terça-feira, julho 15, 2014

O emprego depois da Copa - JOSÉ PASTORE

O ESTADO DE S. PAULO - 15/07

Terminada a Copa do Mundo, os brasileiros estão à espera dos frutos do espetacular evento. No campo do emprego, as promessas foram sedutoras. O presidente da Embratur, José Vicente L. Neto, disse que a Copa criaria 1 milhão de empregos. Considerando os efeitos de longo prazo, José Benin, do Ministério do Esporte, anunciou a geração de 3,6 milhões de postos de trabalho. O que dizer?

Com base em estudos das Copas do Mundo realizadas na Europa e na África, sabe-se que as estimativas de geração de emprego apresentadas antes do evento são muito superiores às constatas depois do certame.

Na realidade, a Copa do Mundo é simplesmente uma grande festa que, como toda festa, gera oportunidades de trabalho temporário e de curta duração. Nas estimativas de Edson P. Domingues, da Universidade Federal de Minas Gerais, o total de empregos gerados pelo torneio deve ter ficado em torno de 185 mil, na maioria, temporários e ligados às atividades de turismo, alimentação, transporte, produção e vendas de bens alusivos ao evento - camisetas, bandeiras, flâmulas e adereços.

E o turismo, não teria alavancado a geração de empregos? O evento atraiu mais estrangeiros do que se esperava (cerca de 700 mil), o que gerou contratações de curta duração. Tudo seria diferente se, a partir da Copa, o Brasil se tomasse um polo de atração permanente para o turismo mundial, como são a França, os EUA, a China e o Caribe. É pouco provável que a Copa do Mundo tenha removido os focos de preocupação e apreensão dos estrangeiros em relação à insegurança e à violência no Brasil - assunto fartamente divulgado na imprensa internacional.

No comércio, o impacto também parece ter sido pequeno, mesmo porque, como compradores, os brasileiros não estavam tão animados como nas Copas anteriores. No setor de varejo ocorreu algo inesperado: a Copa esvaziou as lojas (com exceção das que vendem eletrodomésticos). A própria abertura do certame coincidiu com o Dia dos Namorados (12 de junho). De modo geral, os feriados decretados nas cidades-sede afetaram o setor de comércio e serviços, o que limitou a contratação de temporários.

A expansão da infraestrutura merece consideração especial. A construção dos estádios, aeroportos, vias de acesso e transporte estimulou a geração de empregos, sem dúvida. Mas, aqui também, concluídas as obras, terminam os empregos, com exceção dos ligados à operação dos novos empreendimentos como, por exemplo, os funcionários dos estádios, aeroportos e meios de transporte. Mesmo assim, ficamos longe da imensidão de empregos prometida.

Em suma, como aconteceu nas Copas do Mundo da França, Alemanha e Africado Sul, tudo indica que a promessa de geração de empregos decorrentes do certame no Brasil foi exagerada.

Wolfgang Maennig, que é especialista na análise dos impactos dos grandes eventos esportivos, salienta que o ganho mais concreto das Copas do Mundo é a disseminação de um sentimento de euforia e felicidade na população -fato que no Brasil durou só até a humilhante derrota para a Alemanha. Terminada a Copa, diz ele, as pessoas descobrem que, voltando à vida normal, têm de contar com os empregos de longa duração 
da indústria, agricultura, comércio e serviços, porque os que vieram com a Copa com ela se foram.

Nesse sentido, lamento dizer que no campo do emprego o Brasil vai tão mal quanto no campo do futebol. Nos primeiros cinco meses de 2014, a geração de novos postos de trabalho formal foi 32% menor do que em 2013 e 46% menor que em 2012. Isso indica a debilidade da nossa economia para gerar empregos, tudo agravado pela inflação, pelo custo Brasil, abaixa produtividade e a complexidade da CLT, que continuam tão perversos quanto antes da Copa. Quem sabe, passada a Copa, o Brasil decida remover esses entraves para os brasileiros poderem trabalhar e viver melhor...

O mundo dará uma força em 2015? - VINICIUS TORRES FREIRE

FOLHA DE SP - 15/07


Economia mundial um tico melhor em 2015 decerto não atrapalha, mas a bola está com o Brasil


O ANO QUE VEM será muito difícil para a economia brasileira, parece se tratar de quase um consenso. Curiosamente, a estimativa mediana de crescimento do PIB para 2015 é de 1,5%, muito fraquinho, decerto, mas superior ao 1% previsto para este 2014.

Dada a incerteza sobre qual será o próximo governo e o que será feito da política econômica, a previsão para o ano que vem não vale nem como ficção científica nível "C".

O resto do mundo, em especial as elites burocráticas do mundo rico, insiste porém que 2015 será enfim um ano, vá lá, bom. Ano de "volta à normalidade", medíocre que seja em termos de crescimento, e não importa que o couro dos mais pobres continue a ser esfolado nessa recuperação sempre mais ou menos frustrada, desde 2009. Vai rolar? A "retomada" euroamericana daria uma mãozinha ao Brasil?

Previa-se neste ano que os EUA crescessem 3%, excelente para um país tão rico. Deve crescer uns 2%, ainda ótimo, mas não é disso que se trata aqui. A Europa do euro sairia da recessão, crescendo pouco mais de 1%. Mas embica para pouco menos que isso.

No ano que vem, os Estados Unidos chegariam aos 3%, a eurozona iria a 1,5%, o Japão repetiria algo em torno de 1,7%, assim como a China repetiria seus 7,5%.

Nada mal. Nada muito bom, no que nos diz respeito. O efeito direto do crescimento da economia mundial no Brasil já é pequeno, pois o país negocia pouco com o exterior. A variação do PIB das economias maiores tende a fazer ainda menos efeito devido a problemas domésticos, brasileiros, e ao tipo de crescimento que virá no curto prazo.

Não haverá valorização anormal dos nossos produtos dominantes de exportação --comida e minério. Para piorar, a economia brasileira permanece inflacionada num mundo que, em parte, namora a deflação.

Ou seja, não vamos ganhar mercados em produtos manufaturados, pelo contrário. China e companhia avançam nos nossos clientes. Nossos custos altos e câmbio valorizado reduzem o interesse pelos nossos produtos (importamos mais, de resto). A Europa está com uma gigantesca sobra na capacidade de sua indústria (como não tem demanda lá, consumo, a Europa faz "xepa" dos seus produtos).

Pode-se argumentar que, pelo menos, pior do que agora não vai ficar. Pode ser, a princípio. Ainda há os riscos da transição.

Como se está cansado de saber, haverá mudança na política monetária americana (grosso modo, taxas de juros mais altas). Mudanças desse tipo sempre causaram algum tumulto financeiro mundial ou pelo menos efeitos colaterais em países mais frágeis (com inflação e déficit externo desconfortáveis).

Como se está cansado de especular, a crise europeia não acabou, por qualquer critério que se empregue, mas há o risco de aparecer outro entulho crítico, o de deflação.

Isto é o caso de uma economia tão fria, já com juro zero, com tanto desemprego de trabalho e de capital, com baixíssimo investimento e corte de gasto público, que passa a esfriar ainda mais.

Não quer dizer que estejamos fritos. Caso não sobrevenham tumultos financeiros maiores nos EUA e na Europa, o cenário externo tende a ser meio neutro. Como quase sempre, a bola está conosco.

Sobre a cana-de-açúcar e a descarbonização energética - ELIZABETH FARINA E ZILMAR DE SOUZA

VALOR ECONÔMICO - 15/07

O economista Jeffrey Sachs, em seu artigo "Os limites das negociações do clima", publicado na edição de 27/6/2014 do Valor, afirma que os países precisam inspirar-se nos casos em que governos, cientistas e indústria uniram-se para produzir grandes mudanças para o mundo vencer a crise decorrente das mudanças climáticas.

Nesse aspecto, o Brasil é frequentemente lembrado e elogiado com relação às emissões antrópicas associadas à matriz energética. Segundo a Empresa de Pesquisa Energética (EPE), com relação às emissões por habitante, cada brasileiro, produzindo e consumindo energia em 2013, emitiu em média 2,3 t CO2 equivalente (tCO2 -eq), ou seja, aproximadamente 8 vezes menos do que um americano e 3 vezes menos do que emite um europeu ou um chinês.

O fator que possibilita esse desempenho brasileiro tem sido a elevada participação de energia renovável na matriz energética, e que se manteve entre as mais elevadas do mundo em 2013, mesmo com a redução de oferta de energia hídrica e o aumento da geração térmica mais poluente.

Setor sucroenergético não pode continuar sendo penalizado por políticas públicas distorcidas

De fato, até houve uma redução na participação das renováveis na matriz energética brasileira de 42,3% para 41%, mas que não foi maior devido ao aumento de quase 10% na oferta interna de energia pelos produtos da cana-de-açúcar, leia-se etanol e bioeletricidade.

O aumento da oferta de cana e de etanol na safra passada na Região Centro-Sul, da ordem de 10%, ocorreu justamente em um período de falta de rentabilidade para os produtores, o que pode parecer um contrassenso, mas é reflexo do enorme esforço que tem sido realizado para reduzir a capacidade ociosa nas usinas instaladas.

Também do lado da bioeletricidade não ocorreu cenário diferente. Dados apresentados pela EPE mostram que a fonte biomassa atingiu uma geração recorde total de 39.679 GWh, um valor 14% superior ao ano anterior e equivalente a 1/3 do consumo anual residencial no sistema interligado em 2013. Basicamente, o resultado dessa geração foi fruto do citado aumento da oferta de cana e da maturação de investimentos realizados em anos anteriores, sob um cenário institucional totalmente diferente do quadro adverso atual.

Essa produção de bioeletricidade foi superior à geração de energia elétrica somada das fontes carvão, nuclear e eólica durante todo o ano, num momento em que a energia armazenada nos reservatórios das hidrelétricas apresentou os piores valores desde 2001, quando se decretou o racionamento de energia.

Mesmo com esse desempenho estratégico dos produtos energéticos da cana causa extrema preocupação o futuro do setor sucroenergético na matriz elétrica brasileira. A preocupação reside na inexistência de uma política setorial clara, estruturante e capaz de estimular o investimento no etanol e na bioeletricidade, comprometendo o futuro desses produtos na matriz energética brasileira. Ao contrário, os incentivos decorrentes da política pública brasileira voltada para combustíveis e eletricidade têm estimulado o consumo de combustíveis fósseis por meio de subsídio e desoneração tributária da gasolina. O resultado tem sido desastroso.

Segundo o Centro Nacional das Indústrias do Setor Sucroenergético e Biocombustíveis (Ceise Br), em meados de 2013 cerca de 250 indústrias de Sertãozinho-SP, o "Vale do Silício da Indústria Sucroenergética", apresentavam ociosidade chegando a 60%. Desde 2010 empresas de bens de capital voltadas para a indústria canavieira registram queda de 50% no faturamento, com corte de milhares de postos de trabalho e 66 unidades produtoras de açúcar e etanol em recuperação judicial atualmente, considerando as unidades em operação e também as inativas.

