sexta-feira, outubro 25, 2013

Isolar ou não isolar? Eis a questão - BARBARA GANCIA

FOLHA DE SP - 25/10

Alô, Haddad! Só tomando uns mé para engolir mais uma mudança na política das internações de dependentes


Em um mundo ideal, tomates seriam os organismos mais indicados para servir de pi­loto de testes da indústria farma­cêutica. A ritalina, aquele remédio que é dado para crianças hiperati­vas, só seria receitado em casos em que se faz estritamente necessário, nunca como sossega leão. Que tal?

Nos últimos anos, distúrbios co­mo o TDAH, TOC e a dislexia (difi­culdade de aprendizado de leitura que até ontem não era reconhecida por lei e excluía legiões de brasilei­ros do mercado de trabalho por fal­ta de acesso a diagnóstico e a méto­dos específicos de alfabetização) e a própria condição de dependente do álcool e de substâncias químicas começaram a ser tratadas à luz do dia. Problema é que em vez de a transparência prevalecer, quem dominou o debate foram a ideolo­gia e o mercantilismo.

Ao contrário do que pensa Myres Cavalcanti, coordenadora de saúde mental da prefeitura, alguns dependentes precisam, sim, de inter­nações prolongadas. São casos ex­tremos, a minoria. Outros, cada ca­so é um caso, podem ser tratados tranquilamente em ambulatórios e conseguem trabalhar e funcionar em sociedade enquanto são trata­dos. No AME (Ambulatório Médi­co Especial) da Vila Maria, em SP, por exemplo, há um programa de acompanhamento de grande su­cesso.

Outro modelo, em que o depen­dente de drogas ou álcool passa o dia, é o do Caps (Centros de Atenção Psicossocial). Além disso, se cada região tivesse um centro de emer­gência com um par de leitos em ca­da hospital e um psiquiatra para atender casos de surtos, nós já esta­ríamos bem munidos, certo, pre­feito Haddad? Governador Alck­min? Não seria mais preciso ficar discutindo qual o modelo ideal, se o das internações longas ou curtas, se o encaminhamento para hospitais, ambulatórios ou para a Ilha do Dia­bo na Guiana Francesa. Cada caso é um caso e deve ser contemplado como tal, se é que a gente quer mes­mo resolver e não ficar entrando e saindo de guerrinhas ideológicas.

Em um mundo ideal, e naquele em que o Estado está inclusive dis­posto a atender mais gente com mais eficiência e por menos dinhei­ro, estes quatro modelos funciona­riam em conjunto a um programa perene de prevenção.

Nesta semana, participei do lan­çamento da cartilha "Papo em Fa­mília" elaborada em conjunto com gente do calibre da nossa Rosely Sayão e dos estúdios da Maurício de Sousa Produções, seguindo as diretrizes estabelecidas pela Orga­nização Mundial de Saúde e patro­cinado pela indústria de bebidas (para quem eu presto serviços na forma de palestras sobre alcoolis­mo).

Menor não pode consumir álcool porque suas sinapses ainda não es­tão formadas e, quanto mais cedo ele entrar em contato com a bebida, mais chances terá de desenvolver uma adição. Isso é fato. Como tam­bém é fato de que a melhor maneira de convencê-lo de que não pode in­gerir álcool é conversando em fa­mília desde cedo.

Há uma pesquisa feita entre jovens tapuias indicando que ele confia mais nos pais do que nos amigos. Só que os pais não sabem conversar sobre certos temas mais tênues com seus filhos. Ou não se dão conta de que o exemplo dado em casa vale mais do que um mi­lhão de horas de blablablá. Ou não estão informados de que a conversa sobre a bebida deve começar a par­tir dos seis anos. Ou que amar é im­por limites e não ser um facilitador obsceno. Ou que estabelecer limites não significa moralizar nem a con­versa deve ocorrer de cima para baixo. Seja como for, viu, Haddad e Alckmin, educadores, pais, indús­tria, todo mundo: vamos apressar o passo?

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