terça-feira, outubro 20, 2015

Quem manda? - MÍRIAM LEITÃO

O GLOBO - 20/10

A presidente Dilma fez um favor a si mesma ao desautorizar o presidente do PT, Rui Falcão. Depois das atitudes do ex-presidente Lula, só faltava mesmo uma entrevista como a de Falcão para enfraquecer mais o governo. Ele disse que Levy pode ir embora caso não aceite mudar a política econômica. Se Dilma nada falasse, estaria fora da Presidência. Teria terceirizado o governo à dupla Lula-Falcão.

O presidente do PT faria um favor a si mesmo se estudasse um pouco mais os temas sobre os quais quer opinar. Ele deu, na entrevista à "Folha de S. Paulo" dois exemplos de mudanças que o ministro Levy teria que aceitar: redução da taxa de juros e liberação do compulsório dos "bancos privados" 


Juros e compulsório são temas exclusivos do Banco Central. Se quiser exigi-los, o PT deve se dirigir ao BC e não à Fazenda. Falcão quer impor a Levy o que está na alçada de Alexandre Tombini. Outra informação para ajudar Falcão na próxima vez que quiser ditar os rumos da política econômica: não existe "compulsório de banco privado". Existe compulsório. De todos os bancos. É o percentual dos depósitos em conta-corrente e em aplicações que deve ser recolhido ao BC. Não se estabelece níveis diferentes para bancos públicos e privados. Não teria cabimento.

A presidente, ao desautorizar Falcão, e assim salvaguardar a prerrogativa dela, estava preenchendo uma lacuna que ficou aberta na sexta-feira e atravessou todo o fim de semana. Após a boataria sobre a queda do Levy, ele negou que estivesse de saída, mas do Palácio do Planalto não se ouviu qualquer defesa. Como sempre acontece com Levy, ele tem que defender a si mesmo, porque o governo não o defende. Isso costuma ser entendido como sinal de desprestígio. E é.

Tudo continua mal parado, e, mesmo com o desmentido da presidente, a situação do ministro da Fazenda permanece frágil. O ex-presidente Lula continua operando pela substituição dele por outro. Um dos nomes que circula é o do ex-presidente do Banco Central Henrique Meirelles, hoje na direção do grupo J&S, holding do JBS Friboi, o controvertido grupo que tanta ajuda recebeu do BNDES para o seu crescimento nos anos petistas. Meirelles fez um bom trabalho no Banco Central, e Lula agora sonha em chamá-lo de volta. O problema é que Henrique Meirelles não aceitou interferência na política monetária. No cargo de ministro da Fazenda, ele tende a ter o mesmo comportamento. Caso altere drasticamente sua forma de pensar e agir, perderá a credibilidade que conquistou.

O PT continua com sua cruzada. O problema é que ela parece sem rumo. No fim de semana, o presidente do partido se reuniu com o ministro Nelson Barbosa. E, ontem, respondendo à presidente, refez suas críticas à política econômica. O encontro com Barbosa no meio da saraivada de críticas fica mal. Para o ministro do Planejamento.

A presidente, que está bem falante desde que chegou em terras escandinavas, repetiu que o Brasil tem apenas problemas conjunturais e não estruturais. Antes fosse. É natural que ao falar para potenciais investidores a presidente queira infundir confiança. Mas adianta pouco tapar o sol com a peneira. O Brasil tem tamanho e importância suficientes para ser um caso conhecido. Nossos indicadores não são ignorados por bancos ou instituição multilateral. E os dados mostram deterioração forte de todos os fundamentos. O superávit primário despencou, a dívida disparou, o déficit nominal está em nível insustentável, o governo não consegue aprovar no Congresso nenhuma medida que aponte para melhoras nos dados do país no médio prazo.

Se a presidente estivesse dizendo isso apenas para sueco ver, tudo bem. Mas ela já falou no Brasil que nossos problemas são apenas conjunturais. Infelizmente, temos problemas estruturais gravíssimos. Um governo que cobra dos contribuintes 36% do PIB ao ano em impostos e que, mesmo assim, está com 9% de déficit nominal tem problemas sérios. E a solução proposta é mais imposto. E aí há um raro ponto de concordância de Rui Falcão com a política econômica. Disse que a CPMF é o plano A, B e C do governo. A presidente Dilma deve pensar rapidamente no plano D, porque o Congresso, pelo visto, não aceita o novo imposto.


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