês é uma grande surpresa ou o mundo do futebol desconhecia suas qualidades individuais e coletivas, por atuar em um campeonato menos importante? Depois de cinco partidas brilhantes contra grandes adversários, o Ajax não é uma zebra.

Em 1966, o Cruzeiro, também uma equipe jovem, venceu o Santos de Pelé por 6 a 2 e 3 a 2, e foi campeão da Taça Brasil. Não foi também uma zebra. Era apenas desconhecido fora de Minas Gerais. Na época, a elite do futebol brasileiro era apenas Rio e São Paulo. Hoje é diferente.

Ao ver o Ajax atuar, é inevitável não se lembrar do Barcelona dirigido por Guardiola. Obviamente, o time catalão era muito melhor, pois tinha Messi, Xavi, Iniesta e outros craques. Mas o estilo é parecido, de pressionar para ter a bola e trocar muitos passes, até a infiltração de alguém, para fazer o gol.

Provavelmente teremos Ajax e Barcelona na final. O Barcelona venceu por 3 a 0, mas o Liverpool foi melhor coletivamente. As diferenças foram Messi e o goleiro Ter Stegen. O Barcelona atual é bem diferente, na maneira de jogar, do da época de Guardiola. A equipe atual marca muito e usa bastante os rápidos contra-ataques. O técnico Valverde escalou Vidal no lugar de Arthur, para marcar os avanços do bom lateral-esquerdo Robertson.

Se der Ajax e Barcelona na final, Cruyff será lembrado e reverenciado. Ele, além de ter sido um dos maiores jogadores da história, foi tricampeão da Champions League como jogador pelo Ajax e campeão como técnico pelo Barcelona. Mais que isso, foi o grande mestre de Guardiola na formação de um time revolucionário.

Guardiola bebeu na fonte de Cruyff, que bebeu na de Rinus Michels, técnico campeão pelo Ajax e da seleção holandesa de 1974. São três mestres, ícones do futebol mundial. Há outros, como Zagallo. Os mestres não são somente os sábios. São os que têm também rigor técnico, são detalhistas, obsessivos.

Na terça-feira (30), o repórter Bruno Rodrigues, da Folha, mostrou que Cruyff, em 2010, quando era colunista de um jornal holandês, ficou indignado e fez duras críticas ao Ajax, na derrota por 2 a 0 para o Real Madrid, pela Champions League. A indignação não era pelo resultado, e sim pela postura defensiva do time holandês. O Ajax atual resgatou a filosofia de Cruyff.

Repito, todos os técnicos são pragmáticos, pois querem vencer. A diferença é que alguns pensam que a melhor maneira de ganhar é jogar bem, de uma maneira prazerosa, divertida e que valorize o espetáculo. Estes são poucos, os melhores, os que nos encantam, os que nos fazem arrepiar, sonhar, e os que ficam na história.

Se a final for entre Ajax e Barcelona, Cruyff estará na tribuna, sentado, representado pelo filho dele, ovacionado pelas duas torcidas. Gostaria de estar lá, para aplaudi-lo de pé.

CAMPEONATO BRASILEIRO
O Brasileiro está na terceira rodada, e já começaram as justificativas, os chavões, para explicar as derrotas e as escalações de tantos reservas, como o cansaço, o calendário, a falta de tempo dos técnicos e a falta de entrosamento quando há várias mudanças no time. Com isso, os técnicos escamoteiam seus defeitos e avacalham com o campeonato mais importante do país.

Tostão
Cronista esportivo, participou como jogador das Copas de 1966 e 1970. É formado em medicina

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