sábado, julho 23, 2016

A volta da política - EDITORIAL ESTADÃO

ESTADÃO - 23/07

Um encontro como o de Temer, Calheiros e Maia, no qual foi discutida uma agenda de amplo alcance, especialmente as medidas econômicas e as reformas previdenciária e trabalhista, seria impensável até pouco tempo atrás


Pretende-se que o jantar realizado na terça-feira passada entre o presidente em exercício Michel Temer e os presidentes do Senado, Renan Calheiros, e da Câmara, Rodrigo Maia, represente a volta da política como protagonista da cena nacional. O gesto mostraria a disposição de alcançar o quanto antes o entendimento necessário para debater e aprovar as medidas de que o País tanto necessita para superar essa infausta quadra de sua história. Espera-se que este seja o primeiro sinal de que a prática política tenha começado a deixar para trás o caráter de mera ferramenta de assalto ao Estado para enriquecer gatunos e financiar projetos delirantes de poder.

Um encontro como o de Temer, Calheiros e Maia, no qual foi discutida uma agenda de amplo alcance, especialmente as medidas econômicas e as reformas previdenciária e trabalhista, seria impensável até pouco tempo atrás, quando a Presidência da República era ocupada por Dilma Rousseff e a Câmara era presidida pelo deputado Eduardo Cunha.

No caso da petista, sua aversão aos volteios da articulação com o Congresso era notória. Eleita exclusivamente graças à popularidade de seu padrinho, o chefão Lula da Silva, Dilma adotou a arrogância como método em sua relação com o Legislativo. Ela provavelmente supôs que sua legitimidade, em razão do monopólio da vontade popular que o PT sempre julgou ter, fosse muito superior à dos deputados e senadores, desprezíveis “picaretas”, como a eles se referiu Lula certa vez.

Por essa razão, em lugar de se dedicar à dura negociação dos projetos de interesse do governo, Dilma exigia obediência e submissão dos políticos. E, afinal de contas, considerando que parte da base governista estava se lambuzando de dinheiro público roubado de estatais, seria natural esperar que não houvesse dificuldade para aprovar o que Dilma quisesse. Assim, a presidente e o PT trocaram a política, que dá trabalho e exige uma expertise que Dilma jamais teve, pela descarada compra de votos, cuja única habilidade requerida é saber se safar do flagrante.

Nem mesmo a iminência do afastamento de Dilma fez a presidente e o PT mudarem de comportamento. Dilma sabotou todos os esforços de seus articuladores no Congresso, enquanto Lula, apesar da aura de raposa política, se limitou a tentar comprar apoio de deputados num quarto de hotel em Brasília para salvar sua pupila.

Eduardo Cunha, por sua vez, foi o resultado mais expressivo da transformação da política em gangsterismo. O deputado explorou a degradação produzida pelo lulopetismo no Congresso para formar um bloco de parlamentares fiéis apenas a seus interesses pessoais, em número suficiente para fazer dele o presidente da Câmara e para submeter os inimigos a todo tipo de chantagem. É claro que um tal político seria um sério obstáculo para as articulações que Temer agora começa a operar.

Sem Cunha e Dilma, que estão a caminho da cassação, o presidente em exercício pode enfim restabelecer a negociação política tradicional, que é o único caminho, nas democracias representativas, para que os diversos interesses da sociedade sejam levados em conta. Nada disso significa que o saneamento esteja completo – o País está apenas no começo desse trabalhoso processo.

Um exemplo disso é que o próprio Temer ainda parece prisioneiro da prática de lotear a máquina do Estado para angariar apoio, como deixou claro em entrevista recente aoEstado. Questionado sobre se o PMDB de Minas Gerais ficaria com o Ministério do Turismo, Temer respondeu: “Estamos examinando com calma. A bancada do PMDB de Minas está acertando com Furnas. Vou devolver a estatal a eles”. E o raciocínio foi além: “Furnas pode ser mais expressiva politicamente do que o Turismo. Tem Chesf, Eletronorte, Eletrosul, Itaipu...”. Ao tratar estatais como propriedades dos partidos, o presidente em exercício flerta com um modo de fazer política que o Brasil repudia: a política com etiqueta de preço.

Temer tem demonstrado até aqui grande habilidade para superar o grave momento do País, razão pela qual não parece demais esperar que ele tenha condições de arregimentar sustentação sem precisar recorrer ao bazar fisiológico do Congresso.


O preço do óbvio - HÉLIO SCHWARTSMAN

FOLHA DE SP - 23/07

O futuro é incerto? Eu apostaria que sim. O demônio de Laplace, isto é, a ideia de que um intelecto superpoderoso que conhecesse as leis da física e as posições atuais de todos os átomos do Universo saberia automaticamente o passado e o futuro de tudo, perdeu popularidade do século 19 para cá.

Não apenas não nos é possível na prática reunir tamanho conhecimento como, diante do inegável sucesso da mecânica quântica, há motivos para acreditar num Universo menos determinista, que traz algum grau de incerteza inscrito em seu âmago.

Apesar desses problemas intratáveis, há situações em que é relativamente fácil prever o futuro. A percepção de que a Rio-2016 se revelaria um péssimo investimento entra nessa categoria. Em 2009 escrevi a coluna "Pesadelo olímpico", na qual antecipava algumas das encrencas fiscais agora evidentes. Dois anos antes, por ocasião do Pan, já anunciava, no texto "Entregando o ouro", meu receio pelo buraco financeiro que contrataríamos caso o Rio viesse a ser escolhido para sediar os Jogos.

Obviamente, não tenho parte com o demônio de Laplace. Minhas previsões eram fáceis por uma razão bastante simples: no agregado, pessoas e governos se comportam de modo muito semelhante. A esmagadora maioria das cidades que hospedaram uma Olimpíada, quando fizeram as contas na ponta do lápis, constataram que haviam feito um péssimo negócio. A tendência é tão saliente que os economistas já haviam até cunhado a expressão "maldição olímpica" para designar o fenômeno. E, se nem países desenvolvidos se deram bem nesse jogo, no caso do Brasil o sensato a fazer era multiplicar por "n" o tamanho do prejuízo.

Há aí uma lição para a vida. Nunca confie em projeções interessadas e nem mesmo em como sua imaginação pinta o futuro. Se você quer um guia um pouco menos incerto, verifique como se encontram aqueles que já passaram pela situação.


Arestas a aparar e questões não respondidas - MARCO AURÉLIO NOGUEIRA

ESTADÃO - 23/07

O jogo está aberto, para ser disputado por quem se mostrar qualificado teórica e politicamente



Não foi somente a vitória de Rodrigo Maia na Câmara ou as pesquisas que, na última semana, mostraram que mais da metade dos brasileiros se mostram favoráveis à finalização do impedimento de Dilma Rousseff. Foi isso e mais um pouco.

O governo interino de Michel Temer começou a soldar suas partes e já não é tão combatido. A eleição do novo presidente da Câmara – nascida de uma articulação política não fisiológica – deu ao governo uma oportunidade para se mexer com maior desenvoltura no Congresso. A frente contra o “golpe” continua ativa, mas já não exibe a mesma força de antes. Buscou-se reforçá-lo com os slogans “fora, Temer” e “não reconheço governo golpista”, que não animaram a vida política. Sem ter a seu favor análises realistas que dessem consistência e credibilidade à ideia mesma de “golpe”, o movimento foi-se curvando aos dados duros da política, à vida cotidiana e aos novos problemas da agenda nacional, que magnetizam as lideranças. Hoje, salvo melhor juízo, os slogans “antigolpe” servem mais como música de fundo para atos localizados de protesto e reivindicação.

