sexta-feira, agosto 23, 2013

Tranquilizante para o mercado - VINICIUS TORRES FREIRE

FOLHA DE SP - 23/08

BC anuncia 'ração semanal' de dólares, medida que não segura valor da moeda, mas evita acidentes


O BANCO CENTRAL do Brasil deu a entender, como era mais ou menos previsível, que não vai tomar atitudes heroicas a fim de lidar com a disparada do dólar, o que seria de resto inócuo. Também indicou, outra vez, que não vai acelerar o passo da alta de juros devido ao risco de inflação maior decorrente da alta do dólar.

O BC anunciou ontem que vai oferecer uma ração semanal de uma espécie de empréstimos em dólar ("leilão de linha": venda de dólares com compromisso de recompra daqui a "x" meses). Uma ração de US$ 1 bilhão por semana. Em tese e na ausência de acidentes outros, isso tranquiliza a praça. No curto prazo, o dólar pode tomar um tombo.

Mas tal medida não serve para segurar o preço do dólar nesse ou naquele degrau. Parece mais com um aumento do estoque de bolsas de sangue num hospital em épocas nas quais ocorrem mais acidentes. Se alguém precisar de sangue, tem. Ou seja, as instituições financeiras podem oferecer dólar a preço e juro razoável para clientes que estejam com a língua de fora.

Por língua de fora entendam-se empresas que tenham problemas com dívidas e rolagem neste período complicado, em que a oferta de dinheiro no mercado mundial (para emergentes) diminuiu e/ou ficou cara demais, quando não desapareceu.

Por exemplo, considere-se o caso elementar de uma empresa que deva em dólar, mas não tenha feito operação financeira para se proteger de alta tão rápida do dólar. Pior: o caso de que empresas e/ou instituições financeiras que em massa receiem disparada ainda maior do dólar e corram ao mercado para se proteger. O dólar ficaria ainda mais caro.

O BC ofereceu condições para que empresas e instituições financeiras se planejem e se acalmem. Oferecendo "empréstimos" (leilão de linha), o Banco Central evita acidentes (por asfixia de dólar) e estresses que podem fazer o dólar dar pulos ainda maiores, por motivos menores, o que pode causar mais acidentes.

O Banco Central já fez "leilões de linha" nesta temporada de estresse. Também o fez em momentos de desastre (2001 e 2002), em 2008 e 2009 (quando o crédito secou mesmo) e em 2011, num final de ano de crise greco-europeia pegando fogo.

Isto posto, os entendidos têm ainda menos ideia de para onde vai o dólar. Desde maio, tem seguido o aumento dos juros no mercado americano, que continuam subindo, mas também ninguém sabe para onde.

Seguindo ou não os juros americanos, é improvável que o dólar se aquiete. O real se desvalorizaria mais cedo ou mais tarde porque estamos consumindo demais, o que engorda nosso deficit externo (diferença entre o que importamos e exportamos em bens e serviços). Um dólar mais caro significa que o mundo está nos dando menos crédito para continuar a consumir. Com a presente revoada de dinheiros para os EUA, há menos crédito ainda.

O real se desvaloriza, pois. Ficamos relativamente mais pobres, talvez invistamos mais. Se o governo/BC segurarem a inflação, as coisas em algum momento melhoram, com dores pelo caminho. Isto é, menos crescimento, menos emprego, salários mais contidos, melhorias para a indústria, pioras para o setor de serviços.

Esta coluna foi concluída antes do anúncio do resultado da reunião do Conselho Monetário Nacional (20h44).

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