domingo, novembro 17, 2013

Schadenfreude e Eike - BELMIRO VALVERDE JOBIM CASTOR

GAZETA DO POVO - PR/11

Sobre o afundamento das empresas de Eike Batista muito já foi escrito, mas ainda me confesso perplexo pela velocidade e pela profundidade da derrocada do agora denominado na imprensa de “ex-bilionário”.

Eike e sua debacle são o exemplo pronto e acabado de um tipo muito popular de capitalismo no Brasil, marcado por empresários audaciosos com fortes traços de inconsequência, superficialismo e ostentação, que fascinam os basbaques com seus lances ousados, frases de efeito e autoconfiança ilimitada para, em seguida, deixar um rastro de prejuízos e de lamentações entre os que acreditaram em suas habilidades mágicas e investiram nelas. Para relembrar: Coroa Brastel, Construtora Encol, Mappin Mesbla, Naji Nahas, Fazendas Boi Gordo, entre muitos outros exemplos.

Anestesiados pelo sucesso aparente desses tycoons, “analistas” e “especialistas” esquecem as cautelas e a história pregressa para embarcar numa louvação exagerada. Eike criou, mesmo, um “sistema” de gestão, o tal “Visão 360 graus”, descrito em um livro (Eike Batista e o X da Questão) como a pedra filosofal dos alquimistas financeiros modernos por revisores simpáticos. E para nós, brasileiros, que adoramos encontrar um traço de transgressão ou uma ilegalidade oculta na formação das fortunas alheias, um atrativo extra: a suspeita, sempre desmentida, de que a ascensão empresarial fulminante do empresário se deveu a um mapa estratégico das reservas de minério do Brasil, presenteado por seu pai, Eliezer Batista, o “dono” das informações sobre o subsolo brasileiro por décadas.

Daí para as boas graças de banqueiros públicos e privados foi um pulo. Nos dois casos, todas aquelas exigências para um cidadão comum financiar até um carrinho de pipoca foram esquecidas ou aligeiradas, e o fato de alguém ser catapultado subitamente de milionário simples do comércio de ouro para a oitava fortuna do mundo, considerado naturalíssimo. No caso dos bancos privados, o problema é deles. Mas, no caso do BNDES e da Caixa, entupidos até o gargalo com bilhões de reais de créditos imprudentes, o problema é nosso.

Agora que ficou claro que os poucos críticos que alertaram para o “risco Eike” tinham razão, todos se sentem mais ou menos logrados por ele e por suas projeções exageradas de sucesso. Investidores e bancos descobrem de repente que, como diz a anedota corrente, Eike foi a segunda pessoa que ganhou mais dinheiro com o programa de computador Power Point, usado para preparar apresentações maravilhosas (o primeiro foi Bill Gates, o dono da Microsoft, que o criou).

Em um livro delicioso de Fabio Campana, que revisito vez por outra, A Árvore de Isaías, encontrei a explicação psicossociológica: o sentimento de ter sido enganado desencadeou nos brasileiros o que os alemães chamam de schadenfreude, a alegria pelo sofrimento dos outros, o prazer em vê-los quebrar a cara. E assim pululam as brincadeiras, as ironias e o deboche em sites em que as agruras do novo-pobre Eike são tratadas às gargalhadas em postagens como “Eike lambendo a tampa do iogurte”, “raspando o cartão telefônico no chão para aumentar a validade”, “comprando pizza no Groupon” e “usando camiseta de campanha de vereador como pijama”...

De minha parte, acho que essa história toda do Império X ainda não está bem contada (olha a teoria conspiratória), e Eike e alguns de seus investidores, principalmente os internacionais, ainda têm motivos para rir à toa. Quem não tem são os investidores miúdos, o BNDES e a Caixa. Quem viver verá.

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