O próprio PT já não se empenha tanto. Continua a denunciar o “golpe” mais por dever de ofício que por convicção. Chegou mesmo a apoiar a eleição de Rodrigo Maia, que até ontem seria um dos líderes da “conspiração golpista”.

É verdade, também, que não surgiu nenhuma onda de entusiasmo ou apoio ao novo governo. A sociedade parece anestesiada, à espera de atos que a ajudem a se reposicionar e, eventualmente, a se repactuar com a política e os políticos. Os cidadãos olham para o Executivo e o Legislativo com tédio, decepção e desdém, como se se tratasse de um planeta distante, cujas ameaças criam mal-estar.

Seria estranho se fosse diferente. Não há, a rigor, motivos para comemoração: a democracia funciona, seus ritos e instituições têm sido respeitados, mas o sistema não se mostra ágil o suficiente para responder às demandas e expectativas da sociedade. Seu descompasso vem junto com a indiferença social, que se mantém ativa graças à convicção de muitos cidadãos de que a política se tornou exclusivamente coisa de políticos sem caráter. É um cenário desfavorável, ainda que não seja imutável.

O governo interino concentra-se em compor sua base parlamentar e recuperar a economia, valendo-se da ideia de trazer de volta a “confiança” entre os políticos e entre os agentes econômicos. Acredita que, com tal procedimento, terá como obter a aprovação do impedimento definitivo de Dilma e, a partir de então, reorganizar seus apoios, seu Ministério e suas políticas. Se der errado, Dilma pode voltar e aí o caos será completo.

O governo continua com muitas arestas, ainda não se “arredondou”. Se passar pela prova final do impeachment, é provável que continue a flutuar como um polígono convexo irregular, condicionado pela dificuldade de coordenar uma sociedade sem eixo, pela carência de articuladores competentes no Congresso, pelas pressões do fisiologismo.

A própria recuperação da economia não é certa. A equipe econômica é competente, está sintonizada com o mercado e conhece os meandros das contas públicas, mas os ajustes anticrise por ela concebidos terão de ser discutidos e aprovados no âmbito político, onde os obstáculos são imensos. Há, além disso, a situação geral do País, suas desigualdades sociais, seus sistemas públicos e suas políticas pouco eficazes, seus déficits em termos de infraestrutura e de produtividade

O governo, porém, confia no tamanho do mercado interno e na força da economia brasileira, no peso estratégico do País no mundo e na desarticulação das grandes maiorias. Tem até como usar a seu favor, paradoxalmente, a própria crise política, agindo mediante negociações seletivas, privilegiando ora uns, ora outros dos mais de 30 partidos políticos, sem ser hostilizado pela oposição, que se mostra, hoje, desestruturada e confusa.

Essas, porém, são vantagens bastante relativas. A disjunção entre Estado e sociedade jamais favorecerá a democracia e o bom governo. Se, no momento atual, desponta um novo clima político, derivado da neutralização dos fatores desorganizadores que se infiltraram nos governos petistas, não há como saber de que modo o País seguirá em frente.

Haverá no horizonte algum movimento virtuoso para reformar a prática e a cultura dos políticos e de seus partidos, ajudando ao mesmo tempo a que se reduzam a fragmentação parlamentar, o fisiologismo, o alto custo das campanhas eleitorais? O novo governo trará consigo uma estrutura administrativa mais eficiente, novos hábitos, procedimentos e mentalidades, que auxiliem a que se racionalize e se aperfeiçoe a atuação do Estado? A democracia ganhará ímpeto mais substantivo e melhor qualidade? Que caminho seguirão os partidos para assimilar os efeitos da Lava Jato e bloquear os germes da “antipolítica” que ameaçam contaminar a população? Que esquerda emergirá da crise do PT?

Nenhuma dessas questões tem como ser hoje respondida.

O País pede por renovação nas práticas políticas e nas orientações governamentais. Poderá continuar a aceitar que isso não venha no curto prazo, mas não se mostra disposto a esperar tempo excessivo. Sociedades dinâmicas, heterogêneas, repletas de carecimentos e desejosas de direitos igualitários e oportunidades, como a brasileira, não costumam ser propriamente tolerantes.

A paralisia da esquerda, sua entrega mais à agitação que à elaboração política, despoja a democracia brasileira de um protagonista que faria a diferença. Especialmente porque, ao contrário do que se diz, não há uma “hegemonia de direita” no País, nem a vida política é tutelada pela “mídia monopolizada”. A sociedade é cada vez mais plural, os cidadãos estão soltos e individualizados, as correntes de opinião se manifestam livremente e a democracia política vigora. O jogo está aberto, para ser disputado por quem se mostrar qualificado teórica e politicamente.

* MARCO AURÉLIO NOGUEIRA É PROFESSOR TITULAR DE TEORIA POLÍTICA E COORDENADOR DO NÚCLEO DE ESTUDOS E ANÁLISES INTERNACIONAIS DA UNESP

Mudança de sinais - MÍRIAM LEITÃO

O Globo 23/07

Uma pesquisa feita no setor de eletrônicos mostrou que 42% dos associados esperam aumento das vendas neste segundo semestre, percentual maior do que os 33% que esperam queda. A confiança na indústria subiu pelo quinto mês. Os sinais de mudança de humor, como temos dito, estão espalhados pelo mercado e pela economia real. Mas ainda são frágeis e dependentes do quadro político.

A sondagem foi feita pela Abinee (Associação Brasileira da Indústria Eletroeletrônica) em junho, mas ainda não havia sido divulgada. Além desse sinal positivo, houve desaceleração nas demissões do setor em maio, que caíram ao menor nível desde fevereiro de 2015, segundo a entidade.

— Há muito tempo não víamos indicações de vendas superarem as de queda em nossas sondagens. Esta semana ouvi de um empresário que ele já está com crescimento das encomendas. A melhora de ânimo que se vê no mercado financeiro pode estar começando a chegar na economia real —afirmou Humberto Barbato, presidente da Abinee.

Na visão do executivo, a partir de setembro será possível medir a intensidade desse processo, porque nesse mês a indústria começará a receber os pedidos para o Natal. Ele avalia que a interinidade do governo Temer é um impeditivo para a volta mais forte da confiança porque a incerteza continua elevada. Além disso, ainda não houve a aprovação de nenhuma reforma relevante no Congresso.

— Mesmo com a melhora da confiança, ninguém vai tirar da gaveta projetos de investimento em um governo interino — afirmou.

No setor de papelão ondulado, que é considerado um termômetro do nível de atividade, o mês de junho apontou alta de 3% sobre o mesmo mês de 2015, e tudo indica uma nova alta em julho, segundo Sergio Ribas, diretor da ABPO. Mas ele ressalta que a base de comparação é muito fraca e não está claro se esses números são uma nova tendência. Ele também avalia que a interinidade do atual governo é um entrave para a recuperação.

