domingo, março 22, 2015

O ano que já exauriu - MÍRIAM LEITÃO

O GLOBO - 22/03

Que ano é este? Estamos chegando ao fim do primeiro trimestre como se tivéssemos vivido 12 meses em três. A inflação deu um salto, a presidente teve a mais rápida queda de popularidade da história, o Supremo recebeu denúncia contra os chefes da Câmara e do Senado, o governo e sua base brigam, novas denúncias surgem, a Petrobras foi rebaixada e o dólar não para quieto.

Não houve dia de sossego neste 2015 e dá vontade de inverter a ideia criada pelo genial Zuenir Ventura. É o ano que já acabou, logo depois que começou. As previsões pessimistas feitas sobre ele vão sendo superadas pelos fatos. O temor era de uma inflação que estourasse o teto da meta, agora a preliminar do IPCA de março já levou o país a quase 8% de inflação em 12 meses.

A presidente Dilma tenta falar mais, para mudar a comunicação, mas parece exasperada em cada entrevista improvisada que tem dado ultimamente. Fala em diálogo e ataca os que quer atrair para o diálogo. É criticada pelos seus e pelos outros. Notícias de brigas entre criatura e criador ocupam as páginas dos jornais, claramente vazadas pelo criador, que assim se distancia de tão atrapalhada criatura.

Um documento apócrifo circulou pelas mais poderosas mesas do Palácio do Planalto propondo mudar a comunicação e partir para a guerrilha política, com o uso de robôs, e soldados de fora do governo, mas com munição de dentro. Enquanto isso, o vice-presidente Michel Temer se reúne discretamente com pessoas da oposição. Partidos que fazem parte da base política criticam as medidas econômicas ou os modos políticos da presidente. O lema do novo mandato é "pátria educadora" e o ministro da Educação aponta o dedo para os aliados, chama-os de achacadores, é demitido, e a presidente Dilma tem que escolher seu quinto ministro da área.

O país todo está pedindo água a esta altura, tamanho o sufoco hídrico. A água ou não vem socorrer reservatórios e mananciais secos ou despenca com fúria alagando cidades. A natureza não está sozinha nas suas oscilações tempestuosas. Estão voláteis o dólar, as expectativas, o humor da presidente, a bolsa de valores, a taxa de juros e as convicções econômicas da chefe de governo. Os indicadores que saem são sempre os piores em muitos anos.

O povo ocupou as praças, as ruas, pontes, carregando bandeira verde e amarela e cantou o hino nacional na maior das manifestações já feitas desde a campanha das Diretas. Consultado em pesquisas, o brasileiro também foi claro: está pessimista na economia, sabe o que é operação Lava-Jato e rejeita a presidente em 62%.

Ninguém acredita, nem mesmo o governo, que o ano será bom. Há duas visões: a benigna é que teremos um bom 2016. Este ano será de recessão, inflação alta e correção dos erros e problemas que a presidente negou existirem quando era candidata a mais um mandato.

Do jeito que o ritmo dos eventos vai não haverá espaço na retrospectiva do ano. Será preciso já começar a pedir espaço extra nos programas de TV e rádio, e mais páginas nos jornais sobre o ano de 2015.

O governo faz de tudo, exceto o certo. A equipe econômica que a presidente escolheu trabalha sob o peso de um divórcio de convicções entre a política proposta e as crenças do partido do governo. Os ministros só não são desautorizados quando não falam.

Todo mês sobe o preço da energia. É o aumento ordinário, ou extraordinário, ou especial, ou de bandeirada. As distribuidoras de energia continuam se dizendo quebradas e pedindo mais empréstimos que serão, no futuro, repassados para o consumidor.

A Operação Lava-Jato já fez duas operações no ano: "My way" e "Que país é este?" Errou quem pensou em canções de Frank Sinatra e Renato Russo. Estiveram nas paradas de sucesso João Vaccari Neto, que foi intimado a depor na nona, e o ex-diretor Renato Duque, que foi preso na décima. A CPI da Petrobras voltou a funcionar e ouviu Pedro Barusco contando tudo o que ele e seu chefe, Renato Duque, fizeram de errado na Petrobras. Barusco foi à CPI e disse que há hora de falar e de calar. Ele calou. Mas não ficou parado, tirou seu dinheiro da Suíça para Mônaco. A coluna acabou e não esgotou a lista de confusões do ano mais cansativo dos últimos tempos.


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