Outra consequência dessa conjuntura: em 2008, os desembolsos do BNDES em bioeletricidade sucroenergética chegaram a R$ 2 bilhões. Em 2013, foram de apenas R$ 200 milhões, reflexo de um cenário de incertezas quanto ao papel tanto da bioeletricidade quanto do etanol na matriz de energia do país.

Nenhuma cadeia produtiva consegue sobreviver a uma política de stop and go como a que está vivenciando o portfólio de produtos do setor sucroenergético. Este é um péssimo sinal. É necessário estabelecer condições institucionais para que o etanol e a bioeletricidade sejam tratados como prioridade no planejamento energético brasileiro.

O investimento em bioeletricidade será impulsionado de forma consolidada novamente quando voltarmos a expandir os canaviais. E essa expansão somente acontecerá se tivermos políticas públicas que estimulem o etanol hidratado e seu papel na matriz de energia do Brasil. Etanol e bioeletricidade são produtos sinérgicos e, portanto, precisam de políticas públicas concatenadas adequadas e de longo prazo.

Na linha do artigo do professor Jeffrey Sachs, para que etanol e bioeletricidade continuem sendo casos brasileiros de sucesso e possam servir de inspiração para o mundo quanto à "descarbonização" do sistema energético, o setor sucroenergético não pode continuar sendo penalizado por políticas públicas distorcidas que não reconhecem os atributos desses produtos e seu papel na matriz energética brasileira.

Os Brics como bloco - CELSO MING

O ESTADO DE S.PAULO - 15/07


Hoje, em Fortaleza, o Brics dará o primeiro passo para ser mais do que uma sigla. Embora não passem de um aglomerado de países grandes com escassos interesses em comum, Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul sacramentam a criação de duas instituições que podem aumentar sua influência conjunta na geopolítica global.

Criada há 13 anos por Jim O'Neill, então economista-chefe do banco Goldman Sachs, a sigla pretendia apenas apontar os países emergentes com mais condições de influência futura no mundo. Agora, seus dirigentes pretendem costurar projetos em comum e agir como bloco.

As mais importantes decisões a serem tomadas hoje em Fortaleza pelos chefes de Estado dos Brics são a criação de um banco de desenvolvimento, o New Development Bank (NDB), e um fundo de reservas para prevenir incapacidades de pagamento, o Contingency Reserve Arrangement (CRA).

Ambos nascem a partir das críticas à atuação das duas grandes instituições globais fundadas em 1944, na reunião de Bretton Woods, destinadas então a compor a reorganização global no pós-guerra: o Banco Mundial (World Bank) e o Fundo Monetário Internacional (FMI).

Os Brics entendem que o Banco Mundial e o FMI fazem o jogo dos Estados Unidos, estão esclerosados, rechaçam reformas que garantam maior participação dos emergentes em sua direção e fazem exigências demais aos países que eventualmente precisem de recursos para enfrentar uma crise na sua capacidade de honrar compromissos.

O novo banco terá capital inicial de US$ 50 bilhões, a ser subscrito equitativamente pelos cinco sócios. O CRA deverá contar com US$ 100 bilhões, com os quais a China aportará 41%; Brasil, Rússia e Índia entrarão com 18% cada um; e a África do Sul, com 5%.

Com esse capital de apenas US$ 50 bilhões, o novo banco terá limitado poder de fogo. Apenas para comparar, um projeto de trem-bala, tal como o previsto para o Brasil, não sai por menos de US$ 14 bilhões. Apenas a Petrobrás prevê investimentos de US$ 220 bilhões nos próximos quatro anos. É claro que esse banco poderá completar seu passivo com levantamento de recursos no mercado global. Ainda assim, será pequeno. Somente o nosso BNDES tem um passivo de US$ 350 bilhões.

Quando integralizadas, as disponibilidades do novo fundo de reserva serão apenas uma fração do volume de reservas externas em poder de cada um dos Brics - exceção feita ao caso da África do Sul.

Ou seja, se for para se apoiar mutuamente, essas duas instituições terão baixo alcance. E, se for para atender terceiros países, terão alcance mais limitado ainda. No entanto, o tamanho e a função real a ser desempenhada por essas instituições não serão as questões mais importantes. Mais importante será saber se os cinco integrantes do Brics conseguirão se entender em torno de um projeto comum que se apresente como alternativa ao Banco Mundial e ao FMI.

Supertele do além - MIRIAM LEITÃO

O GLOBO - 15/07


A ideia de criar uma supertele brasileira não cansa de fracassar. Foi um projeto desenvolvido no governo Lula, que envolveu mudança de regulação e empréstimos do BNDES, que é um dos acionistas. Não deu certo, e a empresa acabou tendo uma grande fatia comprada por uma companhia portuguesa. Agora, a ex-supertele brasileira é atingida pelos estilhaços do que acontece em além-mar.

O último lance dessa complicação fez o valor da Oi despencar e depois se recuperar em parte. O que detonou a crise de confiança em relação à empresa não foi resolvido. Hoje, o Banco Espírito Santo terá que pagar títulos comprados pela Portugal Telecom e que, se não forem pagos, enfraquecem financeiramente a maior acionista da Oi. O pior é que o investimento temerário feito pela PT não foi comunicado à tele brasileira.

O governo Lula achava que era preciso um esforço para haver uma empresa de telecomunicações forte de capital nacional. Por isso, em 2008, removeu um importante obstáculo regulatório e permitiu que ela comprasse a Brasil Telecom. Isso expandiu de forma significativa a área de atuação da empresa.

Para a compra em 2008, a empresa recebeu injeção de recursos do BNDES. O banco nos informou ontem que ao todo emprestou R$ 22 bilhões à empresa desde a privatização. Além disso, de 1999 até agora, o BNDESPar aplicou em compra de debêntures e ações um total de R$ 6 bilhões na empresa.

A fusão com a Portugal Telecom não conseguiu cumprir a promessa de simplificar sua confusa estrutura societária. Eduardo Tude, presidente da consultoria Teleco, especializada em telecomunicações, explicou por que a compra da Brasil Telecom não atingiu os objetivos:

— Desde que a Oi comprou a Brasil Telecom é como se ela tivesse engolido uma caça maior do que ela. A empresa entrou em estado de paralisia, num longo processo de reestruturação interna e de recomposição acionária. O processo consumiu muita energia e tempo na empresa, enquanto as concorrentes continuaram buscando crescer no mercado.

No ano passado, veio outra novidade: a Portugal Telecom comprou uma grande fatia da empresa e virou a maior acionista do que passou a ser a ex-supertele nacional. A operação foi anunciada como “fusão”. Desde o início do processo, as ações da Oi, segundo o “Valor”, caíram 62%. Agora, quando a empresa se preparava para uma oferta de ações para fortalecer-se financeiramente, a maior acionista, exatamente a Portugal Telecom, aparece encrencada por ter feito aplicações em papéis de um banco português em dificuldades.

A Oi, desde a privatização, enfrentou vários momentos de muita desconfiança do mercado por falta de transparência nas decisões da empresa, falta de governança. A expectativa era que a companhia conseguisse agora passar mais segurança sobre sua gestão.

A Portugal Telecom se comprometeu a aportar R$ 5,7 bilhões em ativos dela na empresa. No total, contando os que iriam acompanhar a capitalização, a empresa receberia R$ 14 bilhões. O processo estava em andamento quando saiu a notícia de que a PT comprou debêntures do Grupo Espírito Santo, sem comunicar aos seus sócios, e agora está sob risco de levar um calote. Então o problema que seria resolvido com a entrada do sócio estrangeiro acabou ficando pior exatamente por causa desse sócio.

A confusão nunca é pequena quando se trata dessa empresa. Descobriu-se que a Previ vendeu ações no período que não poderia, porque estava se preparando uma nova oferta bilionária de ações. O fundo de previdência dos funcionários do Banco do Brasil tem participação no capital da Oi tanto diretamente quanto indiretamente, através da Telemar Participações.

As confusões além-mar são piores. Aqui, o que se trata é mais um nó na empresa escolhida para ser campeã nacional, que virou portuguesa, e agora está a bater com os burros n’água na sua relação com o novo dono. Lá, o risco é de insolvência do Banco Espírito Santo, que pode chacoalhar a economia de Portugal e ter reflexos fora do país. Portugal, recentemente, pagou o que devia ao Fundo Monetário Internacional e dispensou nova ajuda do Fundo, dizendo ser capaz de lidar sozinho com seus problemas. Mas agora seu principal grupo financeiro está em apuros.

Sinuca macroeconômica - JOSÉ PAULO KUPFER

O ESTADÃO - 15/07


Dez entre 10 analistas concordam que o Comitê de Política Monetária (Copom) manterá a taxa básica de juros em 11% ao ano, na reunião marcadas para hoje e amanhã. Consensos em torno das decisões do Copom não são incomuns. Mas uma unanimidade como a que agora se observa é coisa mais rara. Qualquer resultado diferente desta vez, por isso, configurará a surpresa das surpresas.

Não deixa de parecer algo estranho quando há também unanimidade sobre os índices de inflação futuros. Os mesmos que estão convictos de que os juros básicos não se mexerão tão cedo também se mostram convencidos de que a inflação, já tendo ultrapassado o teto da meta, continuará em alta até pelo menos o fim deste terceiro trimestre.

Essa, porém, é uma estranheza apenas aparente. Existem, de fato, razões fortes para que nenhum analista ouse discordar da tendência à imobilidade, nos próximos meses, da taxa Selic. A principal delas deriva do fato de que a economia vem dando sinais de esfriamento cada vez mais evidentes. Ninguém duvida de uma contração da atividade, no segundo trimestre, em relação ao trimestre anterior. A expectativa é a de que, mesmo ocorrendo alguma recuperação daí em diante, a tendência para a variação do PIB em 2014 é descendente, com boas possibilidades de fechar o ano com crescimento abaixo de 1%.

Assim, uma elevação nos juros básicos enquanto não for possível detectar onde se encontra o fundo do poço da atividade econômica - ou seja, até onde podem ir os impactos contracionistas acumulados da alta nos juros promovida no último ano - embutiria grandes riscos. O maior deles seria o de jogar a economia numa recessão de dimensões desconhecidas.

Tem sido particularmente notável - e preocupante - o recuo no setor industrial. Embora seu peso no conjunto da economia venha diminuindo ano a ano, o progressivo encolhimento da indústria tem consequências de grande impacto no nível geral de atividades e, como reflexo, nos indicadores econômicos. A produção industrial recua, consecutivamente, mês a mês, há quase três anos, na comparação com o mesmo período do ano anterior. No início do segundo semestre, as projeções para a produção da indústria, em 2014, já estão 1% abaixo do volume produzido em 2013.