— Tivemos dois meses estáveis, em abril e maio, crescimento em junho, e acredito que julho terá nova alta. Percebo que há uma vontade muito grande do empresário de que a recuperação dê certo. É muito importante que o governo deixe de ser interino e apresente propostas concretas. Se acontecer, acredito que a recuperação pode se intensificar — disse Sérgio Ribas.

Outro problema para a retomada, na visão da ABPO, é o medo do desemprego. O consumo vai demorar a reagir porque mesmo quem está empregado tem preocupação de perder a vaga. Com isso, evita as compras e os financiamentos. Além disso, avalia que as empresas estão com muita ociosidade e vão tentar aumentar a produção com as equipes mais enxutas.

— O desemprego não vai cair na mesma intensidade que subiu, e isso vai afetar o consumo, e consequentemente, os investimentos — disse Ribas.

O setor de máquinas continua sofrendo muito com os juros elevados, a pouca confiança para os investimentos e, agora, a valorização do real. O presidente da Abimaq, José Velloso, acha que o governo Temer está emitindo sinais ambíguos na questão fiscal e isso está impedindo a redução dos juros, como ficou claro na decisão do Copom deste semana.

— O governo está aceitando dar aumento de salários para vários grupos. Quanto mais tempo demorar para equilibrar o Orçamento, mais tempo levará para derrubar a Selic. Meu setor está sem capital de giro e asfixiado pelas taxas de financiamento — disse.

Os três executivos ouvidos pela coluna temem que o BC utilize a valorização do real no combate à inflação. Isso tiraria a competitividade dos exportadores e aumentaria a presença dos importados.

— Já há empresas levando prejuízo porque exportaram com câmbio em R$ 3,60 e agora a taxa voltou para R$ 3,25. Uma forma de crescer na crise é tentar substituir as importações. Meu setor já perdeu mais 80 mil postos de trabalho em quatro anos. Com esse câmbio e esses juros, não vai se recuperar — explicou Velloso.

Há as reclamações de sempre dos empresários, e as preocupações novas. Os sinais de melhora precisam se consolidar. A confiança está voltando, mas com um pé atrás.


BC, uma pedra no caminho - ADRIANA FERNANDES

ESTADÃO - 23/07

Não há fórmula mágica para reduzir o rombo das contas públicas. Em clima de quase euforia, o governo interino de Michel Temer passou a tratar, nos últimos dias, a securitização de dívida tributária parcelada pelos contribuintes como uma fonte de receita capaz de mitigar o déficit e garantir o cumprimento da meta.

O ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, chegou até mesmo a incluir a venda desses créditos que o governo tem a receber como uma das alternativas mais viáveis para evitar um novo contingenciamento.

Cifras variadas começaram a pipocar – R$ 15 bilhões, R$ 55 bilhões e R$ 60 bilhões –, para mostrar o potencial de arrecadação depois que o projeto do ministro das Relações Exteriores, José Serra, entrou na pauta de votação do Senado, com apoio da equipe econômica.

A orientação no governo foi agilizar a securitização que permite à União, Estados e municípios embalarem essas dívidas parceladas, mais conhecidas popularmente como “Refis”, para vender à iniciativa privada. São créditos considerados de melhor qualidade, porque já foram parcelados e, por isso, com mais chance de serem pagos pelos devedores. Uma forma de antecipar para o curto prazo receitas que o governo só receberia daqui a anos. Uma ajuda e tanto no momento de recessão e queda brusca da arrecadação.

Mas o que não veio a público até agora é que nos bastidores do governo está sendo travada uma discussão técnica e complexa que pode mudar o enredo dessa história. O Banco Central resiste em registrar a arrecadação da securitização como receita primária, que é aquela justamente utilizada para a verificação do cumprimento da meta.

No Brasil, cabe ao BC definir essas regras. Por enquanto, o banco avalia que esse dinheiro é uma receita financeira, que não deveria entrar no cálculo. Se esse entendimento prevalecer, toda a arrecadação que o governo vier a receber não poderá ajudar no cumprimento da meta fiscal. A euforia em torno do projeto como uma salvação da meta pode murchar.

Os defensores da proposta consideram que o BC está errado em querer classificar essas receitas dessa forma. Para eles, não há compromisso financeiro futuro do governo caso o crédito não seja honrado pelos devedores. O risco será de quem comprou a dívida.

Para não deixar dúvidas, uma cláusula de proteção foi incluída pelo relator do projeto, deixando claro que não se trata de uma operação de crédito.

Será que o BC vai bater o pé para manter essa interpretação da norma se o presidente Temer insistir em dar prioridade à securitização? Muitos acreditam que não.

Emissários já foram enviados à instituição para acabar com as resistências, que se somam às do TCU. O Tribunal de Contas considera que a venda dos créditos pode ser caracterizada com uma operação de crédito. O governo pediu um novo parecer. A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), que cobra a dívida tributária, também não vê com simpatia.

A polêmica técnica não desmerece o projeto e nem muda o fato de que a arrecadação com a securitização vai ajudar a abater a dívida pública. Afinal, colocar a dívida numa trajetória sustentável é o objetivo último pelo qual o governo persegue uma meta fiscal.

Alguns Estados já fizerem esse tipo de operação, entre eles, São Paulo. Outros, como o Paraná, esperam as condições do mercado melhorarem para lançar a venda.

O fato é que o governo não pode colocar a proposta de securitização entre as suas fichas mais valiosas para incrementar as receitas, como fez a equipe de Dilma Rousseff com a repatriação de recursos enviados ilegalmente ao exterior. Muito menos tentando convencer de que algo poderá ser feito ainda este ano.

Ao contrário do que vende o ministro Padilha, o projeto, mesmo que aprovado, vai demorar para ser operacionalizado. Não é tábua de salvação para o ajuste fiscal.


Propina no caixa dois - MERVAL PEREIRA

O Globo - 23/07

Há um erro fundamental em tratar o pagamento do marqueteiro João Santana como mais um caso de caixa dois de campanha eleitoral. O engenheiro Zwi Skornicki, representante do consórcio Fels Setal/Technip que vendia plataformas para a Petrobras, pagou US$ 4,5 milhões em parcelas a Santana a pedido do tesoureiro João Vaccari, para quitar uma dívida do PT da campanha presidencial de 2010, que elegeu pela primeira vez Dilma Rousseff.

Ninguém recebe dinheiro por fora em uma conta no exterior de uma pessoa que não conhece, muito menos quem, no caso de João Santana, era um dos principais artífices do projeto político que estava no poder.

Caixa dois também foi a desculpa dada por Lula quando, em 2005, o esquema do mensalão foi descoberto. Há uma antiga piada política que diz que o candidato honesto usa o dinheiro de caixa dois para fazer a campanha eleitoral, e os desonestos embolsam o dinheiro. Mas o que diferencia o esquema tradicional de caixa dois do mensalão e do petrolão é que o dinheiro era desviado de obras das empresas estatais controladas pelo PT, e declarado pelas empresas como doações legais, declaradas ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Uma “tecnologia” criada pelo PT que desafia as autoridades dos órgãos de controle e da própria Justiça. Nesse caso, há um novo tipo de falcatrua: João Santana recebeu propina pelo caixa dois. Ele tem razão ao declarar ao juiz Sérgio Moro que “o marketing eleitoral não cria corrupção, não corrompe, e não cobra propina”. Mas não há como negar que o papel de Santana nos governos petistas, a partir da eleição presidencial de 2006, era muito mais central do que a simples orientação marqueteira nas campanhas.

