domingo, maio 12, 2019

A conta de Bolsonaro está chegando - ASCÂNIO SELEME

O GLOBO - 12/05

O governo está desarticulado e vai acabar perdendo mais do que seus antecessores na relação com o Congresso


Por simples teimosia , falta de visão e articulação política, o presidente Jair Bolsonaro apanha no Congresso Nacional como se estivesse em fim de mandato. Logo na largada demitiu aquele que melhor dialogava com a casa, o ex-ministro Gustavo Bebianno, atendendo a futricas do filho Carlos. Depois, demorou a recuar da sua decisão de não fazer concessões em torno de projetos que queria aprovar. E agora, não consegue sequer que parlamentares alinhados se entendam e aprendam a lidar com a política. E a votar a favor de suas propostas.

O que se viu na votação da comissão especial do Congresso que analisa a reforma administrativa foi um típico ajuste de contas, bem conhecido do Congresso, e sempre articulado pelos partidos de centro que buscam incessantemente espaços no poder para usar como trampolins políticos que os mantenham em cena. Analisando mais de perto os pontos aprovados e rejeitados pela comissão, dá para se entender como foi cuidadoso o trabalho fisiológico dos deputados do centrão com o apoio do PT.

1 - Tirar o Coaf do Ministério da Justiça e o devolver para o Ministério da Economia amputa uma dos braços do ministro Sergio Moro. Sem o Coaf, que controla todas as atividades financeiras do país, o xerife da corrupção perde a visão geral que teria automaticamente sobre a movimentação de fundos de pessoas, empresas, políticos ou partidos suspeitos. Quem ganha são a banda podre da política e o crime organizado (milícia, tráfico, contrabando etc). Foi o Coaf que identificou as movimentações vultosas de Fabrício Queiroz e, num passado mais remoto mas ainda vivo na memória nacional, escancarou o mensalão do PT.

2- A devolução da Funai da Agricultura para a Justiça, decidida pela mesma comissão, só tem um sentido: empilhar mais problemas na mesa de Moro. Não que a atribuição da questão indígena seja da Agricultura, não é. Mas, neste momento, o que parece ter movido 15 dos 24 deputados que votaram foi a vontade de atrapalhar, de tirar o foco do ministro que assumiu para si a tarefa de varrer a corrupção da vida pública.

3 - Foi tirada do Ministério da Economia e entregue ao Ministério da Ciência e Tecnologia a competência de formular a política do desenvolvimento industrial brasileiro. O que significa isso? Significa tirar de quem tem a missão de zelar pelo orçamento, enxugando gastos e cortando verbas desnecessárias, o poder de criar incentivos fiscais para setores industriais. Ou seja, num outro ministério fica mais fácil convencer alguém a abrir mão de receita, a conceder benefícios, a desembolsar dinheiro público, em última análise.

4 - Foram mantidos pela comissão os dois ministérios novos propostos pelo governo, o da Integração Nacional e o das Cidades. Claro, haverá mais cargos de ministros, secretários adjuntos, chefes de gabinetes e assessores, muitos assessores para serem ocupados. Além de descentralizar a alocação de verbas.

5 - O jabuti colocado em cima da frondosa árvore da reforma administrativa foi aprovado. Com ele, os auditores da receita são proibidos de investigar crimes que não tenham natureza fiscal. O auditor nada poderá fazer se identificar, por exemplo, um súbito e absurdo enriquecimento de um contribuinte qualquer, mesmo que desconheça a sua origem, se o imposto devido tiver sido recolhido. Com a decisão, indícios de corrupção e lavagem de dinheiro não poderão mais ser compartilhados pela Receita com o Ministério Público sem ordem judicial. Por quê? Quem ganha com isso? Desnecessário responder.

O governo está desarticulado e vai acabar, ao contrário do sonho de Bolsonaro, perdendo mais do que seus antecessores na relação com o Congresso. É de tal grandeza a bateção de cabeça da base no plenário, que o deputado Diego Garcia (Podemos - PR) conseguiu, numa questão de ordem, impedir a votação da proposta aprovada pela comissão. Votação que poderia inclusive derrubar o jabuti e as outras mudanças incluídas na proposta. A MP foi para o fim da fila e nenhum líder governista reagiu ou defendeu o deputado Rodrigo Maia que estabelecera a inversão da pauta, mas recuou ao ser chamado de desleal pelo deputado do Podemos. E o deputado apoia o governo Bolsonaro. Pode?

GOVERNO CIVIL

Como na guerra entre Olavo de Carvalho e os generais o presidente vem mostrando que prefere o guru aos seus outrora estimados milicos, já-já podemos voltar a ter um governo formado só por civis. O problema será o perfil dos civis que vierem a substituir os militares que saírem por não aguentar mais tanta aporrinhação. Serão do tipo Paulo Guedes, Osmar Terra e Sergio Moro ou da espécie de Damares Alves, Ernesto Araújo e Abraham Weintraub?