Diante de um quadro agudo de perda de substância da produção em geral, puxada pela queda da produção industrial, a política de juros perde espaço como ferramenta eficaz para furar pressões inflacionárias. Essa tarefa foi transferida para a política cambial, que opera com o objetivo de manter o real valorizado, esvaziando a pressão inflacionária dos produtos comerciáveis, que competem com bens importados. Mas esta também roda em avenida estreita.

Com reservas internacionais abundantes e um perfil de passivo externo menos dependente de dívidas do que de participações em capital, embora a fatia das dívidas esteja em progressão, não é por esse lado que a margem de manobra da política cambial fica mais apertada. Valendo-se desse colchão de moeda estrangeira, o Banco Central tem mantido a taxa de câmbio estacionada em ponto baixo com a venda de dólares em operações diárias programadas

Os limites da política cambial, no quadro atual, são dados pelo outro lado do câmbio, expresso pelas contas do balanço de pagamentos, com ênfase na balança em transações correntes. Já nas alturas de US$ 80 bilhões, o equivalente a 3,6% do PIB, o déficit em transações correntes não só, mas também em razão do câmbio valorizado, se encontra no limite do administrável.

É, em resumo, tal a sinuca em que se encontra a política macroeconômica e são tão crescentes os riscos de uma recessão que, com inflação no teto da meta e tudo, começam a ganhar adeptos, ainda que timidamente, as hipóteses de cortes pelo Banco Central - e não aumentos, como seria de se esperar com a inflação no teto - da taxa básica de juros, em futuro não distante.

O professor e o senador - FERNANDO TIBÚRCIO PEÑA

O GLOBO - 15/07

Quando vi a presidente Dilma assinar o decreto que disciplina a criação dos conselhos populares, tive a impressão de que houve uma certa influência bolivariana



É um convite à reflexão a recente troca de farpas entre Marco Aurélio Garcia, assessor especial da Presidência da República para Assuntos Internacionais, e Ricardo Ferraço, presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional do Senado. Provavelmente incomodado com a natural repercussão que teve a entrevista do senador Ferraço nas páginas amarelas da revista de maior circulação no país, o professor aposentado da Unicamp partiu para o contra-ataque usando a condenável estratégia de desqualificar academicamente o seu opositor. A meu ver, não surtiu efeito. Li o seu artigo-resposta e fiquei com a sensação de que o professor estava schopenhauerianamente tentando vencer o debate sem ter razão.

A certa altura, Marco Aurélio Garcia — a quem Ferraço chamou de “chanceler de fato” — acusa o senador de recorrer a velhos chavões da direita. Na ótica do professor, como o “comunismo” está virando um assunto restrito aos livros de história, o senador teria encontrado um novo “espantalho” para subsidiar um discurso supostamente conservador: o “bolivarianismo”. Marco Aurélio Garcia enfatiza que o senador não explicou que bicho é esse, embora ele também não o tenha explicado. Foi aí que percebi que eu próprio, quem sabe por uma deficiência acadêmica, não era capaz de traçar com precisão o conceito de “bolivarianismo”.

Quando vi a presidente Dilma Rousseff assinar o decreto que disciplina a criação dos conselhos populares, tive a impressão de que houve sim, muito diferente do que diz o professor Marco Aurélio, uma certa influência bolivariana. Sei que o diabo andou por ali, mas não saberia dizer com segurança que cara tem o diabo.

Para o meu alívio, depois de muito pesquisar, descobri que são incipientes as tentativas de encontrar uma definição para o termo e que, na maioria das vezes, há uma compreensível confusão entre “bolivarianismo” e “chavismo”. O que achei na doutrina não vai além do óbvio vínculo que tem o movimento sociopolítico com a sua fonte inspiradora, Simón Bolívar. Então, decidi sistematizar as características que moldam o bolivarianismo, como parte de uma atrevida experimentação com o fim de estabelecer as bases para um futuro conceito. As mais evidentes talvez sejam a dificuldade dos seus líderes para se desapegarem do poder e a formação de uma nova elite nos seus respectivos países.

Basta ver que o próprio Simón Bolívar se autodenominou “ditador e libertador das Províncias Ocidentais da Venezuela”. Bolívar se rodeou de pompa própria de uma corte, deixando os assuntos importantes nas mãos de favoritos, que acabaram por arruinar as finanças públicas, levando-os a recorrer a meios odiosos para reorganizá-las. Não sou eu que estou dizendo isso. O juízo de valor, que um século e meio mais tarde serve para contextualizar a atual elite chavista venezuelana, foi feito por um dos maiores ícones da esquerda, senão o maior: Karl Marx.

Hoje, além do presidente venezuelano Nicolás Maduro, discípulo de Hugo Chávez, outros três presidentes latino-americanos se autoproclamam bolivarianos: Evo Morales, Rafael Correa e Daniel Ortega. Manuel Zelaya, o caudilho hondurenho que o Brasil acolheu em sua embaixada em Tegucigalpa, outro bolivariano confesso, não é mais presidente (em que pese o intento frustrado de sua mulher, Xiomara, para tentar ressuscitar o zelaísmo). Foi apeado do poder por um golpe de Estado que teve como estopim as suas manobras para alcançar um segundo mandato, uma iniciativa tão aterradora para a Constituição de seu país, a ponto de sujeitar Zelaya a perder a cidadania hondurenha.

Evo Morales obteve num Tribunal Constitucional Plurinacional totalmente manipulado pelo governo o direito de concorrer a um terceiro mandato, não obstante o fato de a Constituição boliviana proibir expressamente mais de uma reeleição imediata.

Rafael Correa, que também sonha em se eternizar no poder, deixou para trás Evo Morales. Inspirador da virada de mesa do líder cocaleiro, Correa já está no terceiro mandato, um estado de coisas que afronta a Constituição. A solução para permanecer por mais tempo no Palácio de Carondelet foi apelar para reeleições indefinidas. Sem a menor vontade de largar o osso, Correa decidiu apoiar uma emenda constitucional que poderá reconduzi-lo uma ou mais vezes à Presidência do Equador.

Maduro, por obra de seu mentor, e Ortega, por obra dele mesmo, não têm motivos para se preocupar: as regras do jogo foram mudadas enquanto o jogo era jogado e agora a reeleição indefinida faz parte dos sistemas eleitorais da Venezuela e da Nicarágua.

Personagens de uma América Latina populista. Companheiros dos convescotes do Foro de São Paulo. Amigos do professor.

O melhor do Brasil - ELIANE CANTANHÊDE

FOLHA DE SP - 15/07


BRASÍLIA - Na hora dos balanços sobre a Copa, é necessário reconhecer: todo mundo (quase literalmente) achava que o Brasil levaria a taça nos gramados e daria um vexame fora deles, com manifestações, quebra-quebra, violência policial, aeroportos insuportáveis, estádios cheios de tapumes e uma onda de assaltos a nacionais e a estrangeiros. Ocorreu justamente o oposto.

Se a expectativa era muito favorável à seleção e bem pessimista quanto à capacidade do país em recebê-lo, no fim o time do Felipão é que se revelou um fiasco histórico, enquanto a Copa se afirmava como um sucesso para brasileiros e para torcedores das mais diferentes nacionalidades.

Como sempre se critica aqui o uso despudorado dos instrumentos e da visibilidade da Presidência da República para fazer campanha aberta, agora faça-se justiça: depois de meses engolindo críticas e dúvidas, Dilma, como presidente, acertou ao reunir uma penca de ministros para prestar contas, fazer um balanço, apontar o dedo na cara dos "pessimistas" e capitalizar o sucesso do maior evento desportivo do planeta.

Vá lá que obras de mobilidade urbana ficaram para "depois" e que houve atrasos e improvisos, com tudo entregue em cima da hora, incompleto e com problemas, mas, no geral, os aeroportos e estádios funcionaram a contento e o esquema de segurança foi integrado e aparentemente impecável.

E a "hospitalidade" do brasileiro, o clima do Brasil e o ambiente da festa fizeram o resto e definiram o êxito, como confirma o Datafolha.

Podemos até estar perdendo o carimbo de "país do futebol", mas, ainda assim, um mês de Copa do Mundo fez mais pela diplomacia e pela imagem do Brasil no mundo do que os quatro anos de política externa do governo Dilma Rousseff.

Conclui-se, pois, de uma vez por todas, que --apesar da corrupção, da violência, da malemolência e do espírito "macunaímico"--, o melhor do Brasil é mesmo... o povo brasileiro.

O legado dos 7 x 1 - GIL CASTELLO BRANCO

O GLOBO - 15/07


Oportunismo por parte das autoridades teve como finalidade descolar as derrotas contundentes do projeto de reeleição


O talento de Carlos Drummond de Andrade vai além da capacidade de transformar palavras em arte. Na semana passada, atordoado com os 7 x 1, reli a crônica “Perder, ganhar, viver”, publicada há 32 anos, na derrota do Brasil para a Itália, no Mundial de 1982. No texto, o poeta retratou a frustração que tomou conta do país, comparável à que nos envolveu agora, nas goleadas impostas por Alemanha e Holanda.

A respeito da reação dos políticos, Drummond escreve: “...Vi a decepção controlada do presidente, que se preparava, como torcedor número um do país, para viver o seu grande momento de euforia pessoal e nacional, depois de curtir tantas desilusões de governo; vi os candidatos do partido da situação aturdidos por um malogro que lhes roubava um trunfo poderoso para a campanha eleitoral; vi as oposições divididas, unificadas na mesma perplexidade diante da catástrofe que levará talvez o povo a se desencantar de tudo, inclusive das eleições...” Nada tão atual.

Horas depois do maior atropelo da seleção brasileira em cem anos, os políticos entraram em campo e jogaram para a arquibancada. A presidente da República deu entrevista à CNN sobre a necessidade de renovação do futebol brasileiro e concluiu que “o Brasil não pode mais continuar exportando jogador”, sem explicar como irá aprisionar as jovens revelações ou repatriar Neymar, Thiago Silva, David Luiz e outros. Pelo que imagino, será mais difícil do que congelar as tarifas de energia ou o preço da gasolina. O jornalista Franklin Martins, responsável por um dos blogs da campanha de Dilma, jogou no colo da CBF, de José Maria Marin e Ricardo Teixeira, a conta do vexame, mas exagerou na dose a ponto de a “chefa” reclamar do tom. O ministro do Esporte, Aldo Rebelo, defendeu “intervenção indireta”, mal explicada. O mais curioso é que essas propostas só agora tenham vindo à tona, apesar de o Ministério do Esporte existir desde 2003, inclusive tendo na sua estrutura, a partir de 2009, a Secretaria Especial de Futebol e Defesa dos Direitos do Torcedor.

Mudar as leis, porém, depende do Congresso Nacional e, nesse sentido, o projeto de lei original que lá se encontra é do deputado Vicente Cândido (PT/SP), por coincidência vice-presidente da Federação Paulista de Futebol para a região metropolitana e o ABCD. No bojo, muito mais sobre a anistia das dívidas fiscais bilionárias dos times de futebol do que sobre a responsabilização dos dirigentes e entidades esportivas. Cá entre nós, o surto de oportunismo por parte das autoridades governamentais teve como única finalidade descolar as derrotas contundentes da seleção do projeto de reeleição da candidata-presidente. Afinal, as mazelas do futebol brasileiro e a patota que o comanda são conhecidas há muitos anos.

