domingo, dezembro 21, 2014

As armadilhas de uma prolongada estagnação - EDMAR BACHA

O ESTADO DE S. PAULO - 21/12

Se o crescimento de 0,3% na produtividade média do trabalho entre 1981 e 2014 não aumentar, o Brasil jamais deixará de ser um país de renda média

Tem sido bastante discutida na imprensa a “estagnação secular” por que estariam passando os países desenvolvidos. Menor atenção tem sido dada para o fato de a economia brasileira estar semiestagnada há 33 anos, apesar de ter uma renda per capita de apenas um terço da média dos países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

Entre 1981 e 2014, a taxa média de crescimento da produtividade do trabalho no Brasil foi de apenas 0,3% por ano. A conclusão pouco difere se excluirmos da conta, por serem períodos excepcionais, a década perdida de 1981 a 1992 e os anos da bonança externa entre 2004 e 2010: há muito tempo a produtividade do trabalho cresce a não mais do que 0,4% por ano.

Com essa taxa minúscula de crescimento da produtividade, jamais deixaremos de ser um País de renda média, jamais atingiremos a renda per capita dos países da OCDE.

Crescimento da produtividade requer empresas com tecnologia, escala, especialização e concorrência. Esses ingredientes somente se conseguem com a integração do país às correntes internacionais de comércio. Pois, apesar de o Brasil ser o sétimo maior PIB (Produto Interno Bruto) do mundo, tem apenas 3,3% do PIB mundial: 96,7 % do mercado global está fora das fronteiras brasileiras.

Os países que conseguiram entrar no primeiro mundo após a 2.ª Guerra Mundial o fizeram integrando-se com a economia mundial. Os tigres asiáticos e Israel se desenvolveram com exportações industriais; os países da periferia europeia com exportações de serviços inclusive de mão de obra; Austrália, Noruega e Nova Zelândia com a exportação de commodities.

Cada grupo a sua maneira, explorando suas respectivas vantagens comparativas, mas todos com uma característica comum - uma forte integração ao comércio internacional.

Em contraste, o Brasil é uma das economias mais fechadas ao comércio exterior do mundo. Grandes economias são grandes exportadoras. Os seis países com PIB maior do que o Brasil - Estados Unidos, China, Japão, Alemanha, França e Reino Unido - são também os seis maiores exportadores mundiais. O Brasil é apenas o vigésimo segundo. Um gigantinho em termos de PIB, somos um anão em termos de exportações - apenas 1,3% do total mundial.

O que se observa nas exportações nacionais repete-se nas importações. A participação das importações no PIB brasileiro é de apenas 13% (dados de 2012). Trata-se do menor valor entre todos 176 países considerados pelo Banco Mundial. Apenas não podemos dizer que o Brasil é o país mais fechado do mundo porque não há dados para a Coreia do Norte - que aparenta ser mais fechada ao comércio do que o Brasil!

Investimento. O curioso é que, sendo fechado para o comércio, o Brasil é extremamente aberto para o investimento externo direto. Éramos até há pouco tempo a 4ª destinação mais preferida pelas multinacionais, atrás somente dos EUA, China e Hong Kong.

O problema é que as multinacionais vêm aqui não para exportar como o fazem na Ásia, mas para substituir importações aproveitando-se do mercado interno protegido. Elas lucram com isso, mas a economia como um todo pode sair perdendo, pois a substituição de importações faz o câmbio apreciar e, assim, tende a reduzir as exportações do país. Paradoxalmente, a abertura para o investimento estrangeiro, na forma em que ela é feita no Brasil, pode estar contribuindo para diminuir o volume de comércio exterior do país.

A política industrial do governo vai na contramão da integração do País ao comércio mundial. Tarifas elevadas sobre bens de produção. Barreiras difíceis de transpor aos serviços importados complementares à produção industrial.

Ausência de acordos comerciais com os principais parceiros no primeiro mundo. Requisitos exagerados de conteúdo local, que aumentam os custos da indústria. Preferências excessivas para compras do governo no mercado local. A lista poderia continuar.

Mas há esperança que essa política de avestruz possa ser revertida no futuro próximo. A esperança vem de três constatações incontornáveis.

A primeira é o desempenho econômico pífio no último quadriênio, em que houve uma diminuição de 2% na produtividade total do trabalho e do capital. Os “pibinhos” não se deveram à falta de demanda, pois há pleno emprego. Também não foi por falta de capital, pois o investimento apesar de baixo esteve dentro da média histórica. O que houve foi a destruição da produtividade pelas políticas econômicas introvertidas e intervencionistas do último quadriênio.

Em segundo lugar, corremos o risco de nos isolar ainda mais do mundo. Além do Acordo do Transpacífico, está em curso a proposta de um amplo entendimento comercial entre os EUA e a União Europeia. Esses acordos nos deixarão à margem dos principais mercados mundiais.

Em terceiro lugar, há o escândalo da Petrobrás. À parte de suas implicações éticas e políticas, esse escândalo desvenda o extraordinário potencial de corrupção de uma política industrial fundada no monopólio estatal, na reserva de mercado e nos requisitos exagerados de conteúdo nacional.

O Brasil está numa encruzilhada. Ou mantemos o protecionismo e continuamos a retroceder como ocorreu nos últimos quatro anos. Ou nos integramos ao resto do mundo e contemplamos a possibilidade de nos tornar um país plenamente desenvolvido.


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