terça-feira, agosto 26, 2014

Nós, os vermes - JOÃO PEREIRA COUTINHO

FOLHA DE SP - 26/08

Se nós, ocidentais, não respeitamos o que somos, por que motivo devem os outros respeitar-nos?


Que beleza, leitor: um grupo intitulado Estado Islâmico do Iraque e do Levante (EIIL) agora domina partes da Síria e do Iraque. Melhor: já faz vídeos. Com decapitações de ocidentais. E proclamações: existe um novo Califado, dizem os assassinos, renascido das cinzas otomanas que a Primeira Guerra provocou.

Essa utopia terrena está atraindo jihadistas do mundo inteiro. Do mundo inteiro, vírgula: do Reino Unido em especial. O premiê David Cameron está pasmo. Membros do seu governo, "idem". E a "inteligência" britânica quer saber como é possível que cidadãos britânicos, que nasceram e cresceram à sombra do Estado de bem-estar social, viram as costas ao Ocidente para lutarem contra o Ocidente.

Boas perguntas. Nenhuma delas é especialmente misteriosa. Qualquer pessoa com dois neurônios compreende que, no caso do Reino Unido, a produção de jihadistas explica-se pela belíssima cultura de "tolerância" que, durante duas gerações, permitiu que muitas mesquitas locais fossem antros de ódio e extremismo.

Só Deus sabe --ou Alá, já agora, para não ferir certas sensibilidades ecumênicas-- a extrema dificuldade legal que Londres teve para extraditar Hamza al-Masri, o famoso "Capitão Gancho" da mesquita de Finsbury Park, em Londres, para os Estados Unidos, onde era acusado de vários complôs. O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem estava preocupado com os "direitos humanos" de um terrorista, mas não com os direitos das vítimas que ele potencialmente causava com as suas palavras de loucura e morte.

E só agora a ministra do Interior britânica, a conservadora Theresa May, promete legislação pesada para o extremismo e as incitações ao ódio --em espaços públicos, escolas, mesquitas etc. Até os trabalhistas aplaudem a "coragem" da senhora.

Não admira: como informa o "Daily Telegraph", existem mais cidadãos britânicos de origem muçulmana marchando nas fileiras do EIIL do que no exército de Sua Majestade. Eis um retrato da pátria de Churchill.

Mas há outro. Porque não existem apenas fanáticos islamitas que, dentro do Ocidente, pregam a morte do Ocidente. É preciso relembrar os fanáticos revisionistas e multiculturalistas que, na mídia e nas universidades, foram oferecendo as doces pastagens da retórica antiocidental.

Caso clássico: anos atrás, Ian Buruma e Avishai Margalit escreverem um livro que inverte o título (e a tese) do celebrado "Orientalismo" de Edward Said. Chama-se "Ocidentalismo" e é um estudo sobre a visão deturpada e grotesca do Ocidente produzida pelos seus inimigos.

E, no topo da lista, está um longo rol de intelectuais ocidentais --de Spengler a Heidegger, sem esquecer o demencial Sartre-- para quem o Ocidente era um antro de decadência/declínio/corrupção/brutalidade/desumanidade/exploração (pode escolher à vontade). Essa retórica, escreviam os autores, acabou por emigrar para o mundo inteiro, Oriente Médio em especial. E é hoje repetida, "ipsis verbis", pela turma do EIIL.

No livro, há até um episódio pícaro (e grotesco; atenção, famílias) que ilustra bem como as más ideias viajam depressa. Acontece quando o Taleban tomou Cabul em 1996, pendurou o presidente afegão Najibullah no poste, encheu os seus bolsos de dólares e colocou cigarros entre os dedos quebrados do cadáver.

Mensagem: esse aí é um produto degenerado do Ocidente em seus vícios e ganâncias.

(Curioso, lembrei agora: as campanhas antifumo poderiam usar a imagem do antigo presidente afegão enforcado e com cigarros entre os dedos. E o lema: "Fumar prejudica a saúde." Mas divago.)

Porque a questão é glacial: se nós, ocidentais, não respeitamos o que somos ou temos, independentemente de todos os erros cometidos (e corrigidos: será preciso lembrar a escravatura, abolida por aqui e praticada ainda no resto do mundo?), por que motivo devem os outros respeitar-nos?

Gostamos tanto de nos apresentar como vermes que os outros acabam olhando para nós como vermes.

Soluções?

Deixemos isso para os líderes do mundo, como Barack Obama, que tipicamente não sabe o que fazer. (Uma sugestão: que tal reduzir à Idade da Pedra quem tem a mentalidade de homens das cavernas, senhor presidente?)

Mas já seria um grande contributo se o Ocidente fosse um pouco mais intolerante com a intolerância daqueles que recebemos, alimentamos, sustentamos --e enlouquecemos de ódio com o ódio que sentimos por nós próprios.

‘Contabilidade criativa’ retarda gastos públicos - EDITORIAL O GLOBO

O GLOBO - 26/08

Ao usar a Caixa para maquiar o superávit primário, o Tesouro repete governadores que se financiaram nos bancos estaduais, a ponto de quebrá-los


Uma das causas do rebaixamento da nota de risco do Brasil, em março, pela agência Standard & Poor’s, a “contabilidade criativa” continua sendo aplicada para melhorar as aparências das contas públicas. Por reduzir a transparência da contabilidade oficial, ajudou naquela espécie de cartão amarelo recebido pela economia brasileira. Sob o impacto da má notícia, autoridades econômicas, na tentativa de restabelecer alguma confiança nas estatísticas oficiais, se comprometeram com um superávit primário de 1,9% do PIB, sem maiores contorcionismos contábeis.