Ele comandava os pronunciamentos públicos dos presidentes Lula e Dilma e orientava a ação governamental, garantindo a popularidade dos presidentes que ajudara a eleger. Ele entrou no esquema petista substituindo outro marqueteiro, Duda Mendonça, que também foi pago pelo PT com dinheiro no exterior, esse, sim, caracteristicamente um pagamento em caixa dois saído de contas secretas do PT.

A confissão de Duda foi dos pontos mais dramáticos do escândalo do mensalão, e provocou choros de petistas na tribuna da Câmara. Vários deles depois deixaram o partido para fundar o PSOL. Portanto, não é crível que João Santana não soubesse onde estava pisando quando assumiu as tarefas de criar a imagem e as mensagens do segundo governo Lula e dos dois mandatos de Dilma.

Assim como não se pode levar em consideração a afirmação da presidente afastada, Dilma Rousseff, de que não autorizou nenhum pagamento de caixa dois em suas campanhas, e que, se foi feito, não foi de seu conhecimento. Não é de hoje que Dilma afirma não saber de nada do que acontece de errado em seu entorno, o que deixa apenas duas opções: ou é uma irresponsável que não controla os que trabalham com ela, ou está mentindo.

Desde que era ministra de Minas e Energia, comandando o Conselho de Administração da Petrobras, coisas erradas acontecem à sua volta sem que ela tenha tomado providências, desde a compra da refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos, passando pelos escândalos de corrupção na Petrobras, terminando nas denúncias de financiamentos com dinheiro desviado das estatais, sobretudo da Petrobras.

Mas o problema do pagamento de João Santana, que construiu a imagem de Dilma e agora a destruiu com as revelações de pagamentos irregulares, não terminou nessa admissão de culpa. Há um outro processo em que a empreiteira Odebrecht é acusada de ter pagado, por ordem do PT, parte da campanha presidencial de 2014 ao marqueteiro em uma conta na Suíça.

Santana e sua mulher, Mônica Moura, estão negociando com os procuradores da Lava-Jato delação premiada específica sobre esse caso, que vai reafirmar a repetição dos procedimentos irregulares. Difícil acreditar que, mais uma vez, Dilma não soubesse de nada, e que Santana achasse que se tratava apenas de caixa dois.


Prevenção e imagem - EDITORIAL FOLHA DE SP

FOLHA DE SP - 23/07

Diante da prisão de dez brasileiros suspeitos de planejar um ataque terrorista na Olimpíada do Rio, hesita-se entre os sentimentos do alívio e da desconfiança.

Sem dúvida, a ação da Polícia Federal dá mostras de que não eram vazias as declarações de que havia preocupação real com a segurança nos Jogos. Evidenciou-se, ao menos, a existência de um monitoramento eletrônico sobre eventuais simpatizantes do extremismo muçulmano.

Ao mesmo tempo, não se exclui a possibilidade de que a ofensiva das autoridades tenha se revestido de algum componente midiático.

De acordo com o relato oficial, havia indícios consideráveis a pesar contra alguns dos detidos —estratégias de ataque debatidas pela internet; celebração dos atentados em Nice e em Orlando; uso de pseudônimos; em pelo menos quatro casos, juramentos de lealdade ao Estado Islâmico.

Não é pouco, e dada a imprevisibilidade inerente das ações terroristas, a cautela se impõe acima de tudo. Até que ponto, todavia, acrescenta-se a esse raciocínio a conveniência de demonstrar internacionalmente, em cronograma calculado, a existência de um eficaz dispositivo de controle sobre possíveis ameaças?

A incerteza da situação traduz-se em paradoxo, para não dizer em contradições abertas, quando se analisam as atitudes do ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, e de outras autoridades.

Tratava-se de célula "amadora", "sem nenhum preparo", afirmou Moraes, aludindo ao fato de que um de seus membros tentara comprar armamentos pela internet, em vez de recorrer a fornecedores especializados.

Os suspeitos tinham, entretanto, um líder, prosseguiu o ministro. Difícil afirmar tal coisa, rebateu o juiz responsável pelas prisões.

Em meio às ambiguidades do caso, transparece um dilema político real. É preciso evitar que o sentimento de medo e insegurança prevaleça na Olimpíada e, ao mesmo tempo, assegurar que as forças policiais não estão a minimizar nenhuma ameaça.

Desse modo, se quisermos exagerar o teor do que disseram as autoridades, transmite-se a ideia de que havia perigo, mas que esse perigo não era considerável; que os suspeitos estavam organizados, mas não muito –e que os Jogos se realizarão em paz, mas talvez não.

Seria todavia injusto caracterizar assim as hesitações do discurso oficial. Pois, de fato, garantias absolutas não existem contra ações terroristas (pouco importando se provêm de "amadores" ou não). Fez-se o correto; o que se afirmou sobre o feito, contudo, perdeu-se na névoa da conveniência política.


Um legado de Dilma - EDITORIAL ESTADÃO

ESTADÃO -23/07

A ironia é irresistível: como é que esse pessoal tem coragem de fazer isso com uma mulher honesta? Essa deve ser a pergunta que estão fazendo os estupefatos brasileiros que tomaram conhecimento da surpreendente revelação de que havia caixa 2 nas campanhas eleitorais de Dilma Rousseff. É inacreditável, porque Dilma, a honesta, e o PT não se cansam de repetir que todos os recursos financeiros que passam por suas campanhas eleitorais são “recebidos na forma da lei e registrados na Justiça Eleitoral”. Mas a fonte é insuspeita: o marqueteiro João Santana e sua mulher e sócia, Mônica Moura, que acham tudo isso muito feio, mas confessaram ao juiz Sérgio Moro que tiveram que fazer o que fizeram porque, senão, “vem outro e faz”. Não por coincidência, é assim que pensam também os políticos gananciosos, bem como os maus empresários que antes preferem competir à margem da lei, pelo atalho da corrupção, do que pelo aumento da qualidade e a redução dos custos e dos preços de seus produtos e serviços.

O cinismo e a hipocrisia dos depoimentos prestados em Curitiba, no âmbito da Operação Lava Jato, pelo marqueteiro oficial das últimas campanhas presidenciais do PT e por sua companheira e cúmplice, ao trazerem a público aquilo que todo mundo sempre soube e doravante a honesta Dilma não poderá continuar negando, evidenciam a completa deterioração dos padrões de moralidade naquilo que a política tem de mais vital: o jogo eleitoral. Não se pode dizer, numa República que teve suas primeiras décadas marcadas pela ampla manipulação do resultado das urnas, que a fraude eleitoral seja uma novidade. Mas há pouco mais de 35 anos entrou em cena um partido que, apresentando-se como dono da verdade e da virtude, logrou tornar-se a mais importante força política graças à anunciada disposição de lutar “contra tudo isso que está aí”.

Pois é exatamente esse, o Partido dos Trabalhadores, que aliado ao que há de pior na vida pública e privada – do coronelismo nordestino ao banditismo sindical e empresarial – cometeu um escandaloso estelionato eleitoral em 2014. Por força do exagero da sede com que foi ao pote, o PT acabou prestando à democracia brasileira o favor de facilitar a tarefa das investigações policiais que lancetaram o tumor da corrupção e deixaram vazar a secreção pútrida das práticas mentirosas e ilegais das campanhas eleitorais.