Em 2001, a CPI da CBF-Nike, presidida justamente pelo então deputado Aldo Rebelo, desvendou esse esquema de grandes negócios que enriquece cartolas à custa da penúria dos clubes, transforma jogadores em mercadoria e destrói a seleção. No livro que escreveram sobre a CPI, os deputados Aldo e Silvio Torres entraram de sola na cúpula do futebol brasileiro:

“...São milhões de dólares que rolam em contratos obscuros e desaparecem. Quanto maiores os contratos, mais endividados ficam a CBF, as federações e os clubes, enquanto fortunas privadas formam-se rapidamente, administradas em paraísos fiscais de onde brotam mansões, iates, e se alimenta o poder de cooptação e de corrupção.”

Apesar dessas constatações, o que se viu nos últimos 13 anos foi mais do mesmo. Como as mudanças dependem do Congresso Nacional, que neste ano praticamente já encerrou as suas atividades em função das eleições, essa tal “reformulação do futebol brasileiro”, decorrente do “legado dos 7 x 1”, ficará para o próximo governo.

O importante, neste momento, é mudarmos o disco. Pior do que a seleção de Felipão é a conjuntura da economia. O crescimento econômico em 2014 será de 1%, se tanto. A inflação acumulada em 12 meses estourou o teto da meta de 6,5%, mesmo com os preços administrados represados. O déficit em conta-corrente (diferença entre importações e exportações de bens e serviços) acumulado até maio já alcança 4,3% do PIB. Sem as “mágicas contábeis”, o superávit primário (necessário para o pagamento dos juros da dívida pública) é nulo. Ao que parece, está na hora de realizarmos “a eleição das eleições”.

Desta forma, volto a Carlos Drummond de Andrade: “Foi-se a Copa? Não faz mal. Adeus chutes e sistemas. A gente pode, afinal, cuidar dos nossos problemas.”

Palácio do Palanque - DORA KRAMER

O ESTADO DE S.PAULO - 15/07


O instituto da reeleição impõe um desafio legal (e moral) difícil de ser cumprido. Nem por isso deve deixar de ser perseguido por candidatos a um segundo mandato consecutivo: a separação dos atos de campanha dos compromissos de governo.

O limite da distinção entre uma agenda e outra é sutil, mas com boa-fé, com respeito ao jogo limpo, com um mínimo de discernimento sobre o momento em que se ultrapassam essas fronteiras e, sobretudo, com consciência sobre o significado da representação do cargo público, principalmente quando se refere ao conjunto da Nação, é possível o governante administrar a vantagem natural sem perder a estribeiras.

Pois a presidente Dilma Rousseff, que já tinha ficado perigosamente próxima de perdê-las na semana passada naquela megassolenidade via teleconferência de entrega de casas populares e promessas de construção de outras tantas unidades, em ato financiado com dinheiro público para ser usado no horário eleitoral, agora vai deixando desandar a carruagem.

Deu uma entrevista à TV Al Jazeera, do Qatar, simplesmente pedindo votos. "Eu acredito que o povo brasileiro deve me dar a oportunidade de um novo período de governo pelo fato de que nós fazemos parte de um projeto que transformou o País", disse.

Na condição de presidente de uma república em entrevista a uma emissora internacional, falando como representante de todo o Brasil, no exercício de seu posto, Dilma Rousseff apresenta-se como integrante de um grupo. A referência ao já notório "nós" pressupõe a existência do igualmente afamado "eles", um ente apartado do País.

Definitivamente, não são maneiras de um mandatário. Nem de candidato à reeleição na posse ética para o jogo. E o pior é que não foi um lapso. A presidente prosseguiu ao falar sobre os índices de pobres e miseráveis que passaram a integrar a classe média: "Nós transformamos a vida dessas pessoas".

Faltou completar, mas deixou implícito: e, por isso, devem por gratidão votar em "nós". A senhora Dilma Rousseff, talvez empolgada com a campanha eleitoral que agora se inicia, parece ter perdido a noção de que até o dia 1.º de janeiro de 2015 ainda é presidente do Brasil e pode vir a ser por mais quatro anos.

Enquanto estiver no exercício da Presidência representa todos os brasileiros. Ou entende isso, e assim se comporta, ou se enfraquecem os apelos ao respeito à instituição presidencial quando a chefe de governo é desrespeitada, por exemplo, em estádios.

No discurso de palanque ao microfone da Al Jazeera Dilma recitou o versinho marqueteiro: "Nós oferecemos o seguinte: quem fez, sabe continuar fazendo, enquanto quem quando pode não fez, não sabe fazer. É simples a opção".

Paralelo a isso, o Palácio do Planalto faz toda uma cenografia de neutralidade dizendo que há um esquema especial de comando de governo para evitar a ultrapassagem de limites.

Ocorre que os ministros escalados para ficar em Brasília, oficialmente com funções exclusivamente relacionadas com o governo, informalmente participam de decisões de campanha. Funcionarão como "consultores", alega-se.

Sabem o senhor e a senhora como é? Quando vários ministros no auge da campanha estiverem em pleno horário de expediente se movimentando para cima e para baixo, recebendo prefeitos, dirigentes partidários, reunindo-se para discutir como responder a esse ou àquele ataque da oposição, serão apenas atos de "consulta".

Não importa que todos eles façam isso a partir da estrutura de governo. Do Palácio do Planalto (do Palanque?), dos ministérios, a qualquer hora, de qualquer local. Na prática, está tudo liberado.

Como a partir de agora a presidente não pode inaugurar obras nem anunciar novas realizações de governo, faz uma agenda de entrevistas. No exercício do cargo de presidente. E nelas pede votos na condição de candidata.

Um homem honrado - JOSÉ SERRA

FOLHA DE SP - 15/07


Há homens que admiramos não porque falam o que pensamos, mas porque falam o que pensam. Plínio se foi de bem com sua consciência


Morreu Plínio de Arruda Sampaio. Era um homem inequivocamente de esquerda sem nunca ter sido de fato marxista. Foi um democrata cristão no início de sua vida pública sem jamais ter sido um conservador. Sua personalidade complexa e aparentemente contraditória, que conheci bem, guardava uma notável coerência.

Concordasse eu com suas escolhas ou não --e é certo que, politicamente, estivemos mais próximos no passado do que em dias recentes--, tenho claro que Plínio rompeu barreiras políticas sempre por bons motivos, que nunca atenderam à sua conveniência pessoal. Há homens que admiramos não porque falam o que nós pensamos, mas porque falam o que eles pensam. Plínio se foi de bem com sua consciência, e aí está uma grandeza e uma paz merecidas.

A primeira vez em que ouvi falar dele foi na minha adolescência. Plínio era subchefe da Casa Civil do governo de São Paulo, e lhe coubera coordenar um plano de ação que orientaria os investimentos do Estado de 1958 a 1962, ano em que se elegeu com facilidade deputado federal pelo Partido Democrata Cristão.

No Congresso, foi relator do projeto de reforma agrária contemplado nas "reformas de base" do governo de João Goulart. Em abril de 1964, com o golpe militar, teve seu mandato cassado e seus direitos políticos suspensos por dez anos.

No exílio chileno, Plínio tornou-se técnico da FAO, num projeto de capacitação e pesquisa sobre a reforma agrária conduzido pelo governo democrata cristão de Eduardo Frei. Em Santiago, frequentar a casa de Plínio e Marieta era um dos meus hábitos preferidos em razão da acolhida de toda a família.

Depois da vitória da Unidade Popular, de Salvador Allende, no fim de 1970, ele se mudou para os EUA. Tornara-se funcionário do Banco Interamericano de Desenvolvimento. E foi lá que a família Sampaio nos acolheu em sua casa --a mim, mulher e dois filhos pequenos--, em meados de 1974, depois da prisão e perseguição que sofremos da ditadura do general Pinochet.

Após um mês e meio de hospedagem, fomos para a Universidade de Cornell, onde eu iria obter o doutorado em economia. Descobri que havia lá um mestrado em economia agrícola. Um pouco mais tarde, convenci Plínio a fazê-lo. Na pequena cidade de Ithaca, as duas famílias conviveram intensamente. Foi de lá que ele regressou ao Brasil, em 1976.

A partir de 1977, um grupo, do qual faziam parte eu, Fernando Henrique Cardoso, Francisco Weffort, Almino Affonso e Plínio começou a discutir a ideia de se criar um novo partido de esquerda. Plínio e Almino propuseram lançar a candidatura de FHC ao Senado nas eleições de 1978, a fim de aglutinar as forças que comporiam a nova legenda.

Pensava-se em atrair Lula, o dirigente sindical mais expressivo da época, que viria a participar da campanha de FHC naquele ano. Em 1979, fez-se uma grande reunião aberta no ABC para impulsionar a criação do novo partido. Ocorreu, porém, o oposto: de um lado, Lula defendeu a criação de um partido operário; do outro, os "autênticos" do MDB, Fernando Lyra à frente, defenderam a permanência no MDB como frente ampla da oposição ao governo do general Figueiredo.

Plínio engajou-se então na criação do PT, com o respaldo de setores da Igreja Católica. A história posterior é mais conhecida. Mas vale registrar um episódio: em 1988, ele foi pré-candidato a prefeito de São Paulo. Apesar de sua experiência, foi preterido por integrantes do aparato petista. Em 1990, deram-lhe a candidatura ao governo do Estado, quando a chance de vitória PT era nenhuma.

Em 2010, ambos candidatos à Presidência da República, fui inquirido por ele em vários debates na TV: firme, sem fazer concessões. Em vez de me chamar de "Serra", preferia o "Zé", o vocativo de uma amizade de tantas décadas. E fazia essa escolha não porque pretendesse me preservar das nossas divergências, mas porque um confronto também pode ser elegante.

Velórios são tristes. Velórios de pessoas de bem são especialmente tristes. Eu estava lá porque queria dignificar as nossas diferenças. Eu estava lá, sobretudo, porque queria dignificar a nossa amizade --as diferenças e a amizade de um homem honrado, com uma família adorável.

Responsabilidade fiscal nos clubes - MERVAL PEREIRA

O GLOBO - 15/07

A partir da discussão sobre o que fazer para reorganizar nossa estrutura futebolística, o primeiro passo parece ser a mudança a partir dos próprios clubes, que são a fonte de poder das federações estaduais, que, por sua vez, elegem a diretoria da Confederação Brasileira de Futebol (CBF).

Não há como começar esse processo sem ser dessa base, dizem os especialistas pois, sendo uma entidade privada, a CBF não está sujeita a intervenções oficiais, protegida pela própria Fifa, que proíbe a interferência de governos e de tribunais que não sejam os da Justiça Esportiva.