Não cumprem a promessa, e há mesmo analistas que preveem que, sem contabilidade criativa, não haja, este ano, qualquer superávit, ou ocorra até algum déficit primário, um resultado muito ruim do ponto de vista da administração da dívida pública. Logo, com reflexos negativos no custo dos financiamentos externos ao Brasil.

A usina de criatividade que aparece na Secretaria do Tesouro já produziu efeito paradoxal de transformar endividamento público em receita primária — sempre para embonecar o superávit primário, a fim de transmitir aos mercados uma ideia de austeridade fiscal que na realidade inexiste. Isso acontece quando o Tesouro lança títulos para captar recursos, repassa-os ao BNDES, Caixa ou Banco do Brasil e estes antecipam o pagamento de dividendos ao Tesouro. Neste passeio, o dinheiro vai como proveniente de dívida e volta como lucro distribuído pelas estatais. Uma “lavagem”.

Outra manobra criativa, descoberta há pouco, tema de reportagem do GLOBO no sábado, é o Tesouro retardar repasses obrigatórios para, novamente, melhorar o superávit. Essas “pedaladas”, no jargão dos analistas, não chegam a ser novidade. Devido a elas, a rubrica “restos a pagar” costuma ser robusta nas viradas de ano: o Tesouro retém transferências no final de dezembro, para eles serem contabilizados apenas em janeiro, no novo exercício fiscal. A preocupante novidade é o aumento do volume dos atrasos em repasses que o Tesouro tem de fazer à Caixa Econômica, para ressarci-la pelo pagamento de benefícios como o Bolsa Família e seguro desemprego. Em entrevista exclusiva ao jornal, o secretário do Tesouro, Arno Agustin, negou qualquer artifício, tudo ocorreria normalmente no fluxo de créditos e débitos no relacionamento Tesouro/CEF.

O Ministério Público, por não concordar, aciona o Tribunal de Contas da União, e o próprio Banco Central faz consulta à Procuradoria-Geral da Fazenda sobre essas operações. Afinal, na prática, a CEF está financiando o Tesouro, algo proibido pela Lei de Responsabilidade Fiscal. Nem mesmo banco privado pode liberar crédito aos controladores.

O Tesouro usa um banco estatal assim como, no passado, governadores se valeram de bancos estaduais para criar moeda. Quebraram as instituições financeiras. Repetir hoje a manobra é abalar os alicerces da estabilização da economia.

Hollande beijou a cruz - CELSO MING

O ESTADÃO - 26/08


A queda do ministério do governo da França é o resultado da forte guinada do presidente François Hollande para uma política econômica ortodoxa.


A França vive hoje uma estagnação do sistema produtivo parecida com a do Brasil. Hollande se elegeu pregando a cartilha heterodoxa contra o arrocho fiscal e impôs uma linha dura contra o capital e os mais ricos. Chegou a decretar um imposto de renda de 75% sobre ganhos superiores a 1 milhão de euros por ano. Tudo o que conseguiu foi o fechamento recorde de indústrias e a revoada de artistas e de empresários para o exterior.

Em janeiro, Hollande beijou a cruz e agora tenta levar adiante uma política econômica que ele mesmo denominou de “pacto de austeridade”, destinada a reequilibrar as contas públicas e a criar condições para que o setor produtivo recupere competitividade.

O problema básico de Hollande é o de que a dívida alta demais (93,6% do PIB), o baixo crescimento econômico (de apenas 0,3% em 2013) e o alto desemprego (10%) impedem a expansão dos gastos públicos como alavanca de recuperação da economia. Se a França não fizesse parte de uma união monetária (área do euro), seu governo ainda poderia desvalorizar sua moeda para reduzir os salários, baratear em moeda estrangeira o produto francês e exportar mais. Como renunciou à soberania monetária, tem de produzir efeito equivalente por meio da redução drástica de despesas.

O francês não tem nem consciência nem disciplina pública suficiente para aceitar uma redução de salários, como o alemão aceitou. Assim, as reformas e o megacorte de despesas públicas da ordem de 50 bilhões de euros (US$ 65,5 bilhões) em três anos funcionam como disfarce para a redução da renda. A transferência de recursos em vantagens fiscais para as empresas para que possam se recuperar foi de 40 bilhões de euros (US$ 52,4 bilhões).

Neste domingo, o até ontem ministro da Economia, Arnaud Montebourg, feroz adversário da “obsessão alemã”, em entrevista ao jornal francês Le Monde, na prática declarou-se em rebelião contra essa política. Assim, facilitou a vida de François Hollande que acaba de ordenar a recomposição do governo que abre caminho para o inevitável.

Na última sexta-feira, o presidente do Banco Central Europeu, Mario Draghi, admitiu que poderia ajudar a retomada da atividade com emissão de moeda se os governos da área do euro fizessem sua parte com mais aperto fiscal. Isso sugere que o movimento de Hollande seja parte de esforço coordenado da área do euro para a criação de condições para a retomada sustentável da produção.

A conversão do socialista Hollande à austeridade, agora com ações de maior impacto, é um aviso para o governo Dilma que também vem desprezando recomendações em direção ao maior equilíbrio fiscal. Pode-se administrar política pública de qualquer coloração ideológica, desde que a execução do orçamento seja feita com equilíbrio.

