sábado, outubro 07, 2017

INIMIGOS PÚBLICOS Nº 1, 2, 3, 4, ... - PERCIVAL PUGGINA

Percival.org - 07/10

Todos os 210 milhões de brasileiros têm consciência de que sua vida pende do fio da casualidade. Basta estar no lugar errado na hora errada. Esta independe do que diga o relógio, aquele pode ser qualquer um. No entanto, parece passar despercebido o fato de que a totalidade dos quase 60 mil homicídios nacionais foram praticados por criminosos fora das grades, soltos nas nossas ruas. As prisões estão lotadas e os homicidas em liberdade matam nessa proporção!

Aliás, se somarmos os homicídios cometidos por ano em toda a Europa, mais Rússia, China, Estados Unidos, Canadá, Austrália, Nova Zelândia e acrescentarmos ainda alguns países do Oriente Médio, não se chega aos 59.080 homicídios intencionais ocorridos no Brasil em 2015, último ano com resultados consolidados pelo IPEA no Atlas da Violência 2017. É o maior número entre os países do globo! O terrorismo mata muito menos que a criminalidade nacional, a mais homicida do planeta.

Por outro lado, relatório da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) divulgado em 2016 informou que 7,9% das pessoas entrevistadas no Brasil pela pesquisa Better Life Initiative reportaram terem sido vítimas de assalto nos 12 meses anteriores. Essa taxa é o dobro da média dos países pesquisados e sugere um número de ocorrências contra o patrimônio da ordem de vários milhões anuais. E ainda aparece gente para sustentar que temos presos em excesso! O que há no Brasil é um número inacreditável e intolerável de bandidos de todas as "especialidades" que precisam ser capturados, julgados, encarcerados e permanecerem presos até o cumprimento total de suas penas, para o bem da sociedade.

Estou falando dos inimigos públicos que atuam diretamente contra a vida e o patrimônio alheios. Mas a lista dos adversários da nossa segurança precisa acrescentar:

• os desencarceramentistas, para os quais, se a cadeia não reeduca, então deve abrir as portas;

• os bandidólatras (no dizer do excelente livro Bandidolatria e Democídio), para os quais os bandidos são agentes de transformação social e vítimas da sociedade, indivíduos dos quais não se poderia exigir outra conduta;

• os garantistas instalados no Poder Judiciário e em outras instituições e órgãos do Estado, que não se sentem comprometidos com a segurança da população, dado não ser sua função evitar que crimes ocorram, o que os faz moralmente responsáveis por muitos que poderiam ser cautelarmente evitados;

• os inimigos da redução da maioridade penal, que lacrimejam ante a simples possibilidade de que um brutamontes de 17 anos, estuprador e assassino, não seja tratado com as benevolências devidas a um reeducando em instituição socioeducativa;

• os defensores do desarmamento, manipuladores de estatísticas, maus leitores dos bons exemplos internacionais, acocorados no mundo da lua, exclamando que a terra é azul;

• os políticos alinhados ou influenciados por uma ou por todas essas correntes, que para nosso azar abandonaram o sistema penitenciário e a lei penal à própria sorte, criando o caos que serve esplendidamente aos criminosos;

• os defensores dos direitos humanos dos bandidos, sempre alertas para protegê-los ou a pranteá-los com enlevos e aconchegos maternais, jamais interessados nas inocentes vítimas de sua cupidez, violência e perversões;

• os inimigos ideológicos da atividade policial e da necessária repressão ao crime, corregedores avulsos de cada operação policial, responsáveis por muitas mortes de agentes da lei cujo gatilho tardou em ser acionado com receio da repercussão.

Todos, a seu modo, desservem à sociedade e ampliam, direta ou indiretamente, a insegurança de nosso cotidiano.

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* Percival Puggina (72), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil. integrante do grupo Pensar+.

Rumo aos 100% - J.R. GUZZO

REVISTA VEJA

A situação política e pessoal do ex-presidente Lula está cada vez mais parecida com o entulho que sobrou de um prédio em demolição, à espera do caminhão-caçamba que vem buscar os detritos. Sua defesa nos processos penais a que responde tornou-se uma humilhação — com documentos datados em 31 de junho ou 31 de novembro, a responsabilidade de tudo jogada o tempo todo sobre a mulher morta e as suas razões reduzidas a uma afirmação só: “Eu não sabia”. Ficou oito anos seguidos na Presidência da República, mas nunca soube de nenhum crime de corrupção, nem um só, entre centenas que foram praticados e já confessados por gente de seu governo. A carta aberta de seu homem de confiança, Antonio Palocci, é feia como uma fratura exposta. Achou que a população, organizada pelos “movimentos sociais”, iria em massa para as ruas e impediria a Justiça de expedir uma sentença de condenação contra ele. Não aconteceu nada. É como se tivesse olhado em volta de si para dar a voz de comando — e não havia ninguém para comandar.