Mesmo que a interferência do governo e dos políticos seja indesejável, será preciso repactuar as dívidas dos clubes com o governo para que reformulemos nossa estrutura clubística em novas bases.

Já existe na Câmara dos Deputados em Brasília um substitutivo, do deputado federal do PSDB do Rio Otávio Leite, que pode ser votado em breve, pois está pronto para ir ao plenário desde abril, depois de ser aprovado pelas comissões. Mas vem sofrendo a obstrução da base aliada do governo.

A proposta é ampla e representa importante avanço, a partir da renegociação da dívida dos clubes, mas com punições rigorosas, que podem chegar ao rebaixamento, para o não pagamento. O substitutivo já está sendo designado como Lei da Responsabilidade Fiscal do Esporte (LRFE), numa alusão proposital à Lei de Responsabilidade Fiscal, aprovada junto com o Plano Real, que limitou as dívidas dos estados e municípios e impôs aos entes federativos hábitos financeiros saudáveis que até hoje vêm sendo respeitados, a despeito de diversas tentativas de burlá-la.

Não haverá anistia nem perdão das dívidas, mas uma renegociação dos débitos com o governo: INSS, IR, FGTS, Timemania e Banco Central. O montante único dos débitos seria refinanciado em 25 anos com a taxa TJLP, usada pelo BNDES para seus empréstimos. O total da dívida, excluídas as trabalhistas e os empréstimos que não entrariam nesse refinanciamento, é de R$ 3,3 bilhões aproximadamente.

A União teria uma arrecadação anual estimada em R$ 140 milhões e, com a unificação dos débitos, haveria um documento único de arrecadação e a redução dos meios administrativos dos órgãos públicos que cuidam das dívidas.

O objetivo da LRFE de ter uma gestão transparente e democrática seria monitorado por várias medidas, como a apresentação obrigatória de Certidão Negativa de Débito (CND) ao início de cada competição, sob pena de rebaixamento.

Também o cumprimento regular de pagamentos dos contratos de trabalho dos jogadores e funcionários dos clubes seria fiscalizado. Os dirigentes seriam responsabilizados pessoalmente pelas dívidas dos clubes, e seria proibido o aumento do nível de endividamento depois da repactuação.

Haverá uma expressa proibição de antecipação de receitas de qualquer natureza que ultrapasse o fim do mandato do dirigente. E os mandatos de presidente serão limitados a quatro anos, com uma única recondução. Haverá ainda um comitê de acompanhamento da execução das regras estabelecidas, formado por representantes dos clubes, dos jogadores, dos patrocinadores, da imprensa, do grupo de jogadores Bom Senso e do Poder Executivo.

A legislação prevê ainda a criação de um Fundo de Iniciação Desportiva na Educação, que teria recursos, entre outros, vindos de uma nova loteria e a instituição de um imposto sobre a venda de patrocínios da camisa da seleção.

A necessidade de dar resultados financeiros e ter transparência nos gastos para reformar as dívidas, mas, sobretudo, a responsabilização pessoal dos dirigentes obrigaria os clubes a uma profissionalização indispensável para uma nova etapa de reorganização do futebol brasileiro a partir de sua base, que são os clubes.

Não basta xingar - RICARDO BALTHAZAR

FOLHA DE SP - 15/07


SÃO PAULO - Uma nova rodada de pesquisas dirá nesta semana se a humilhação sofrida pela seleção brasileira e o fim da Copa do Mundo tiveram algum efeito sobre o humor do país e a disputa eleitoral. A oposição acha que a presidente Dilma Rousseff saiu perdendo. Quem olha para trás aposta que o impacto será passageiro, se não for nulo.

Os brasileiros sabem separar o futebol da política? Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva foram reeleitos em outros anos após derrotas da seleção brasileira nos estádios. Mas é possível que desta vez seja tudo diferente, porque a Copa foi no Brasil, e porque nunca os políticos se movimentaram tanto para explorar politicamente o evento.

Dilma virou piada nas redes sociais e voltou a ser vaiada por torcedores neste domingo no Maracanã. Mau sinal para o governo, mas as pesquisas feitas antes do fiasco da semana passada mostraram que a maioria da população repudiou as ofensas à presidente na abertura da Copa.

A máquina de propaganda do governo fez de tudo para associar a imagem de Dilma à euforia em torno da competição. Com o Brasil eliminado, ela foi a primeira a mudar de assunto e pedir a renovação do futebol brasileiro, num lance oportunista que caberá ao eleitor julgar.

A oposição se comportou de forma errática. Aécio Neves e Eduardo Campos primeiro deram razão aos torcedores que xingaram a presidente no Itaquerão e depois os criticaram. Ambos atacaram Dilma por tentar tirar proveito político da Copa. Em todos os dias em que o Brasil entrou em campo, os dois fizeram-se fotografar torcendo com a camiseta da seleção.

Encerrado o torneio, as pessoas voltarão a se angustiar com a economia e as dificuldades de sempre. Isso pode criar um ambiente favorável à oposição, mas é cedo para ela comemorar. Vaiar é fácil e ajuda a angariar simpatia na arquibancada, mas para ganhar a eleição será preciso oferecer algo mais para satisfazer o desejo de mudança do eleitorado.

A volta do complexo de vira-latas - ARNALDO JABOR

O ESTADO DE S.PAULO - 15/07


Amigos,

vocês passaram o tempo todo da Copa falando de mim: Nelson Rodrigues pra cá, pra lá...

Antes eu era o pornográfico, o reacionário, agora virei técnico de futebol. E me citavam. Todos diziam que tinha acabado o nosso "complexo de vira-latas". Mas esse complexo que eu descobri pode existir também ao avesso (Freud nem me olha aqui no céu, com uma inveja danada). Mas ele não é apenas o pavor diante dos estrangeiros, a cabeça baixa, o "sim senhor", a alma de contínuo. Não. Este complexo aparece na submissão à FIFA, lambendo-lhe os pés como cachorrinhos gratos, nas arenas grã-finas. O vira-latas estava ali. Podemos botar uma fitinha cor de rosa no vira-latas que ele continua sendo um legitimo vira-latas, cheirando postes e abanando o rabo.

Para nossos jogadores ricos e famosos, o Brasil é a vaga lembrança da infância pobre, humilhada. O País virou um passado para os plásticos negões falando alemão, todos de brinco e com louras vertiginosas. Não são maus meninos, ingratos, não; mas neles está ausente a fome nacional "por um prato de comida", a ânsia dos vira-latas.

Já disse e repito que, antes, nas copas do mundo, éramos a pátria de chuteiras. Hoje somos chuteiras sem pátria. Fomos infeccionados pelo futebol europeu, mas pela metade; ficamos na dúvida se somos Pelé ou Dunga.

Nesta Copa, só o povo estava de chuteiras, para esquecer os escândalos que lhe mergulharam em cava depressão.

Foi diferente de 1950. Lá, sonhávamos com um futuro para o País. Agora, tentamos limpar nosso presente. Somos uma nação de humilhados e ofendidos, pois o país é dominado por ladrões de galinha e batedores de carteira. E a população queria que o escrete fizesse tudo que o governo não fez. Mas, era peso demais. O brasileiro não estava preparado para ser o "maior do mundo" em coisa nenhuma. Ser o maior do mundo, mesmo em cuspe à distância, implica numa grave e sufocante responsabilidade. Além disso, era um time de várzea.

Isso era o óbvio, mas foi ignorado. E quando o obvio é desprezado, ficamos expostos ao mistério do destino. E um dos fatos óbvios foi o endeusamento do técnico. Felipão era mais importante que o time. E ninguém é mais obstinado do que o sujeito que é portador de um erro colossal. O ser humano acredita mais em seus equívocos do que em suas verdades. O técnico é sempre contra a opinião geral. Em vez de orientar as vocações dos rapazes, Felipão achou que todos tinham de caber em sua estratégia. O técnico devia ser um reles treinador, quase um roupeiro, humilde diante dos craques. Mas o Felipão os tratava como garotinhos inseguros ou então parecia um "Mussolini" de capacete e penacho. A própria figura do Felipão era deplorável - nervoso e mal vestido, quase de pijama, era o retrato físico de nosso despreparo. O único jogador do "passado glorioso" foi o Neymar - Didi, Zizinho, Ademir guiavam seus dribles.

Quando o alemão fez o primeiro gol, sentimo-nos diante da verdade de que os próprios jogadores suspeitavam: éramos 11 solitários, nosso time era uma ilusão que parecia realidade por causa do Neymar. Nossa meta não era o gol; era o Neymar. Esse jovem gênio nos cegou e, com ele, acreditávamos que o Brasil voltaria a seus melhores dias. Mas, o Brasil nunca está em seus melhores dias. Não esperávamos uma vitória, mas uma salvação. Só a taça aplacaria nossa impotência diante da zona brasileira - era a nossa única chance de felicidade.

E aí começaram as interpretações dos idiotas da objetividade: por que perdemos? Tentam explicar a derrota como uma bula de remédio. Como se a derrota tivesse explicação; toda derrota é anterior a si mesma, ela começa 40 anos antes do Nada e vem desabrochar em nossos dias. Mas só podemos entender o que "não" houve. Atrás da derrota, estavam todos nossos vícios seculares: salvacionismo, milagres brasileiros, fé no improviso, vitórias abstratas e derrotas políticas.

Além disso, há entre nós e a loucura um limite que é quase nada. Enlouquecemos diante da Alemanha.

Nessa hora do jogo a loucura explodiu feito uma libertação. Isso. Nossa loucura não foi de Napoleões ou Neros, nossa loucura apareceu como um fundo desejo de parar, de ter sossego. Nos jogadores surgiu a ânsia do fracasso, como uma exaustão diante de tanta incapacidade.

Ao contrario do que disse o Parreira em 2006, de que "não estávamos preparados para perder", dessa vez estávamos todos preparados para a calamidade e secretamente sabíamos disso. Depois daqueles seis minutos em que houve quatro gols, o absurdo adquiriu uma doce, persuasiva, admirável naturalidade. Depois de 5 a 0, queríamos perder mais, queríamos nos espojar na derrota absoluta, sentíamos a doce nostalgia do aniquilamento. E aí, quem surgiu no estádio? O imponderável Sobrenatural de Almeida passou a dirigir o time como um técnico espectral, um fantasma trapaceiro. Dava até para ver que os alemães tiveram pena de nós, os anfitriões desmoralizados.

Até o Felipão fez autocrítica. Mas a autocrítica tem a imodéstia de um necrológio redigido pelo próprio defunto.

É isso. Sempre que vai estourar uma catástrofe, o ser humano cai num otimismo obtuso, pétreo, córneo. E perde.

Agora estamos com uma angústia épica, como uma víbora crispada dentro de nós.

