domingo, janeiro 28, 2018

Esperança - UGO GIORGETTI

ESTADÃO - 28/01

Os torcedores me deram a certeza de que a Portuguesa poderá ser reerguer


Sou, confessadamente, um fascinado pela Portuguesa de Desportos. Não um torcedor. Se fosse um torcedor, tudo seria mais facilmente explicado. Como não sou, minha ligação com esse clube só é explicável pela coincidência da minha vida com a dele. Quero dizer que sou contemporâneo de uma Portuguesa recuada no tempo, de uma equipe que metia medo em todos os outros grandes e frequentemente os goleava com seus poucos torcedores e seus muitos craques.

No começo dos anos 1950 a Portuguesa tinha 8 de seus jogadores convocados para compor a seleção paulista; em 1952 tinha 4 jogadores na seleção que venceu o primeiro título internacional ganho pelo Brasil, o Panamericano do Chile; em 1954 a Portuguesa tinha 3 titulares da seleção brasileira que disputou a Copa na Suíça.

Houve outros feitos importantes da Portuguesa que acompanhei no decorrer dos anos. Depois a decadência que todos conhecemos e que parece não ter fim. Ou por outra, teve fim, e do modo mais triste. Hoje nem sei mais em que categoria ou competição joga a Portuguesa, nem sei mais a situação do clube. Aliás, ninguém sabe e isso é o pior. Desceu sobre a Portuguesa a fatalidade do esquecimento. Ela saiu do mapa. Nem há mais lamentações pelo que ela foi, nem qualquer preocupação com o que será. A Portuguesa não é mais notícia, isso é tudo.

Mas eis que estava eu preguiçosamente diante da TV quando num jogo dessa Copa São Paulo, a Copinha, surge diante de mim, como uma visão do passado, o glorioso uniforme da Portuguesa. O esquecido time disputava a Copinha, o que me fez imediatamente passar a prestar atenção no torneio. Para minha satisfação a Portuguesa, justificando sua tradição de vencedora por duas vezes do torneio, teve atuações muito dignas sendo só eliminada pelo Flamengo, que acabou campeão.

Ver a Portuguesa de volta a um torneio importante já me deu satisfação, mas o acontecimento maior, espantoso, não foi o time, foi a torcida. Sim, há torcida da Portuguesa. Estavam lá os Leões da Fabulosa, não excessivamente numerosos como sempre, mas animados, com faixas, charanga e tudo. Por essa eu não esperava. Não podia supor que o time do qual não se fala mais, arremessado para a periferia do futebol, do qual só chegam más notícias, quando chegam, pudesse contar com torcedores tão fiéis.

Fiquei olhando estarrecido, procurando decifrar quem pudesse ser aquela gente. E isso só aumentou meu assombro. Pelas várias vezes que a câmera enquadrou a torcida, e não foram poucas, percebi que aquele entusiasmo não provinha de uma torcida de velhos, de gente que se lembrava de coisas de 60 anos atrás. A torcida ali presente era composta de jovens que, tenho certeza, jamais viram a grande Portuguesa em campo.

A última destacada atuação da Portuguesa na Série A do Campeonato Brasileiro foi, acho, que em 1997, quando disputou a final com o Grêmio e ganhou no Pacaembu, mas perdeu em Porto Alegre – e o Grêmio ficou com o título pelo saldo. Lá se vão 20 anos ou pouco mais, uma geração. Não acho que muitos daqueles jovens que estavam no Pacaembu e no Canindé torcendo nessa Copinha se lembram claramente daquela Portuguesa de 1997, da qual aparentemente só resta o Zé Roberto que acaba de encerrar a carreira.

Ao contrário, a maioria daqueles jovens torcedores só testemunhou o pior, a queda livre, o abismo. E, no entanto, lá estavam. Se nunca tive muita certeza que a Portuguesa pudesse ter chance de se reerguer, agora tenho. Aquele grupo de torcedores enlouquecidos de esperança, com sua dignidade e raça, me convenceu que é possível. Não sei o que os move. Isso faz parte dos mistérios do futebol. Mas é admirável.

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