Entraram para sempre na sua biografia, no papel de aliados íntimos, criminosos como Sérgio Cabral, Joesley Batista, Marcelo Odebrecht, Geddel Vieira Lima, Eduardo Cunha, Antonio Palocci, todos na cadeia — isso sem contar a diretorzada da Petrobras que anda com tornozeleira para não fugir da prisão domiciliar. Vive cercado de advogados criminais, puxa-sacos e gente que não manda mais em nada. Não consegue fazer alianças com ninguém. Não tem ministérios para oferecer em troca de apoio. Não manda mais na Petrobras, não pode encomendar sondas para a extração de petróleo nem prestar serviços a empreiteiras de obras públicas. Não pode mandar o BNDES e os fundos de pensão das estatais dar dinheiro à JBS e a outras empresas amigas, ou amigas das amigas. Em suma: a vida está dura e com viés de ficar pior. O máximo que se consegue fazer por Lula no momento, ao que parece, são pesquisas de intenção de voto para a Presidência da República. O número de eleitores que pretendem votar nele nas eleições de 2018 vai aumentando à medida que sua situação na Justiça se complica; quanto mais cartas de Palocci e recibos com datas inexistentes aparecem, mais votos ele tem nas sondagens. Ao ritmo atual, deverá estar chegando perto dos 100% do total na véspera de sua próxima sentença.

A ideia, pelo que dá para entender, é fazer com que a Justiça, diante da prodigiosa quantidade de votos para Lula que os institutos anunciam, fique com medo de alguma “convulsão social” etc., anule sua condenação atual e outras que vierem — ou, então, troque de repente o baralho e decida que ele pode ser candidato à Presidência mesmo estando condenado. Não está claro se esse é um caminho promissor. Pesquisas de opinião não costumam mudar sentenças judiciais, mesmo na Justiça brasileira. O número de votos que dão a Lula também não aparece na rua — até agora, tudo o que o seu sistema de apoio conseguiu produzir em termos de manifestação popular foi o costumeiro ajuntamento de meia dúzia de ônibus fretados, militantes profissionais e distribuição de lanches ou camisetas vermelhas. É pouco, para a revolução que pretendem fazer. Parece ter havido um grande engano na coisa toda. Lula achou que o povo ficaria indignado com sua condenação, ou possível prisão. Mas o povo em geral não fica indignado com prisão nenhuma, muito menos com a prisão de um magnata como ele — que caiu na descrição genérica de “político ladrão” aplicada pela população brasileira a nove entre dez políticos deste país. É o contrário: o povo gosta quando algum peixe gordo vai preso. Fica indignado, isso sim, quando qualquer deles é solto.

Também parecem pouco promissoras, em termos de resultados práticos, as pesquisas segundo as quais a “popularidade” do juiz Sergio Moro “está caindo” ou que afirmam que ele seria “derrotado” por Lula num segundo turno das eleições de 2018. Mas Moro não está participando de um concurso de Mr. Simpatia; também não vai, menos ainda, disputar nenhuma eleição contra Lula. De que adianta dizer isso? Não dá para esperar deste pesqueiro os mesmos resultados que se esperam das pesquisas de “intenção de voto”. Aqui é a vida real. Vai sair uma sentença no tribunal regional que julga os recursos de Lula contra sua condenação; vão sair outras sentenças. E, se o ex­-presidente acabar condenado em definitivo, o “juizinho do interior”, formado na faculdade de direito de Maringá, vai ser considerado um dos maiores heróis que o Brasil já teve, digam o que disserem as pesquisas. É a vida.


COLUNA DE CLAUDIO HUMBERTO

TEMER AGUARDA MINISTRO PARA DECIDIR EXTRADIÇÃO

O presidente Michel Temer aguarda que o ministro Torquato Jardim (Justiça) leva a ele o pedido do governo da Itália para revisão do “asilo político” concedido ao terrorista italiano Cesare Battisti, decretando sua extradição. Temer informou à coluna que ainda não decidiu. Como constitucionalista, é um especialista no tema. Battisti foi condenado duas vezes à prisão perpétua, em seu País, por quatro assassinatos.

O NOME É OUTRO
Até por desinformação, Battisti é chamado de “ativista” na imprensa brasileira. Mas é terrorista com sentença transitada em julgado.

DR. TERRORISTA?
Tem gente estranhando que, preso, Battisti estava “em cela comum”. É bandido comum, foi acusado de crimes como assalto e até estupro.

LOROTA
A Itália contratou o criminalista Nabor Bulhões para atuar na extradição, junto ao STF, mas Lula deu ao foragido status de “perseguido político”.

JUSTIÇA DE OLHO
O MP obteve na 20ª Vara Federal de Brasília a anulação do absurdo “asilo político” de Battisti, mas liminar do TRF1 suspendeu a extradição.

BRASIL PEDIU PRIMEIRO O FIM DAS ARMAS NUCLEARES
Acordando com as galinhas, bem cedo, o presidente Michel Temer comemorou solitariamente ontem, pelas 6h, o anúncio do Prêmio Nobel da Paz de 2017 para a Campanha Internacional para a Abolição das Armas Nucleares. É que o Brasil ajudou na escolha: sintonizado com a campanha, ele fez questão de ser o primeiro chefe de Estado a assinar na ONU, dia 20 passado, o Tratado de Proibição de Armas Nucleares.

