quarta-feira, janeiro 15, 2014

O rombo da indústria - EDITORIAL O ESTADÃO

O Estado de S.Paulo - 15/01

Com um buraco de US$ 105 bilhões na conta de manufaturados, o comércio exterior foi mais uma vez desastroso para a indústria brasileira, em 2013. Atribuir o mau resultado à crise internacional e ao câmbio, como têm feito autoridades federais, é tentar disfarçar o indisfarçável. Mesmo com o ambiente externo desfavorável e a queda de preços de vários produtos, o agronegócio faturou US$ 99,97 bilhões no ano passado, 4,3% mais que em 2012, e fechou o balanço com um superávit acumulado de US$ 82,91 bilhões, 4,4% maior que o do período anterior. Uma palavra explica a diferença entre os dois desempenhos: competitividade. Apesar dos problemas logísticos e de uma porção de outras dificuldades, o campo e a indústria diretamente ligada à agropecuária têm mantido um padrão de eficiência respeitado internacionalmente. A maior parte do setor manufatureiro tem sido muito mais afetada pelos entraves à produção e à comercialização - a própria logística, o alto custo da energia, a escassez de mão de obra qualificada e até qualificável, a tributação irracional e, naturalmente, os erros da política econômica.

A indústria exportou em 2013 manufaturados no valor de US$ 93,09 bilhões, valor 1,8% maior que o de 2012, pela média dos dias úteis. Mas esse resultado inclui US$ 7,74 bilhões obtidos com a exportação meramente contábil de sete plataformas de exploração de petróleo e gás. Sem sair do País, esses equipamentos foram vendidos para a obtenção de benefícios fiscais e alugados para uso no Brasil.

São operações legais, permitidas há mais de dez anos, mas seu volume e seu valor têm crescido a ponto de se tornarem essas plataformas o item principal da pauta de manufaturados. Isso obviamente distorce os números, porque exportação de plataformas significa, de fato, algo muito diferente de exportação de soja, café, aviões, automóveis, peças, tratores, biquínis, açúcar e minério.

Expurgadas as contas do ano passado e de 2012, as vendas de manufaturados de fato encolhem, passando de US$ 89,25 bilhões para US$ 85,35 bilhões. Com esse desconto, o déficit do setor sobe de US$ 105 bilhões para US$ 112,75 bilhões. Não se trata de um déficit qualquer, facilmente assimilável e causado por algum fator conjuntural. O quadro fica mais feio quando a atenção se volta para um detalhe. Não se trata somente de importação maior que exportação. O próprio déficit, o resultado da subtração, é muito maior que o valor exportado, seja o oficial (US$ 93,09 bilhões) ou o expurgado (US$ 85,35 bilhões).

Com ou sem plataformas, pode-se falar de uma desindustrialização das exportações brasileiras. As vendas de manufaturados garantiram mais de 50% da receita comercial durante os anos 90 e em boa parte da última década. Em 2007 ainda proporcionaram 52,25% do valor vendido ao exterior. No ano seguinte a proporção caiu para 46,82%. A queda prosseguiu nos anos seguintes, até 38,4% em 2013. Somada a parcela dos semimanufaturados, obtém-se a participação total dos industrializados, 51% do total vendido ao exterior. Em 2007, a soma dos dois itens ainda rendeu 65,82%, praticamente dois terços da receita comercial.

O mau desempenho comercial do setor de transformação tem como contrapartida o baixo crescimento do produto industrial nos últimos anos. Os dois fenômenos estão associados. Por um evidente erro de diagnóstico, o governo vem estimulando há anos a demanda de consumo, sem remover de fato os muitos entraves à produção.

A indústria tem sido incapaz de responder à demanda crescente e de enfrentar a concorrência estrangeira, no exterior e no mercado interno. Apesar disso, as empresas do setor conseguiram durante anos manter o pessoal. Evitaram os altos custos de demissão e os problemas de recomposição de quadros num mercado de mão de obra de baixa qualidade. Esse esforço parece ter chegado ao limite. O emprego na indústria ficou estável em novembro, em nível 1,7% inferior ao de um ano antes, e diminuiu 1,1% em 12 meses. Cada vez mais, a sustentação do emprego tem dependido de vagas em atividades pouco produtivas, principalmente em serviços. Um Bric digno desse nome tem de fazer muito mais.

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