domingo, outubro 12, 2014

Do sonho ao pesadelo - EDITORIAL CORREIO BRAZILIENSE

CORREIO BRAZILIENSE - 12/10

Enquanto dezenas de bilhões de barris de petróleo repousam no fundo do Oceano Atlântico ao longo da costa brasileira, escândalos jorram das profundezas da Petrobras. É o sonho da redenção, acalentado pelas riquezas do pré-sal, transformado num pesadelo sem fim, como a confirmar a máxima de que o Brasil de fato está destinado a ser - para sempre - o país do futuro.

A história que começou a ser escrita com a coautoria de Monteiro Lobato - autor de uma das mais amplas e marcantes obras da literatura infantil brasileira e que, em meados do século passado, se tornou ícone da campanha "o petróleo é nosso" - ganhou capítulo que envergonha contar com crianças na sala. E exige sequência igualmente imprópria para menores, com cenas de doloroso, repugnante, mas absolutamente necessário exorcismo de malfeitos.

A companhia fundada 61 anos atrás pelo presidente Getúlio Vargas há que voltar a orgulhar o brasileiro e a servir de exemplo para a criançada. Há que ter resgatado o papel com que se firmou no mundo, de espécie de bússola brasileira de qualidade e tecnologia de ponta. Há que se revelar maior do que aproveitadores de ocasião, maus gestores eventuais.

A Petrobras está presente em 17 países. É protagonista mundial no campo energético. Sociedade anônima de capital aberto, tem quase 800 mil acionistas embora o governo seja majoritário. Emprega mais de 86 mil pessoas, tem receita de vendas superior a R$ 300 bilhões, investimentos acima de R$ 100 bilhões.

São números expressivos, grandeza que se imaginava capaz de, por si, impor respeito. Mas tanto brilho acabou por atrair imensurada rapinagem. O que vem à tona com os depoimentos de um ex-diretor e um doleiro flagrados em investigações da Polícia Federal - que resolveram colaborar, em troca dos benefícios da delação premiada - é monumental esquema de corrupção, que, confirmado do modo como descrito, terá a gravidade de um plano institucional, um ataque governamental ao patrimônio do povo brasileiro.

 Seria inacreditável, não fossem os depoimentos balizados por muita coerência e muitos detalhes. Não se pode permitir que uma só palavra dita pelos delatores soe vazia. Eles falam de um megaesquema envolvendo partidos, políticos, grandes empreiteiras, pagamento de propinas, obras superfaturadas e desvios também em empreendimentos de outras áreas, como a tão carente infraestrutura nacional. Ou seja, é mais do que roubo de dinheiro. É ataque organizado ao desenvolvimento nacional, com miras calibradas sobre portos, hidrovias, ferrovias, hidrelétricas e até usinas nucleares.

A esta altura, esperava-se da Petrobras a apresentação de projetos arrojados de investimento, projeções capazes de impactar o desenvolvimento econômico e social do país como nunca antes na história, a transformação radical do Brasil de reles importador a privilegiado exportador de petróleo. Não dá para conformar-se com o caos anunciado. É pôr ordem na casa ou pôr ordem na casa. Quanto aos responsáveis, o lugar deles é um só: atrás das grades.

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