SURFANDO NA ONDA
Ainda muito cedo, Temer decidiu que gravaria um vídeo saudando o Nobel da Paz para reafirmar o compromisso do Brasil com a causa.

BRASIL PRESENTE
A adesão ao Tratado de Proibição de Armas Nucleares é orgulho da diplomacia brasileira, que teve papel fundamental na sua negociação.

ITAMARATY DEU SHOW
Ao menos dez diplomatas brasileiros estiveram na costura do Tratado, como o ex-chanceler Mauro Vieira, chefe da Missão do Brasil na ONU.

CELULARES BLINDADOS
O ministro Marco Aurélio autorizou a PF a mandar para os Estados Unidos celulares apreendidos de familiares do senador Aécio Neves (PSDB-MG), na tentativa de descobrir as respectivas senhas. Os aparelhos inexpugnáveis são vários iPhones e um Morotorola.

PELO AFASTAMENTO
O senador Pedro Chaves (PSC-MS) diz haver pressão muito grande para que o Senado inocente o tucano Aécio Neves. Para ele, o afastamento determinado pelo STF deve ser mantido no Senado.

SIMPATIA É QUASE AMOR
Filiado ao PMDB, o ministro Marx Beltrão (Turismo) confirmou que fica no partido, mas ainda flertando abertamente com o PSDB do prefeito de Maceió, Rui Palmeira, maior ameaça ao clã Calheiros, em 2018.

MERRECA
Apesar de ter dito à IstoÉ que o fundo de bolsas para novos candidatos ao legislativo em 2018 “não tem agenda política”, o empresário Eduardo Mufarej promete gastar só entre R$5 e R$8 mil por candidato.

NA GAVETA HÁ 11 ANOS
Está na pauta da Câmara um pedido de urgência para o projeto que obriga os circos a se registrar no governo federal, incluindo o emprego de animais selvagens. A “urgência” aguarda votação desde 2006.

MAPA DO ATRASO
Sobrinho de Luiz Gastão de Orleans e Bragança, que seria o imperador se o Brasil fosse uma monarquia, Luiz Philippe de Orleans e Bragança, empresário e presidente do movimento Acorda Brasil, lançou ontem, em São Paulo, seu livro “Por que o Brasil é um país atrasado”.

REGRA DE OURO QUEBRADA
Segundo consultorias de orçamento da Câmara e do Senado, as operações de crédito previstas na proposta de orçamento 2018 estão R$62,8 bilhões acima das despesas de capital. A dívida vai crescer.

ÁREA DE ATUAÇÃO
Em homenagem ao Dia do Aviador e ao Dia da Força Aérea Brasileira (FAB), em 23 de outubro, a FAB promove exposição que esclarece sua responsabilidade sobre área de 22 milhões de Km2.

PENSANDO BEM...
...ontem foi Dia do prefeito. Parece que ninguém comemorou.

Mercosul: mais comércio, menos barreiras - ALOYSIO NUNES FERREIRA

ESTADÃO - 07/10

O momento atual do bloco é de coincidência de objetivos entre os países fundadores


Graças à nova convergência de visões entre os sócios-fundadores, o Mercosul passa por uma refundação. Um de seus aspectos notáveis é a derrubada de barreiras que travam o comércio dentro do bloco e impedem o acesso de nossos produtos a outros mercados do planeta. Essa remodelação pretende transformar a América do Sul numa ampla área de livre-comércio.

Hoje já há resultados concretos para apresentar. Cito quatro exemplos.

Primeiro, num exercício conjunto inédito, por meio do Plano de Ação para o Fortalecimento do Mercosul Comercial e Econômico, os países do bloco identificaram 78 entraves internos. Desse total, 57 (ou 73%) já foram derrubados e receberam tratamento satisfatório no último ano. Entre as principais medidas já superadas estão as restrições na importação pelo Brasil de cítricos argentinos e o anúncio do país vizinho à reabertura de seu mercado para a carne bovina brasileira.

Quero, durante a presidência pro tempore, dar continuidade ao tratamento das 21 medidas remanescentes. O caminho trilhado, agora, está na contramão do passado recente, em que obstáculos ao comércio eram criados e se acumulavam, sem nenhum tipo de encaminhamento satisfatório.

Em segundo lugar, o Brasil tem trabalhado para adotar mecanismos que evitem o surgimento de novas barreiras. Para isso, foi apresentado neste ano um conjunto de propostas para dar agilidade às questões regulatórias, de forma a impedir que regulamentos técnicos, sanitários e fitossanitários sejam pretextos para dificultar o comércio.

Um passo importante é concluir a modernização dos processos e da norma que dispõe sobre a elaboração e revisão de regulamentos do bloco. Para tanto, o Brasil propôs um projeto sobre Iniciativas Facilitadoras de Comércio do Mercosul. Essas ações constituem medidas complementares de cunho voluntário, cooperativo, flexível e interinstitucional em matéria regulatória. A próxima etapa será a de promover discussões sobre um protocolo acerca da coerência e boas práticas regulatórias dentro do Mercosul.