Se permanecesse fiel a suas promessas de moralizar a política, o PT poderia ter usado o grande poder político de que por algum tempo dispôs para pelo menos minimizar as práticas criminosas que comprometem a lisura das urnas. Em vez disso, as campanhas eleitorais se tornaram cada vez mais caras e contaminadas por práticas ilegais, como admitiu João Santana em seu depoimento ao juiz Moro: “Acho que é preciso rasgar o véu da hipocrisia que cobre as relações políticas eleitorais no Brasil e no mundo”.

Mônica Moura, que era responsável pela administração financeira da dupla, admitiu ter recebido, “como caixa 2, mesmo”, US$ 4,5 milhões relativos à campanha presidencial de 2010. E explicou: “Os partidos não querem declarar o valor real que recebem das empresas e as empresas não querem declarar o quanto doam. Ficamos no meio disso. Não era uma opção minha, mas uma prática não só do PT, mas de todos os partidos”.

O casal tentou fazer crer que não contou nada no interrogatório que se seguiu à prisão, no início do ano, porque tinha a intenção de preservar a imagem de Dilma Rousseff: “Eu achava que isso poderia prejudicar a presidente Dilma”, afirmou o publicitário. “Eu que ajudei, de certa maneira, a eleição dela, não seria a pessoa que iria destruir a presidente.” Mônica Moura acrescentou: “Para ser sincera, eu não quis incriminá-la, porque achava que ia piorar a situação. Queria apenas me poupar de piorar a situação”. Pelo jeito, nenhum dos dois entende que haja agora alguma maneira de impedir que a “situação” de Dilma piore.

Os marqueteiros de Dilma não deixam dúvidas: a corrupção faz parte do catastrófico legado dela.


Truculência ou inteligência, eis a questão - RICARDO BALESTRERI

O GLOBO - 23/07

‘Equivalência bélica’ levou a uma progressão do poder de letalidade dos criminosos: começaram a usar granadas, lança-foguetes e armas de perfuração de blindados


Temos acompanhado, com preocupação, recentes declarações de autoridades de segurança, no sentido de pleitear autorização para aquisição e emprego, pelas polícias, de armas de fogo com ainda maior potencial destrutivo, como panaceia para o combate ao aumento da criminalidade violenta.

Toda crise de aumento criminal, ou de casos emblemáticos de violência, acaba reavivando essas velhas discussões, com as suas “soluções” simplistas: acolhimento de execuções extrajudiciais, instituição da pena de morte, aumento genérico das penas para todos, banalização do porte de armas e, inevitavelmente, permissão para a utilização de armas mais lesivas pelas autoridades policiais. Sem adentrar no mérito do conjunto das discussões, destacamos uma que nos parece absolutamente despropositada: a corrida armamentista.

O Estado do Rio de Janeiro, por 40 anos, foi um caso paradigmático de como a corrida armamentista, dotando as polícias de armas de guerra, não se mostrou solução eficaz para a redução da criminalidade ou para fazer frente ao poderio bélico dos marginais. Ao contrário, a chamada “equivalência bélica” (conceito de guerra) levou a uma progressão do poder de letalidade dos criminosos, em espiral: começaram a utilizar granadas, lança-foguetes e armas de perfuração de blindados, porque, infelizmente, pela ausência de políticas consequentes de controle fronteiras, todas essas armas chegam a todos os lugares do Brasil, com muita facilidade.

A criminalidade deixou de recrudescer somente quando a gestão de segurança do Rio decidiu apostar na “desbanalização” dos fuzis (que não podem ser totalmente abandonados, mas utilizados com racionalidade e especialização), trocando-os por armas com suficientestop power, contudo adequadas ao uso urbano policial, com seus cenários habitados majoritariamente por cidadãos pobres e honestos. Parou de crescer também quando resolveu-se apostar no investimento em treinamento, em inteligência e no gradiente do uso da força, a partir das armas não letais, até chegar às letais adequadas. Ou ainda quando adotou uma estratégia mais abrangente e científica, com polícia de proximidade, retomada de territórios, com subsequente pacificação e instalação de postos avançados. Infelizmente, por questões de gestão e orçamento, tal política não se fez acompanhar das necessárias ações sociais de educação (não apenas da população atendida mas, inclusive, dos contingentes policiais), saúde, renda, trabalho e imagem institucional. Hoje, tende a agonizar.

Assim, pleitear a utilização de armas de guerra, para serem usadas em meio a densos contingentes populacionais humildes e indefesos, vai contra o bom senso que clama pela redução da letalidade, pela superação da barbárie, pela diminuição das “balas perdidas” e da morte de inocentes (inclusive de muitos heroicos policiais).

O Estado de São Paulo é, por exemplo, referência para o país e o mundo na utilização de armas e munições não letais e na redução da letalidade. Basta comparar números de ocorrências para ver que, embora ainda haja graves casos de violência institucional, esta não é uma constante estatística. Apelar à utilização de armas de grosso calibre, seja por demagogia, seja por desespero, é retroceder em avanços que não deveriam ter volta. Isso não resolverá o problema do combate ao crime e somente criará uma falsa e efêmera sensação de poder estatal, que desembocará, fatalmente, em ações mais violentas e letais dos bandidos.

A violência e o crime sempre diminuem quando se criam e se articulam políticas públicas com o cérebro e os neurônios e sempre aumentam quando o Estado se permite “pensar” com o fígado e a bílis. À população cabe pagar a conta dos espetáculos e das aventuras.

Ricardo Balestreri é presidente do Observatório do Uso da Força e foi secretário nacional de Segurança Pública

Acabou o dinheiro - JOÃO DOMINGOS

ESTADÃO - 23/07

Tanto caixa 2 fizeram candidatos, partidos e doadores nas eleições passadas, tantos escândalos causaram, que o financiamento de campanhas políticas por empresas não corre mais o risco de voltar. “E se voltar, ninguém mais vai querer doar. Os empresários já estão dizendo isso. Para eles, acabou. Doar dinheiro para campanhas políticas no Brasil tornou-se uma atividade perigosa”, alerta o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ).

Até há um tempo não era. Mas se tornou. Tanto é que boa parte dos dirigentes empresariais e de partidos políticos do País ou está na cadeia ou usa tornozeleira eletrônica. João Santana, o marqueteiro de uma campanha de Lula e de duas de Dilma Rousseff, todas vitoriosas, acaba de confessar ao juiz Sérgio Moro que parte de seus ganhos veio do caixa 2, e que mentiu anteriormente sobre a origem do dinheiro porque, tendo ajudado a eleger Dilma, não queria destruí-la.

Relator da última e frustrada reforma política, Maia é defensor do financiamento privado de campanha. Mas ele se diz pé no chão. Sabe que não tem volta. “O jeito é tentar aprender com o caos que se transformará a eleição municipal deste ano, sem a doação de pessoas jurídicas, e verificar o que pode ser melhor adaptado ao financiamento público.”

Na terça-feira, Maia e o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), jantaram com o presidente em exercício Michel Temer. A ideia era fazer um pacto de colaboração entre Executivo e Legislativo, de forma que a proposta de interesse do governo que for aprovada por uma das Casas deverá ser apreciada logo pela outra. Uma forma de ganhar tempo.