Isso não significa que não se devam fazer dívidas. Significa apenas que estas têm de ser cobertas com recursos que não coloquem em risco seu pagamento futuro. No Brasil, até mesmo o flexível ministro da Fazenda, Guido Mantega, já avisou que, em 2015, será preciso providenciar um alentado aumento do superávit das contas públicas para garantir um mínimo de arrumação da economia.

Antônio Ermírio
Dizia sempre o que pensava. Podia mudar de opinião, mas nunca desdisse o que disse. Terno surrado sobre camisa de colarinho folgado em pelo menos três dedos, Antônio Ermírio estava sempre pronto a operar sua régua de cálculo. Os resultados saiam com precisão de décimos. Acreditar no futuro do Brasil era só um bom começo. O resto teria de vir com trabalho duro – e nada de dar mesada generosa demais para os filhos, “pra não criar vagabundo”. Fará muita falta.

Política lucrativa - JOSÉ CASADO

O GLOBO - 26/08


Controlados por poucos, que se perpetuam no comando, os partidos políticos se tornaram valioso ativo financeiro, com dinheiro público pagando contas privadas



Um dos melhores negócios do mercado brasileiro é ser dono de partido político. Convive-se com 32 deles, dos quais duas dezenas têm bancadas no Congresso. Na essência, diz o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, se transformaram num “agregado de pessoas que querem um pedacinho do orçamento”.

Partido político no Brasil se tornou ativo financeiro de alto retorno, sem risco e com recursos públicos garantidos por lei, elaborada e votada pelos próprios interessados.

Em ano de eleição, as doações de empresas representam cerca de 60% das receitas declaradas, mas é do orçamento federal que sai o financiamento das despesas regulares da estrutura e da propaganda partidária (o horário eleitoral gratuito só é gratuito para partidos e candidatos, quem paga a conta é o público, telespectador ou não, via isenção fiscal).

Nunca os partidos brasileiros receberam tanto dinheiro público como neste ano: R$ 313,4 milhões, dos quais 57% já repassados.

O Fundo de Assistência Financeira, que sustenta as máquinas partidárias, aumentou 184,5% nos últimos dez anos. Seu valor nesse período subiu em ritmo muito acima da inflação, da correção da poupança e do salário mínimo, da valorização da Bolsa de Valores (Ibovespa) e do Certificado de Depósito Bancário (CDB).

Os contribuintes vão pagar, além disso, mais R$ 600 milhões como compensação fiscal às emissoras de rádio e televisão pelo horário de propaganda eleitoral.

Todos os 32 partidos registrados na Justiça Eleitoral têm direito a um pedaço do orçamento. É o que diferencia o Brasil. Há países com mais de 50 organizados e em atividade, mas o acesso ao dinheiro público é limitado àqueles que têm representação legislativa.

A maioria dos partidos brasileiros é controlada por duas dezenas de famílias, em regime de revezamento nos cargos de direção e com mandato variável entre cinco e oito anos.

Caso exemplar é o Partido Trabalhista Cristão (PTC). Há 25 anos atendia pela sigla PRN e hospedou Fernando Collor como candidato à Presidência. Tem 14 pessoas na cúpula. Cinco partilham o mesmo sobrenome (Tourinho) e cerca de R$ 150 mil mensais do fundo.

No Legislativo funciona um condomínio partidário baseado na perpetuação do poder familiar. Metade dos deputados federais eleitos em 2010 tem pais, filhos, irmãos, avós, tios, primos, sobrinhos, cônjuges, genros, noras ou cunhados em cargos eletivos. Sete de cada dez estão nas ruas, batalhando a reeleição.

Dos deputados eleitos em 2010, e que na época tinham menos de 30 anos de idade, 79% eram herdeiros (filhos ou netos) de clãs políticos — informa a ONG Transparência.

Ser dono de partido no Brasil é ótimo negócio porque garante acesso a dinheiro fácil, sem custo, direto do orçamento. Basta ter o registro da Justiça Eleitoral.

Melhor ainda é ser dono de partido com bancada na Câmara. A fatia do fundo partidário é maior e já vem com a garantia de um tempo mínimo na propaganda eleitoral. É mercadoria passível de negociação, a dinheiro ou em barganhas por cargos.

O que se vê nesta eleição é que nenhum partido político pode ser tão ruim quanto seus líderes.

O emprego na campanha eleitoral - JOSÉ PASTORE

O ESTADÃO - 26/08


Mario Henrique Simonsen costumava dizer que a inflação aleija, mas o câmbio mata. Parafraseando o saudoso economista, parece razoável dizer que, numa campanha eleitoral, a inflação aleija, mas o desemprego mata. Isso porque o desemprego fragiliza a economia doméstica e mina o sentimento de dignidade.

Os primeiros programas eleitorais no rádio e na televisão já mostraram a importância do tema. Os candidatos da situação destacam que nunca na história deste país se gerou tanto emprego como na gestão do PT. Os dados da Relação Anual de Informações Sociais (Rais) de 2013 indicaram a existência de 49 milhões de empregos formais, um avanço de 65% em dez anos. Mais do que isso, eles argumentam que os trabalhadores desfrutam hoje de uma situação de pleno-emprego - com apenas 5% de desempregados. E adicionam o fato de que a maioria dos brasileiros foi beneficiada com uma apreciável elevação da renda do trabalho, que em dez anos aumentou 32% em termos reais.

São trunfos preciosos. A oposição fica com o difícil desafio de convencer o eleitor comum a abandonar os candidatos da situação e tudo o que fizeram até aqui em favor do emprego e do poder de compra dos trabalhadores.