Um terceiro exemplo é a plena retomada da agenda de negociações externas. Há dez anos atrasadas, as negociações foram contaminadas por considerações de cunho ideológico. Neste momento, estou fortemente empenhado, junto com os demais chanceleres das nações fundadoras, em concluir um acordo com a União Europeia, em aprofundar os laços com a Aliança do Pacífico e em avançar em novas frentes negociadoras com países desenvolvidos e em desenvolvimento de diferentes regiões do planeta. Isso ajudará a aumentar a produtividade da economia brasileira e trará novas oportunidades de acesso a outros mercados.

Vale lembrar que, graças aos acordos celebrados pelo bloco com outros países vizinhos, a América do Sul se tornará até 2019, como mencionei anteriormente, uma ampla área de livre-comércio, com a supressão de praticamente a totalidade das barreiras tarifárias à entrada de nossos produtos nos mercados da região. Em julho, o Mercosul assinou novo acordo com a Colômbia para ampliar a liberalização do comércio de 84% para 97% da pauta tarifária. A presidência brasileira pro tempore trabalha atualmente por um novo entendimento com o México, o único país da Aliança do Pacífico com o qual ainda não há acordo de livre-comércio.

O quarto exemplo é o resgate de temas da agenda original do bloco que estavam paralisados. Em abril deste ano foi assinado o Protocolo de Cooperação e Facilitação de Investimentos, que propicia aos investidores nos demais países do Mercosul garantias legais de que seus investimentos terão o mesmo tratamento dispensado aos investidores nacionais.

Também foram retomadas as negociações do Protocolo de Contratações Públicas, que deve ser concluído até o fim de 2017 e contribuirá para criar mais oportunidades de negócio para as empresas de nossos países. No âmbito do protocolo, cada país integrante do Mercosul propõe o escopo da sua abertura de mercado, as entidades públicas que participarão do arranjo e os bens e serviços eventualmente excluídos, iniciativa inédita no âmbito do bloco. Para 2018 está prevista, por sua vez, a conclusão de mecanismo de proteção mútua de indicações geográficas.

Na pauta. Há outras matérias relevantes para a integração econômico-comercial que, na avaliação da presidência brasileira, devem ser retomadas: o debate sobre comércio eletrônico (que não ocorre desde 2010); nova rodada negociadora do comércio de serviços (que não ocorre desde 2009); a negociação de um acordo sobre a proteção recíproca de indicações geográficas; a reativação da comissão de micro, pequenas e médias empresas; e ações na área de defesa do consumidor, como a elaboração de um Código do Consumidor do Mercosul.

Todas essas matérias, relegadas a um segundo plano no passado recente, trarão, no curto e no médio prazos, resultados positivos para os cidadãos e agentes econômicos dos países-membros do bloco.

O momento atual do bloco é de coincidência de objetivos entre os países fundadores, permitindo que todos os temas sejam tratados sem tabus nem preconceitos, respeitando as posições e os limites de cada país, mas sempre em busca de um objetivo comum: o avanço do Mercosul. É nesse sentido que o Brasil não se furtará a abordar com seus sócios-fundadores questões estruturais, como a plena inclusão dos setores automotivo e açucareiro nas disciplinas do bloco. Com a continuidade dos esforços, o bloco seguramente retomará seu papel preponderante nas estratégias nacionais de desenvolvimento econômico e inserção internacional.

O Mercosul tem sido, e continuará a ser, formidável instrumento para a defesa da democracia, da estabilidade política e do progresso de nossa região.

*MINISTRO DAS RELAÇÕES EXTERIORES, É SENADOR LICENCIADO PELO PSDB (SP)

A pífia reforma política - EDITORIAL O ESTADÃO

ESTADÃO - 07/10

O Congresso brasileiro perdeu mais uma oportunidade de promover uma verdadeira e necessária reforma política


O Congresso perdeu mais uma oportunidade de promover uma verdadeira e necessária reforma política. Até mesmo as duas medidas positivas aprovadas perderam, em sua redação final, boa parte de sua capacidade moralizadora. O fim das coligações nas eleições proporcionais só começará a valer em 2020 e a cláusula de desempenho para os partidos políticos foi seriamente mitigada. Muitas legendas nanicas, com pouquíssima representação, continuarão a gozar das benesses do Estado.

Essas duas medidas são o que pode ser qualificado de positivo nas alterações das regras eleitorais feitas pelo Congresso. O restante é claramente negativo. Sem qualquer pudor, Senado e Câmara aprovaram a criação de um fundo com dinheiro público para financiar as campanhas políticas. Tamanha foi a pressa em aprovar a medida absolutamente imoral – que desvirtua o princípio básico de que é a sociedade, e não o Estado, que deve bancar as causas políticas – que ninguém sabe ao certo quanto de dinheiro do contribuinte será repassado aos partidos com o novo fundo. Fala-se em R$ 2 bilhões, mas o valor pode ser maior.