Mas não houve jeito. As consequências da Operação Lava Jato na política logo entraram na conversa. Renan disse que era preciso fazer uma reforma política para a eleição presidencial de 2022. Maia rebateu. Afirmou que algo precisa ser preparado já para 2018, para a sucessão presidencial. O presidente interino concordou. Fazer o quê?

Os três concluíram que o atual sistema político e eleitoral está condenado pela sociedade. O eleitor hoje rejeita as campanhas caríssimas que acabam por levar ao caixa 2. Falaram sobre o fim das coligações para as eleições proporcionais e a instituição da cláusula de desempenho de voto para que um partido possa existir e ter representação no Congresso. É um remendo, concluíram, um remendo apenas.

Sem uma saída à vista, os três ficaram de chamar os presidentes de todos os partidos para dar início à busca de uma solução para a questão partidária e eleitoral.

A princípio, não há como fugir do financiamento público de campanha, visto que o financiamento de pessoa jurídica está proibido.

A questão é criar as regras para que esse tipo de financiamento seja regulamentado, além de um enorme trabalho de publicidade para convencer o cidadão de que, a partir de agora, ele é que vai financiar as campanhas eleitorais por intermédio do imposto que paga. Não será fácil, principalmente no momento, com o País tão quebrado.

Com o financiamento público das campanhas, é bom esquecer o voto aberto, como é hoje, em que o eleitor vota no candidato de sua preferência e não no partido. É excessivamente caro.

Pelas fórmulas conhecidas no mundo, restariam o sistema distrital, em que cada Estado é dividido em distritos, o distrital misto, com votos em distritos e em todo o Estado, e o voto numa lista fechada, estabelecida pelo partido.

De todos os três sistemas, o mais barato é o voto em lista, pois não exige propaganda dos candidatos, mas dos partidos. Será uma novidade e tanto. Mas talvez a única a se enquadrar dentro das possibilidades oferecidas pelo financiamento público.


Empurrão para o impeachment - LEANDRO COLON

FOLHA DE SP - 23/07

"Não autorizei pagamento de caixa 2 a ninguém. Se houve pagamento, não foi com o meu conhecimento", reagiu Dilma Rousseff à confissão do marqueteiro João Santana de que recebeu por debaixo do pano US$ 4,5 milhões da campanha dela de 2010.

A presidente afastada recorre a poucos caracteres para adotar a estratégia lulista de defesa: a falcatrua pode até ter ocorrido, mas se de fato ocorreu, foi sem a ciência do seu maior beneficiário — no caso, a própria Dilma, eleita presidente e sucessora de Lula naquele ano.

No depoimento ao juiz Sérgio Moro na quinta (21), Mônica Moura, mulher de João Santana, contou que inventou, na ocasião da prisão do casal, a versão de que recebera os US$ 4,5 milhões como um pagamento de uma campanha feita no exterior.

Alegou que escondeu a informação de que era caixa 2 da campanha de Dilma para não incriminar a petista em meio ao processo político em curso contra ela. "As coisas que estavam acontecendo em torno da presidente Dilma, não preciso falar sobre isso, todos sabem", disse. "Eu queria apenas poupar de piorar a situação do que estava acontecendo naquele momento", ressaltou Mônica.

O casal foi preso no dia 23 de fevereiro. Na época, o debate sobre o impeachment circulava — novamente — sob temperatura morna, num certo estado de dormência no Congresso.

Aquela mentira contada por Mônica Moura aos investigadores pode ter ajudado de alguma maneira a adiar a saída temporária de Dilma, mas a revelação agora do caixa 2, mesmo que tardia, enfraquece uma presidente afastada, abandonada por aliados, e vivendo dias de isolamento no Alvorada.

A pouco mais de um mês do julgamento do impeachment no Senado, João Santana e Mônica Moura contribuem politicamente para tornar ainda mais remota a chance de retorno ao Palácio do Planalto da cliente que ajudaram, por duas vezes, a ser eleita presidente da República.

UM VETO DE MUITOS RISCOS - JORGE BASTOS MORENO

O Globo - 23/07

São históricos os desencontros entre Michel Temer e Renan Calheiros. É sempre assim: um curto período de lua de mel e um inverno de belicismo.


Neste momento, a relação está em ponto morto, à espera da decisão de Temer sobre se nomeia ou não um apadrinhado de Renan, o deputado Marx Beltrão (PMDB-AL), réu no STF, para o Ministério do Turismo. Dos três ministros mais influentes junto ao presidente em exercício, Geddel Vieira Lima e Moreira Franco acham que não é hora de o governo criar mais um contencioso com o presidente do Senado, embora também torçam o nariz para Beltrão. Já Eliseu Padilha, como o próprio Temer, acha que essa nomeação é ruim para a imagem do Planalto.

Se prevalecer, como parece, o veto a Beltrão, a quase um mês da votação do impeachment, Temer sabe que até lá vai viver em um verdadeiro inferno de ameaças e chantagens. É essa briga que o governo avalia se, a esta altura, vale ou não comprar.

Pelo celular
Temer tem dispensado a ajuda de secretárias e assessores e, do seu próprio celular, tem ligado para as pessoas. E revela que o interlocutor às vezes demora até 30 segundos ou mais para entender que está falando com o presidente da República:

— Eu costumo me identificar “É o Michel!”. A pessoa não entende, aí eu digo “É o Temer! Michel Temer!”.

Só aí cai a ficha.

Bocão
Dia desses, inclusive, Temer ligou para Heráclito Fortes, que, amuado com o governo por causa da disputa da Câmara, achava que o presidente havia rompido com ele. Dentro do supermercado, ao perceber quem estava do outro lado da linha, Fortes, deixando cair a garrafa de vinho que tinha nas mãos, gritou, assustando as pessoas:

“Preeeesidenteeeee!!!”.

Retorno
Nas tratativas para fechar a delação premiada, a Odebrecht prometeu reabrir um escândalo que achou que tivesse enterrado nos idos dos anos 2000.

Os investigadores exigiram que os executivos revelem detalhes do caso Infraero, que mirava fraudes em obras de aeroportos. Mas a operação, à época, foi melada, o que frustrou investigadores.

Como uma das condições para fechar o acordo, os executivos estão dispostos a colaborar com a Justiça e prometem abrir o bico sobre o assunto.

O caso Infraero foi alvo da Operação Caixa-Preta, que começou em 2007 e apontou desvios em obras de aeroportos como Congonhas (SP), Guarulhos (SP), Brasília e outros, envolvendo construtoras como Odebrecht, OAS, Camargo Corrêa etc.

Os inquéritos ainda estão abertos.

Parece, mas não é
O ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, principalmente depois que renovou o convite para o delegado Leandro Daiello permanecer no comando da Polícia Federal, ganhou o apoio da maioria da corporação.

Chave do sucesso: Moraes fala a linguagem da polícia. Embora tivesse se enrolado um pouco na coletiva sobre a prisão dos suspeitos de terrorismo.

Homem bom
Pergunta recorrente nos corredores do Itamaraty:

Por que o ministro Serra não trocou ainda o embaixador do Brasil na Venezuela?

É muito ligado ao PT e responde a questionamentos internos.

Respondo, mesmo sem ter procuração, pelo nobre chanceler, totalmente avesso à política de caça às bruxas: o cara deve ser muito competente, uai!

