sexta-feira, julho 11, 2014

Na batalha contra a inflação o crédito começa a esfriar - EDITORIAL VALOR ECONÔMICO

VALOR ECONÔMICO - 11/07 


O Banco Central (BC) acaba de reduzir a previsão de expansão do crédito neste ano de 13% para 12%. Se a projeção se confirmar, os empréstimos irão registrar o menor crescimento desde 2003. A correção de trajetória foi feita por causa da desaceleração dos financiamentos ao consumo, especialmente para a compra de veículos. Chamados de créditos com recursos livres, essas operações acumularam 5,7% de expansão nos 12 meses terminados em maio, depois de terem crescido 7,8 % no ano passado. Por isso, o Banco Central reduziu a previsão de aumento para este ano de 10% para 7%.

Outras operações também estão mais moderadas. Os empréstimos direcionados para linhas como financiamento imobiliário e rural, por exemplo, aumentaram 22,3% nos 12 meses terminados em maio e, segundo o BC, fecharão o ano com expansão de 19% e não dos 17% anteriormente estimados. No ano passado, registraram aumento de 24,6%.

A retração do crédito em 2003 foi resultado da turbulência generalizada nos mercados, causada pela eleição de Luiz Inácio Lula da Silva. O crédito cresceu 8,4%, para retomar posteriormente a tendência de recuperação iniciada com a estabilização econômica, caracterizada por taxa média de crescimento anual de 20,9% nos últimos dez anos.

A desaceleração atual que levou o BC a rever as previsões para o ano, coincidentemente nas proximidades de nova eleição presidencial, pode ser explicada por uma conjunção de fatores.

Os tomadores de recursos estão mais arredios depois que os juros do crédito subiram para patamares mais elevados, na esteira do aumento da taxa básica de juros (Selic) promovida pelo BC para conter a inflação, manobra ainda sem sucesso evidente.

O juro do crédito com recursos livres para empresas subiu de 18,5% para 23% ao ano, com aumento de 4,5 pontos percentuais, um pouco mais do que os 3,75 pontos de reajuste imprimido à Selic, que está atualmente em 11%. Na próxima semana, o Comitê de Política Monetária (Copom) realiza nova reunião e deve manter os juros nesse patamar. Já nas operações com pessoas físicas, as taxas subiram quase 10 pontos, de 34% para 42,5% ao ano.

O encarecimento do crédito tornou as pessoas mais cuidadosas, mesmo porque já vinham aumentando o endividamento nos últimos anos. Levantamento do Banco Central mostra que o endividamento das famílias equivalia a 45,7% da renda em março, dado mais recente disponível, em comparação com 40% há três anos; e que o serviço da dívida comprometia 21,5% da renda mensal.

O financiamento habitacional representa cerca de um terço do endividamento das famílias, o que é um bom sinal, mas significa também um compromisso de longo prazo, que reduz o espaço para outras dívidas por um bom período. Sem as dívidas habitacionais, o endividamento cai para 29,5% e o comprometimento, para 19,6%.

O brasileiro chegou a esses níveis de endividamento em um cenário preocupante, de atividade econômica mais fraca, com impacto nos salários e menor ritmo de criação de empregos. Depois de aumentar 4,1% em 2012, o rendimento real dos salários cresceu 1,8% em 2013 e 2,3% nos 12 meses terminados em abril. Tudo isso tem contribuído para reduzir os índices de confiança.

Os bancos, do seu lado, também estão mais cautelosos diante desse quadro e apertando os critérios de concessão de recursos, embora raramente admitam isso. A postura foi reforçada depois que a inadimplência deu sinais de aumento em maio, pela primeira vez no ano. Os atrasos acima de 90 dias nas operações com recursos livres passaram de 6,5% para 6,7% no caso das pessoas físicas; e de 3,3% para 3,5% nas empresas.

Tem razão, portanto, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, quando reclama da menor oferta de crédito para o consumo, o que reduz as atividades do varejo e repercute na indústria. Nos 12 meses terminados em maio, o financiamento para a aquisição de veículos diminuiu 2,7%, embora o crédito pessoal tenha aumentado 11,8%, e o cartão de crédito, 13,3%, no mesmo período.

Mas a situação é resultado das medidas tomadas para conter a inflação. Do ponto de vista do Banco Central, o comportamento do mercado de crédito reflete nada menos do que o funcionamento azeitado dos canais de transmissão da política monetária, como foi repetido exaustivamente na apresentação do mais recente relatório trimestral de inflação.

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