É um disparate aprovar a destinação de dinheiro público a campanhas políticas, especialmente quando o governo precisa passar por sério ajuste fiscal. Há, no caso, uma clara falta de sintonia entre os Poderes. O Executivo tenta cortar os gastos públicos – tarefa especialmente difícil na atual organização do Estado, com inúmeras vinculações de despesas – e o Legislativo, como se os recursos públicos fossem infinitos, aprova um novo fundo para as campanhas eleitorais.

Vislumbram-se no caso, uma vez mais, os efeitos deletérios da atuação de Rodrigo Janot. Tivesse contido suas idiossincrasias e deixado de apresentar uma denúncia inepta contra o presidente Michel Temer, o ex-procurador-geral da República não teria privado o governo federal das condições políticas mínimas para realizar o necessário veto ao novo fundo de financiamento de campanha. É mais uma evidência de como é difícil melhorar a política e as instituições quando as autoridades não cumprem responsavelmente suas funções.

No quesito descumprimento das responsabilidades institucionais, alguns parlamentares se sobressaíram. Por exemplo, o deputado Áureo (SD/RJ) apresentou uma emenda para instituir a censura na internet, permitindo a remoção de conteúdos sem a necessidade de autorização judicial. Para tanto, bastaria uma denúncia sobre o suposto caráter ofensivo de determinada publicação na internet.

E o pior é que a emenda do deputado Áureo foi aprovada pela Câmara. Diante da forte reação contra a esdrúxula medida, até o deputado recuou de sua proposta. Segundo o Palácio do Planalto, o deputado solicitou ao presidente Michel Temer que vete o mecanismo de censura.

Outra imoralidade aprovada pelo Congresso foi a concessão de uma ampla anistia para as multas aplicadas aos partidos políticos. A nova regra estabelece que a legenda não poderá pagar por mês um valor maior do que o correspondente a 2% do repasse mensal do Fundo Partidário. Consagra-se, assim, a impunidade. Os maiores equívocos podem ser cometidos, mas as legendas terão a garantia de que as multas não afetarão suas finanças.

Para completar o conjunto de bizarrices, o Senado tentou de última hora eliminar o teto para o autofinanciamento das campanhas eleitorais. A existência de um limite máximo de dinheiro do próprio bolso do candidato para financiar sua campanha é medida elementar para um mínimo de equilíbrio nas eleições. A proposta inicial previa um teto de 7% dos gastos da campanha para deputado e de R$ 200 mil para cargos majoritários. No entanto, o Senado eliminou o artigo sobre o autofinanciamento do texto final aprovado, para que não houvesse qualquer limite. A manobra teve, no entanto, resultado oposto: valerá para todos, seja candidato ou não, a regra geral que limita a doação a 10 salários mínimos.

Essa atuação destrambelhada do Congresso manifesta o descompasso de boa parte dos parlamentares com as reais necessidades do País. Agora, é torcer para que o eleitor se dê conta em 2018 de que precisa de outros representantes. Com a turma atual, já é uma baita sorte quando as coisas não pioram demasiadamente.

Capitalismo, Angry Birds e multiplicação de riquezas - GUSTAVO REICHENBACH

GAZETA DO POVO - PR - 07/10

Capitalismo, Angry Birds e multiplicação de riquezas
A ideia de que uns precisam empobrecer para que outros possam criar ou multiplicar riqueza é um mito


O leitor talvez já tenha jogado algum jogo da série “Angry Birds”. Pra quem desconhece, trata-se de um jogo muito divertido e inteligente, com uma física determinista própria, onde o objetivo é eliminar os famigerados porquinhos ladrões de ovos. Não sei se a empresa finlandesa Rovio imaginava o tamanho do sucesso em 2009, quando o jogo foi criado; fato é que a Forbes avaliou a empresa em algo entre US$ 700 milhões e US$ 1 bilhão, mas um dos fundadores da empresa, Peter Versterbacka, diz que não a vende por menos de US$ 20 bilhões – acredito que ele consiga essa quantia.

A exemplo de Bill Gates, que iniciou a Microsoft em uma garagem, a Rovio também começou pequena e hoje vale bilhões. Digo isso pra refutar o mito de que para criar ou multiplicar riquezas outros precisem empobrecer. Riquezas podem e devem ser criadas, por vezes a partir apenas de uma boa ideia; a internet é campo extremamente propício a isso.


O problema nunca foi a desigualdade, mas sim a pobreza 
Empregos foram gerados, famílias inteiras sustentadas, impostos recolhidos, pessoas se divertem jogando, sem ninguém empobrecer. Ao contrário: o ciclo econômico retorna com mais força, mais gente trabalhando, mais dinheiro no mercado, maior crescimento econômico e mais credibilidade em atrair o capital estrangeiro. Quando a economia é saudável, funciona como um relógio.

Não obstante, levando o raciocínio a outra área, quando uma incorporadora compra um conjunto de casas e constrói um edifício, o valor do terreno somado ao valor da obra é inferior ao valor total do edifício, e novamente famílias foram sustentadas, impostos recolhidos e, claro, a incorporadora multiplicou suas riquezas sem necessariamente lesar alguém. Todos podem e devem ganhar.

