O Estado de S.Paulo - 01/03
Na ópera trágica que assistimos na Ucrânia, é difícil entender as frases, acompanhar as peripécias. Durante três meses, jornalistas e políticos nos dizem que toda a Ucrânia "está com fome da Europa" e os revoltosos heroicos, pró-europeus e democráticos da Praça Maidan não tinham outros rivais a não ser os policiais e soldados do regime do presidente Viktor Yanukovich.
Dois dias após o triunfo dos democratas de Maidan, porém, eis que em algumas regiões da Ucrânia a revolta de Kiev é denunciada como "fascista" e multidões esperam a luz de Moscou. Assim, mais uma vez, observamos que a história, quando a política a expulsa pela porta, ela entra pela janela. Na realidade, a Rússia é filha da Ucrânia. No século 9.º, Kiev forjou um Estado povoado de tribos da estepe eslava que ameaçavam os nômades da Ásia Central. Esse Estado, chamado "Rus", aproxima-se da Europa. É cristão de rito bizantino e tem um intercâmbio comercial com Bizâncio e com a Europa. Três séculos mais tarde, em 1240, essa primeira Ucrânia, ao mesmo tempo russa e europeia, é aniquilada pelos mongóis. Kiev desaparece.
A região se fragmenta em três grupos etnolinguísticos. A noroeste. os russos brancos. Ao sul, os ucranianos. Esses dois grupos ficam na esfera de influência da Lituânia, reunida à Polônia no século 14 sob a monarquia dos Jaguelões. O terceiro grupo, a nordeste de Kiev, reúne os grandes russos atraídos para o Principado de Moscou, que inicialmente era um feudo dos mongóis, mas que pouco a pouco se separou deles.
Nesse momento, a Ucrânia desmembrada adquire forma: de um lado, a oeste, reina a monarquia dos Jaguelões, que respeita as minorias e as aristocracias locais. Do outro lado, a leste, um principado ligado a Moscou e subjugado por czares violentos, entre os quais o mais célebre foi Ivã, o Terrível.
E, como nesses tempos obscuros a religião é a base das comunidades, em breve, haverá no espaço ucraniano duas igrejas. De um lado, a ortodoxa, de tradição eslava e russa, a religião das massas. De outro, nascida em 1596, uma igreja que pratica o rito ortodoxo, mas reconhece Roma e a autoridade do papa. Em outros termos, uma igreja nas mãos de Moscou, outra voltada para o Ocidente.
Na mesma ocasião surge um novo ator no drama: os cossacos, guerreiros que detestam qualquer autoridade. Eles mesmos adotam um comportamento ao mesmo tempo democrático, militar e libertário. Detestam o absolutismo dos czares e não querem ser servos. No entanto, não estão próximos da Ucrânia polonesa, que estabelecerá para eles um tipo de autonomia.
Em 1648, ocorre uma revolta na Ucrânia sob o impulso de um cossaco exaltado, Bogdan Khmelnitski, que foi obrigado a se aliar com Moscou. Seis anos depois, a Ucrânia tem de decidir seu futuro, ou seja, volta-se para a Rússia, liga-se à Polônia ou é absorvida pelo Império Otomano. Os ucranianos juram fidelidade à Rússia, mas a lua de mel é breve.
Foi preciso demarcar uma linha ao longo do Rio Dnieper. A oeste, a Polônia. A leste, o império dos czares. Essas fronteiras são cicatrizes na carne de um país e jamais se apagam completamente. Concluindo o percurso cossaco. A grande Catarina, no século 17, conquista a Crimeia, que hoje é o principal foco explosivo da Ucrânia. Depois, vem a Revolução Bolchevique e, em 1932, a fome que alguns afirmam ter sido organizada por Stalin. Balanço: 4 milhões de mortos.
Enfim, quando a União Soviética naufraga nas águas mortas da história, em 1991, a Ucrânia conquista sua independência. Na verdade, este é um artigo severo, um pouco universitário, mas me parece útil ter a energia de lê-lo para compreender melhor as figuras que se defrontam numa das mais perigosas crises da era pós-soviética. / TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO
Gostei dessa lição de história. Tks.
ResponderExcluirEngraçado é que o comuna francês fresquinho diz que são alguns que dizem ter o genocida comuna-soviético matado pela fome 4 milhões de ucranianos. Deus do céu, realmente ainda hoje há quem defenda o facinoroso. Ô monsignor Frescal, nenhum historiador sério duvida do Grande Holomodor, há registros oficiais da própria polícia secreta stalinista que o confirmam e revelam que o morticínio fora fria e calculadamente arquitetado pela cúpula comuno-soviética. E mais: não foram "só" 4 milhões de ucranianos esfaimados mortos, não, monsignor afeminado com batata na boca. Os comunistas, nessa oportunidade genocidária, muito longe claro de outros eventos recordes, contentaram-se, por baixo, em matar uns 6,5 milhões de ucranianos, literalmente de FOME. Aliás, não há eventos de morte por fome em larga ou média escala, pelo menos nos últimos duzentos anos da humanidade, que não tenham sido causados por essa ideologia satânico-assassina. Para imagens aterradoras, basta consultar o Google-Imagens sobre casos de canibalismo durante o Holomodor e verão porque comunistas são chamados de "comedores de criancinhas".
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