quarta-feira, abril 24, 2019

Para ser um ótimo técnico, não basta ter conhecimento - TOSTÃO

FOLHA DE SP - 24/04

É necessário ter também sabedoria, enxergar os detalhes subjetivos e objetivos

Os estaduais, que não precisam acabar, mas que deveriam ser mais curtos, são como as novelas. Os capítulos são longos, repetitivos e tediosos, à espera do grande final, da festa emocionante. Parece até que, na média, as partidas foram excelentes.

Já o Brasileiro seria como os grandes romances. Ainda mais se for bem jogado. As belíssimas tramas perpassam todos os capítulos, sem depender do final, que pode ser emocionante ou apenas um complemento. Assim é também a vida. A existência é muito mais interessante que o fim, sem graça e sem escolha.
Abel Braga, técnico do Flamengo, na final do Campeonato Carioca contra o Vasco - Mauro Pimentel/AFP

Antes de começar o Brasileiro, continuam a Copa do Brasil e a Libertadores. O Flamengo tem grande chance de se classificar, mas, fora de casa, tem de ficar atento aos perigos que são LDU e Peñarol. O time, com todos os jogadores em boas condições, possui, do meio para frente, no mínimo, seis atletas bons e do mesmo nível (Bruno Henrique, Vitinho, Arrascaeta, Gabigol, Diego e Éverton Ribeiro). Dois ficam na reserva, já que Abel está cada dia mais convencido de que o volante Willian Arão não pode sair do time, como muitos pedem. Sempre quando o time perder, dirão que faltou o jogador que estava na reserva.

A equipe precisa ter, no mínimo, um armador. Possui dois, Diego e Éverton Ribeiro. Se Diego ficar na reserva, Éverton Ribeiro deveria jogar pelo meio, como fez no primeiro jogo contra o Vasco. Arrascaeta é um meia-atacante. Bruno Henrique é o que tem se destacado mais. Ele e Gabigol podem jogar pelo centro ou pelo lado. Já Arrascaeta se dá bem quando atua pela esquerda. Abel Braga tem variado e posicionado bem os jogadores.

Arão é um volante que marca e chega rapidamente ao ataque, para finalizar, além de ser bom nas jogadas aéreas, de bolas paradas. Assim jogou Paulinho, na seleção, e atua Elias, no Atlético. Arão é um volante sem talento para chegar à frente trocando passes, como um bom meia.

Mano Menezes passa a ter um problema parecido com o de Abel, escalar juntos Thiago Neves e Rodriguinho. Fez isso no momento certo, quando o Atlético vencia por 1 a 0. Saiu o volante Romero. Mas não foi por isso que saiu o gol de empate, e sim pela belíssima jogada individual de Pedro Rocha. Logo que empatou, Mano voltou aos dois volantes, com a entrada de Lucas Silva no lugar de Rodriguinho.

É querer demais que o precavido e seguro Mano Menezes escale habitualmente, desde o início, Rodriguinho e Thiago Neves. Se isso acontecer, o técnico vai se olhar no espelho e dizer: "Não acredito que você fez isso".

Se o técnico do Cruzeiro ou o do Flamengo fossem Guardiola, certamente escalariam um volante e dois meias, como faz o Manchester City. Mas, para isso, teriam de mudar outros parâmetros estratégicos, o que não é comum nos times brasileiros.

Outro técnico que substituiu bem, no momento certo, foi Carille, na decisão paulista, ao colocar Vagner Love, muito mais para ser um segundo atacante do que para jogar aberto, como fazia Pedrinho. O gol do Corinthians foi belíssimo, pelo passe preciso de Sornoza e pela conclusão de Love. Carille não é um iluminado, é muito bom treinador.

Para ser um ótimo técnico, não basta ter informação, conhecimento. É necessário ter também sabedoria, enxergar os detalhes subjetivos e objetivos, além de fazer com os jogadores executem bem o que foi planejado. A sabedoria não está nas escolas, nos livros, mas, sem os livros, não existe sabedoria.

Tostão
Cronista esportivo, participou como jogador das Copas de 1966 e 1970. É formado em medicina.

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