E depois de perdermos para a Holanda por 3 a 0, vimos que não houve derrota - como haver derrota se não tínhamos time? O povo viu no fracasso a confirmação de sua sina de vira-latas e desceu as rampas arrastando os chinelos, como em 1950.

Agora, eis o nosso dilema: ou o Brasil ou o caos. O diabo é que temos a vocação do caos. O Brasil precisa ser feito e nós não o fazemos. O mal da cultura brasileira é que nenhum intelectual sabe bater um escanteio.

Mas ninguém cresce sem sentir o gosto amargo da vergonha. Sempre fomos condenados à esperança, ansiando por uma redenção pelo futebol; mas pode ser que agora a gente vá assumir a própria miséria, a própria lepra, e isso será nossa salvação.

É isso aí, amigos, e só.

Dependência do agronegócio - EDITORIAL O ESTADÃO

O ESTADO DE S.PAULO - 15/07


Com um rombo em torno de US$ 100 bilhões anuais no comércio de manufaturados, o Brasil depende cada vez mais da exportação de produtos do agronegócio para evitar um desastre nas contas externas. Por isso é especialmente preocupante a perspectiva de preços agrícolas em queda nos próximos dois anos, apontada por um relatório conjunto de duas importantes entidades multilaterais, a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) e a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). A divulgação do relatório coincidiu com o anúncio, na sexta-feira, das novas estimativas de oferta e demanda de grãos e oleaginosas do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos para a safra 2014-2015, ainda em fim de plantio no país.

Cotações caíram imediatamente, na primeira reação dos mercados às novas informações. Mesmo com a correção de algum exagero, observada já na segunda-feira, as perspectivas continuam desfavoráveis aos produtores, como têm sido na maior parte deste ano.

Segundo as projeções da FAO e da OCDE, os preços dos produtos vegetais devem cair ainda por dois anos e em seguida se estabilizarão em níveis superiores aos de antes da crise de 2008. Já há algum tempo os mercados vêm-se acomodando, depois de alguns anos de cotações excepcionalmente altas. No caso das carnes, os preços devem continuar sustentados por uma demanda crescente.

Apesar da acomodação da maior parte das cotações nos próximos dois anos, ao longo da próxima década a evolução dos mercados deve ampliar as oportunidades para os produtores. A demanda global de cereais em 2023, pouco acima de 1,2 bilhão de toneladas, deve ser 150 milhões de toneladas maior que a do ano passado. Também de acordo com o relatório, deverá crescer o consumo de proteínas, óleos e açúcar, como consequência do crescimento da renda e da urbanização.

A produção global de cereais deverá aumentar 15% e a de oleaginosas, 26%. A agricultura será impulsionada tanto pela demanda de alimentos - em boa parte por causa da melhora de condições nos países em desenvolvimento - quanto pelo uso crescente de biocombustíveis. As oportunidades para o Brasil são evidentes. O agronegócio terá de fazer sua parte, cuidando de sua tecnologia. O governo precisará cuidar da infraestrutura, manter condições razoáveis de financiamento e, acima de tudo, resistir às pressões de seus parceiros - ideológicos ou meramente malandros - contra o sucesso empresarial no campo.

A curto e a médio prazos, no entanto, o País terá de enfrentar os problemas associados à deterioração dos preços internacionais. Até agora, o agronegócio conseguiu produzir um belo resultado comercial, apesar das condições externas. De janeiro a junho as exportações do setor, no valor de US$ 49,11 bilhões, corresponderam a 44,43% da receita do comércio de mercadorias.

O superávit do agronegócio, de US$ 40,78 bilhões, só compensou parcialmente o déficit dos manufaturados, de US$ 56 bilhões. Para uma comparação mais precisa, seria preciso separar desse valor uma pequena parcela de itens do agronegócio incluída na conta de manufaturados (açúcar refinado e etanol, por exemplo). De toda forma, o quadro geral é claro. O bom resultado conseguido com os produtos da agropecuária ocorreu apesar da queda de preços da soja em grão (4,2% em relação ao mesmo período de 2013), farelo (7,8%), óleo (17,4%), carne de frango (9,8%), açúcar (15,1%) e café (9,1%), para citar só os mais importantes.

Mas, além de se preocupar com as condições de produção e de comercialização da agropecuária (investindo em infraestrutura, por exemplo), o governo terá de se preocupar com a competitividade da maior parte da indústria. É ruim para a economia brasileira depender tanto quanto hoje do sucesso comercial da agropecuária e das indústrias ligadas ao setor. Mas a política industrial terá de ir muito além da escolha de campeões e do protecionismo dos últimos anos - políticas inequivocamente fracassadas. Fracassos maiores ainda ocorrerão, se o governo continuar incapaz de aprender com seus erros.

Temores com o projeto das Olimpíadas - EDITORIAL O GLOBO

O GLOBO - 15/07


Não se pode depender de remendos num evento com 15 mil atletas, de 204 países, que disputarão competições em 28 modalidades de esportes. A improvisação será fatal



As avaliações de praxe de um evento da dimensão da Copa do Mundo têm, para o Brasil, uma aplicação prática, por se estar a dois anos das Olimpíadas do Rio. O exercício, portanto, de balanço da Copa precisa ser feito voltado para o projeto dos Jogos de 2016. E as primeiras impressões não são animadoras.

Há diferenças importantes entre Copa e Olimpíadas. Uma se espalha por estados, enquanto os Jogos se concentram numa cidade — embora, no futebol, estejam previstas partidas também em São Paulo e Belo Horizonte, por exemplo, o que não será problema, pelo que se viu na Copa.

A centralização do evento em uma cidade, porém, dá ao prefeito e comissão organizadora uma enorme responsabilidade. Não se pode baixar a guarda. Neste sentido, portanto, devido à concentração dos riscos e à grande diversidade, os Jogos são mais complexos até que a Copa.

Entre os predicados do Rio para 2016, demonstrados nas últimas semanas, estão a hospitalidade do carioca e a cidade em si. O sucesso das Fifa Fan Fests inspirou Eduardo Paes a promover algo semelhante, daqui a dois anos, no Porto, já sem a Perimetral, e no Parque Madureira, revelou o prefeito ao GLOBO. Copacabana, onde fervilhou a Fan Fest do futebol, será ocupada por competições, mas não deveria sair dos planos da prefeitura, pela facilidade de acesso por parte dos turistas.

A Copa comprovou que uma palavra-chave é mobilidade. Com todas as precariedades ainda existentes, no Rio e em São Paulo, foi o transporte sobre trilhos — metrô e trens — que tornou aceitável o acesso ao Maracanã e Itaquerão.

Ou seja, a conclusão da Linha 4 do Metrô, para a Barra — na verdade, um “puxadão” da Linha 1 —, é crucial para não haver maiores transtornos na chegada e saída do Parque Olímpico, com a ajuda dos BRTs.

Então, a entrega da linha a tempo é estratégica para o êxito dos Jogos. E não apenas isso, mas também a sua operação de forma a que não ocorra superlotação, temida pelo fato de a linha ser uma extensão de outra. Não haveria maiores temores se fosse a original Linha 4, da Barra ao Centro, via Gávea.

Mais uma vez deu-se um “jeitinho”, tão usado na Copa. Preocupa a possibilidade, bastante palpável, de atrasos em obras — uma característica do país, também observada na falta de boa parte do legado da Copa do Mundo, toda ela de projetos de mobilidade não concluídos, alguns até sequer iniciados.

O cenário atual do Parque Olímpico é de um enorme canteiro de obras no início, algo muito preocupante. A situação é até pior no Complexo Esportivo de Deodoro, em que os trabalhos começaram na semana passada. Não se pode depender de remendos e meias soluções num evento com 15 mil atletas de 204 países, que disputarão competições em 28 modalidades esportivas. A improvisação será fatal.

A hora e a vez da outra Copa - EDITORIAL CORREIO BRAZILIENSE

CORREIO BRAZILIENSE - 15/07
Copa do Mundo de 2014 sagrou a Alemanha tetracampeã e deixou a Seleção Canarinho em humilhante 4° lugar. O adjetivo se deve não à classificação, mas ao desempenho abaixo do aceitável nos dois confrontos finais. As goleadas - 7x1 e 3x0 - mostraram a fragilidade, o despreparo e a falta de sintonia do time com a modernidade, que valoriza a equipe em vez de talentos individuais.
Embora não tenha correspondido às expectativas na disputa por gols, o país brilhou fora do campo. Os brasileiros receberam os milhares de turistas com a reconhecida hospitalidade nacional. Mesmo os adversários tradicionais - como a arquirrival Argentina, cujos torcedores invadiram o Rio no fim de semana - não têm do que reclamar. Vale lembrar: na partida contra os alemães no Mineirão, brasileiros se esqueceram da dor e aplaudiram o belo desempenho da seleção comandada por Philipp Lahm.

A maturidade demonstrada no Mundial de Futebol desperta expectativa para as próximas eleições. Em outubro, os brasileiros vão às urnas escolher o presidente da República, senadores e deputados. É a oportunidade de exercer a cidadania para fazer escolhas aptas a atender as expectativas da sociedade. O tempo constitui indicador importante. O fim do regime militar está prestes a completar 30 anos. A Constituição Cidadã já completou 26. Trata-se da 7a eleição presidencial livre e sem crise institucional desde 1988.

Nada menos de 56 milhões do eleitorado têm até 35 anos. Muitos, que vão votar pela 1a vez, não conheceram a ditadura - censura, tortura, luta armada, invasão de universidades, fechamento do Congresso. Os 141,5 milhões de cidadãos não constituem um bloco uniforme. Ao contrário. Como é natural numa democracia, que permite a livre expressão do pensamento, formam um país dividido. Entre eles, há conservadores e vanguardistas.

Uns e outros convivem com conquistas irreversíveis. No século 21, a sociedade é includente, livre, avessa à discriminação de qualquer natureza (negro, mulher, índio, homossexual), contrária à corrupção, consciente de que não existem salvadores da pátria. Graças à inclusão social, à crescente inserção no processo político e às redes sociais, o brasileiro exige participação ativa. As manifestações de um ano atrás deram recado claro: o brasileiro não quer ser turista no país dele.

A campanha está nas ruas. Em pouco mais de um mês, começa o programa eleitoral gratuito. É importante que os partidos e os respectivos candidatos saibam ler o tempo - interpretar e antecipar as demandas da sociedade: transparência, verdade, competência, sintonia com o moderno. Palavras ocas, promessas vazias, maravilhas de marqueteiros fazem parte de um Brasil velho, de uma democracia sem povo.

