domingo, abril 06, 2014

Planos de saúde recebem, mas não pagam - ELIO GASPARI

O GLOBO - 06/04

Articula-se no Congresso uma CPI para a Petrobras. Pode ser boa ideia, mas seria bom se alguém pudesse criar a CPI do Congresso. Na terça-feira passada, a Câmara aprovou a Medida Provisória 627, que trata da tributação de empresas brasileiras no exterior. Como é praxe, seu texto foi enxertado por 523 contrabandos. Entre eles, um artigo concedeu anistia parcial aos planos de saúde que não cumprem os contratos, apesar de embolsarem as mensalidades das vítimas. O truque é simples. Há multas que vão de R$ 5 mil a R$ 1 milhão. Como nas infrações de trânsito, cada multa é uma multa.

Até dia 31 de dezembro deste ano eleitoral em que o Senado poderá ratificar a maluquice e a doutora Dilma poderá sancioná-lo, as empresas terão a seguinte pista livre: a empresa que tomou de duas a 50 multas da mesma natureza, pagará apenas duas; de 50 a 100, mais duas; acima de mil, vinte. Assim, quem foi multado cem vezes, pagará quatro penalidades. Em números: uma multa por negativa de procedimento custa R$ 80 mil. Quem delinquir cem vezes, paga R$ 8 milhões, mas com a mudança pagará R$ 320 mil.

Os defensores do truque deveriam contar por que não aplicam a mesma tabelinha aos clientes que deixarem de pagar as mensalidades estabelecidas nos contratos. Caloteou 50 pagamentos, paga dois.

A maracutaia estimula a delinquência, penaliza quem não delinque e favorece poderosos delinquentes, quase todos grandes financiadores de campanhas. (Entre 2006 e 2012 elas cresceram 37,2%, para pelo menos R$ 8,6 milhões.)

Se tudo isso fosse pouco, a doutora Dilma indicou para uma diretoria da Agência Nacional de Saúde o doutor José Carlos Abrahão. Ele é um sincero adversário das normas legais que obrigam as operadoras a ressarcir o SUS quando seus clientes são atendidos pela rede pública. Pelo cheiro da brilhantina, se algum dia vierem a cobrá-la por essa indicação, poderá dizer que se baseou em "informações incompletas" ou num parecer "técnica e juricamente falho", como no caso da refinaria de Pasadena.

PAGAR IMPOSTO É COISA DE OTÁRIO

Pela ordem social do andar de cima há no país os cavalgados e os cavalcantis. Os cavalgados compram suas coisas e pagam todos os impostos no caixa. Trabalham o mês todo e quando recebem o contracheque, ele vem com a mordida do imposto de renda.

Os cavalcantis não pagam o que a Receita cobra e, uma vez autuados, esperam que o governo lhes ofereça um plano de refinanciamento do débito. Os descontos são tamanhos que não pagar torna-se bom negócio. O truque atende pelo nome de Refis, e num acordo do governo com a oposição (em ano eleitoral) a Câmara dos Deputados, numa Medida Provisória relatada pelo deputado Eduardo Cunha, acaba de patrocinar mais uma festinha. É o Refis 8.0. Resta saber se a doutora Dilma vai sancioná-la.

O Refis socorre sonegadores desde 1999. Por meio de engenhosos mecanismos, tornou-se um benefício contínuo. Houve empresa com a dívida parcelada por 1.066 anos. Outra, que devia R$ 128 milhões, passou a pagar R$ 12 por mês. Bancos e multinacionais já refinanciaram R$ 680 bilhões. A Vale parcelou uma cobrança de R$ 45 bilhões com 50% de desconto. A Companhia Siderúrgica Nacional safou-se de uma dívida de R$ 5 bilhões. A Braskem podou um espeto de R$ 1,9 bilhão.

Em 2009, a secretária da Receita, Lina Vieira, disse que, com esse gatilho, "o bom contribuinte se sente um otário". Ela foi demitida pouco depois pelo ministro Guido Mantega.

Sempre que o governo maquia o Refis vem o argumento de que com ele arrecada-se cerca de 15% do que está emperrado. É verdade, mas deixa-se de receber o que se cobrou aos cavalcantis, o que nunca acontece com os cavalgados.



Eremildo, o idiota

Eremildo é um idiota e soube que a Vale arrisca tomar um tombo de US$ 507 milhões na Guiné. Em 2010 ela comprou a um empresário israelense parte da concessão da grande jazida de minério de ferro de Simandou. Mudou o presidente eseu sucessor resolveu reexaminar a maneira como a concessão foi vendida e ameaça cancelá-la.

Mesmo sendo idiota, Eremildo não consegue entender o que há na cabeça de sábios brasileiros que se metem em negócios com sobas africanos. O cretino sabe que a Guiné Equatorial nada tem a ver com a outra Guiné, mas convenceu-se de que Lula foi lá em 2011 para representar a doutora Dilma num encontro da União Africana em busca de encrencas. Nosso Guia viajou num avião da Odebrecht e incluiu um diretor da empresa na sua comitiva.

A Guiné Equatorial é um pequeno país de 700 mil habitantes que flutua sobre petróleo. Tem a maior renda per capita da África, mas os nativos vivem na miséria (70% da população com menos de dois dólares por dia). Já o clã dos Obiang, que governa a terra desde 1979, vai bem, obrigado. Um deles tem um apartamento de US$ 15 milhões em São Paulo, e outro negociou a compra de um triplex de US$ 10 milhões na Avenida Vieira Souto. Quando Lula foi ver Obiang, o embaixador Celso Amorim disse que "negócios são negócios". Resta saber quais eram os negócios.

A empresa holandesa SBM, locadora de plataformas de petróleo, acaba de informar que pagou US$ 18,8 milhões em propinas na Guiné Equatorial. Se esse dinheiro fosse para o povo, renderia 26 dólares para cada um. Para o Fundo Obiango, renderia mais um apartamento.

ISONOMIA

Ameaçando criar a CPI do Fim dos Mundo 2.0, o PT não conseguirá limpar uma só nódoa nos negócios da Petrobras. Apesar disso, demonstrou que o tucanato está disposto a qualquer coisa para não mexer com o cartel da Alstom.

Estão nessa desde 1995, quando opatrono da empresa organizou uma revoada de notáveis para assistir a posse de Bill Clinton. O pior é que a turma dizia que foi convidada pelo governo americano, quando se sabe que a posse de presidentes em Washington é um evento doméstico.

LOROTA

Sabendo-se que é falsa a informação do ex-diretor Nestor Cerveró, segundo a qual os conselheiros da Petrobras receberam o contrato de compra da refinaria de Pasadena com 15 dias de antecedência, fica uma pergunta: Qual é a linha que separa a verdade das lorotas dos petrocomissários?

MADAME NATASHA

Madame Natasha zela pela malha do idioma e concedeu mais uma de suas bolsas de estudo aos sábios que redigiram o Plano Diretor Estratégico da prefeitura de São Paulo pelo paragrafo único do seu artigo 178, que diz o seguinte:

"A Zona Rural do Município de São Paulo é multissetorial e multifuncional, comportando a diversidade de atividades integrantes das cadeias produtivas da agricultura e do turismo, incluindo infraestrutura e serviços aelas associados, e exercendo as funções de produção, inclusão social, prestação de serviços e conservação ambiental características da ruralidade contemporânea."

A senhora acredita que eles poderiam ter escrito a mesma coisa a respeito da Lua.

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