segunda-feira, fevereiro 17, 2014

Pacote de ilusões - EDITORIAL CORREIO BRAZILIENSE

CORREIO BRAZILIENSE - 17/02
O governo da presidente Dilma Rousseff se prepara para lançar ainda neste semestre a terceira versão do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), portfólio de obras montado pela administração federal. O segundo relançamento do carro-chefe de investimentos públicos e privados em infraestrutura também servirá aos propósitos da corrida eleitoral, visando projetar a ideia de continuidade de um conjunto de ações do Executivo no período seguinte, pós-urnas. Rebatizado de PAC 3, o pacote deverá, contudo, ser marcado em seu oitavo ano de execução pelo descrédito de analistas e pelo uso ainda mais desmedido da propaganda oficial.
Com o polêmico Trem de Alta Velocidade (TAV) encabeçando a lista de realizações perseguidas pelo programa, o repaginado programa ainda carregará nas costas as promessas não cumpridas dos PACs 1 e 2. O que ainda não saiu do papel ganhará novas cores e outros alvos menos ambiciosos, como o avanço da inclusão digital e foco maior nas questões mais urbanas, leia-se mobilidade e saneamento, deverão ser incluídos. Tudo com a supervisão direta do marketing dedicado, simultaneamente, à administração federal e à reeleição da presidente.

Lançado em janeiro de 2007, o PAC virou precocemente PAC 2 em março de 2010, começo do último ano da era Lula, como ponte para a candidata ao Planalto e atual sucessora. Em sete anos, o programa do qual Dilma foi denominada "mãe" tem avançado com dificuldades, mas, curiosamente, ganha mais fôlego na divulgação nos anos eleitorais - 2008, 2010, 2012 e, finalmente, 2014. O mesmo não ocorre na prestação de contas, que há muito perdeu a regularidade, e, quando ocorre, vem acompanhada de dúvidas em torno das mudanças de critérios de avaliação, de valores empenhados e de itens expostos.

Depois de conseguir avanços no relacionamento com o Tribunal de Contas da União (TCU), considerado por Lula o obstáculo maior ao PAC, o governo ainda esbarra em entraves burocráticos nos planos para animar e tornar eficaz a economia. A própria ex-ministra da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, admitiu que os projetos na esfera federal não andam na velocidade desejada por falta de "cultura de resultados" na máquina pública.

Há obras do PAC com seis anos de atraso, algumas que causam grande constrangimento, como a transposição de águas do Rio São Francisco, sonhada desde a época do Império. A expectativa agora é tentar mostrar que 2015 terá novo ritmo para tudo o que é proposto, sem, contudo, indicar como o arranque poderá ser feito sem alterar metodologias.

Embora o balanço do PAC 2, que deve ser apresentado amanhã, provavelmente indique o cumprimento da meta de investimentos até dezembro de 2014 de quase R$ 1 trilhão, boa parte do total vem de financiamentos habitacionais e do plano de investimentos da Petrobras. Segundo o Ministério do Planejamento, responsável pelo PAC, a dotação do programa chegou a R$ 181,42 bilhões, dos quais R$ 112,03 bilhões foram efetivamente pagos ou 61,75% do original. Para 2014, as obras do PAC têm previstos R$ 61,4 bilhões no Orçamento da União.

A democracia conquistada pelo país, há 25 anos sob a proteção da Constituição, permitiu o convívio com a rotina de eleições a cada dois anos, com mandatos de quatro para os eleitos dos três níveis de governo. Mas o maior desafio para fazer o sistema representativo funcionar ainda é o de conciliar as políticas de Estado com o uso político do Estado.

A lógica eleitoral acaba interferindo negativamente nos prazos e objetivos dos grandes investimentos públicos e, sobretudo, na sua transparência. A solução está no aperfeiçoamento da cultura da gestão estatal para alcançar visão de longo e médio prazo, descolando até onde for possível dos ditames das campanhas pelo voto popular.

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