Mais uma manobra? - EDITORIAL O ESTADÃO

O ESTADO DE S.PAULO - 15/07


Em época de conta de padeiro nas estatais - conforme denunciou o ex-diretor de abastecimento da Petrobrás Paulo Roberto da Costa, ao indicar como o orçamento para a construção da Refinaria Abreu e Lima havia sido feito -, o governo está conseguindo um patamar de qualidade ainda mais baixo nas suas contas. A diferença no cálculo do déficit primário de maio foi de R$ 4 bi, conforme revelou o Estado (11/7). O governo iria anunciar um rombo de R$ 15 bi, mas acabou informando "meros" R$ 11 bi. Com essa performance, bateu outro recorde, além do erro de cálculo. O déficit primário mensal de R$ 11 bi foi o pior resultado fiscal para os meses de maio em toda a história. É o governo do PT cumprindo o seu estribilho: "Nunca antes na história deste país". E, como o governo não deu explicações convincentes sobre o ocorrido, naturalmente aumentou a desconfiança em relação aos números que apresenta. Será mais uma manobra?

Todos os meses, o Ministério da Fazenda divulga o resultado do esforço fiscal do governo central (Tesouro Nacional, Banco Central e Previdência Social). É a diferença entre o que o governo arrecada com impostos e o que gasta. O Banco Central (BC), por sua vez, divulga os números do setor público consolidado. Ao calcular o resultado do setor público do mês de maio, o BC encontrou uma discrepância entre os seus números e os apresentados pelo Tesouro Nacional. Na busca pela origem dessa diferença, o BC descobriu R$ 4 bi depositados numa conta de um banco privado, conta esta que não constava do sistema de rastreamento da autoridade monetária. Segundo o BC, esse dinheiro representava um crédito em favor da União e foi incorporado às contas nas vésperas do anúncio do resultado fiscal do mês de maio pelo Tesouro.

O BC parece tratar o tema como assunto resolvido. Para o porta-voz da instituição, "a situação foi verificada e, depois, normalizada junto ao banco". Já o Ministério da Fazenda diz que é "assunto do BC", e nada explica. Entretanto, fontes da área técnica do governo disseram - segundo reportagem do Estado - que "quando o BC procurou o banco privado para averiguar a diferença encontrada a resposta ouvida pela instituição financeira foi a de que era preciso ouvir o Tesouro".

A credibilidade fiscal do governo está abalada desde o início de 2013, quando foram divulgadas manobras do Tesouro Nacional para fechar as contas fiscais de 2012. A "criatividade" consistiu na triangulação de R$ 12,5 bi, entre o Fundo Soberano do Brasil, o BNDES e o Tesouro Nacional, fazendo com que o valor fosse computado no cálculo do esforço fiscal do governo. Ficou evidente que a operação era uma manobra contábil, provocando apreensão no mercado financeiro e investidores internacionais sobre a política fiscal do governo Dilma e sua transparência.

A ação do BC e a omissão do Ministério da Fazenda indicam uma tentativa de blindar o secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin, dos danos causados pela descoberta de R$ 4 bi. Apontado como principal articulador de manobras contábeis, a diminuição do rombo só aumentou a desconfiança em torno da política fiscal brasileira. A estratégia é a de que o BC dê "explicações técnicas" sobre o crédito encontrado, como se o Tesouro Nacional não tivesse relação com o assunto.

Sem uma séria explicação sobre os R$ 4 bi, reforça-se a impressão de que é mais uma manobra contábil. Neste caso, a chamada "pedalada" nos gastos: atraso por parte do Tesouro do repasse aos bancos privados dos pagamentos dos benefícios do INSS a aposentados e pensionistas. Os R$ 4 bi seriam referentes à movimentação mensal do INSS.

É conhecida nos aeroportos a mensagem de mudança do portão de embarque "devido ao reposicionamento de aeronave". Não é honesta, já que coloca a culpa na aeronave, quando o problema é outro. É o que o governo está fazendo agora. O problema não está no registro contábil: antes não contabilizava e agora contabiliza. Mera explicação técnica que autoevidencia a sua insuficiência. É preciso que o Tesouro explique por que a conta não estava contabilizada e agora está. Finanças públicas exigem transparência, e um governo sério sabe disso.

Quadros médicos - EDITORIAL FOLHA DE SP

FOLHA DE SP - 15/07


Já há algum tempo formou-se um consenso entre especialistas em saúde pública: é prioritário enfrentar o deficit de médicos nas periferias das metrópoles e em áreas distantes dos centros urbanos.

Se parece forçoso buscar redistribuir no território nacional os profissionais já existentes, é necessário, ao mesmo tempo, formar um número maior de pessoas aptas a praticar a medicina --o que demanda a abertura de novos cursos.

De um ponto de vista superficial, o governo Dilma Rousseff parece dedicar atenção ao tema. A atual gestão já liberou a criação de 44 cursos, o que equivale a 76% do total autorizado nos mandatos de Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010) e ultrapassa em 63% os aprovados na administração Fernando Henrique Cardoso (1995-2002).

Um olhar um pouco mais aprofundado, contudo, basta para diagnosticar problemas nesse quadro. Especialistas manifestam, com razão, receios quanto à qualidade do ensino nessas instituições.

Fazer a saúde pública avançar vai muito além de multiplicar as vagas no ensino superior --uma das principais diretrizes do programa Mais Médicos, lançado com estardalhaço por Dilma no ano passado.

No campo educacional, é fundamental, por exemplo, proporcionar condições mínimas para que os formados tenham um bom nível.

Não se trata de aspecto trivial; mesmo em São Paulo os jovens profissionais ficam aquém do recomendável. No último exame do Conselho Regional de Medicina, 59% dos graduandos foram incapazes de acertar 60% das questões.

Reverter esse quadro depende de bons professores e de estrutura básica para a aprendizagem da medicina. Encaixam-se nessa categoria as recomendações de que todas as universidades disponham de hospitais-escola e de que as vagas de residência médica sejam ampliadas e se tornem obrigatórias.

Não basta, aliás, fazer intervenções na academia. Oferecer condições adequadas de trabalho é uma forma de incentivar médicos a buscar trabalho em zonas afastadas dos grandes centros.

Sem que contem com o atrativo dos resultados imediatos, contudo, é improvável que o governo se dedique a essas tarefas. Nesse ritmo, o país até poderá formar mais médicos, mas poucas pessoas desejarão se tratar com a maioria deles.

Setor industrial perde força para competir com o exterior - EDITORIAL VALOR ECONÔMICO

VALOR ECONÔMICO - 15/07


A análise detalhada da balança comercial de alguns segmentos econômicos mostra como é frágil a situação da indústria nacional quando se mede seu poder de competição no mundo. O panorama atual já é bastante ruim, mas o mais preocupante é que ele tende a se agravar, segundo os especialistas.

Dados recentemente divulgados evidenciam esse problema - grave - por exemplo no setor de plásticos. Segundo reportagem publicada pelo Valor no dia 7, no primeiro trimestre, foi registrado um déficit de US$ 678 milhões no segmento, com um aumento de 13,4% em relação ao mesmo período do ano passado. Os dados são do Econoplast, boletim econômico da Associação Brasileira da Indústria do Plástico (Abiplast). O valor registrado em apenas três meses deste ano já supera o déficit total de US$ 646 milhões registrado há sete anos pela indústria - desde 2007, o saldo negativo quase quadruplicou, diante da perda de competitividade do produto nacional.

A principal explicação para esse resultado fortemente negativo é o avanço dos importados no mercado doméstico, que contribuiu para o déficit comercial de US$ 2,45 bilhões da indústria brasileira de transformação de plástico no ano passado.

Neste ano, houve uma piora da balança comercial do segmento, refletindo não somente o aumento das importações, mas também o crescimento do valor das compras externas e o enfraquecimento das exportações em volume. A crise na Argentina, principal destino externo dos manufaturados plásticos brasileiros, tem agravado o cenário, ao mesmo tempo em que a - persistente - desaceleração das economias desenvolvidas levou os chineses a voltarem a atenção para mercados como o brasileiro.

De janeiro a março, as importações brasileiras de transformados plásticos somaram US$ 977 milhões, com alta de 8,4% na comparação anual. As exportações, por sua vez, totalizaram US$ 299 milhões, com queda de 1,6%. Em volume, o saldo comercial no período é deficitário em 136 mil toneladas, 12% acima do registrado no primeiro trimestre do ano passado, com importações de 189 mil toneladas e exportações de 52 mil toneladas.

A situação não é, obviamente, nova. O país vem perdendo competividade no que se refere às exportações de produtos industrializados há anos. Em parte, porque o governo tem usado a política cambial como um instrumento para segurar a pressão inflacionária. É frequente a observação de exportadores que uma cotação mais "realista" do real em relação ao dólar ajudaria nas vendas dos seus produtos ao exterior.

Outra razão para a dificuldade em exportar produtos industrializados, na observação de empresários e economistas, é o custo muito mais elevado do crédito no Brasil do que em outros país. De fato, o juros em termos reais praticadas no mercado doméstico levaram o país de volta à liderança da lista das nações com as taxas mais altas. Também o custo da energia é alvo de frequentes críticas das empresas. Diga-se, por oportuno, que o governo da presidente Dilma Rousseff tentou combater esses dois problemas - juros elevados e energia cara -, mas suas tentativas não foram exatamente bem sucedidas.

Com isso, acentua-se a tendência de a pauta das exportações ser dominada por produtos básicos. No primeiro semestre de 2014, a concentração das exportações em primários atingiu o ponto mais alto em três décadas e meia. Pela primeira vez desde 1980 (último dado disponível), mais da metade dos embarques ao exterior no primeiro semestre foi de bens primários, como soja e minério de ferro. De janeiro a junho, os básicos representaram 50,8% do que o país exportou. Essa proporção era de 25% em 2002 e já havia subido para 47,5% no mesmo período de 2013.

Enquanto isso, os produtos manufaturados encolheram sua participação para o menor nível também desde 1980 e hoje equivalem a 34,4% das vendas totais, em um movimento que o governo atribui à lenta recuperação econômica nos principais mercados.

Dados do Ministério do Desenvolvimento que especificam a performance por produto, até maio, são expressivos o suficiente para dispensar qualquer comentário adicional. Nesse período, houve queda nas exportações de laminados planos (-34,8%), automóveis de passageiros (-30,0%), etanol (-29,8%), autopeças (-25,0%), veículos de carga (-18,9%), para citar alguns exemplos.

A derrota do saneamento - EDITORIAL GAZETA DO POVO - PR

GAZETA DO POVO - PR - 15/07


Embora todos os governos falem em dar prioridade a essa área, a ineficiência estatal vem respondendo por entraves e baixo progresso na solução do atraso



O Brasil é um país rico de recursos naturais, tem excelência empresarial em vários setores da economia e teve boa evolução social depois da redemocratização em 1985. Como todos os países do grupo de emergentes, o Brasil apresenta um conjunto de virtudes econômicas e sociais, mas também apresenta uma pilha de problemas graves que requerem atenção urgente. Embora a gravidade dos problemas varie, entre os mais dramáticos está o setor de saneamento básico. Neste ponto está uma das maiores derrotas sociais, conforme aponta estudo feito pela Fundação Getulio Vargas, cujo resumo está na revista Conjuntura Econômica de junho passado.