Missão complicada. Aos candidatos da oposição resta explorar as dificuldades latentes no mercado de trabalho. Entram na sua argumentação os dados recentes do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), que em julho revelaram um crescimento pífio na geração de empregos: menos de 12 mil novos postos de trabalho, o pior resultado dos últimos 15 anos. A oposição destaca ainda que os setores mais dinâmicos e que melhor empregam passaram a dispensar empregados, como é o caso da indústria automobilística, mecânica e metalúrgica. Com isso, os candidatos tentam criar nos eleitores um clima de apreensão em relação ao futuro.

É pouco provável, porém, que o eleitor comum que está empregado e recebendo aumentos salariais acima da inflação venha a se abalar com o futuro sombrio apontado pela oposição, por mais realista que seja o raciocínio dos que veem a estagnação da economia no presente como detonadora de uma grave crise de emprego no futuro.

Não invejo a situação dos marqueteiros da oposição porque, no campo do emprego e da renda, os dados parecem favorecer a situação. Com o forte encolhimento dos que procuram emprego, a taxa de desemprego se mantém baixa e a pressão salarial se mantém alta. A desocupação em São Paulo, por exemplo, recuou de 5,1% para 4,9% em julho, ao mesmo tempo que 93% das negociações coletivas do primeiro semestre terminaram com ganhos reais de salários.

É verdade que o emprego de amanhã resulta dos investimentos de hoje. E como o setor privado parou de investir, o quadro de 2015 tende a ser bastante diferente do atual. Ou seja, a oposição pode questionar a capacidade de a situação repetir o feito anterior em condição tão adversa como a que se descortina para o próximo ano. Mas isso requer um exercício de lógica simples para o especialista, mas complexo para o eleitor comum. Como levá-lo a abandonar o certo pelo incerto? Isso não é impossível, mas exige uma didática aprimorada que seja capaz de criar no eleitorado uma dissonância acentuada entre o que ele vive hoje e a incerteza que o espera amanhã.

Não tenho a menor vocação para o ramo da propaganda. Levanto estas questões porque não vejo fragilidade no discurso da situação no que tange aos temas relacionados ao mercado de trabalho. Não vejo tampouco na oposição uma estratégia efetiva de geração da incerteza que pode levar o eleitor comum a desprezar o presente certo em favor de um futuro incerto.

Pedindo desculpas ao leitor por me considerar um reles amador em matéria política, penso ser este um dos maiores obstáculos da campanha da oposição no pleito atual. Sem uma estratégia adequada, é melhor mudar de assunto.

COLUNA DE CLAUDIO HUMBERTO

‘Infelizmente, esse não é o Brasil real’
Aécio Neves (PSDB) sobre o País que o PT mostra em sua propaganda eleitoral



CANDIDATURA DE MARINA TIRA MAIS VOTOS DE AÉCIO

O comando da campanha de Aécio Neves (PSDB) a presidente anda apreensivo com o resultado dos levantamentos preliminares do próprio partido. A confirmação de Marina Silva na disputa revela-se mais prejudicial ao tucano do que à candidatura de Dilma Rousseff (PT). O desempenho da candidata do PSB surpreende em grandes colégios eleitorais: São Paulo, Rio de Janeiro, DF, Paraná e Pernambuco.

ONDE BATER

A turma de Aécio já discute como enfrentar Marina Silva sem fechar as portas para eventual entendimento no segundo turno.

INEXPERIÊNCIA

A tendência do PSDB é fazer o contraponto da inexperiência de Marina em gestão com a administração bem avaliada de Aécio em Minas.

PIBINHO

É quase unânime no boletim Focus do Banco Central, que consulta quase 100 instituições: o crescimento do PIB não passará de 0,7%.

BATEU, LEVOU

Candidato tucano a vice-presidente, Aloysio Nunes avisa que Geraldo Alckmin responderá a quem o atacar: “Quem quiser bater vai ter volta”.

POR QUE AUMENTO? BARRIL SUBIU SÓ 1,9% DESDE 2011

A gasolina subiu 13,2% no Brasil desde a posse de Dilma: de R$ 2,612, em 2011, para os atuais R$ 2,959. O desempenho do diesel é bem pior: subiu 24,3% no mesmo período. De R$ 2,009, em 2011, a R$ 2,498, hoje. Difícil explicar o aumento “imprescindível” pretendido pela Petrobras no cenário atual. O barril de petróleo cru era negociado a US$ 91,55, em 2011, e US$93,38, ontem. Aumentou só 1,9% no período.

QUE PT?

Na propaganda de Delcídio Amaral ao governo do Mato Grosso do Sul, o PT não é citado, nem sua estrela. E a cor oficial da campanha é azul.

QUE DILMA?

Em Pernambuco, a propaganda do ex-prefeito do Recife João Paulo (PT) ao Senado continua sem citar ou mostrar Dilma. Só Lula aparece.

CAMILO RIFADO

Lula reiterou a Eunício Oliveira (PMDB) que nem ele nem Dilma vão ao Ceará pedir votos para o candidato do PT ao governo, Camilo Santana.

GIM COMO OPÇÃO

Com a candidatura a governador do DF impugnada pelo TRE, José Roberto Arruda (PR) continua otimista quanto ao julgamento do recurso no TSE, mas, pelo sim, pelo não, seus aliados já definiram: se ele ficar fora da disputa, será substituído pelo senador Gim Argello (PTB).