ARMA NO TRAVESSEIRO

Os que conhecem Bolsonaro na intimidade não se surpreenderam com o ponto do decreto de posse e porte de arma que permite menor de idade requentar clubes de tiro na companhia de um dos pais. Ele ensinou seus filhos a usar armas bem antes da maioridade dos meninos, quando era ilegal. Quem não o conhece bem tampouco deveria se surpreender com a medida, bastava puxar pela memória e lembrar da imagem do então candidato ensinando uma menina de menos de cinco anos a fazer com a mão o formato de um revólver, que virou símbolo da sua campanha. Sua fixação por armas é tão grande que ele dorme com um revólver na mesinha de cabeceira. Todas as noites. Mesmo no Palácio do Alvorada, um dos dois prédios mais vigiados e seguros do Brasil.

MILAGRE DE BOLSONARO

Nem o PSDB de São Paulo acreditou. Com a proposta de transferir o GP de F1 para o Rio, o presidente Bolsonaro conseguiu colocar novamente debaixo do mesmo guarda-chuva o governador João Doria e o prefeito Bruno Covas. Ambos contra o ele, obviamente.

IMUNIDADE X IMPUNIDADE

A decisão do Supremo Tribunal Federal de permitir que Assembleias Legislativas revoguem ordens de prisão de deputados estaduais criminosos transforma em impunidade o preceito constitucional da imunidade. Por vezes, algumas decisões do STF parecem desenhadas para desacreditar a Corte. No caso, foi necessário o presidente Dias Toffoli mudar seu voto, na quarta-feira, para que se pudesse efetivamente disparar mais um tiro no pé. Mas nada como um dia depois do outro, ou um tiro depois do outro. Na quinta, o STF julgou legal o indulto de Natal que o ex-presidente Michel Temer tentou conceder no ano passado e que reduz para um quinto a pena dos que cometeram crimes de lavagem de dinheiro, corrupção passiva, formação de quadrilha e outros que alcançam toda a turma da Lava-Jato. Com o indulto autorizado pelos senhores ministros, muita gente vai voltar mais cedo para casa.

ENTREOUVIDO POR AÍ

Conversa entre duas senhoras no Metrô do Rio.

A - Você viu como mandam esses filhos do Bolsonaro?

B - Se vi. Tem um que acha que é o presidente.

A - Sim. Aquele mais gordinho e mais careca.

B - Isso, o que tem cara de bolacha.

CAFÉ QUENTE

A turma mais chegada sabe que o ex-presidente Lula adora tomar café expresso bem quente. Sirva a ele um café frio e depois aguente as consequências. Quando ocupava o trono, quero dizer, a principal cadeira do Palácio do Planalto, o pessoal de apoio levava uma máquina de expresso em todas as viagens presidenciais. Foram compradas três máquinas italianas, grandes e profissionais, de modo que numa viagem com escalas sempre houvesse um café bem quente em todas as paradas. A equipe precursora levava as máquinas para poder instalá-las de maneira a estarem em ponto de ebulição na chegada de Lula. Houve viagens com quatro escalas, sobretudo em anos eleitorais. Nesses casos, a primeira máquina depois de cumprir sua missão embarcava em voo especial para a última parada de Lula.

LEGISLANDO COM IRA

A deputada estadual Rosane Félix (PSD) caiu de patinete no Rio, quebrou três dentes da frente e resolveu fazer uma lei regulamentando seu uso. Quer tornar obrigatório o uso do capacete na condução do veículo. Quem vai pagar pelos capacetes serão as empresas que exploram as patinetes. E como mantê-las nos equipamentos sem risco de roubo? A proposta, se aprovada, vai acabar inviabilizando o negócio. Um retrocesso na busca de alternativas ao consumo de combustível fóssil. Mas dá para entender a ira da deputada, dona de um dos sorrisos mais bonitos da casa.

DOS SILLAS

Numa entrevista concedida esta semana em Caracas, Juan Guaidó sentou-se em duas cadeiras de plástico, uma encaixada sobre a outra. Talvez o autoproclamado presidente da Venezuela quisesse parecer mais alto do que é, ou ficar num plano mais alto que os demais ocupantes da mesa.

AGENDA DA DIVERSIDADE

Vai acontecer, entre 19 e 23 de junho na Paróquia da Santíssima Trindade de São Paulo, o 1º Congresso de Igrejas e Comunidades LGBTI+. A paróquia pertence à Igreja Episcopal Anglicana do Brasil, pioneira na celebração de casamentos de pessoas do mesmo gênero, que realiza desde junho do ano passado.

É BIRRA?

Parece a você também ou é equívoco meu? Mas o presidente da Câmara não tem feito muito beicinho ultimamente?

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