Adoçando a boca
Convidado para o primeiro jantar em homenagem ao filho presidente da Câmara, na Gávea Pequena, Cesar Maia alegou ao anfitrião Eduardo Paes que não poderia ir “por causa da coluna”.

O prefeito fez questão de justificar essa sentida ausência em discurso, acrescentando: — Eu fingi que acreditei! O incrédulo alcaide queimou a língua no dia seguinte, ao ler a coluna do vereador na internet.

Era cacetada pura, de cabo a rabo, na sua gestão.

Foco
Na delação de Gim Argello, o foco é justamente as negociatas que envolvem o trâmite das medidas provisórias.

Por falar nelas, a PF está investigando a polêmica MP dos Portos. Lembram?


A reboque - EDITORIAL FOLHA DE SP

FOLHA DE SP - 23/07

Era inevitável. Depois de avalizar, no mês passado, reajustes salariais para servidores dos três Poderes, o governo Michel Temer (PMDB) se viu forçado a contemplar uma nova leva de corporações do funcionalismo.

Desta vez, projetos a serem examinados pelo Congresso concederão aumentos escalonados até 2019 para uma dezena de categorias do Executivo, incluindo carreiras de elite como as dos policiais federais e auditores da Receita —estes deflagraram na semana passada uma greve capaz de deprimir ainda mais a arrecadação de impostos.

Há muito pouco de planejamento nessas decisões. Assim o demonstrou, de maneira constrangedora, o erro no cômputo do impacto orçamentário das benesses de junho, primeiro estimado em R$ 52,9 bilhões e depois elevado a R$ 67,7 bilhões em três anos.

A respeito dos novos reajustes, divulgou-se apenas a despesa adicional prevista para 2016, na casa dos R$ 700 milhões. A maior parcela da conta, portanto, permanece desconhecida.

Argumenta o governo que a medida compensa perdas salariais passadas e já havia sido negociada com os servidores na gestão da presidente Dilma Rousseff (PT), hoje afastada. Temer defendeu o endosso aos acordos como maneira de evitar uma onda de paralisações politicamente desastrosa.

Por pragmático que seja, o cálculo do interino significa privilegiar, em meio à aguda recessão, um segmento que conta com estabilidade no emprego e renda muito acima dos padrões nacionais —a despesa por funcionário civil no Executivo é de R$ 8.300 mensais, ao passo que o rendimento médio do trabalho no país é de R$ 1.900.

Para que se leve a cabo a proposta de limitar a alta do gasto federal nos próximos anos à taxa de inflação, a passividade na gestão dos recursos humanos terá de dar lugar a um enfrentamento mais corajoso das demandas salariais.

A folha de pagamentos da União consumirá R$ 255 bilhões neste ano, ou 22% dos dispêndios não financeiros —e a cifra cresce vegetativamente devido a promoções automáticas por tempo de serviço. Logo, futuras correções e contratações terão de passar por análise rigorosa, caso a caso.

A tarefa envolve diagnosticar carências da máquina administrativa, estabelecer prioridades, cobrar desempenho e premiar o mérito. Enfim, nada mais que uma política de recursos humanos, esquecida ao longo dos anos em que o governo caminhou a reboque do poder do corporativismo.


Essa tal polarização - EDITORIAL GAZETA DO POVO - PR

Gazeta do Povo - 23/07

Não podemos considerar a defesa da ladroagem uma posição moralmente igual, ou igualmente digna de respeito, em comparação com a crítica à roubalheira


Ao longo de todo o processo de impeachment da presidente afastada Dilma Rousseff, ganhou força um discurso que busca igualar os brasileiros não na sua proverbial alegria e generosidade, mas no que é quase a sua antítese: o ódio. Nesta narrativa, o país está polarizado e dominado por arautos da violência em ambos os lados da disputa. Todos querem briga, todos querem incendiar o país. É o tipo de explicação que tem tudo para ressurgir no próximo dia 31, quando está marcada a primeira grande manifestação de rua desde o afastamento de Dilma.

O problema dessa posição é apagar ou ignorar as nuances, fazendo terra arrasada, como se atenuantes ou agravantes não importassem – mas importam, e muito. Todos, independentemente de coloração partidária, hão de concordar, por exemplo, que a incitação à violência não tem lugar em uma sociedade democrática. Mas os líderes sem-terra João Pedro Stédile e Aristides Santos, o líder sem-teto Guilherme Boulos e o sindicalista Vágner Freitas prometeram ou foram recrutados por Lula para ir às ruas com seus “exércitos”, de “armas na mão”, para “botar fogo no país” – e alguns deles foram aplaudidos em pleno Palácio do Planalto por isso! Este comportamento não tem apoio no campo ideologicamente oposto; até há uma minoria antipetista inconsequente que pede golpe militar, mas ela é repudiada pela grande maioria dos manifestantes que desejam a saída de Dilma pelos meios legais, como o impeachment ou a cassação da chapa.

Em outro caso, durante a votação do impeachment, o deputado Jean Wyllys se considerou no direito de cuspir em Jair Bolsonaro em plena Câmara, defendendo seu ato nas mídias sociais. A atitude, que mereceria repúdio generalizado, acabou justificada e até elogiada por muitas pessoas de esquerda. O mesmo ocorreu semanas atrás, quando a advogada Janaína Paschoal, coautora do pedido de impeachment de Dilma, foi hostilizada no aeroporto de Brasília.

Assim como no caso da violência, deveria ser consenso que a defesa de ditadores, terroristas e torturadores merece crítica severa. E, de fato, quando Jair Bolsonaro disse suas sandices (pelas quais, aliás, ele deverá responder ao Conselho de Ética da Câmara) em elogio a um torturador da ditadura militar, naquela mesma votação do impeachment, foi repudiado por vários ditos “conservadores” ou “de direita”. Por que, no entanto, não se observa a mesma autocrítica em relação aos deputados de esquerda que citaram terroristas como Carlos Marighella e Carlos Lamarca?

Passando do nível institucional para o pessoal, episódios envolvendo cidadãos comuns também têm sido usados na tentativa de emplacar a narrativa do “ódio generalizado”. Repudiamos veementemente quaisquer atos de violência, inclusive verbal, ou de cerceamento de direitos básicos, como o de ir e vir. Mas até que ponto tudo o que foi divulgado se encaixa efetivamente na categoria de “ódio”, ou “ódio injustificado”?

Após tantas comprovações da participação do governo federal na montagem e na execução de esquemas bilionários de corrupção e do uso do Estado para a construção de projetos de poder partidários, numa verdadeira fraude contra a democracia, não existe mais justificativa aceitável para ficar ao lado do governo ora afastado. A defesa dos ideais de esquerda pode muito bem ser feita sem endossar a corrupção, a incitação à violência ou o elogio a terroristas.

Depois de tudo o que sabemos sobre o mensalão, o petrolão, as tentativas de usar prerrogativas ministeriais para proteger Lula, defender Dilma e o PT é defender o indefensável. E é perfeitamente natural e legítima a indignação contra quem defende o indefensável – desde que respeitados os limites da civilidade, como acabamos de lembrar.