PERDEU A CABEÇA

Ex-PT-PR, notório amigo do doleiro Alberto Youssef e enrolado até o pescoço na operação Lava-Jato, da Polícia Federal, o deputado André Vargas foi retirado da lista dos Cabeças do Congresso 2014 do Diap.

ANÚNCIO DE CONCURSO...

O Ministério do Planejamento aprovou concursos públicos no apagar das luzes do governo Dilma. O anúncio é para dar aos sindicatos aliados meios de pedir votos para o PT às categorias, mas é lorota.

...É SÓ LOROTA ELEITORAL

A promessa de concurso é lorota porque a Lei de Responsabilidade Fiscal proíbe aumentar gastos com pessoal nos últimos 180 dias de mandato. A oposição pretende denunciar a manobra à Justiça Eleitoral.

OUTRO JATINHO

Como o Citation que caiu, também pertencia à Bandeirantes Pneus, do Recife, o Learjet usado por Eduardo Campos na visita a Feira de Santana (BA), em maio. Os gastos não constam da prestação de contas do PSB porque a viagem foi anterior ao registro da candidatura.

NOVA CORREGEDORA

A ministra Nancy Andrighi tomará posse, do Superior Tribunal de Justiça,como corregedora nacional de Justiça nesta terça-feira (26), às 18h. Ela sucede ao ministro Francisco Falcão.

O PROBLEMA É A COR

Candidato ao governo do DF, Toninho do Psol já não promete extinguir o Bope, um dos mais admirados batalhões da Polícia Militar. Promete só mudar a aparência. Para ele, fardamento preto é “fascista”.

ANTI-PT COMO BANDEIRA

A rejeição ao PT chegou a tal ponto que no DF os adversários do partido passaram a direcionar suas campanhas para o “anti-petismo”. Pelas pesquisas, isso dá mais votos que apresentar projetos.

GASTOS CAMPEÕES

Atingiu R$ 453 milhões em junho o total de diárias pagas pelo governo Dilma. Até maio eram R$ 354 milhões. Fecharão o ano em R$ 1 bilhão.


PODER SEM PUDOR

GARANTIA

O poeta chileno Pablo Neruda era conhecido pelo hábito de abandonar qualquer coisa por uma boa soneca, após o almoço. Ele era candidato a presidente de seu país quando visitou o Brasil. Numa de suas muitas entrevistas, ele acabaria sendo confrontado com aquele hábito que fazia as delícias dos seus adversários. Neruda respondeu com tranquilidade:

- Claro, vou continuar com a sesta. Enquanto estiver dormindo, a população saberá que não lhe vou fazer nenhum mal.


Invasão de danos - EDITORIAL FOLHA DE SP

FOLHA DE SP - 26/08


Como se resolver o problema do deficit habitacional já não fosse tarefa complexa, invasões orquestradas por movimentos de sem-teto em empreendimentos populares inacabados adicionam à equação dificuldades nada desprezíveis --e não apenas para as autoridades.

Também a população que vive em áreas de risco ou espera há anos por sua residência se vê prejudicada por intervenções de grupos que, à margem da lei, decidem se apossar de conjuntos habitacionais construídos com recursos públicos.

Reportagem desta Folha mostra que, na cidade de São Paulo, 1.427 famílias de baixa renda continuam à espera de moradias do programa federal Minha Casa Minha Vida devido a danos causados por invasores.

Não satisfeitos em ocupar ilegalmente unidades quase prontas, que dependiam apenas de ligações de água e de esgoto para serem entregues, os sem-teto depredaram e incendiaram instalações de oito condomínios quando a polícia comandou uma ação de reintegração de posse.

O vandalismo tornou necessário reformar os empreendimentos. Assim, não se sabe quando as unidades, em construção desde 2010, serão oferecidas às famílias. Agrava-se, pois, a situação de quem hoje vivem em condições precárias.

É o caso, por exemplo, do mecânico Thiago do Nascimento Silva, 24, que mora com a mulher e a filha de três anos no Jardim Pantanal, bairro da zona leste frequentemente sujeito a alagamentos.

"Até hoje espero minha casa e quase não tenho mais esperança. Perdi meu carro na última enchente e tenho medo de a minha filha ficar doente", lamenta Silva.

Essa destruição, ademais, impõe um custo adicional às obras --responsabilidade da qual os invasores provavelmente escaparão. Segundo a Caixa Econômica Federal, que zela pelos imóveis, ainda não há estimativa para os gastos extraordinários em que incorrerá.

A julgar por experiência semelhante na esfera municipal, o prejuízo será significativo. Na Prefeitura de São Paulo, calcula-se em R$ 700 mil o custo para reformar 40 apartamentos de um condomínio da Cohab (empresa metropolitana de habitação) que também foi destruído no momento do despejo.

Os próprios sem-teto agradeceriam se os recursos não precisassem ser aplicados duas vezes no mesmo apartamento.

Marina e a democracia - EDITORIAL O ESTADÃO

O ESTADO DE S.PAULO - 26/08


"É necessário criar mecanismos de participação popular que revigorem a democracia representativa, aumentando sua legitimidade." Essa vaga afirmação de princípios consta - e dela quem há de discordar? - do texto prévio do programa de governo de Marina Silva a ser divulgado, segundo se anuncia, até a próxima sexta-feira. Esse texto foi antecipado pelo Estado no último domingo e precipitou reações contraditórias, especialmente no que se refere à questão da formação de conselhos populares destinados a promover o "controle social" da atividade política, o mesmo tema do polêmico decreto de Dilma Rousseff que está sendo examinado pelo Congresso Nacional.