A Secretaria Nacional de Saneamento Ambiental (SNSA), vinculada ao Ministério das Cidades, elaborou estudo em 2012 com 5.070 municípios no qual mostra que, apesar de o índice de atendimento com rede de água ser de 82,7%, o porcentual de brasileiros atendidos com coleta de esgotos é de apenas 48,3%, e o tratamento do esgoto gerado é de sofríveis 38,7%. Ou seja, a faixa de brasileiros fora desses dois serviços vai de 100 milhões a 120 milhões de pessoas. Trata-se de uma derrota social grave, pois, no mundo desenvolvido, esse problema foi resolvido no século 19.

Em 2010, a presidente Dilma inscreveu em seu plano de governo que um dos objetivos de sua gestão era recuperar o atraso nessa área. Mesmo sendo um gargalo de graves consequências em termos econômicos e em termos de saúde pública – cuja solução deveria fazer parte das três maiores prioridades nacionais –, o fato de metade da população brasileira não ser beneficiada com rede de coleta de esgoto somente persiste porque essa chaga não tem o potencial político explosivo de outros dramas, como falta de ônibus e caos na saúde pública.

A maior e mais importante revolução tecnológica – aquela que teve o maior impacto sobre o aumento da produtividade e a melhoria do padrão de vida da humanidade – ocorreu entre 1870 e 1900, e suas três invenções mais profundas foram a eletricidade, o motor a combustão interna e a água encanada. Essa revolução tecnológica possibilitou o aumento explosivo da produção por habitante e respondeu também pelo aumento da expectativa média de vida da população mundial. Um dos efeitos foi o desenvolvimento industrial e a mecanização da agricultura, levando ao crescimento acelerado das cidades, a ponto de, segundo dados da Organização das Nações Unidos (ONU), 70% dos habitantes da Terra estarem vivendo nas cidades em 2050.

Com o rápido aumento da população urbana, um dos serviços mais relevantes para a melhoria de vida e de saúde pública é a coleta e o tratamento do esgoto gerado. Embora todos os governos falem em dar prioridade a essa área, a ineficiência estatal vem respondendo por entraves e baixo progresso na solução do atraso. No Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) foram inscritas 149 obras referentes a esgoto, das quais mais da metade está em situação de atraso, paralisação ou nem sequer iniciada, conforme cita a revista Conjuntura Econômica. O resumo informa que, das 149 obras previstas, apenas 28 foram concluídas, 28 estão em andamento normal, 35 foram paralisadas, 33 estão atrasadas, 20 não foram iniciadas e 5 estão sem medição.

E, mesmo que todas essas obras tivessem sido concluídas, ainda haveria um gargalo enorme a ser vencido nos próximos anos. Como a população brasileira continua aumentando em torno de 2 milhões de habitantes por ano, as perspectivas não são boas. A campanha eleitoral é um bom momento para a população tomar ciência do drama que o país vive na área de saneamento básico e pressionar os candidatos para o enfrentamento desse triste quadro.

Se a falta de rede de esgotos e de usinas de tratamento recebesse uma fração da indignação nacional dada à derrota do Brasil para a Alemanha na Copa do Mundo, quem sabe os governantes se vissem forçados a dedicar mais atenção aos planos e obras vinculadas a esse setor, porque aqui sim está uma das maiores derrotas sociais do país.

A produção industrial caiu muito no Nordeste - EDITORIAL O ESTADÃO

O ESTADO DE S.PAULO - 15/07


Entre abril e maio, a produção industrial da Região Nordeste caiu 4,5%. Na Bahia, o recuo atingiu 6,8%, segundo a Pesquisa Industrial Mensal - Resultados Regionais, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Outros números da indústria foram menos ruins, o que se deve mais à base de comparação, porque, de fato, há acentuada deterioração em 2014.

A piora é clara quando se comparam os primeiros cinco meses de 2014 e de 2013. A produção industrial brasileira caiu 1,6%, puxada pelo Paraná (-1,7%), Rio Grande do Sul (-2,5%), Bahia (-2,8%), Espírito Santo (-3,3%), Rio de Janeiro (-4,3%) e São Paulo (-4,7%). Entre os Estados mais dinâmicos, só Minas Gerais escapou da queda nesse período de comparação, subindo 0,2%, mas se trata de porcentual indicativo de estagnação.

Na comparação entre períodos mais longos, por exemplo, de 12 meses, até maio, com os 12 meses anteriores, a produção geral ainda avança 0,2%, mas com tendência de declínio: o aumento havia sido de 0,7%, até abril, e de 2%, até março.

O recuo da Região Nordeste, entre maio de 2013 e maio de 2014 (-2,1%), foi influenciado pela queda no setor de veículos automotores, reboques e carrocerias (-15,5%), metalurgia (-9,4%) e produtos químicos (-8,2%). Os resultados da região só não foram piores por causa do aumento da produção de refrigerantes, cervejas e cachaça, calças compridas de uso masculino e calcinhas de malha, ou ainda minérios de cobre, reservatórios, caixas de água, cisternas, piscinas e artefatos de plástico, como tubos ou canos para a construção civil e filmes para embalagem.

O que se constata, no conjunto da indústria do País, é que persiste a tendência de queda - e esta afeta as decisões de investimento. O grau de oscilação é incompatível com o planejamento das empresas.

Note-se que o desestímulo do investimento não pode ser compensado, do ponto de vista da indústria em geral, por decisões tributárias que favorecem alguns setores ou pela concessão de crédito subsidiado, que não pode ser concedido a todos.

Portanto, salvo nos casos de empresas que produzem itens de consumo obrigatório - e só por isso escapam de problemas maiores -, as demais passam a depender de estímulos do governo para investir. E tal situação não se sustenta.

Os dados regionais confirmam o grau de dificuldades enfrentado pelo setor secundário.

COLUNA DE CLAUDIO HUMBERTO

“O Brasil tem demorado muito para modernizar o seu Estado”

Presidente Dilma, após três anos e meio no poder, além dos oito anos de governo Lula



CPMI DA PETROBRAS É SÓ EMBROMAÇÃO

A CPI Mista da Petrobras nem se dá ao trabalho de fingir que funciona. Acumula 395 requerimentos sem votar porque os parlamentares não comparecem e, controlada pelo governo, a CPMI nem sequer quebrou sigilos de um dos principais acusados no esquema de corrupção: Paulo Roberto Costa, ex-diretor da Petrobras, preso pela Polícia Federal na Operação Lava Jato. Tem outra sessão marcada para esta quarta (16).

QUADRILHA IMPUNE

A CPMI foi instalada para investigar o que a Polícia Federal chamou de “quadrilha instalada na Petrobras” para a prática da corrupção.

SUPERFATURAMENTO

Além do superfaturamento na refinaria de Pasadena, a CPMI deveria investigar corrupção na obra da refinaria de Abreu e Lima (PE).

CORDEIROS

O Planalto controla a CPMI por meio do senador Vital do Rêgo (PMDB-PB), presidente, e do deputado Marco Maia (PT-RS), relator.

INSERVÍVEIS

Instalada em 28 de maio, a CPMI só ouviu depoimentos inócuos de Sergio Gabrielli e Graça Foster, ex e atual presidentes da Petrobras.

FOLGA REMUNERADA

Após a vagabundagem das semanas anteriores, a pretexto da Copa, quando as sessões deliberativas chegaram a ser formalmente canceladas, a Câmara dos Deputados seguiu a folga remunerada ontem, quando apenas 21 dos 513 deputados deram as caras. E olhe que havia convocação do presidente da Casa, Henrique Alves, para votar projeto de resolução destinado a derrubar o decreto presidencial que criou os chamados “conselhos populares”.

RESSACA?

Registrou-se ontem a presença de menos de 10% do mínimo de 257 deputados federais necessários para se abrir sessão deliberativa.

MP PENDURADA

Os deputados federais também estão devendo a votação da medida provisória 641, que altera regras de comercialização de energia.

LÁ VEM O RECESSO

Após enforcar o mês da Copa, o Congresso entra em recesso na sexta (18), a menos que não votem a Lei de Diretrizes Orçamentárias.

FPM MAIOR

O presidente da Câmara, Henrique Alves, quer colocar votação nesta quarta (16) o aumento em 2% do repasse do Fundo de Participação dos Municípios (FPM). Cortesia com chapéu alheio em ano eleitoral.

COISA DE AMIGOS

Prefeitos andam irritados com Dilma, que renovou a isenção do IPI para carros, em mais uma ajuda ao setor que financia campanhas do PT. O IPI alimenta boa parte do Fundo de Participação dos Municípios.

SILÊNCIO CONIVENTE

Paulo André, ex-Corinthians, que ainda joga porque se mudou para a China, voltou a atacar a CBF, federações e clubes de futebol. Mas faz conveniente silêncio sobre a decisão do governo de retirar a prática esportiva do currículo das escolas, sufocando sonhos e vocações.

TRAQUEOTOMIA NA PISTA

Lula convocou prefeitos do PT paulista para acompanhá-lo em caminhada, nesta sexta (18), para tentar reanimar a nocauteada candidatura de Alexandre Padilha (PT) ao governo de SP.

ADICIONAL

O Senado promete votar quarta (16) a proposta que prevê adicional de tempo de serviço para magistrados e integrantes do Ministério Público, elevando-lhes os salário em até 35%. Chegariam a R$ 40 mil.

BESTEIROL

Dentre as alegações mais preconceituosas, sobre os estádios da Copa no Brasil, é a de que em cinco estados não há jogos da Série A do Campeonato Brasileiro. O Santa Cruz, do Recife, bateu recorde de público quando disputava a Série D, e o Fortaleza na Série C, em 2013.

ACORDO

O senador Eunício Oliveira (PMDB) se convenceu de que a presidente Dilma Rousseff e o antecessor Lula não vão pôr os pés nas eleições no Ceará, onde o peemedebista enfrentará Camilo Santana (PT) ao governo.

OUTROS TEMPOS

O presidente do PPS, Roberto Freire (SP), garante que não “há essa relação umbilical” entre o tucano José Serra e Gilberto Kassab (PSD): “Houve um afastamento depois que o Kassab se juntou a Dilma”.

GOVERNO CAMARADA

Isentada de IPI, a indústria automobilística continua dispensada de melhorar suas carroças e reduzir preços para aumentar as vendas.



PODER SEM PUDOR

TODO CUIDADO É POUCO

Costa Rego fez fama como jornalista no Rio de Janeiro e, nos anos 1920, voltou à sua Alagoas já na condição de governador eleito. Foi um governante austero, e com fama de mulherengo. Seu secretário da Fazenda era Epaminondas Gracindo, pai do ator Paulo Gracindo. Certa dia, ele tomava o café da manhã quando viu Costa Rego abrindo a porta de sua casa e ir entrando com a maior naturalidade.

- Espere aí, governador! - foi logo gritando Epaminondas - Com essa sua fama de garanhão, o senhor não pode entrar assim, em casa de uma família de respeito.

O governador deu uma risada e despachou com o secretário na calçada.