Porém, para que esse “milagre” aconteça é necessário um cenário propício, um alto grau de liberdade econômica, uma carga tributária coerente, pois do contrário isso afasta os empreendedores, que transferem suas empresas para outros países, levando consigo seu dinheiro e empobrecendo o país – ou seja, o “relógio” se inverte.

Há um conceito em economia chamado “curva de Laffer” que descreve esse fenômeno: acima de certa porcentagem, a arrecadação de impostos diminui em vez de aumentar. Essa alta tributação é nociva para os empresários, para o consumidor, para a economia e para o próprio governo. Os governos altamente intervencionistas ignoram solenemente esse conceito e o resultado sempre é péssimo, motivo pelo qual são tão nefastas essas ideologias pseudopopulistas.

Ninguém que eu conheça é contra pobres voando de avião, como a extrema-esquerda discursa. É necessária uma esquerda moderada e que respeite o mercado, pois a política também necessita de oposição nos partidos. O problema são partidos com ideologias nocivas e políticos oportunistas lesando o nosso país.

O problema nunca foi a desigualdade, mas sim a pobreza. Quer eliminar a pobreza? Multiplique as riquezas e o resto ocorrerá naturalmente.

Não há atalhos na lei - RONALDO CAIADO

FOLHA DE SP - 07/10

Não há precedente na história da democracia de crise política que se resolva de fora para dentro –isto é, sem o protagonismo dos próprios políticos. Inversamente, há inúmeros casos em que, a pretexto de condenar a ação nefasta de alguns, destruiu-se a democracia, na ilusão de que a solução poderia vir de fora.

O país assiste ao ressurgimento desse equívoco, que tem como ponto de partida a relativização –quando não a transgressão pura e simples– da lei.

O ativismo político de parte do Judiciário e o retorno de manifestações pró-intervenção militar são sintomas desse equívoco, que ignora as lições do passado e vende uma ilusão: de que é possível uma democracia sem políticos.

Convém lembrar a lição de Winston Churchill, de que a democracia é o pior dos regimes, excetuados todos os outros. Mais que lição, é um alerta permanente.

A política brasileira está enferma. Algumas das principais lideranças estão submetidas à Justiça, umas já condenadas, outras denunciadas e algumas já presas. Incluem-se aí nada menos que dois ex-presidentes –Lula (já condenado) e Dilma (ré)– e o atual, Michel Temer (denunciado), além de alguns dos principais empresários do país.

São nos momentos de crise que se pode avaliar a eficiência das instituições. Todo esse processo, inédito entre nós, se dá sem a quebra da normalidade e rigorosamente dentro da ordem jurídica do Estado democrático de Direito. Portanto, é hora de insistir nesse procedimento.

O paciente está na UTI, mas recebe tratamento adequado, que não deve ser interrompido sob pena do pior.

Senado e STF divergem neste momento quanto ao enquadramento penal que se deve dar a um parlamentar: deve ser julgado como um servidor público estatutário –que não o é, assim como também não o são os ministros do STF e o presidente da República– ou se pela Constituição.

Cada uma daquelas funções está regulada pela Constituição, que, como é óbvio, se sobrepõe à legislação ordinária.

A título de comparação, se uma comissão do Senado, que tem a prerrogativa de julgar ministros do STF, enquadrasse um deles como servidor estatutário e o suspendesse da função, antes do julgamento pelo plenário, recolhendo-o à prisão domiciliar, estaria infringindo a Constituição.

O Senado já deu provas de que se dispõe a trabalhar em harmonia com o Judiciário. Quando o STF decretou a prisão do então senador Delcídio do Amaral, pediu, dentro do que estabelece a Constituição, autorização ao Senado, que a aprovou no mesmo dia. Posteriormente a Comissão de Ética casou o mandato.

Não há, pois, razão para alimentar controvérsias. E o Senado entendeu e evitou confrontos com o Supremo. Não o fez porque investe na superação da crise.

No dia 11, o pleno do STF decide Ação Direta de Inconstitucionalidade, que trata do tema. Acreditamos que prevalecerá a Constituição, que os ministros não sucumbirão ao ativismo político. A tentação de legislar já se manifestou em outras ocasiões, mas integrante do Judiciário é prisioneiro da lei. Se quiser legislar, terá de se candidatar.

O sistema de pesos e contrapesos da República funciona. Nenhum dos três Poderes é maior que os demais, e nenhum pode ter sua esfera de ação invadida, por mais nobre que seja a causa. Não há atalhos na lei.

De minha parte, jamais serei conivente com a corrupção em qualquer esfera da vida pública ou privada. Mas não darei também apoio a qualquer ato que, seja lá qual for sua intenção, pretenda se sobrepor à lei. Fora dela, já dizia Ruy Barbosa, não há salvação.

Regra de ouro, o dique - ADRIANA FERNANDES

ESTADÃO - 07/10

O Brasil não pode conviver com déficits sucessivos por muito mais tempo


A deterioração das contas públicas chegou num patamar tão grave que o governo pode ser forçado a enfrentar uma situação muito parecida com a de um trabalhador que vai ao banco para pedir empréstimo com o propósito de pagar suas contas de água, luz, supermercado, cartão de crédito e outros itens das suas despesas diárias mais básicas.