No mesmo dia, Marina Silva se dispôs a colocar água na fervura, tentando desvincular sua proposta do decreto de Dilma. Saiu-se, porém, mais uma vez, pela tangente da generalização. A intenção é "aprofundar a democracia" por meio da "valorização das instituições e que essas instituições e as representações políticas possam estar ligadas à sociedade brasileira". Mais uma vez: discordar, quem há de?

A generalização pode ser um recurso eficaz, especialmente durante campanhas eleitorais, para tornar acessíveis e atraentes ideias complexas. Criar signos de fácil compreensão é um exercício também conhecido como "falar a linguagem do povo". Mas é também a melhor maneira de escamotear as verdadeiras intenções de quem os propõe. A generalização pode ser, pura e simplesmente, uma maneira de dissimular o engodo.

É o caso desse decreto do governo petista que institui a Política Nacional de Participação Social (PNPS). O decreto não chega a ser novidade, uma vez que conselhos já existem, e há muito tempo, em todos os âmbitos e níveis da administração pública. Tais conselhos não têm o poder de impor políticas, mas apenas o de ampliar a "participação popular" na gestão da coisa pública, inclusive fiscalizando o trabalho dos gestores. A novidade é a óbvia intenção do lulopetismo de usar seu poder hoje quase hegemônico para influir fortemente na estruturação desses conselhos - que serão coordenados diretamente pelo Palácio do Planalto, por intermédio da Secretaria-Geral da Presidência - e manipulá-los como instrumentos de pressão política para consolidar e perpetuar essa hegemonia. Em outras palavras, por simples decreto revoga-se o dispositivo constitucional que consagra a representação popular nos órgãos de soberania nacional, transformando os conselhos em centros de decisão até mesmo mais efetivos que o Congresso Nacional, eleito pelo voto universal.

Isso significa que, reeleita Dilma Rousseff, os petistas disporão de pelo menos quatro anos para montar nas entranhas da administração federal uma ampla estrutura de pressão política capaz de garantir-lhes o exercício de um forte poder paralelo mesmo que venham a ser apeados do poder formal por decisão das urnas.

Pela voz de seu então líder, Eduardo Campos, o movimento político que hoje, por injunção da "providência divina", Marina Silva comanda já se havia posicionado claramente contra a mentira dissimulada na proposta petista. Em junho, Eduardo Campos reagiu duramente à iniciativa do Planalto, denunciando a incoerência entre "a palavra e a atitude" de Dilma Rousseff: "Essa palavra e esse decreto não têm nada a ver com o que o governo pratica no dia a dia. É um governo fechado, que não tem as portas abertas para o diálogo".

Não obstante, Marina Silva chegara a defender o decreto da PNPS e essa posição em certa medida foi levada em consideração no texto prévio do programa de governo do PSB. Agora cabeça de chapa e forçada a harmonizar suas convicções pessoais com as do partido que a hospeda, Marina recuou, justificando-se com o argumento de que o documento a que o Estado teve acesso é apenas preliminar.

O PSB, como todo mundo, apoia o fortalecimento da democracia, mas não quer ouvir falar do decreto de Dilma Rousseff. O candidato a vice, Beto Albuquerque, pessebista histórico, colocou o dedo na chaga: "A proposta de Dilma é diferente. Você não pode me dizer que vai ter controle social sem me dizer quem vai controlar o eleito. Isso é muito perigoso". Melhor assim.

Revendo conceitos - MERVAL PEREIRA

O GLOBO - 26/08

Nos últimos 19 dias, muita coisa mudou para a candidata à Presidência da República pelo PSB Marina Silva, inclusive algumas ideias. Para se manter na condição em que deve aparecer na pesquisa Ibope/Estadão a ser divulgada hoje, à frente do tucano Aécio Neves e abrindo boa vantagem para a presidente Dilma no segundo turno, Marina está tendo que rever alguns de seus conceitos mais arraigados.

No dia 5 de agosto, então candidata a vice na chapa de Eduardo Campos, a ex-senadora Marina Silva elogiou o decreto da presidente Dilma Rousseff que cria conselhos populares em órgãos do governo, medida que teve uma forte reação contrária do Congresso e da sociedade civil independente.

Para Marina, o decreto era tão bom que foi classificado como uma medida eleitoral de Dilma, pois já deveria ter sido editado antes. A participação da sociedade é algo muito bom em um país como o nosso, com essa dimensão territorial e diversidade cultural. É fundamental que os governos façam coisas com as pessoas e não para as pessoas. Mas isso é para ser feito ao longo de toda uma vida, e não apenas vinculado à eleição. É algo a ser cultivado, independente de ser estratégia eleitoral. É uma inovação na gestão pública .

A ideia era tão boa que foi parar no programa que o PSB estava organizando para o candidato Eduardo Campos, e que agora Marina herdará. O que se buscaria era o controle social da política, com a criação de instâncias próprias para o exercício de pressão, supervisão, intervenção, reclamo e responsabilização .

Da mesma maneira que o decreto da presidente Dilma foi considerado uma tentativa de aparelhar a sociedade civil, criando conselhos populares que seriam manipulados pelas organizações e movimentos ligados ao PT para passar por cima do Congresso, também a decisão de Marina Silva de se utilizar desses conselhos para ações de pressão, supervisão, intervenção, reclamo e responsabilização provocou o mesmo temor, principalmente tratando-se de quem não leva muito em conta os partidos políticos como Marina.