Exteriorizar a indignação não é apenas legítimo: é saudável. Manifestar respeito pelas pessoas, mas firmeza para com ideias e comportamentos abomináveis é um direito de todo brasileiro cansado de corrupção, assim como é natural reagir quando alguém é associado a ideologias totalitárias como o fascismo só por criticar o governo. Não podemos considerar a defesa da ladroagem uma posição moralmente igual, ou igualmente digna de respeito, em comparação com a crítica à roubalheira.

Aquele que, diante da indignação demonstrada de forma firme, mas sem agressões, reage com expressões do tipo “calma, por que tanto ódio?” só está, de maneira sorrateira, tentando calar a legítima indignação alheia.


Recomeço eleitoral - EDITORIALCORREIO BRAZILIENSE

CORREIO BRAZILIENSE - 23/07

As próximas eleições municipais serão as primeiras após a definição do processo de impeachment, que provavelmente deve encerrar a passagem de Dilma Rousseff na presidência da República. Durante um determinado período de agosto, milhões de eleitores terão um olho na campanha dos candidatos em seus municípios, outro no que acontecerá no plenário do Senado Federal. Ainda que se trate de momentos em escalas diferentes, existem razões que devem ser consideradas pelo eleitor.

O iminente afastamento definitivo da presidente da República conclui o período de 13 anos de administrações petistas no governo federal. Em linhas gerais, a política conduzida pelos expoentes do partido se caracterizou por gastos públicos exacerbados, forte aparelhamento da máquina estatal, convicções econômicas equivocadas e graves denúncias de corrupção - este último item transformou em letra morta o discurso de ética do partido. É nesse contexto desfavorável que o Partido dos Trabalhadores se lança às urnas. Pela primeira vez, desde 1982, há uma expectativa de que a legenda conquiste um número menor de prefeituras. Em 2012, os candidatos petistas venceram em mais de 630 municípios.

É preciso ressaltar, no entanto, que o desconforto do PT também se estende a outros partidos. Entre as profundas marcas deixadas no imaginário do eleitorado nacional pela Operação Lava-Jato, está a certeza de que o sistema partidário está falido e carece de credibilidade. O envolvimento de legendas de peso, como o PMDB, no escândalo da Petrobras alimenta a desconfiança do eleitorado em relação a candidatos que contam com alguma estrutura de campanha. A crise ética que abate as forças partidárias tradicionais pode representar uma oportunidade a candidatos menos conhecidos, ou ainda imunes de escândalos. Se por um lado abre-se uma porta para a renovação eleitoral, há um risco de surgimento de prefeitos entusiastas ou sem experiência administrativa.

Além das novas coordenadas na divisão do poder, as eleições de outubro ficarão marcadas pela aplicação das regras de financiamento de campanha estabelecidas recentemente. A proibição de doações por pessoas jurídicas seguramente vai mudar o tratamento entre candidatos e empresas, relação que se tornou perniciosa para a vida nacional, como comprovam os últimos escândalos.

Feitas essas preliminares, convém destacar o que deve ser levado em conta pelo eleitor nestas eleições municipais. Em primeiro lugar, e desnecessário explicar porquê: o compromisso ético do candidato. O segundo ponto a examinar são os planos do político em relação às contas públicas. O flagelo fiscal que abala a grande maioria dos estados tem impacto direto nas prefeituras. É obrigação do postulante a cargo municipal apresentar propostas concretas para economizar gastos, aumentar receita sem elevar impostos, construir alianças e estabelecer parcerias que visem a superação dos desafios locais. Não é pouca coisa.


Hora de prudência - EDITORIAL ESTADÃO

ESTADÃO - 23/07

Elogiada pelo governo norte-americano, a Operação Hashtag foi uma eficaz diligência da Polícia Federal e do Ministério Público Federal


Conduzida pela Polícia Federal, a Operação Hashtag mostrou que o terrorismo durante os Jogos Olímpicos do Rio não é um perigo remoto. Com base na Lei Antiterrorismo, a Justiça determinou a prisão temporária por 30 dias, com possibilidade de prorrogação por mais 30 dias, de um grupo de brasileiros acusados de realizarem atos preparatórios para possíveis ações terroristas durante os Jogos Olímpicos. Os presos são suspeitos de compor uma célula terrorista internacional do Estado Islâmico.

Elogiada pelo governo norte-americano, a Operação Hashtag foi uma eficaz diligência da Polícia Federal e do Ministério Público Federal (MPF). O risco de atos terroristas durante o evento esportivo internacional exige alerta máximo das autoridades. Nas circunstâncias atuais, não há dúvida de que é preferível ir ao limite de prudência, agindo prontamente diante da existência de indícios.

O processo tramita em segredo de justiça. Segundo nota do MPF do Paraná, foram constatados “indícios de atos preparatórios pelo grupo”, sem notícia de atos concretos para a realização de ataque terrorista. “Entre as principais provas identificadas até o momento, há uma comunicação eletrônica na qual um dos integrantes do grupo conclama interessados a se organizarem para prestar apoio ao Estado Islâmico com treinamento já em território brasileiro. Foram também identificadas mensagens relacionadas à possibilidade de se aproveitar o momento dos Jogos Olímpicos para a realização de ato terrorista”, informou o MPF. As investigações apontam que alguns presos fizeram obayat, uma espécie de batismo do Estado Islâmico, no qual os novos membros fazem um juramento de fidelidade à organização terrorista.

“As provas colhidas até o momento possibilitam o enquadramento dos investigados, no mínimo, nos tipos penais que estipulam ‘promover’ ou ‘integrar’ organização terrorista como crime”, afirmou o procurador da República Rafael Brum Miron.

A Operação Hashtag já cumpriu 31 mandados judiciais, entre prisões, buscas e conduções coercitivas. “A custódia dos presos em presídio federal efetivará a prevenção de atuação terrorista pelo grupo em questão durante o evento internacional sediado no País”, informou o MPF.

Se merece elogio a diligência da Polícia Federal e do MPF, o mesmo não ocorre, porém, com as intervenções dos titulares das pastas da Justiça, Alexandre de Moraes, e da Defesa, Raul Jungmann. O que tinham de sobra era açodamento para mostrar serviço.

Jungmann se disse disposto a abater avião, se necessário for, e avisou: “Não estamos para brincadeira”. Já Moraes prometeu a reação “mais dura possível”. Conforme artigo de Wilson Tosta no Estado, “são atitudes opostas ao que pregam especialistas em contraterrorismo. Esses pedem discrição e linguajar não militarista para não aumentar a ameaça e não dar ao terror importância maior do que a que tem”.

No trato público das coisas relacionadas ao terrorismo a prudência é necessária e essencial. Para alcançar seu objetivo de instalar o medo, o terrorismo não precisa necessariamente detonar bombas ou abater aviões. Às vezes, a difusão do terror na população se dá por uma comunicação desastrada das próprias autoridades, que acabam proporcionando aos terroristas vitórias que, de outro modo, lhe seriam inalcançáveis.

Nesse sentido, é crucial a qualidade da comunicação do poder público para não alterar a dimensão do problema. Por exemplo, a fala do ministro da Justiça pouco contribuiu para esclarecer o potencial ofensivo dos dez presos na Operação Hashtag.

Da mesma forma que um esquadrão antibomba necessita de acurada perícia técnica para o manuseio de artefatos explosivos, as autoridades precisam de mais do que boa intenção para proteger a população. Quem fala em nome do governo precisa, além de domínio do assunto, de uma apurada competência técnica na arte da comunicação.