sábado, outubro 19, 2013

Barreira dos juros de dois dígitos desafia BC - EDITORIAL O GLOBO

O GLOBO - 19/10

Ata do Copom sinaliza persistência no combate à inflação e proximidade de 2014 alimenta especulações sobre liberdade que terá o banco na elevação da Selic



À medida que a inflação persiste nas proximidades da elevada fronteira dos 6%, vislumbra-se uma rota de colisão entre a correta retomada da elevação dos juros pelo Banco Central e a barreira dos dois dígitos, devido à campanha de reeleição da presidente Dilma. Uma taxa Selic de 9,75% ou 10% não faz muita diferença no mundo da técnica, porém, no universo dos marqueteiros eleitorais, este 0,25 ponto percentual tem outra dimensão, por significar mais munição para os adversários de Dilma em outubro de 2014.

A rigor, 10% ou pouco mais até são taxas baixas em relação ao passado. Mas a política metaboliza a realidade de forma diferente.

O teor da ata da reunião da semana passada do Copom, conselho de política monetária, formado pela diretoria do BC, projeta esta possível colisão. Divulgado na quinta-feira, para explicar a decisão de aumentar em 0,5 ponto, para 9,5%, os juros básicos, o documento sinaliza que mais aumentos poderão vir, pois “em momentos como o atual, a política monetária deve se manter especialmente vigilante (...)”.

Embora o BC continue a enxergar alguma moderação à frente nos gastos públicos — cenário invisível para analistas independentes —, a autoridade monetária se preocupa com a continuação de aumentos salariais acima da produtividade — seguramente, uma aposta de marqueteiros de Dilma — e com a ação de mecanismos formais e informais de indexação.

Ao admitir uma inflação persistente bem acima do centro da meta de 4,5% — em nenhum ano de governo Dilma ela terá sido alcançada —, o governo permitiu o acionamento destes perigosos mecanismos. O preço a pagar é que a dosagem de juros para levar o IPCA aos 4,5% será maior do que seria necessário se não houvesse a leniência com a pressão sobre os preços. E pior: leniência em nome de um crescimento que não veio.

A dúvida se o BC será contido antes de chegar aos dois dígitos permeará as análises de conjuntura. Volta, assim, o manto de suspeição sobre a real autonomia do BC, questão que só ele pode elucidar. Melhor que execute o que tem de executar, e cumpra sua missão institucional de proteger o poder aquisitivo da moeda.

O ambiente econômico, devido a inflação elevada e baixo crescimento, e no início da aceleração da campanha eleitoral, aumenta a atenção sobre os próximos passos do BC.

Três ex-presidentes da instituição, Gustavo Franco e Armínio Fraga, de FH, e Henrique Meirelles, de Lula, abriram fogo, em simpósio, contra a inflação dos últimos três anos. Ou seja, teriam agido de forma diferente. Meirelles, por sua vez, pregou um “conservadorismo fiscal”.

É certo, porque, até agora, persiste um quadro monótono, visto desde o final do primeiro mandato de Lula: um governo gastador em custeio que obriga o BC a reforçar a dose nos juros. A diferença é que agora, com Dilma, a real autonomia do Copom continua uma incógnita.

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