Essa rejeição à política tradicional , aliás, é uma das suas vantagens competitivas no atual momento junto a um eleitorado que em sua maioria quer mudanças no país e desacredita os líderes políticos. Mas, ao mesmo tempo, Marina não pode assumir posições radicais, senão se arrisca a perder um eleitorado mais conservador que quer mudanças, mas não revoluções.

Instada a reafirmar sua posição nesse assunto tão controverso, Marina tratou de dar um passo atrás e disse que o texto a que os jornalistas do Estadão tiveram acesso não havia sido aprovado por ela, e que o programa de governo que será lançado na sexta-feira pretende, isso sim, valorizar as instituições .

O nosso documento fala em aprofundar a democracia, o que significa a valorização das instituições, e que essas instituições e as representações políticas possam estar ligadas à sociedade brasileira , explicou a candidata. A explicação verdadeira só saberemos quando o texto oficial for divulgado, mas está claro que a Marina candidata já não está tão empolgada com o decreto da presidente Dilma, a ponto de seu vice, o deputado federal Beto Albuquerque, ter dito que controlar representantes eleitos é muito perigoso , e que a proposta de sua chapa é bem diferente da de Dilma.

Da mesma maneira Marina está sendo chamada a se posicionar sobre a origem do avião que era usado na campanha por ela e por Eduardo Campos, e caiu no mesmo erro de Aécio Neves ao falar do aeródromo de Cláudio, em Minas. A explicação será dada no tempo necessário , disse ela.

O tempo necessário do candidato geralmente não é o tempo do eleitor, do cidadão comum. A própria Marina sabe disso, pois na ocasião cobrou providências, pois achava que havia fortes indícios de ilicitudes . E completou, criticando tanto o PT quanto o PSDB: Eu e o Eduardo Campos estamos lutando contra estes grandes grupos que se alimentam da corrupção. É por isso que cada um tem um mensalão para chamar de seu .

Hoje, é ela quem está tendo que dar explicações e justamente quando anuncia querer o apoio da parte boa do PT e do PSDB para formar um eventual futuro governo. Ao citar o ex-governador José Serra como um desses, Marina deixou no ar uma questão: por que negou-se a apoiá-lo em 2010 no segundo turno?

O recomeço - DORA KRAMER

O ESTADÃO - 26/08


Ainda sem ataques, fazendo a linha bem comportada, os três candidatos competitivos a presidente deram uma rearrumada nos discursos a fim de adaptá-los para a nova realidade da campanha, com a entrada de Marina Silva no páreo.

A mexida maior, claro, até agora foi no PSB, obrigado a trocar os pneus com o carro em movimento. Com a candidatura de Eduardo Campos, a estratégia era a de acentuar a oposição ao governo Dilma e apresentar as propostas para consertar os erros cometidos por ela na visão do então candidato.

Agora, o PSB precisa mostrar, ao mesmo tempo, que honra os compromissos com os aliados, que a candidata não é tão sectária como parece, que o mercado e o empresariado não têm nada a temer, que ela terá pulso firme para governar, que suas propostas "sonháticas" não são necessariamente lunáticas e, sobretudo, que dispõe de lastro em termos de equipe para o caso de vir a se eleger.

O movimento desde os últimos dias da semana passada foi intenso nesse sentido. Emissários saíram para conversas em todas as direções: o agronegócio, o setor empresarial, a área financeira, os partidos aliados nos Estados.

Não foi esquecida nem a velha carta de união dos "melhores" do PT e do PSDB para a formação de um governo de qualidade.

A ideia muito ventilada tempos atrás andava arquivada havia mais de dez anos. Por um motivo óbvio: a completa impossibilidade de convergência entre tucanos e petistas no tocante ao papel do Estado e na relação deste com a sociedade. Mas ao PSB nessa altura cabe isso mesmo, fazer gestos de conciliação, mostrar-se agregador, capaz de unir "os melhores" como convém ao projeto de terceira via.

Evidentemente, a tal associação soa inexequível. Primeiro, porque aquelas duas forças têm candidatos à Presidência. E depois, o PT e o PSDB nessa altura pensam em tudo, menos em colaborar com a adversária.

Na realidade nua e crua, querem mais é que Marina e o PSB se esfrangalhem a fim de não conseguirem consolidar a mudança do roteiro original em que petistas e tucanos se enfrentariam no segundo turno.

No fim de semana Dilma Rousseff e Aécio Neves já começaram a explicitar a divergência, ambos ressaltando o mesmo ponto de deficiência de Marina. A presidente aproveitou uma crítica da ex-senadora ao seu perfil de gerente para qualificar a declaração de "coisa de quem não tem experiência administrativa".

O candidato tucano em suas andanças de campanha também deu um jeito de encaixar uma fala ressaltando a si como a única alternativa "segura", para destacar a representação de insegurança em Marina. Hoje à noite, no primeiro debate entre os candidatos na TV Bandeirantes, será o teste inicial do peso da artilharia das campanhas presidenciais.

Legado. No PSB há a convicção de que o partido sai ganhando mesmo se Marina Silva perder a eleição para presidente ou, se eleita, deixar a legenda quando a Rede Sustentabilidade conseguir o registro definitivo na Justiça Eleitoral.

Com a candidatura presidencial forte, o PSB tem chance de eleger boa bancada de deputados federais. Isso dará ao partido direito a um tempo de televisão maior e uma parcela mais substanciosa do fundo partidário.

Caça ao apoio. Ávidos por boas notícias, PSB e PSDB adorariam neste momento contar com a declaração de voto do ex-presidente do Supremo Tribunal Federal Joaquim Barbosa. Ambos trabalham em surdina. Nenhum dos dois ousa registrar sombra de êxito.

