quarta-feira, dezembro 04, 2013

Orçamento de ficção - TERESA BERGHER

O GLOBO - 04/12

Altera-se o curso do dinheiro público, sepultando qualquer tentativa de planejamento



Todo ano é a mesma brincadeira: o prefeito soberano do Rio envia ao Legislativo um projeto de lei orçamentária de mentirinha. E a Câmara assina embaixo de um faz de conta, que será substancialmente alterado pelo Executivo, graças à nociva margem de remanejamento de nada menos que 30%. Isso é muito, ou melhor, quase tudo.

O orçamento da cidade para o ano que vem é de R$ 27 bilhões. Retirando as operações de crédito contratuais, encargos e amortização da dívida, sobram nas mãos do prefeito R$ 24 bilhões. Como grande parte deste dinheiro é destinada ao pagamento de pessoal e outras despesas fixas, no fim das contas, os 30% que a Câmara lhe permite alterar — a fortuna de mais de R$ 7 bilhões — são praticamente tudo o que resta.

E é assim que ele pode tudo. É assim que, todo ano, ele brinca de engordar o orçamento da Riotur, com uma simples canetada. A empresa municipal de Turismo entrou em 2012 com previsão orçamentária de R$ 55 milhões e terminou o ano com gastos que ultrapassaram os R$ 171 milhões — uma variação inacreditável de 213%. Pode isso?

Um exemplo claro do mexe-remexe que o prefeito faz com o dinheiro público está nos 86 decretos para abertura de crédito suplementar, somando mais de R$ 300 milhões, publicados de uma só tacada no Diário Oficial do dia 11 de novembro. Nesta salada mista, o alcaide cancelou R$ 40 milhões de obrigações patronais e outros benefícios aos servidores da Administração, para dar prosseguimento ao VLT do Centro. E assim altera-se o curso do dinheiro público, sepultando qualquer tentativa de planejamento para a cidade.

No orçamento de 2014, estão lá, preto no branco, nada menos que 82 ações de minúsculos R$ 1 mil. A recém-criada Riosaúde, por exemplo, tem para o ano que vem apenas R$ 7 mil de migalhas. Não é preciso ser diplomado em finanças públicas para apostar que este é o indício de que tudo será devidamente alterado. O prefeito não surpreende nunca.

Dando prosseguimento ao ilusionismo, o orçamento é aprovado depois da apreciação de emendas parlamentares, que jamais serão cumpridas, embora os valores tenham sido previamente acordados com o Executivo, mas um dia também servirão para iludir o cidadão. E ficará tudo por isso mesmo.

Para tentar botar um freio na farsa orçamentária do prefeito, apresentei emenda reduzindo a margem de remanejamento para 10%, com base em parecer do Tribunal de Contas do Município, que indica que este é o limite histórico do que é habitualmente remanejado. Ainda assim é muito. Vamos torcer para que a emenda passe. Quem sabe os vereadores da base governista não botam a mão na consciência e deixam de dar ao prefeito o tradicional cheque em branco de Natal.

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