Se há algo profundamente igualitário no Brasil, é a burocracia. Ela atinge todas as camadas sociais, pessoas físicas e pessoas jurídicas, grandes ou pequenas, de todos os setores. E parte importante dessa burocracia se refere ao licenciamento ambiental. Segundo estudo da Confederação Nacional da Indústria (CNI), há cerca de 30 mil normas, expedidas pela União e pelos Estados, que regulam esse procedimento. Para piorar o cenário, tais regras são muitas vezes contraditórias entre si.
O licenciamento ambiental é o processo administrativo pelo qual o órgão ambiental autoriza a implantação de empreendimentos ou a realização de atividades que utilizam recursos ambientais ou que podem provocar efeitos danosos ao meio ambiente. Ele é obrigatório tanto para grandes obras de infraestrutura quanto para pequenos negócios, como, por exemplo, um posto de gasolina.
De acordo com o levantamento da CNI, o tempo médio para obtenção de uma licença ambiental é de 28 meses, prazo "incompatível com os custos de oportunidade da maioria dos investimentos", na opinião de Shelley Carneiro, gerente do Meio Ambiente e Sustentabilidade da CNI. "Ninguém é contra a licença ambiental, e alguns empreendimentos de fato podem ser muito agressivos. (...) Mas, do jeito como ela vem sendo feita, só gera uma burocracia imensa que não resulta em nada de bom para o meio ambiente", disse Carneiro ao Estado (20/7).
O estudo da CNI elenca 21 pontos críticos no licenciamento ambiental. Entre eles estão as condicionantes ambientais, isto é, as exigências feitas pelo poder público ao empreendedor para mitigar os impactos ambientais e que condicionam a obtenção da autorização ambiental. Como consequência lógica da sua finalidade (a proteção ambiental), essas condicionantes deveriam ter relação direta com o meio ambiente. No entanto, as exigências estão cada vez mais amplas, transformando a licença ambiental em moeda de troca política. "Os políticos às vezes aproveitam para pedir coisas que não têm nada a ver com o projeto, como hospitais e rodoviárias", afirmou Shelley Carneiro.
Uma das causas para essa situação é a ausência de um critério claro para o estabelecimento das condicionantes ambientais. Há uma ampla margem de discricionariedade para o agente público, gerando decisões com impactos econômicos muito díspares. Por exemplo, o programa de sustentabilidade da Usina Santo Antônio, no Rio Madeira (RO), teve um custo de R$ 2 bilhões, e o investimento total na obra foi de R$ 20 bilhões. Já na Usina Belo Monte, em construção no Rio Xingu (PA), as ações socioambientais somam R$ 3,7 bilhões, para um custo total estimado em R$ 25,8 bilhões.
Se depender do governo, não há muitas perspectivas de melhora. Segundo o site do Ministério do Meio Ambiente, "o licenciamento é, sim, palco de conflitos; pois é espaço de democracia". Essa estranha lógica que vê o conflito como algo natural - e até desejável, como consequência da democracia - é uma miopia que trava o crescimento e torna o meio ambiente cenário para luta política.
Em dezembro de 2011 foi dado um passo para uma melhor coordenação entre as esferas de governo na emissão de licenças. Aprovou-se a Lei Complementar 140, que estabelece as atribuições dos entes federativos no processo ambiental. No entanto, a lei ainda está à espera de regulamentação, que cabe ao governo federal, e vem gerando dúvidas na hora de ser aplicada. A promessa da presidente Dilma Rousseff é regulamentar a Lei 140/2011 no seu segundo mandato, caso seja reeleita. Por que esperar?
O País precisa com urgência de regras claras, proporcionando um ambiente de segurança, onde os custos e riscos possam ser avaliados com precisão. Incerteza e conflito não colaboram para o desenvolvimento nacional e são ocasiões para a arbitrariedade e a corrupção.
Há ainda um efeito colateral, não pequeno, em toda essa ineficiência. Transmite-se a impressão de que o respeito ao meio ambiente gera atrasos. A preocupação ecológica não é a culpada, como se fosse necessário certo descaso com o meio ambiente para o Brasil crescer mais rápido. A culpa é da burocracia, ampla e desconexa, alimentada pelas omissões do poder público.
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