Não precisa ser economista para perceber que essa situação é insustentável e que alguma providência tem que ser tomada para reverter rapidamente essa bola de neve.

Esse é mais o menos o retrato do que está acontecendo com as contas públicas. O que pouca gente sabe é que os parlamentares que redigiram a Constituição em vigor incluíram um dispositivo muito simples para impedir que isso aconteça - o que poderia piorar ainda mais o quadro fiscal do País.

Por isso, essa regra foi chamada “de ouro”. Ela não pode deixar - em hipótese alguma - de ser cumprida, sob o risco de o governo ter que parar de pagar as suas despesas, o que levaria de fato à paralisação da máquina administrativa, numa situação limite que é mais conhecida como “shutdown”. Ela segue o que outros países do mundo já fazem.

O Tesouro não pode se endividar para bancar despesas de custeio do governo (como gastos com pessoal e Previdência). Isso só é permitido para o refinanciamento da própria dívida ou para despesas de investimento.

Do contrário, as autoridades do governo poderão ser responsabilizadas e, inclusive, o presidente da República ser afastado do cargo. A regra funciona como um dique a barrar desequilíbrios das contas públicas. Os dois outros diques fiscais são as metas fiscais e o teto de gastos - o limitador de crescimento das despesas criado no ano passado.

Embora técnico e complexo, a regra de ouro será “o” assunto mais comentado dos próximos anos na área fiscal e muito provavelmente cairá no colo do próximo presidente em 2019. Vai se popularizar porque de alguma forma pode afetar a prestação de serviços e o pagamento de salários e benefícios, caso o problema não seja resolvido.

O risco de descumprimento entrou no radar com os rombos sucessivos nas contas do governo e deve ficar pairando como um fantasma pelo menos até 2021, quando se espera que os déficits comecem a ser revertidos.

Em 2017 e 2018, o governo tenta solucionar o problema com a devolução antecipada de empréstimos feitos pelo Tesouro Nacional ao BNDES - uma queda de braço entre o banco e a equipe econômica que cresce e pode fazer vítimas, se o presidente da instituição financeira, Paulo Rabello de Castro, insistir em bater de frente com o Ministério da Fazenda.

Mas e depois de 2018, quando não houver mais dinheiro do BNDES para ajudar? O caminho será aumentar as receitas - sejam tributárias ou obtidas com a venda de ativos com as privatizações - além, é claro, de fazer as reformas para reduzir as despesas obrigatórias, como de pessoal e de Previdência.

Um caminho mais fácil e que precisa ser evitado de qualquer jeito é o Congresso alterar a Constituição, permitindo uma espécie de prazo temporário em que a regra pode ser descumprida - numa solução à lá jeitinho brasileiro. Já se fala no Congresso nessa hipótese, na tentativa de minimizar o problema, sem levar em conta que o próprio enfrentamento do risco de descumprimento já é prova de que a regra (o dique) está funcionando para conter o agravamento da crise. Ou seja, o Brasil não pode continuar convivendo com déficits sucessivos por muito mais tempo. Não é muito difícil perceber as razões.

FMI. A pedido do governo brasileiro, o FMI fez uma avaliação da situação das contas públicas diante do novo regime fiscal com a criação do teto do gasto. A principal recomendação é que o Brasil precisa melhorar a sua comunicação fiscal para um período mais longo, além das previsões de três anos à frente que são incluídas na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). Na prática, explica o coordenador de riscos fiscais do Tesouro, Daniel Borges, é mostrar o que vai acontecer com as contas publicas com previsões com prazo de cinco anos ou mais. Isso levaria, por exemplo, o governo a ter que estimar com mais precisão o impacto de concessões feitas agora, como aumentos de salários e até mesmo perdão de dívidas. Um constrangimento e tanto que pode ajudar.

Municípios demais - EDITORIAL O ESTADÃO

ESTADÃO - 07/10

É evidente que muitos municípios foram criados sem a menor condição de se manterem, gerando suas próprias receitas, administrando suas finanças com justeza e controle e, assim, proporcionando o bem-estar de seus habitantes

É inquestionável o valor do trabalho desempenhado pela Assembleia Nacional Constituinte – cuja instalação completou 30 anos em fevereiro deste ano – para dar ao País a Carta Política que fez do regime democrático o princípio fundamental que norteou a reorganização do Estado após os duros anos da ditadura militar.

Não obstante esse devido reconhecimento pelos esforços dos 559 parlamentares constituintes e pelos incontrastáveis avanços institucionais e civilizatórios trazidos pela Constituição de 1988 – como a proteção de direitos e garantias fundamentais que por anos foram negligenciados –, também é justo reconhecer que muitos dos desafios que o Brasil tem de enfrentar hoje estão assentados em preceitos constitucionais que representam muito mais o afã daqueles legisladores de dar rapidamente uma feição democrática ao País do que o resultado de um processo legislativo cuidadosamente amadurecido.

A prova disso é que, de 1988 até agora, a Constituição já foi emendada 96 vezes e dezenas de outras Propostas de Emenda à Constituição (PEC) tramitam nas Casas Legislativas, em diferentes estágios.

