segunda-feira, outubro 12, 2015

A metafísica do Sudão - LUIZ FELIPE PONDÉ

FOLHA DE SP - 12/10

O Brasil tem uma máquina estatal gigantesca. Todo mundo sabe. O pior é que aqueles que deveriam pensar esse problema, na sua maioria, são os que permanecem na esfera desse Estado, fazendo uso dele e alimentando sua burocracia infernal. E defendendo-a. Só gente mau informada, de má fé ou ignorante espera alguma coisa do Estado.

A filósofa russo-americana Ayn Rand, boicotada nos departamentos de filosofia no Brasil por ser uma liberal radical, nos chamou a atenção para um fato significativo: quando produtivos dependem de improdutivos para produzir, estamos numa fria. Esse é o caso do Brasil.

No Brasil, você sempre está na condição de herói de tragédia clássica, que luta contra um destino irrevogável, leia-se, o Estado brasileiro. Essa descrição maravilhosa é de José Guilherme Merquior no seu "O Liberalismo - Antigo e Moderno", editora É Realizações. Merquior fala aqui da tradição francesa de esmagar o indivíduo sob a bota da máquina estatal.

Pense no número de formulários enormes que você deve preencher. Pense no que você gasta de tempo e dinheiro para ter gente que te ajude a enfrentar a burocracia criada por especialistas em improdutividade.

No caso específico da educação superior, esta fato é uma evidência. Uma gigantesca burocracia, servida por "gestores" que se locupletam a fim de garantir espaços institucionais de poder, vem transformando a vida da pós-graduação no Brasil numa peregrinação de irrelevâncias.

Agora, a maldição invade a graduação, tornando o dia a dia um deserto de formulários que supostamente servem a universidade, mas que na realidade servem apenas a gente com o "gozo da burocracia", que assim detém o poder sobre as instituições particulares, sempre inimigas de governos ideologicamente estatistas, como o governo federal é há anos.

No Brasil, abrir uma pequena empresa é um inferno de impostos e siglas, que, por sua vez, se constituem num mercado tecnocrático em si, fazendo do infeliz empreendedor um desgraçado a mercê da última invenção de algum burocrata de Brasília.

E todos os neolíticos que apostam na máquina do Estado para fazer "justiça social" batem palmas para essa metafísica do Sudão.

Este tipo de cultura atrasada faz com que aqueles que nada produzem mandem no processo, obrigando você a produzir nada (servindo as exigências burocráticas deles) ou a produzir irrelevâncias que, por si só, servem aos esquemas burocráticos.

Num universo como este (um novo círculo do inferno de Dante), o dinheiro se torna refém de quem nada produz, mas detém os mecanismos de tortura sobre suas vítimas, os produtivos, que os carregam nas costas. Servir a essa máquina se torna a garantia de permanecer existindo dentro dessa cadeia, supostamente produtiva, mas onerada pela metafísica do Sudão que a alimenta.

E a corrupção é a grande cereja do bolo de um país com essa metafísica. Quanto maior o Estado, quanto maior seus tentáculos sobre a sociedade, mais ele venderá facilidades para resolver as dificuldades que ele mesmo cria, e que constitui a moeda de toda mentalidade improdutiva.

Do que vive um improdutivo? Antes de tudo, do gozo de infernizar quem produz (dizendo que está preocupado com a "qualidade" ou com a "igualdade"). Passa suas horas imaginando procedimentos que obriguem as pessoas a saírem da cadeia produtiva para servir a essa cadeia da inércia.

Mas a inércia tem suas vantagens. Primeiro, facilmente garante tempo livre para não fazer nada, claro, às custas de quem tem de correr mais e ficar mais estressado para atender as demandas de quem não produz nada.

Mas, talvez, o maior inferno seja mesmo o fato de que em países com essa metafísica da "justa improdutividade", a lei proteja o improdutivo e puna o produtivo que não aceitar ferir sua produção para servir à máquina que torna a vida um nada de formulários, impostos e exigências, que crescem a cada dia.

Imagino um desses improdutivos, com os olhinhos brilhando, acordando de manhã e se perguntando: como posso tornar a vida dos produtivos mais miserável hoje?

Um comentário:

  1. É Murilo, eu sou um desses otarios que trabalha para alimentar esses improdutivos que riem na minha cara. Atrasam minha vida talvez na esperança de que eu "compre" a facilidade. Infelizmente, parabéns pelo texto. Abraço

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