Ou vai... O acordo de delação premiada do ex-diretor da Petrobrás Paulo Roberto Costa funciona assim: ou ele dá à Justiça informações - vale dizer, nomes - que permitam esclarecer o esquema de corrupção na empresa, ou não sairá da cadeia.

Bater ou não bater? - ELIANE CANTANHÊDE

FOLHA DE SP - 26/08


BRASÍLIA - Os programas na TV mostram Dona Nalvinha de dentes novos, humanizam Dilma e colorem Aécio como estadista e Marina como salvadora da pátria. Mas tudo muda nos debates, a partir de hoje.

A discussão é quem, como e onde vai bater primeiro na intrusa Marina, que chegou atrasada, por uma fatalidade, e já bagunçando o coreto. Dilmistas e aecistas estão loucos para bater, mas morrem de medo.

Marina, com seus 50 quilos, alimentação de passarinho e um prontuário recheado de doenças nativas, está emergindo da perplexidade geral e da dor particular com a morte de Eduardo Campos. Como bater numa figura frágil assim?

Ocorre que Dilma e Aécio não têm como fugir disso. Marina é competitiva, uma incógnita fantástica e um fantasma para a polaridade PT-PSDB. Se os dois antes favoritos lavarem as mãos, correm o risco de acordar com Marina disparada. Se bater, o bicho pega; se não, o bicho come.

Dilma vai desviar as baterias de Aécio para Marina, hoje a ameaça principal. Com a economia crescendo 7,5%, Serra tinha em torno de 30% em agosto de 2010. Com crescimento menor que 1%, Aécio só chega a 20% no mesmo mês da campanha. Ou seja: ele se enclausurou nos votos tucanos. É bobagem Dilma bater aí, porque são votos que não vão para ela e para o PT de jeito nenhum.

Aécio vai ter de bater no mau governo de Dilma e nos desmandos do PT, mas sem deixar Marina correndo solta rumo ao segundo turno. E Marina pode bater em quem quiser, mas o problema dela não é só mostrar o que há de ruim nos outros, mas o que há de bom nela além dos sonhos.

Até aqui, Dilma e Aécio questionam a capacidade executiva de Marina e a ausência de quadros suficientes do PSB e da Rede, tanto para compor um eventual governo quanto para cumprir a promessa de combater a síndrome do vitorioso no Brasil: a dependência do que há de pior na política para ter maioria no Congresso.

Bom debate!

Missão não cumprida - RUBENS BARBOSA

O GLOBO - 26/08


O aproveitamento do Centro de Lançamento de Alcântara (CLA) e o desenvolvimento de veículos lançadores de satélites (VLS) são prioridades no âmbito do Programa Nacional de Atividades Espaciais do Ministério da Defesa. O funcionamento de um centro de lançamento competitivo permitiria a entrada do Brasil no importante nicho de mercado de satélites de telecomunicações e de meteorologia.

Um programa desse porte só será possível se houver um entendimento com o governo dos EUA. A Base de Alcântara só poderá tornar-se viável comercialmente quando um novo acordo de salvaguardas entre o Brasil e os EUA tiver sido negociado, uma vez que, por motivos ideológicos, o anterior nunca foi ratificado.

A oposição do PT a esse acordo, que iria regulamentar o uso comercial da base de lançamento de foguetes de Alcântara por empresas americanas, na prática, excluiu o Brasil de um mercado anual de US$ 12 bilhões. Procurando contornar essa dificuldade, o país está tentando desenvolver um VLS próprio, outro com a Ucrânia e conduzindo um programa de lançamento de satélites com a China. Anuncia-se para o dia 29, como parte desse esforço o lançamento em Alcântara de foguete de sondagem, que pela primeira vez testará no Brasil combustível líquido embarcado.

A grande ironia em todo esse affair é que, sem o acordo com os EUA, nem o programa com a Ucrânia poderá avançar, apesar dos milhões de dólares investidos pelo Brasil.

No fim da visita do presidente Obama ao Brasil, em março de 2011, ficou decidido que os entendimentos sobre o acordo de salvaguarda seriam retomados com o objetivo de renegociar o texto para consideração do Congresso Nacional. Com isso, poderia ser viabilizado o programa de lançamento de satélites com a Ucrânia e ficaria aberta a porta para a cooperação entre empresas brasileiras e americanas na área de lançamento de satélites, tornando de fato efetivo o uso da Base de Alcântara. Com a divulgação da espionagem da NSA à presidente Dilma e a relação entre os dois países bastante dificultada, os entendimentos nem chegaram a começar.

Espera-se que, nos próximos quatro anos, sem preconceitos partidários e com razoável dose de pragmatismo, o futuro governo empreste ao programa espacial brasileiro uma efetiva prioridade. Com a conclusão da negociação do acordo de salvaguarda tecnológica com os EUA e com recursos financeiros adequados para garantir a continuidade dos esforços — que, por falta de apoio, caminham com grande dificuldade —, os programas poderão avançar e ser concluídos com êxito.

Em agosto de 2003, sério acidente na Base de Alcântara paralisou o projeto por algum tempo e fez desaparecer uma elite técnica que conduzia o programa do veiculo lançador de satélite. O VLS-1, que estava sendo preparado, explodiu e matou 21 cientistas, adiando ainda mais o projeto que colocaria o Brasil numa posição competitiva no mercado de satélites comerciais.

É urgente recuperar o tempo perdido.