Uma das mudanças trazidas pela Constituição de 1988 e que determinam a agenda de hoje foi a alteração do status dos municípios no âmbito da organização do Estado, reconhecendo-os como entes federativos e, como tais, dando-lhes ampla autonomia política, financeira e administrativa. Na prática, a Carta Magna equiparou os municípios, juridicamente, à União, aos Estados e ao Distrito Federal.

A partir de 1988, devido ao abrandamento das regras de emancipação de porções do território em unidades políticas locais, observou-se um rápido crescimento do número de municípios no País, fenômeno que durou até 1996, quando o Congresso, diante do evidente problema fiscal e político, aprovou a Emenda Constitucional 15, dando nova redação ao parágrafo 4.º do artigo 18, instituindo a obrigatoriedade do Estudo de Viabilidade Municipal antes do prosseguimento do processo de emancipação.

Entretanto, mesmo com o aumento das exigências para a criação de novos municípios, muitos foram constituídos sem a menor capacidade de manterem-se por si mesmos, gerando as suas próprias receitas e administrando as finanças locais sob a égide da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).

Dos 5.570 municípios brasileiros, quase a metade descumpre a LRF (ver editorial A crise fiscal dos municípios, publicado em 4/9/17), de acordo com um estudo realizado pela Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan). Dos entes federativos avaliados pela instituição fluminense, 87% fecharam as contas de 2016 em situação difícil ou crítica.

Um dado ainda mais alarmante foi revelado pelo Estado: em 10% dos municípios, 80% da força de trabalho é composta por funcionários públicos. E deste grupo de municípios, impressionantes 96% estão em situação fiscal difícil ou crítica, segundo o mesmo levantamento feito pela Firjan.

Em Bom Jesus da Serra, por exemplo, no interior da Bahia, o porcentual de funcionários públicos entre os munícipes chega a 90%. A prefeitura está à beira da ilegalidade por comprometer 58% de seus recursos com a folha de pagamento, muito perto do limite de 60% da receita corrente líquida fixado pela LRF para os gastos dessa natureza. Já os que não trabalham na administração pública viram-se com pequenos comércios, uma modesta atividade agrícola ou dependem do auxílio da União por meio de programas sociais como Bolsa Família e Bolsa Safra.

É evidente que muitos municípios foram criados sem a menor condição de se manterem, gerando suas próprias receitas, administrando suas finanças com justeza e controle e, assim, proporcionando o bem-estar de seus habitantes. Prestam-se tão somente a atender a interesses muito particulares – como a barganha por recursos estaduais e federais –, além de fortalecer forças políticas locais que não têm compromisso com o bem comum.

Medo generalizado - EDITORIAL FOLHA DE SP

FOLHA DE SP - 07/10

Estudo que veio à luz nesta sexta-feira (6), elaborado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) com o concurso de pesquisa realizada pelo Datafolha, expõe um quadro preocupante em que se constata uma forte sensação de medo na população, além de apoio a afirmações associadas ao pensamento autoritário.

A partir do trabalho, a entidade formulou um Índice de Apoio a Posições Autoritárias. Indicadores do gênero serão sempre alvo de questionamentos quanto à metodologia e os pressupostos envolvidos; os dados coletados, entretanto, mostram-se eloquentes.

Foram elaborados 17 enunciados que o Datafolha submeteu a uma amostra representativa da população com 16 anos ou mais. Os entrevistados foram convidados a manifestar diferentes graus de adesão às frases propostas, ordenadas em três categorias: submissão à autoridade, agressividade autoritária e convencionalismo.

Num exemplo, 69% concordaram que o país necessita mais de líderes valentes e incansáveis do que de leis ou planos políticos.

Numa escala de 0 a 10, o índice geral apurado foi de 8,1. A propensão revelou-se mais elevada entre os menos escolarizados, os de menor renda, os mais velhos, os que vivem em cidades menores e os habitantes da região Nordeste.

Os resultados não destoam do que se poderia intuitivamente supor. Os mais pobres sentem-se mais desprotegidos e ameaçados —e o Nordeste é hoje uma região assolada pela criminalidade, além das carências sociais agudas.

O estudo fez uma série de perguntas sobre o medo de sofrer algum tipo de agressão —como ter a casa invadida ou ser assassinado. As respostas indicam que a sensação é generalizada no país.

Os entrevistados foram divididos em quatro grupos, conforme a intensidade do medo. Numa escala de 0 a 1, os índices nos quartis variaram de 0,5 a 0,94.

Atesta-se o naufrágio das políticas de segurança no país. Há décadas o poder público, a despeito de um ou outro resultado mais auspicioso, fracassa em prover esse direito básico aos cidadãos.

A ilustrar o lastimável desempenho nacional nessa área, a taxa brasileira de homicídios cresceu de 26,1 por 100 mil habitantes, em 2005, para 28,9 dez anos depois. Praticamente não se encontram números piores que esses fora da América Latina.

Há, portanto, um debate urgente a ser travado entre as forças políticas do país, que não pode estar sujeito a primarismos ideológicos.