sexta-feira, julho 29, 2016

Terceirização e reforma trabalhista - EDITORIAL GAZETA DO POVO - PR

Gazeta do Povo - 29/07

Apresentar um novo projeto contrariando a votação na Câmara do ano passado traz implicações políticas e econômicas



Em uma reunião na última quarta-feira (27), o governo abriu um canal de diálogo com as centrais sindicais para debater a reforma trabalhista. Na conversa, o ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira, expôs as três linhas de mudanças que estão na pauta do presidente interino Michel Temer e saiu com o compromisso das centrais – excluindo-se CUT e CGT, que preferem esperar a votação final do impeachment antes de conversar – de que aceitam debater as mudanças.

A abertura de conversas com as centrais faz bastante sentido em duas das propostas: a criação de um mecanismo perene de manutenção de empregos nos moldes do Programa de Proteção ao Emprego (PPE) e a revisão da legislação trabalhista para que as negociações possam prevalecer sobre o legislado. Sobre o terceiro ponto, a regulamentação da terceirização, é menos clara a necessidade de se retomar a discussão do início, pois um projeto de lei, já aprovado pela Câmara e nas mãos do Senado, tramita no Congresso desde 2004.

Na reunião, Nogueira disse que o governo estuda enviar um novo projeto sobre o tema para o Congresso. A ideia é que ele não legalize a terceirização das chamadas atividades-fim, ou seja, a contratação de prestadores de serviços no mesmo segmento de atuação da empresa contratante, contrariando o texto provado pela Câmara no ano passado. A regulamentação da terceirização da atividade-fim foi alvo de um debate amplo e prevaleceu entre os deputados federais o argumento de que ela é necessária para o setor privado e não reduz os direitos dos trabalhadores.

Apresentar um novo projeto contrariando a votação na Câmara do ano passado traz implicações políticas e econômicas. Do ponto de vista econômico, qualquer atraso na regulamentação aumenta a insegurança jurídica de empresas que precisam recorrer a prestadores de serviço para conduzir seus negócios. A terceirização é um modelo que permite a especialização de empresas em atividades que exigem o acúmulo de conhecimento e vai muito além do fornecimento de mão de obra para áreas tidas como secundárias, como segurança e limpeza.

É justamente nas áreas mais especializadas que a linha que divide atividades-meio e atividades-fim fica mais tênue. Empresas na fronteira tecnológica costumam terceirizar o desenvolvimento de partes de seus softwares e o design de partes de seus produtos. Mesmo em setores tradicionais, como a construção civil, a terceirização traz ganhos de especialização – uma empresa especializada em fundações, por exemplo, pode fazer obras em diversos canteiros de outras construtoras. Nada disso implica na contratação sem o respeito aos direitos trabalhistas

A inclusão do tema em uma nova negociação com sindicatos traria um sinal político importante e negativo. Em primeiro lugar, desvalorizaria uma votação já feita na Câmara. Além disso, tiraria do Senado a responsabilidade de avaliar o texto que recebeu. É certo que, assim como as centrais sindicais, as entidades empresariais também têm ressalvas sobre o texto que chegou ao Senado e será salutar que os senadores façam uma análise crítica do projeto.

Avançar imediatamente na votação do projeto de lei que está no Senado, portanto, não atropelaria o debate público. Quanto aos outros dois temas–novo modelo de PPE e a prevalência do negociado sobre o legislado –, a abertura do diálogo é bem-vinda. São dois assuntos que, ao amadurecer, podem contribuir para a melhoria do ambiente de negócios no Brasil.


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